Capítulo 04

Os dois levantaram-se, mas antes que fossem embora, Barbara bebeu tudo o que restava do uísque em um só gole. Eles saíram de fininho e, mesmo que alguém na saída os notasse, nada seria dito aos meninos ricos. Barbara o levou até o seu carro no estacionamento privado.

— Você dirige uma Lamborghini? — perguntou impressionado, ficando com a boca aberta.

— O que esperava?

— Uma SVU, talvez.

Ela riu do quanto patético Edgar era. Nem de longe é alguém por quem ela sentiria desejo de beijar.

— Espere um minuto.

Ela entrou no carro e pegou uma bolsa no banco ao lado. Com muita dificuldade, devido ao teto baixo, trocou de roupa. Definitivamente, aquele vestido não era apropriado para um baile na comunidade. Ela o substitui por uma saia de seda branca e um top de lantejoulas prateadas, mantendo a sandália preta. Retirou as joias e colocou um par de brincos de prata. Ajeitando os cabelos com os dedos, saiu do carro.

— Uau! — disse Edgar com a mão no queixo, vendo-a mais sensual do que antes.

— Você não pode ir de smoking.

Ele retirou o paletó e a gravata borboleta. Dobrou as mangas da camisa até os cotovelos e retirou a sua barra de dentro do cós da calça.

— Vamos no seu carro? Eu vim com os meus pais.

Barbara riu, negando aquele momento com a cabeça.

— Meu Deus! Você realmente não faz ideia de como é uma comunidade, não é?

Ele deu de ombros. Ela revirou os olhos. Edgar iria dar um belo trabalho naquela noite.

— Vamos de táxi, garoto.

Ela pegou as peças da roupa e as jogou dentro do carro antes de trancá-lo. Passou por ele a passos largos indo em direção à rua. Edgar a seguiu.

— Você está prestes a ir à melhor festa da sua vida. — O olhar dela era de pura empolgação.

— Pago para ver — disse ele com desdém.

Barbara acenou para um táxi, que parou. Eles entraram e o homem perguntou para onde iam.

— Para Rocinha — ela respondeu rápido.

O motorista a olhou pelo retrovisor e, quando viu a burguesa sentada no seu banco, virou-se para trás.

— Tem certeza, moça?

 — Qual foi, tio? Nunca levou a burguesia pra favela? — Edgar perguntou, forçando um sotaque carioca ridículo, fazendo Barbara se sentir envergonhada.

Ela acertou-lhe uma leve cotovelada nas costelas, repreendendo-o. O taxista o olhava de cara feia.

— Desculpe. O idiota aqui está muito empolgado com a noite. Mas, sim, tenho certeza.

Edgar sorria com divertimento estampado no rosto. Eles nem haviam chegado à festa, mas ele já estava bem animado. O homem então assentiu, virando-se para frente e seguindo o caminho que durou cerca de meia hora. Barbara nem sabia que a comunidade era tão perto de onde estava. Quando chegaram, ela pagou pela corrida e desceram. Parou na calçada olhando morro acima. Era grande, alto e bem iluminado. Ela simplesmente achava fascinante a vida das pessoas naquele lugar. Era uma cultura tão diferente da sua. Inspirava liberdade, embora entendesse bem as dificuldades que aquelas pessoas enfrentavam todos os dias. Se Carlos ao menos sonhasse com ela naquele local, infartaria. Ele via aquelas pessoas como a escória da sociedade.

— E agora, Bárbara? Quem vai levar a gente lá em cima?

Qualé, novinha? perdida por aqui? — perguntou um homem ao se aproximar.

— Queremos ir ao baile — disse ela, sorridente.

Ele riu com sarcasmo, pensando se eles estavam mesmo falando sério. Eram engomadinhos demais. Em anos ao pé do morro, nunca tinha visto gente com a pele tão boa ou mais clara pedir para subir.

— Foram convidados?

O sorriso da Barbara sumiu.

— Não.

— Sem convite, não entra, branquela. Deem o fora daqui! — ele foi rude, encarando-os um tanto feio.

— Qual é, cara? Deixa a gente subir. Posso pagar por isso — falou Edgar.

— Aposto que pode, boy. Mas aqui não funciona assim.

O homem deu um passo em direção a ele com a mandíbula contraída. Levantou a barra da camiseta regata, puxando-a para cima e revelando uma pistola presa no elástico da bermuda estampada. Com certeza aquela recepção era bem diferente dos lugares onde Barbara já tinha estado na companhia da Ester. Ela não iria insistir ou enfrentá-lo, nem deixaria que Edgar fizesse. Afinal, havia outras comunidades para onde poderiam ir e não precisavam de confusão. Ela havia imaginado que seria mais fácil entrar, mas percebeu que se enganou feio e que ali era perigoso demais.

— Vamos. — Ela puxou Edgar pelo braço, que encarava o homem com olhos estreitos.

— Não! Viemos para curtir o baile, não foi? — Edgar olhou para ela rapidamente com um olhar encrenqueiro antes de voltar a encarar o sujeito à sua frente. — Tudo nesse mundo tem um preço. — Foi petulante, erguendo o queixo de modo soberbo. 

O homem deu mais um passo à frente, o peitando com um olhar odioso.

— Vamos agora, Edgar! — disse Barbara alto e firme, estava com medo.

— E ae, Edgar — falou outro sujeito, descendo o morro em direção a eles. — A quanto tempo, cara? — O estranho estendeu a mão para ele. Edgar aceitou o cumprimento, mesmo não fazendo ideia de quem era aquele dali. — São os meus chegados, libera ae — disse para o guardião da entrada, que encarou os forasteiros com desconfiança.

— Firmeza, Matheusinho. — O homem andou para o lado, dando passagem a Edgar e Barbara, mas continuou com uma feição fechada e um tanto irada.

— Obrigado — disse Edgar à Matheus.

— Não por isso. Vão lá curtir a festa.

Os olhos dele saíram do Edgar, indo direto para Barbara, que o olhava de boca entreaberta. Ela só pensava que aquele era o salvador da noite deles – embora já não estivesse mais tanto a fim de estar ali – e um tremendo gostoso com aquela regata de cava funda que exibia a lateral do seu abdome. Matheus sorriu para ela, o que a deixou completamente derretida por dentro. Ele não era um engomadinho com sorriso cheio de facetas. Era um preto que certamente iria adorar poder morder o lábio e arrastar as mãos sobre aquela barba que começava a crescer. Mordendo o próprio lábio, ela sorriu de volta.

— Obrigada — disse baixinho.

Ele piscou para ela e olhou para o lado. Assobiou bem alto e fez um sinal com a mão para que duas pessoas fossem até eles. Dois caras se aproximaram pilotando motos.

— Subam ae. Eles levam vocês até a festa — disse Matheus.

Barbara rapidamente subiu na garupa de um deles, enquanto Edgar estava parado, como se estivesse esperando por algo.

— Sobe logo, maluco — falou o piloto da outra moto.

— E o capacete?

Todos ao redor, inclusive Barbara, explodiram em gargalhadas.

— Não tem. A diversão começa aqui — disse ela, antes que o seu piloto acelerasse morro acima.

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