Luna
O barulho dos meus próprios passos ecoa no corredor da biblioteca, abafado pelo tapete grosso que cobre o chão. O lugar está quase vazio, do jeito que eu gosto. Algumas poucas mesas ocupadas por alunos imersos nos estudos, pilhas de livros espalhadas e o farfalhar discreto de páginas virando. O cheiro de papel antigo e café requentado me envolve, uma mistura reconfortante que me acompanha desde o primeiro dia de faculdade. Minha mesa habitual fica no canto, perto da estante de literatura clássica. Um refúgio silencioso. Deixo a bolsa cair sobre a cadeira e solto um suspiro. Meus ombros relaxam, minha mente encontra um fio de tranquilidade. A biblioteca é o único lugar onde o mundo lá fora não exige nada de mim. Sento, tiro um livro da bolsa e o abro no meio, onde marquei com um post-it rosa. Mas antes que eu possa me perder na história, uma sombra se move na minha visão periférica. — Luna Navarro. Minha cabeça se ergue antes mesmo de processar a voz. Zoe. Ela se j**a na cadeira à minha frente, espalhando suas coisas pela mesa. Seu cabelo tingido de azul está preso num coque bagunçado, os olhos brilhando com um interesse exagerado que significa problema. — O que foi? — pergunto, fechando o livro devagar. — Você. — Ela aponta um dedo na minha direção. — E seu crush secreto no atleta do ano. Meu estômago dá um leve nó, mas minha expressão continua neutra. — Você tá falando do quê? — Do seu olhar de peixe morto para o Damian Hayes no estacionamento hoje cedo. Reviro os olhos. — Eu não tenho um crush nele. — Não? Então qual é a desculpa para ficar hipnotizada toda vez que ele chega? — Curiosidade — digo, simples. — Ele é um clichê ambulante. O bad boy popular, capitão do time, que todo mundo quer por perto. É só interessante ver como esse tipo de pessoa realmente existe. — Sei… Zoe apoia o queixo na mão e me encara como se pudesse arrancar a verdade de mim só com o olhar. — Só digo que o universo tem uma mania engraçada de bagunçar as coisas — ela continua, um sorriso travesso nos lábios. — Cuidado, Luna. Às vezes, o destino adora brincar com pessoas que se acham invisíveis. Dou de ombros. — Eu não sou invisível. Só prefiro que as pessoas não olhem demais. — E se ele olhar? Solto uma risada curta. — Ele nem sabe que eu existo. Mas, no fundo, uma parte de mim se pergunta: e se um dia souber? ⛸️🏒📖❄️ Damian A lanchonete do campus está cheia, como sempre. O cheiro de batata frita e café forte paira no ar, misturado com o burburinho de conversas e risadas. Meu corpo ainda sente o resquício do treino da manhã, os músculos tensos, mas nada que um hambúrguer e um milkshake de baunilha não resolvam. — Cara, você jogou pra caralho hoje — Ryan diz ao meu lado, batendo no meu ombro antes de morder um pedaço enorme do sanduíche dele. — Matt quase chorou. Dou de ombros. — Ele precisa aprender a reagir mais rápido. Se fosse um jogo de verdade, teria levado uma surra. — E você adoraria, né? Ryan ri, me dando um olhar cúmplice. — Admito, eu gosto de ver quem consegue me enfrentar. Ele balança a cabeça. — Você é um desgraçado competitivo, Hayes. — E você não? — Sou. Mas eu sei relaxar. Você, por outro lado… — Eu relaxo. Ryan me encara, levantando uma sobrancelha. — Ah, é? Quando foi a última vez que você fez algo que não envolvesse hóquei? Penso por um momento, mas nada me vem à mente. Ele ri, balançando a cabeça. — Tá vendo? Você vive e respira isso. — Eu preciso. Ele não discorda, mas seu olhar me diz que ele acha que eu estou exagerando. Talvez eu esteja. Mas treinar, jogar, vencer… Isso é o que eu conheço. O que sempre conheci. E falhar não é uma opção. Meus olhos vagueiam pelo salão sem motivo, apenas por hábito. E então, por acaso, eu vejo. Alguém que nunca vi antes. Ela está sentada sozinha, lendo um livro. A pele rica em melanina contrasta com o cabelo volumoso, as ondas se espalhando em um caos perfeito ao redor do rosto. Ela usa um suéter grande, meio caído no ombro, e há algo nela que não combina com o resto do lugar. Como se estivesse em um mundo à parte. Algo me faz encará-la um pouco mais. — Tá olhando o quê? — Ryan pergunta, seguindo meu olhar. — Nada — respondo automaticamente, desviando. Mas por alguma razão, eu quero olhar de novo. E eu olho. Só por um segundo a mais do que deveria. ⛸️🏒📖❄️ Luna Meus olhos captam o movimento antes do meu cérebro processar o que está acontecendo. Damian Hayes está olhando na minha direção. Por um instante, eu acho que estou imaginando coisas. Não faz sentido. Eu sou invisível. Sempre fui. Mas não. Seus olhos verdes estão fixos em mim, mesmo que apenas por um segundo. E, então, como se nada tivesse acontecido, ele desvia. Meu coração acelera, mas minha mente me diz para ignorar. Não significa nada. Pessoas olham umas para as outras o tempo todo. Ele provavelmente nem percebeu que olhou para mim. Mesmo assim, há algo inquietante nisso. Algo que faz um arrepio subir pela minha espinha. Algo me diz que esse não foi o último olhar. E talvez, só talvez… Isso seja o começo de algo que eu não posso evitar.LunaO som abafado das conversas preenche a sala, criando um zumbido constante de vozes misturadas. Meu caderno está aberto sobre a mesa, mas minha mente está longe da matéria.O professor anda de um lado para o outro, os óculos escorregando pelo nariz enquanto ajeita alguns papéis. Sei o que está por vir – ele mencionou um trabalho importante na última aula, e agora é questão de tempo até que ele nos jogue em alguma atividade em dupla.E eu já sei exatamente com quem quero fazer.Zoe está sentada ao meu lado, tamborilando os dedos na mesa com impaciência. Ela lança um olhar sugestivo para mim, e eu reviro os olhos antes mesmo dela dizer qualquer coisa.— Só para garantir, caso role duplas, você vai comigo, né? — sussurra ela.— Óbvio — respondo, distraída.O professor pigarreia, chamando a atenção da turma.— Como mencionei na última aula, o trabalho que vocês farão valerá uma boa parte da nota do semestre. E, para garantir que tenham uma visão mais ampla sobre o tema… — Ele pausa, c
Luna Eu preciso de paciência. Muita paciência. Porque, honestamente, Damian Hayes é insuportável. Depois de quase trinta minutos tentando estruturar nosso trabalho, a única coisa que consegui foi um leve começo de dor de cabeça. Ele se recosta na cadeira como se não tivesse um pingo de preocupação no mundo, enquanto eu rabisco tópicos no meu caderno, tentando não surtar. - Você pode, por favor, focar nisso por cinco minutos? - peço, exasperada. Damian ergue a cabeça e pisca lentamente, como se tivesse acabado de ser acordado de um cochilo. - Eu estou focado. - Não, você não está. Você só tá sentado aí, olhando para mim como se isso fosse um reality show. Ele ri. - Você percebeu? Jogo a caneta sobre a mesa. - Claro que percebi! Dá para parar? - Eu só estou tentando entender você, estressadinha. Fecho os olhos e respiro fundo. - Primeiro: para de me chamar assim. Segundo: não tem nada para entender. Vamos só dividir as tarefas e fazer isso direito, ok? Ele me observa por
LunaA biblioteca está mais silenciosa do que o normal. Talvez porque seja sexta-feira e a maioria dos alunos tenha encontrado lugares melhores para estar do que enfiados entre estantes de livros acadêmicos.Eu, no entanto, não me importo. Esse sempre foi meu refúgio. O lugar onde posso existir sem que ninguém repare em mim.Ou, pelo menos, era.Porque agora, sentada em uma mesa no canto, estou esperando por ele.E, para piorar, me sinto nervosa.Isso é ridículo.Respire fundo, Luna. É só um trabalho.Estou no meio desse mantra interno quando Damian entra na biblioteca.E, claro, ele faz isso como se estivesse invadindo um território desconhecido.Ele passa os olhos pelo lugar, o cenho levemente franzido, como se não soubesse bem o que fazer ali. Seu cabelo está mais bagunçado que o normal, e ele usa um moletom escuro com a logo do time estampada no peito. Mesmo em um ambiente como esse, sua presença é impossível de ignorar.Quando finalmente me vê, ele sorri daquele jeito convencido.
DamianO frio do gelo é uma sensação que sempre me trouxe conforto. O som das lâminas cortando a superfície, o baque seco do puck contra o stick, a vibração dos gritos dos meus companheiros de time—tudo isso faz parte do que eu sou.Aqui, eu não preciso pensar. Não preciso questionar nada.No gelo, sou apenas eu e o jogo.— Bora, Hayes! Para de viajar! — Ryan grita, deslizando ao meu lado antes de roubar o puck da minha frente.Reajo no mesmo segundo, girando o corpo e esticando o stick para tentar recuperar o disco, mas ele já disparou para o outro lado da quadra.Merda.Meus músculos estão no automático, minha mente sabe exatamente o que fazer. Mas algo está diferente.Minha concentração não está onde deveria estar.E eu sei exatamente o motivo.Luna Navarro.Não faz sentido.Ela é só uma garota. Só uma nerd obcecada por organização e argumentos bem estruturados. Só uma pessoa que nem fazia parte do meu mundo até dois dias atrás.Então por que diabos eu passei a noite inteira pensan
Luna — Você não acha que está exagerando um pouco? A voz de Zoe corta minha concentração, me fazendo levantar os olhos da tela do laptop. Estamos sentadas na cafeteria do campus, no nosso canto habitual, e minha melhor amiga me observa com uma expressão meio divertida, meio curiosa. — Exagerando com o quê? — pergunto, franzindo a testa. — Com essa sua obsessão em planejar cada detalhe do trabalho com o loirão tatuado. Reviro os olhos. — Não é obsessão, Zoe. É organização. Ela se inclina para frente, apoiando os cotovelos na mesa. — Tá bom. Então me explica por que você está anotando até as pausas que vão fazer no trabalho. — Porque eu gosto de ter controle das coisas. — Ou porque você está tentando desesperadamente fingir que esse projeto não vai ser uma grande distração. Eu paro. — Como assim? Ela sorri, apontando para mim com a colher do cappuccino. — Luna, amiga, eu te conheço. Sei que você não gosta de surpresas, nem de mudanças na sua rotina. E sei que você tá se co
Damian A zoeira não para nem quando saímos da cafeteria. — Cara, Ken foi pesado — Nate ri, batendo no meu ombro enquanto caminhamos até o carro. — Foi o melhor apelido que ela podia ter te dado — Owen acrescenta, segurando o riso. — Um loiro, cheio de músculos, metido a galã… mano, tu é o Ken. Reviro os olhos, ignorando as risadas dos idiotas ao meu redor. — Isso não vai pegar. — Sei… — Nate debocha. — Como se a gente já não estivesse planejando mudar seu contato no grupo para “Ken Hayes”. Eles caem na gargalhada de novo, e eu só balanço a cabeça. Maldita Luna Navarro. Ela sabia o que estava fazendo quando me chamou daquele jeito. E eu odeio admitir, mas… a nerd metódica sabe provocar. ⛸️🏒📖❄️ O treino começa alguns minutos depois, e eu me forço a focar no que realmente importa: o jogo. O barulho dos patins deslizando no gelo, os gritos do treinador e o impacto do puck contra os tacos ocupam minha mente, deixando pouco espaço para qualquer outra coisa. No gelo, eu não so
Luna on O frio da manhã me faz puxar o casaco ais para perto do corpo enquanto caminho pelo campus. O inverno ainda não chegou com tudo, mas a brisa gelada já avisa que não está longe. Meus dedos estão frios ao redor do copo de café que comprei antes da aula, e eu me pergunto por que diabos ainda não comprei uma luva decente. Ao meu lado, Zoe mastiga distraidamente um pedaço de bolo, a expressão sonolenta. — Você viu o cronograma de provas? — pergunto, tomando um gole do café. — Vi — ela resmunga. — E também vi minha vontade de viver indo embora junto com ele. Solto uma risada baixa, mas não posso discordar. O semestre está apertado, e minha rotina está cada vez mais cheia. Além das provas, tem o trabalho na cafeteria e, claro, o projeto com ele. Damian Hayes. O nome dele surge na minha mente antes que eu possa evitar. Faz dois dias desde que nos encontramos na biblioteca, e eu ainda não decidi se foi uma experiência ruim ou só… estranha. Ele não era o cara arrogante e insu
Luna OnA biblioteca está silenciosa, exatamente como eu gosto. O som baixo das páginas virando, os teclados sendo pressionados em um ritmo contínuo e o leve murmúrio de conversas abafadas criam um ambiente perfeito para se concentrar. Ou pelo menos deveriam criar.Se não fosse por ele.— Você tá realmente escrevendo tudo isso? — Damian questiona ao meu lado, inclinando-se sobre a mesa para espiar minhas anotações.Eu suspiro, sem tirar os olhos do caderno.— Sim, porque eu levo o trabalho a sério. Diferente de certas pessoas.Ele solta uma risada baixa.— Eu levo a sério. Só não vejo necessidade de escrever um livro inteiro de anotações.Reviro os olhos e continuo escrevendo. Mas ele não cala a boca.— Sua letra parece até fonte de computador. Tem certeza que você não é um robô?Solto a caneta e olho diretamente para ele.— Você realmente não consegue passar cinco minutos sem falar?Ele sorri.— Não quando tem alguém tão divertido pra provocar.Cruzo os braços.— Foco, Hayes. Se você