Capítulo 01

Damian On

O despertador toca, e eu o ignoro.

Por exatamente três minutos.

O som irritante continua, insistente, até que minha mão o acerta com força. A luz fraca da manhã atravessa a cortina do meu quarto, iluminando o caos de roupas jogadas, equipamentos de hóquei e livros que eu jurei que ia organizar.

Outra manhã. Outra rotina. O mesmo ciclo de sempre.

Me espreguiço, sentindo a rigidez dos músculos. O treino do dia anterior ainda pesa no corpo, mas nada que um banho frio e cafeína não resolvam. Me arrasto até o banheiro, jogando água no rosto antes de encarar meu reflexo no espelho. Olhos verdes cansados, cabelo bagunçado, um corte no lábio da última disputa mais agressiva no gelo.

Isso é hóquei. Isso sou eu.

Visto uma camiseta preta, jeans rasgado e minha jaqueta de couro surrada. As chaves da minha moto estão onde sempre deixo – no capacete, pendurado na maçaneta da porta. Pego e saio do quarto, descendo as escadas até a garagem do prédio.

Minha moto , Dama da noite espera por mim.

Sim, dei um nome para ela. Nada se compara à sensação de pilotá-la. O motor ronrona quando a ligo, e o vento frio da manhã me acerta assim que acelero. A universidade não fica longe, e em poucos minutos, estou lá, estacionando entre os carros como se aquele espaço fosse meu por direito.

O frio do gelo sempre me acorda de verdade.

Os patins cortam a superfície lisa, deixando rastros enquanto me aqueço com os outros caras do time. O som do disco de hóquei batendo contra os tacos ecoa no rinque vazio. As lâmpadas fluorescentes iluminam a neblina leve que se forma com o choque do frio e do calor dos nossos corpos em movimento.

O treinador assobia.

— Vamos começar com intensidade! Quero velocidade e precisão!

A primeira meia hora é corrida e passes. Patinamos de um lado para o outro do rinque, aumentando a velocidade a cada volta. Meu coração martela dentro do peito, os músculos queimam, mas eu me forço a ir além.

— Não diminuam o ritmo, caralho!

O técnico grita, e eu obedeço sem questionar. Ele não precisa me dizer duas vezes.

Agora é treino de ataque. Estamos divididos em duplas: um atacante e um defensor. Hoje, estou contra Matt, um dos novatos. Ele é rápido, ágil, mas ainda não aprendeu a ler os movimentos do adversário.

— Porra, Matt, isso aqui é jogo de hóquei e não balé, caralho. Sua irmã de cinco anos j**a melhor que você.

Péssimo para ele.

Ele tenta me bloquear quando avanço com o disco. Mas eu vejo a brecha antes mesmo dele perceber que está cometendo um erro. Faço uma finta para a direita, meu corpo inclina, os patins raspam no gelo. No último segundo, desvio para a esquerda e disparo o disco com força.

Gol.

O técnico não diz nada, apenas assente. Sei que ele espera isso de mim.

A pressão está sempre ali, como uma sombra. No rinque, não posso errar. Se eu falho, sou só mais um jogador comum. E jogadores comuns não viram lendas.

A parte final do treino é contato físico. Choques contra a parede, disputas pelo disco, empurrões. O calor sobe, a agressividade aumenta.

E eu gosto disso.

Adrenalina. Competição. O impacto dos corpos contra o gelo.

Quando o apito final soa, estou exausto, o uniforme encharcado de suor. Respiro fundo, olhando para os rastros de patins no gelo. Por um instante, tudo desaparece. Não há torcida, não há expectativas. Apenas eu e o gelo.

Mas a realidade sempre volta rápido demais.

— Bom treino, Hayes. Mas poderia ter sido melhor.

Meu técnico me encara com aquele olhar avaliador. Ele nunca diz que foi suficiente. Nunca.

Solto um riso curto, sem humor.

— Eu sei.

Porque, no fundo, eu também penso a mesma coisa.

⛸️🏒📖❄️

Luna

A manhã chega devagar, deslizando pelas frestas da cortina como um segredo que insiste em ser descoberto.

Abro os olhos, mas não me movo de imediato. O mundo lá fora pode esperar um pouco mais. Aqui, na segurança das cobertas, o tempo parece suspenso – um intervalo entre o sono e a realidade.

O despertador já tocou, mas eu o ignorei. Como sempre.

Respiro fundo, o cheiro adocicado do meu creme de lavanda ainda impregnado no travesseiro. Meus músculos estão pesados, minha mente ainda perdida no resquício dos sonhos da noite passada.

Mas a vida exige movimento.

Me espreguiço lentamente, sentindo os primeiros traços de consciência se instalarem em mim. O quarto ao redor é uma extensão da minha mente: prateleiras abarrotadas de livros, folhas rabiscadas sobre a escrivaninha, um copo esquecido com o resto de café da noite anterior. O caos organizado de alguém que prefere histórias a interações sociais.

Me levanto e sigo para o banheiro. A água fria me desperta, mas não afasta completamente o cansaço que carrego. Me encaro no espelho – cabelo volumoso em uma bagunça descontrolada, olhos ainda sonolentos, olheiras discretas que denunciam mais uma madrugada de leitura.

Visto uma calça jeans confortável, uma camiseta oversized e um suéter felpudo. A roupa perfeita para se misturar na multidão sem chamar atenção.

A bolsa já está pronta. Os livros, pesados como sempre. O café, requentado, amarga na boca, mas eu tomo mesmo assim.

⛸️🏒📖❄️

O campus já está movimentado quando chego. Alunos andando apressados entre os prédios, alguns rindo, outros imersos em seus celulares ou em conversas animadas. Uma energia vibrante que me envolve, mas da qual sempre me mantenho à margem.

Eu sou invisível. E eu gosto assim.

Não que eu não tenha amigos. Pelo contrário. De alguma forma, consegui me conectar com pessoas o suficiente para nunca estar realmente sozinha – baristas da cafeteria, bibliotecárias, colegas de turma que sempre me pedem ajuda com trabalhos. Mas ninguém me nota de verdade. E eu prefiro assim.

Enquanto atravesso o pátio, vejo grupos bem definidos. Os nerds debatendo teorias de filmes, o pessoal das artes discutindo o último projeto da galeria, os atletas dominando a entrada do ginásio.

E então, há ele.

O rugido do motor preenche o estacionamento, um som grave e intimidador que faz algumas pessoas se virarem automaticamente. Damian Hayes chega como sempre – montado em sua moto preta, jaqueta de couro, sorriso de quem não se importa com nada.

E ele não chega sozinho.

Assim que desce da moto, é recebido pelo grupinho de sempre – jogadores do time de hóquei e líderes de torcida. Gente barulhenta, gente que vive para ser notada. Ele os cumprimenta com batidas nos ombros, um sorriso torto, a presença naturalmente dominante.

Não que eu esteja olhando.

Ou talvez esteja.

Só por curiosidade.

— Um dia desses, você vai acabar hipnotizada demais e tropeçar — Zoe, minha amiga da aula de escrita criativa, comenta ao meu lado, um sorriso travesso nos lábios.

— Não faço ideia do que você está falando. — Finjo desinteresse, ajustando a alça da bolsa no ombro.

— Aham, claro. — Ela ri, balançando a cabeça. — Você não é tão invisível quanto acha, sabia?

Reviro os olhos, mas deixo a provocação passar.

Damian Hayes não tem ideia de que eu existo.

E é melhor que continue assim.

Mas alguma coisa me diz que isso está prestes a mudar.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP

Capítulos relacionados

Último capítulo

Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP