Ele ri debochado.—Espere! Eu ouvi bem? Você quer trabalhar para mim?Eu engulo o meu orgulho e assinto.—Sim. Sei que o meu trabalho não pagaria tudo que meu pai roubou, mas eu poderia trabalhar um tempo determinado pelo senhor para saldar uma parte da dívida e a outra parte, meu pai ajuntaria dinheiro para pagar.Ele fecha a cara e dá um murro na mesa. Eu pulo da cadeira.— Fale-me agora, qual é a diferença de você com Daniel?Deus! Eu pisco, confusa e com medo pelo tamanho de sua agressividade. Mas digo ousada:—Ele te..ve a chance de escolha, eu não. Daniel vendeu a sua alma por que quis.—Vender a alma me lembra inferno, e Daniel está bem conosco. Muito melhor do que jamais esteve. Por acaso você tentou entender isso?Eu estremeço.—Isso não vem ao caso...—Dio Santo! E o fato do seu pai roubar, você acha uma atitude certa?Eu estremeço.—Não! É claro que não...—No entanto, está aqui defendendo um ladrão?—Porque é meu pai. É da minha família que está falando.—E Daniel, é o que
— Eu sou formada em administração. Eu poderia trabalhar como secretária, na administração, numa área que não envolve dinheiro já que não confia em mim.Ele ri. Depois gargalha. A sua cabeça jogada para trás e sua garganta morena exposta zombando de mim.— Todas essas vagas estão ocupadas. Por que acha que eu dispensaria alguém para a senhorita ocupar o lugar?— Eu... —Eu o encarei sem palavras.Deus! Eu sinto arrepios de raiva correr pelos meus braços e pernas.— Você irá trabalhar como faxineira. — Ele diz taxativo.O modo como ele fez soar a palavra "faxineira" me deu a impressão que ele estava se divertindo muito com isso. Deus! É muita humilhação. Pelo jeito que ele fala, acho que vou limpar o banheiro dele, quem sabe a sua bunda? Tenho uma vontade insana de socar sua cara.Eu ofego.—Faxineira?—Sim. Enquanto o seu pai não conseguir pagar toda a dívida, você irá trabalhando para mim. Mas como não sou carrasco, meio período está bom. Você escolhe, de manhã ou à tarde.— Mas com ess
Chego do hospital com meu pai. Carrego Michael nos braços, ele ainda dorme profundamente, mas sei que não vai resistir por muito tempo. Coloco-o no berço com cuidado, observando seu rostinho tranquilo. Quando volto para a sala, a carranca de meu pai me encara com um olhar carregado de reprovação.— Deus! Tinha que ser esse lugar? Justo aqui? Você fez de propósito, não fez? — Ele questiona, ainda sentado no sofá apertado da nossa minúscula sala, a voz cheia de frustração.Minhas mãos se fecham na cintura, uma tentativa de controlar a ira que começa a crescer dentro de mim.— Deus, digo eu! Você realmente acha que eu gostaria de morar nesse fim de linha? Lembre-se que nossa pobreza não foi um acidente! Eu me sinto tão desafortunada nessa vida que acho que, se perdesse uma agulha num palheiro, eu a encontraria se me sentasse nele. Se não puder ajudar, fique calado. Afinal, o importante é participar, não é mesmo? — As palavras saem com uma raiva abafada, como se eu carregasse o peso de um
Fiz o almoço e levei para papai. Dei uma papinha de abacate e mel que eu comprei ontem para Michael. Depois que almoço, vou tomar banho. A secretaria havia me dito que eu precisava chegar às duas horas da tarde.Saio às dez horas da noite.Coloco uma calça jeans escura, uma camiseta preta e uma blusa de moletom da mesma cor. Calço tênis preto e depois de dar um beijinho em Michael que já está dormindo, dou um beijo no meu pai.—Pai, estou indo.—Obrigada por estar fazendo isso por mim. Do jeito que aquele homem olhou para mim quando ele descobriu o roubo, sei que eu sofreria muito nas mãos dele. Acredito que por você não ter nada a ver com o roubo ele não irá te cobrar tanto.Eu me arrepiei com suas palavras. Meu pai não sabe da missa a metade. Ele não sabe quem Daniel se tornou e com quem ele se meteu.Pai, vou indo. Não quero chegar atrasada no meu primeiro dia de trabalho. Dou um beijo nele e tento não pensar muito sobre isso durante o trajeto até o Olimpo.Logo que chego sou orien
Lucy chega nesse momento, seu semblante se fecha imediatamente ao me ver falando com Mancini.— Explique depois para a senhorita Johnson as regras.A secretária assente com um leve movimento de cabeça.— Sim, senhor Mancini.Ele abre a porta de forma brusca, como se convidasse não apenas a entrar, mas também a sentir o peso do ambiente.— Entre!Empurro o carrinho para dentro do escritório, sentindo o peso invisível das tensões no ar. Três homens altos e corpulentos estão em pé, rodeando um senhor de meia-idade que parece menor do que realmente é, encolhido sob a pressão dos olhares.Mancini se aproxima lentamente, sua voz baixa como um murmúrio cortante.— O senhor é um tanto corajoso, Sr. Fox. Preciso lembrá-lo com quem está lidando?A presença dele preenche o ambiente. Ele se senta com a calma controlada de quem sabe que domina a situação. Sua postura rígida e o olhar severo fazem o senhorzinho hesitar antes de responder.— Sinto muito, senhor Mancini. Eu errei. Não notei que ela e
— Por que você manteve o meu pai com vida, mesmo com o roubo? Foi por causa de Daniel?Antony me encara diretamente, e o sorriso que aparece no rosto dele é tão irritante quanto desconcertante.— Porque não somos tão maus assim, hoje em dia. Resolvemos rumar para o bem, para o lícito, para o correto. Estamos nos empenhando muito nisso.Olho para ele com descrédito, mordendo a língua para não retrucar. Desvio os meus olhos dos dele, mas ele continua:— E se eu dissesse que aquela conversa que você ouviu foi uma armação?A minha cabeça se ergue de imediato.— Armação? Como assim?— Sim, isso mesmo que ouviu, senhorita Johnson. O senhor Fox, em comum acordo comigo, entrou no meu jogo. Tudo aquilo que ouviu não faz mais parte de nós. Hoje agimos dentro da lei. Se ele tivesse me roubado, eu faria um boletim de ocorrência, como qualquer cidadão comum. Todos nós estávamos nos divertindo às suas custas.Sinto meu rosto queimar de indignação.— Por que fez aquilo? — pergunto, tentando conter o
KateVi quando aquele homem alto entrou no escritório de Mancini. Ele passou por mim sem sequer notar minha presença, movendo-se com uma determinação fria. Sempre soube que o uniforme de empregada nos torna invisíveis, mas, de certa forma, isso não deixa de ser conveniente. Lucy, a secretária, sai da antessala e vai para o corredor, parando como uma estátua diante da porta de Antony.— O que houve? — pergunto, curiosa.— Don está com o senhor Mansur. Quando ele entra em uma sala, é proibido ficar na antessala.— Por quê? — insisto.— As paredes deste cassino são muito finas.— Ah, tá. — Murmuro, sentindo um peso no peito. Esse emprego parece piorar a cada dia.Respire, digo a mim mesma. Vai dar tudo certo.— Você acha que aconteceu algo para ele estar aqui? — questiono, incapaz de conter minha curiosidade.— Com certeza.Que estranho, penso.Não demora muito, e a porta se abre. Mancini sai de lá transtornado. Assim que Lucy o vê, abaixa a cabeça. Eu faço o mesmo, instintivamente.Deus
No dia seguinte, levanto-me bem cedo. O silêncio da casa ainda repousa nos cantos enquanto coloco a água para ferver. O aroma do café fresco enche a cozinha e acalma meu coração, que insiste em começar o dia aos pulos. Meu pai surge pelo corredor, ajeitando o colarinho da camisa, e não demora a pegar a sua xícara fumegante. Ele a segura como se o calor fosse sua força para enfrentar o dia. Depois de alguns goles e poucas palavras, sai decidido a resolver a sua aposentadoria.Quando Michael acorda, já terminei boa parte das tarefas domésticas. Ao vê-lo, meu coração aquece. Seu sorriso é como um raio de sol invadindo um dia nublado. Aproximo-me do berço com um sorriso largo, aquele que guardo só para ele. "Bom dia, meu pequeno!" Acaricio a suas bochechas macias e o encho de beijos, arrancando dele gargalhadas que fazem ecoar vida pela casa. O pego nos braços, sentindo o seu cheirinho único, e o balanço suavemente antes de trocá-lo.Cada dia que passa ele se parece mais com Daniel.Deus,