No dia seguinte, levanto-me bem cedo. O silêncio da casa ainda repousa nos cantos enquanto coloco a água para ferver. O aroma do café fresco enche a cozinha e acalma meu coração, que insiste em começar o dia aos pulos. Meu pai surge pelo corredor, ajeitando o colarinho da camisa, e não demora a pegar a sua xícara fumegante. Ele a segura como se o calor fosse sua força para enfrentar o dia. Depois de alguns goles e poucas palavras, sai decidido a resolver a sua aposentadoria.Quando Michael acorda, já terminei boa parte das tarefas domésticas. Ao vê-lo, meu coração aquece. Seu sorriso é como um raio de sol invadindo um dia nublado. Aproximo-me do berço com um sorriso largo, aquele que guardo só para ele. "Bom dia, meu pequeno!" Acaricio a suas bochechas macias e o encho de beijos, arrancando dele gargalhadas que fazem ecoar vida pela casa. O pego nos braços, sentindo o seu cheirinho único, e o balanço suavemente antes de trocá-lo.Cada dia que passa ele se parece mais com Daniel.Deus,
KateAo chegar à ala norte, o ar está carregado, quase palpável, como se as paredes escondessem um segredo prestes a explodir. As garçonetes se reúnem em pequenos grupos, cochichando com uma excitação evidente. O nome do novo chefe é o centro de todas as conversas, e a tensão paira no ambiente como uma corda esticada, prestes a se romper.De repente, Laura, a moça das fichas, aparece. Desde que nos tornamos amigas, ela parece ter um radar para surgir nos momentos mais inesperados. Assim que me vê, caminha apressada na minha direção.— O chefão está aqui. Já pediu uma reunião com todas as garçonetes, por isso esse alvoroço. — Seus olhos brilham de curiosidade.— É mesmo? E o que você está fazendo aqui? Pelo que eu sei, você trabalha no caixa vendendo fichas. — Brinco, tentando esconder meu próprio nervosismo.— Estou aqui de enxerida, claro. E você? Não é de trabalhar nesse horário.— Entrei mais cedo para resolver umas coisas. — Forço um sorriso, tentando mudar de assunto.— Você viu
Eu o encaro, pela expressão do meu rosto ele sabe que estou resoluta em afastá-lo de minha vida. —Kate... —Ele diz, rouco. —Daniel, por favor... Eu o encaro com tristeza e vejo que ele fica desconcertado. Embora ele tenha permitido que eu o afaste, sei que ele não aceita. Então a expressão dele muda e ele encara-me de um jeito duro, o seu rosto uma pedra. —Por favor, o quê? O seu lugar é ao meu lado!—Não temos volta. Não, depois da decisão que tomou. As minhas palavras não apenas o incomodam de novo, mas sinto que consigo enfurecê-lo. Contemplo-o com temor, enquanto fecha os olhos e aperta os punhos... é a primeira vez que eu o vejo assim. Ele dá um passo em minha direção. Eu me encolho como um animal acuado.—Não. —Ergo as minhas mãos. — Por favor.Ele me olha ofegante. O seu rosto se transforma novamente, ele me olha como uma fera. —Deus! A decisão que tomei foi por você! Quantas vezes terei que repetir isso?! — Daniel urra.Um sentimento de tristeza se crava no meu peito. —
Daniel fica duro como uma pedra, nem parece sentir dor com meus socos. Ele segura os meus braços.—Kate, eu te amo e sei que me ama. Não percebe que o destino nos uniu novamente?Eu o corto:—Eu prefiro ser sua empregada a me casar com você!Minhas palavras soaram como se eu desse um soco no seu estômago. O rosto de Daniel se contorce. Elas doeram em mim também.Ele me olha calado, engolindo tudo que talvez ele estivesse por dizer:—Então é assim, Kate? Prefere ser minha empregada, a se casar comigo.Eu não respondo, apenas o encaro ofegante.—Que medo é esse que tem com relação a nós, Kate? Esse seu medo não é normal e eu vou descobrir porque me teme tanto.Eu estremeço e engulo em seco.Ele não pode saber de Michael!—Claro que tenho medo. Não sou ignorante em relação a essa família. Desde pequena ouço falar dessa família.Daniel assente.—Passado. Kate. Isso tudo é passado. —Ele então me observa atentamente. —Antony assediou você, por isso tem medo?—Não, claro que não.—Digo, sem p
Eu engulo em seco e olho para ela. Tudo nessa mansão demonstra a riqueza dos seus donos. Mas eu não consigo reparar em nada com detalhes, estou muito nervosa.—Quer beber algo, Kate?A minha garganta está seca.—Água.Renata pega o sino e agita. Uma empregada aparece de pronto, exibindo um sorriso.—Sim, dona Renata.—Traz um copo de água por favor. —Ela então se vira para mim com o menino no colo. —Sente-se.Eu respiro fundo e me sento. A criança pede para descer. Ela o coloca no chão, o menino pega um carrinho e vem na minha direção, ergue-o para mim e me mostra.—Que lindo. —Falo para ele. Meu coração ainda está agitado.—Você é bem nova, não é Kate? Daniel me disse que tem apenas dezenove anos.—Sim.—Você sabe quem eu sou? —Ela me pergunta.—Imagino que seja a esposa de Don Vincent.—Exatamente. —Ela me estuda. —Daniel nos contou como nos enxerga.Meu coração se agita e eu assinto. A empregada entra e me oferece o copo de água. Eu bebo como se tivesse no meio do deserto. Sedenta
—Eu...Don Vincent me interrompe.— Não é a mim que você deve dizer alguma coisa, mas sim a Daniel. É a ele que você deve expor a sua resolução. Sei que é muito nova, mas você me parece ser madura para a sua idade. Então, pense nas minhas palavras. Tem portas que se abrem apenas uma vez e você tem que agarrar as oportunidades que vem com elas. Pois não há tempo, nem nada que as faça abrir como antes e mesmo que se abram depois, elas vêm com uma bagagem de perdas. Eu assinto para ele. —Posso ir? Vincent assenti para mim com um gesto de cabeça. Eu me levanto e saio da biblioteca. Parece um sonho, um lindo sonho. Aquela impressão horrível que eu tinha foi-se. Claro que Daniel não me colocaria em risco! Deus! A verdade estava no meu nariz, mas eu não enxerguei. Quando entro na sala, Daniel está lá, sozinho, andando de um lado para o outro, parece nervoso. E eu sei por quê. Ele sabe que estamos num ponto crucial da nossa relação. É sim ou não e ele espera a minha resposta a respeito
Deus! Eu não pensei nisso. Ele nem sabe que esteve nas mãos da máfia. Eu o poupei dessa verdade.— Daniel, pega leve com ele. O coração dele não está bom. E eu não contei que trabalhei para a organização Bertizzollo.Daniel ofega, a tensão tomando conta do ambiente.— Pegue leve com ele? Quem sempre me escorraçou foi o seu pai, não ao contrário.Meu peito sobe e desce rapidamente. São apenas onze horas da manhã, mas sinto como se o dia inteiro já tivesse me drenado. Tento amenizar a situação:— Eu sei, amor, mas agora é diferente. Você o tem nas mãos.Daniel respira fundo, os ombros finalmente relaxando um pouco.— Deus, Kate! É tão bom ouvir você me chamar de "amor". Senti tanto sua falta.Meus olhos se enchem de lágrimas, e um sorriso emocionado escapa de meus lábios. O olhar de Daniel escurece, um misto de dor e desejo estampado em sua expressão, que só o torna ainda mais intensamente belo. Ele me puxa para mais perto, e o calor de sua proximidade faz meu coração disparar. Meu olha
— Cala a boca!Sua voz ressoa como um trovão pelo quarto, e um gemido débil escapa dos meus lábios, atingida pela força de suas palavras. Por um instante, sinto o impacto do seu tom cortante. Deveria estar chateada com a sua grosseria, mas não consigo. Em vez disso, reconheço a dor por trás da sua raiva, a mágoa de alguém que cresceu sem o amor de um pai e viveu toda a vida carregando esse vazio.— Fico me perguntando... Se eu não tivesse tomado uma atitude radical, tirado você do escritório e te levado à mansão à força, eu jamais saberia da existência do meu filho, não é mesmo?Seus olhos brilham com uma mistura de frustração e incredulidade, como se tentasse processar o peso da situação.Me aproximo dele, cada passo mais pesado, como se meu coração carregasse o peso de uma vida inteira de arrependimentos. Quando finalmente estou perto, envolvo-o em um abraço, tentando transmitir tudo o que não consigo dizer em palavras. Ele, porém, permanece imóvel. Os seus braços pendem ao lado do