Passaram-se dias que iam na mesma lentidão com a qual minhas feridas sarravam. Não me importava mais com o passado, mas sim com o futuro. Me cansei tanto de lembrar e reviver, que tinha decidido brincar de adivinhas com o tempo. Cada dia era um dia, me encolhia no embalo do acontecer e me permitia crescer e cicatrizar, por mais que várias coisas tivessem mudado.
Quase no fim da manhã, olhava para meu reflexo banhado de desânimo. Era oque mais via no meu reflexo, todas as noites e todos os dias.
Minha expressão estava indecisa, não sabia se ficava empolgada ou irritada por ter que voltar para escola. Minha calcinha cobria minha indecência, o resto era exposto como se já não me coubesse nem interessasse esconder. Alguns raios solares aqueciam-me a pele de forma fraca, parecia que choviam grãos de poeira, tendo os raios como holofotes para seu espetáculo slow. Estava tudo em câmera lenta, que parecia a forma mais sensata que Deus arranjou para t— Olá, mais uma vez. — disse sem esperar que eu me sentasse no banco de passageiro.— Oi, oque quer falar comigo? — perguntei assim que me acomodei.— Não aqui. — olhou para mim como se tivesse falado algo tão óbvio.— Aonde, então?— Para onde quer ir?Ofereci meu olhar mais intenso. Buscava detectar qualquer vestígio de brincadeira em si, mas não havia, então decidi colocar o cinto de segurança e me pronunciar.— Eu, particularmente, estou com fome. — dito isso, me virei para a janela para esconder meu sorriso.— Podemos ir para minha casa?Me virei bruscamente e o homem me olhava.— Eu tenho que chegar cedo, então não. — Pedi permissão a tua mãe para te levar para sair e depois para casa.— O que? Com que permissão você pediu permissão para minha mãe? Não, espera...você pediu permis
— Quantos quilômetros quadrados tem essa casa? — Não sei dizer. — riu.— Quem está aqui? — perguntei passando pela sala e seguindo seus passos.— Ninguém. Minha mãe foi trabalhar, meu pai viajou e a empregada tem saído cedo, ultimamente.— Ah, estámos sozinhos. — tentei transmitir uma calma que estava à milhas de existir.— Vem, vamos conhecer meu quarto. — parou e estendeu sua mão para mim.— Você também não conhece? — ri e peguei na sua mão meio contrariada. — Espera, conhecer teu quarto?— Não é oque estás a pensar.— Não é oque está a pensar que eu estou a pensar. Você não queria que eu conhecesse teu quarto, porquê isso agora? Sem responder nada, Weben me puxou pelas escadas à cima e entramos no seu quarto. Não era tão grande quanto eu julguei que fosse, era bem pequeno e recheado de uma cama, cabec
Cheguei à casa exausta e confusa, fui para meu quarto rezando para que não fosse interceptada por ninguém. Aquela noite trazia promessas chuvosas e me deixava mais vulnerável ao choro, queria desabar completamente para nunca mais fazê-lo.Entrei no meu quarto e vi que minha mãe dormia na minha cama. Estava de barriga para cima e com as mãos cruzadas por cima do seu abdômen. Embora estivesse a ver que respirava, senti uma necessidade de acordá-la só para ter certeza que estava tudo bem.— Mãe! — entrei no quarto com passos de ballerina, oque não fazia o menor sentido. — Mãe!Deixei minha pasta de costas dentro do guarda-roupa e me virei para ver minha mãe abrir seus olhos como se fosse a primeira vez. Olhou para mim por um tempo e arrastou seu corpo até estar sentada.— Já voltei. — disse enquanto desabotuava minha camisa de uniforme.— Tudo bem? — sua voz saiu rouca, acompanhada de um bocejo.
Passava da meia noite e eu rebolava pela cama completamente desarrumada, buscando por uma posição que se não me permitisse cair no sono, me permitisse sossegar meu corpo dos tremores.— Estourou! — deitada de bruços, sussurava a palavra dita por ele e mordiscava meu relógio menstrual.Minhas lágrimas faziam trilhos grossos pelo meu rosto e encharcavam meus lençóis, quando pensamentos bizarros me apareciam na mente, esfumando minha quietação e me desorientando cada segundo mais. Me encolhi no meu desespero e não vi nada mais que um futuro completamente distorcido e contrário do que meus pais queriam que eu tivesse. Estava tão perdida nas consequências dos meus atos, que estava impossibilitada de ver possíveis soluções para meu problema.Mano, oque foi que eu fiz?Essa frase ecoava na minha mente e contorcia minha expressão a cada repetição.Tentar imaginar as reações dos meus pais apena
Sexta-feiraDia de animação para adultos exaustos e adolescentes inconsequêntes. Era o início de compensação do estresse que os dias úteis da semana proporcionavam.Meu entusiasmo ficava explícito em tudo o que fazia, motivado pela autorização que meus pais me tinham dado para que fosse a tão esperada festa do mês, alusiva ao soprar do vento.Na aula de filosofia, vários pensamentos me tiravam a concentração, dentre os quais se destacava a promessa que Weben, meu namorado, me tinha feito. Sussurou no meu ouvido palavras de arrepiar o corpo e de torturar de ansiedade. Se tinha como, eu não sabia. Mas eu não resistia a voz daquela relíquia da estética. Seu sorriso enfeitava suas palavras tão cheias de segundas intenções e fazia com que a curiosidade me pipocasse pelo corpo todo de tal forma que me esgotavam as poss
Estava uma noite fresca em Maputo. Meu bairro acolhia sons abafados de algumas TV's e grilos cantavam cada vez mais alto a cada passo que eu dava, ansiosa para colocar meus olhos no rapaz que manipulava constantemente meus pensamentos.A medida que eu andava, sua imagem ficava mais nítida através daquele vidro. Lá estava ele, meu presente de Deus empacotado por um carro azul-escuro. Ansiedade reveio, então acelerei meus passos e abri a porta do banco do passageiro, sentindo seu perfume colidir com o meu assim que entrei.— Boa noite! Estás linda. — aquele sorriso e aquela voz surtiram efeito de gelo sobre minha pele.— Oi. — sorri tímida olhando para suas escuras e dilatadas pupílas, por delito da noite.Weben vestia um blusão preto, sem estampa alguma, cujas mangas tinham sido enroladas nos seus cotovelos, deixando seus braços mais cheios. Por baixo vestia um par de jeans azul-claro, sapatilhas a condizer e p
SábadoAcordei com um rio de baba que desagoava no meu travisseiro e para dificultar ainda mais o processo, o sol parecia ter se albergado no meu quarto. Era como se eu tivesse acordado num mundo paralelo até me acostumar com a claridade, ganhar coragem e disposição para me levantar.Movida pela preguiça matinal, arrastei meu corpo até estar sentada na cama e soltei um grunhido assim que senti um forte incômodo na minha intimidade. Depois de choramingar e espalmar a testa, meu cérebro me levou de volta a noite anterior, cujas cenas ficaram tatuadas na minha ervilha.Flashback onEu buscava por ar que nem maluca. O homem pesado e deitado por cima de mi
Primeiro dia útil da semana e minha empolgação ia ao encontro do petróleo no subterrâneo, por resultância do período menstrual.Vestia uniforme escolar preto e branco e arrastava os pés pelo asfalto, perdida nas batidas de músicas aleatórias. Faltavam mais ou menos vinte minutos até a escola e eu estava com disposição zero para fazê-lo em tempo recorde. Enquanto sabotava a sola dos meus sapatos, me perdia nas lembranças da sexta-feira.Demorou um tempinho até eu perceber que um som de bozina se misturava com as batidas da música. Três passos depois parei, retirei um dos meus fones e me virei, dando logo de cara com o carro azul-escuro.Ah Deus, Weben Shadrack!Cada dia parecia retocar sua beleza, era sempre como se o estivesse a ver pela primeira vez. Retirou seu braço através da janela do carro, assenou para mim e em seguida fez um gesto que deu a perceber que eu de