CAPÍTULO 01

     "Eu serei o sacrifício!" Foi o que ela gritou em meio a multidão alarmante. Ela sacrificaria-se pela aldeia para impedir um massacre.

     "Esse povo não merece sequer o seu tempo, quanto mais seu sangue!" Foi o que sua avó gritava. E antes que a velha começasse a jogar pragas e promessas se algo ocorresse com a neta, a garota foi deixada em plena madrugada pela morte agonizando.

     Mas eles não vieram… Não naquele povo…

     Em plena madrugada, quem atreveria-se fora de suas casas?

     Guardas fazendo a proteção de seu reino? Guerreiros em treinamento? Homens em busca de prostitutas ao sentirem-se cansado de suas mulheres?

     Feras em busca de carne humana?

     A lua cheia brilha e uivos são ouvidos provocando calafrios nos guardas de prontidão. O rei encontra-se junto de sua rainha na cama e, embora esteja adormecido, sua esposa não consegue dormir. Algo a incomoda.

     Algo incomoda muitas mulheres nessa madrugada fria. Muitas mulheres encontram-se acordadas, a maioria por ser obrigada ou simplesmente não conseguir dormir.

     O mesmo acontece com a princesa adormecida, porém inquieta, na cama um andar abaixo do quarto real. Apesar de dormir devido a sua exaustão, pesadelos povoam sua mente. O frio da madrugada não ajuda a espantá-los. Apenas pioram.

     O tempo estava fechando-se para uma tempestade. Mas o brilho da lua cheia era visível.

     Quando um raio cai no horizonte fazendo um barulho tão alto que faz a princesa acordar e a rainha assustar-se, um dos guardas somem em um vulto. Um vulto rápido de mais para qualquer outro homem perceber.

     Os ventos sopram as nuvens, quase que ocultando a lua e seu brilho, tornando certas partes do reino ainda mais escuro.

     Entre os corredores das construções, três bravos guerreiros aproveita-se de sua autoridade ao abusar de uma mulher. Ela grita e chora. Súplica por clemência e implora para não violá-la, mas eles não param. Assim que nua e obrigada a ser exposta para a penetração, ela fecha os olhos, perdendo as esperanças de ser ouvida.

      Mas seus gritos foram ouvido.

     O homem desaparece e tudo que ouve-se é um rosnado antes de sangue substituir o lugar onde ele estava.

     Um trovão anuncia a chegada da chuva.

     Enquanto quase todo reino dorme, guerreiros de folga deixam suas mulheres em casa cuidando de seus filhos para reunirem-se em grupo e divertirem-se com prostitutas em tavernas. A maioria, obrigada a viver em um relacionamento devido ao fato de serem mulheres, alegram-se pela saída de tais homens.

     Uma garota em especial que recusou-se a dar prazer a seu marido, tendo como consequência um estupro, o vê sair em busca de diversão com, segundo ele, mulheres melhores que ela. Com ódio nos olhos, ela deseja que ele jamais retorne!

      Seu desejo é atendido…

      Assim que ela grita devido ao ódio que sente dos homens, seu marido que andava sorridente pela rua some deixando apenas sangue e uma cabeça decepada para trás. Tão rápido quanto o novo trovão ao céu.

     Três guardas aproximam-se com cuidado da cabeça sorridente, porém decepada.

     Um rastro de sangue no chão liga a cabeça a uma sombra onde é possível ver a mão do suposto morto. Uma mão puxada para a escuridão quando um novo relâmpago cai no horizonte. Os guerreiros sacam suas armas!

     O mesmo acontece na taverna. Homens sacam suas armas ao ver uma pilha de corpos e prostitutas cobertas de sangue enquanto encolhem-se amedrontadas.

     O reino inteiro mal sabia que seu pesadelo havia chegado…

     A mulher que estava prestes a ser estuprada em uma rua escura abre os olhos ao sentir os homens soltando-a e, cautelosos, olhar para sombra. Um único rosnado de arrepiar a espinha é ouvido antes de olhos âmbar serem vistos.

     Os homens pegam suas armas, apontando para a escuridão.

     As primeiras gotas de chuva caem quando uma enorme pata felpuda deixa o local. Um rugido e um trovão é tudo que os estupradores ouve antes de seu sangue cair como chuva sobre a garota assustada.

     Naquele momento, ela sabia que tempestade não traria apenas raios, trovões e água do céu.

     A tempestade traria morte e sangue…

     Os guardas nos portões, mais do que ninguém, sabem disso. Sete guerreiros desaparecidos deixando apenas um rastro de sangue que ligava seus órgãos internos a escuridão de onde olhos são vistos. Bastou um rugido para todos serem estraçalhados.

     O som de gritos, relâmpagos e trovões apavoram os guardas. Um rosnado, um vulto logo em seguida, sangue e mortos. A sequência se ocorre em toda a cidade antes do som de trombetas e o sino de alarme ser tocado alertando todos de que algo está errado.

     A chuva cai…

     O pressentimento da rainha estava certo e os pesadelos da princesa estava confirmando-se. O rei, depois de brigar com sua esposa por acordá-lo com o grito de susto devido ao relâmpago, sem trocar suas vestimentas, sai apressado do quarto querendo saber o que está acontecendo.

     Mas ninguém sabe…

     Ninguém sabia o que estava acontecendo. Seria um ataque? Mas que tipo de ataque? Suspiros de frustração e gritos de frustração são ouvidos dos rei durante toda a conversa. Mas ninguém sabia o que ocorria até um uivo extremamente alto ser ouvido. Um uivo muito próximo.

— Majestade?! Veja isso! — Um nobre alerta ao olhar a janela.

      A janela onde o rei avista seu pior pesadelo…

     Em um dos telhados de seu castelo, mesmo com a tempestade que dificulta a visão, encontra-se uma fera preta com forma de lobo. Maior que uma pessoa e, obviamente, anormal por estar em cima de um telhado de determinada altura. Uivando para a lua, mas transmitindo ordem. Pela mesma janela, o rei vê seus homens, um por um serem mortos na intensa chuva.

     Gritos, rosnados e rugidos são ouvidos próximo do rei, tomando a atenção do mesmo. Ao fechar a janela acreditando que isso, de alguma forma, possa impedir a fera de adentrar o castelo, o rei fica no centro de seus guerreiros e conselheiros que dizem haver vilarejos que reclamam de bestas. Besta comedoras de carne humana que exigem sacrifício enquanto tiram o sono de crianças.

      Pragas enviadas do próprio demônio…

     Os nobres sempre riram de tais… fantasias.

      Pelo menos, até agora…

     Os gritos vem do outro lado da porta e todos mal querem imaginar o tipo de criatura que estão lidando. Terão alguma chance?

     A porta é arrombada e o vidro da janela quebrado!

     Não querendo ver o que sabe que está cercando seus homens, o rei fecha os olhos. Tudo que escuta são os gritos de seus guerreiros e seus conselheiros implorando por clemência enquanto tem seus corpos estraçalhados.

     Eles estão na sala…

     Mais certeza o rei tem quando uma respiração próxima ao seu rosto o deixa mais amedrontado. Ele não quer, mas precisa abrir os olhos e assim, com pavor e medo, ele faz. E arrepende-se.

     É quase possível ver a íris vermelha da besta sendo refletido aos seus de tão intenso que é.

     Seus olhos arregalam-se e suas pernas perdem o movimento. O rei, apavorado, cambaleia para trás até o ponto de cair.

     A fera aproxima-se dele.

     A mesma fera do telhado.

     Um demônio em forma de lobo!

     Um lobo tão grande cuja a altura atinge a de um homem. Um lobo com pelos tão negros quanto o abismo mais obscuro das noites sem estrelas. Uma fera de olhos vermelhos como o sangue refletindo sua ferocidade. Uma besta com músculos e garras que fazem o rei saber que não haverá nada a fazer a não ser aceitar o seu fim se for pego.

     Antes pelo lobo, mas agora… por um homem…

     Conforme a fera aproxima-se do rei, sua forma muda. Seus ossos estalam-se e seus pêlos diminuem dando origem a uma pele humana. Seu comprimento diminui, seu focinho some, tais como suas orelhas. Mas seus olhos continuam. Suas garras continuam.

     Um homem nu de pele morena, com músculos invejáveis e porte de guerreiro. Um homem de curtos cabelos pretos. No entanto, um homem de olhos vermelhos e garras pretas.

— O q-que és… tu? — O homem abaixa-se a altura do rei sem respondê-lo e apenas observando-o. — O q-que q-quer?

A criatura em forma humana pega o humano pelo pescoço, levantando-o e trazendo-o para perto de seu rosto. As feições cruéis e inabalável de um monstro.

— Seu reino.

+-+

— Vovó? Conte-me uma história? — Pedia a criança completamente animada.

— Claro. Mais qual gostaria de ouvir?

— Do Alpha. 

— Você realmente gosta dessa histórias de lobisomens, não é? — Questiona em ar divertido, fazendo-a sorrir timidamente. Logo, ela deita na cama e encara a senhora a sua frente.

— Nascido de uma longa linhagem ininterrupta, tendo como pai um Alpha forte e poderoso, cuja as batalhas nunca perdia, esse garoto um dia se tornaria o mais poderoso Alpha. Seu nome seria ouvido e temido dentre as sete grandes alcatéia. — A menina sorri. Aconchega-se. Os olhos começam a pesar. — Dificilmente alguém fora de sua alcatéia o via e sabia quem era. Dificilmente ouvia-se falar em seu nome verdadeiro. Mas por teu grande poder… Pelo enorme poder de seu seu sangue ele passou a ser conhecido e temido por todos como o Supremo Alpha…

     Ela lembrava-se das histórias quando fora arrastada. Ouve a voz de sua avó ao ser acorrentada. Sente as lágrimas caírem pelo seu rosto quando foi puxada. Ouvia-se uma discussão.

     Homens sacaram suas espadas. Gritos e xingamentos foram escutados e no meio daquele tumulto, ela pensava neles. Qual o tamanho de seus dentes? E sua forma física? Como vive seu povo?

     Talvez ela saiba. As histórias de sua avó eram reais. Ela estava feliz com isso. Por quê? Seria o sacrifício!

     A aldeia costumava pegar viajantes. Mas a história de humanos desaparecem em sacrifício ao demônio os afugentou daquelas terras obrigando-os a uma vida mais escassa. Criminosos já não existem sabendo que a consequência seria justamente essa. Sem um sacrifício humano a cada lua cheia, eles virão.

    O único problema é que a voluntária a morrer pelo seu povo é justamente aquele desperta maior interesse matrimonial nos homens. Ninguém deixaria ser simplesmente entregue a morte.

     A opinião dela não importa. É uma mulher e, por tanto, não tem mente própria. Ela sequer nem discutia sobre sua escolha e apenas deixa-se levar sendo puxada de um lado e de outro por homens brutos. Até que sente a lama sujando-a no chão quando cai. É pisoteada e chutada em meio a discussão como se fosse uma cadela a barganha.

     Apenas mais uma vagina de prazer e procriação de aparência encantadora. Pouco importa a essência de sua alma. Mulheres são todas iguais.

     E essa só quer uma razão pela qual valha a pena lutar. Tem sonhos e esperanças que prefere matar-los jogando-os aos lobos do que definhar com marido. Ela sequer quer filhos de seres como esse. Mas sacrificaria-se por eles. Deixaria essa existência onde poderia encontrar paz ao mesmo tempo em que salvaria vidas.

     E assim, a decisão final foi tomada e a humana foi arrastada até a entrada da aldeia e crucificada como oferenda. E lá via o que seria seu último entardecer. Sentiu medo. Todos escondiam-se e apenas ela permanecia. Estava apavorada com o desconhecido.

     E quando os últimos raios de luz sumiram no horizonte, escutou uivos.

     Mas não vieram.

     "Eu serei o sacrifício!" Relembra sua voz e sua vontade. Perdida em um mundo paralelo e próprio, relembra seus mesmo seus tempos de criança; "Vovó, conte-me uma história?"

     "Esse povo não merece sequer o seu tempo, quanto mais seu sangue!" Sua avó gritava. "Não deveríamos pertencer a esse povo…" Afirmava amargurada toda lua cheia. Ouvia-se os gritos das presas e o rugido dos predadores. São implacáveis. "Deveria ser nós com eles."

     "Não! Minha menina! Pagarão por isso!" Tudo estava confuso em sua mente. Lembranças se esgrenhavam em vozes. Não processava nada. É completamente sem sentido.

— Levaremo-a para a avó. — Essa voz… Quem é?

     Sente seu corpo ser movido. A dor em seus braços. Mas nada entende.

     "Humanos malditos! Pagarão o estupro com sangue!" Por que vovó gritava? Ela lembra-se vagamente do alarme da aldeia. O cheiro de estábulo e o grito de uma mulher. Vovó…

     Sente dor em seu corpo. O cheiro de terra e ervas. Ela geme. Encontra dificuldade em abrir os olhos.

     "Gosto de pensar que terá um grande futuro como sua irmã, minha querida". Futuro… Qual o desconhecido do futuro. "Eles arruinaram a vida e o futuro dela! Humanos nojentos!"

     "Ele virá…" Um rosnado povoa seus ouvidos. A humana abre os olhos.

— Pela Lua! Meu amor! — Sua cabeça doía. Estava desnorteada. Fraca. Sabia que estava acordada mas tinha a impressão de estar sonhando. Ouvia vozes e isso apenas aumentava sua dor de cabeça. O escuro a consome.

    O tempo passou-se até que ela voltasse a despertar. É doloroso abrir os olhos. Quando se passa uma madrugada inteira crucificada nas calamidade da noite. Mal entendia o que se passava à sua volta. Sua visão está turva e sua cabeça dói.

    A humana está com febre alta mas aos poucos recuperava a consciência. E assim, sua íris castanha foi finalmente vislumbrada pela sua avó.

— Que bom que acordou, meu bem. — Ela checa sua temperatura colocando a mão em seu rosto. — Os lobos não vieram. Pela Lua! Foi a primeira vez que roguei para não viessem e não vieram.

     O sacrifício! Ela escutou os uivos… Sua visão dói e sua garganta arde. Ela tenta mover-se mas a idosa impede.

— Shh! Devagar… — Com cuidado, ela cuida de sua neta. Uma humana jovem de pele branca. Cabelos cacheados e desgrenhados num castanho claro. Estava magra e doente. — Ficou extremamente doente. Graças a grande Loba Prateada está bem! Achei que perderia-te como sua irmã…

    Kathwhen

— Precisa descansar meu bem. Farei uma sopa! — Sua menina precisava de mais tempo para repousar. Estava doente. Kathe agradecia as deusas por salvar sua única neta não arrancada de seus braços.

     A três anos a aldeia cometeu um grande crime. Em sete dias, recebeu um homem.

     Quão cruel a vida pode ser?

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