CAPÍTULO 04

— O que foi? Qual o problema? — O idioma lhupus não era algo bem compreendido pelos humanos e, por tanto, permitia qualquer grupo de lhycantropico conversar sem que seja entendido.

— Nada. — Responde em língua humana. O homem fecha os olhos em sinal de frustração e, em seguida ergue a lâmina a altura de seu rosto. Ele limpa sua adaga encurvada. Não é uma arma extravagante como a de seu Bhetta, mas o ajuda a lutar em sua forma humana. “Os pequenos detalhes fazem a diferença.” É o que acredita. — Esse é o problema. Está tudo muito quieto.

Deseja o caos, irmão? — Zomba em seu idioma o lobisomem em cima de uma rocha afinando a lâmina de seu machado.

    Os humanos locais os encaram tentando adivinhar o que falam, mas tudo que entendem são palavras sem sentido com uma difícil pronunciação. Sequer tentaria fazer tais palavras sair de seus lábios. Desconfortável com o olhar de tantos humanos sobre si, um dos lhycans que nada faz, rosna. Todos desviam rapidamente o olhar.

Tomamos um império. Não acha que deveria haver mais movimentação? — Defende-se o homem ao chegar o brilho de sua faca. Quanto mais limpa, melhor. Poderá ver o reflexo inimigo e seu brilho caso queira encontrá-la depois de a lançar em combate.

— Então cheguei no momento certo. — Um homem faz-se presente.

    Vestindo uma justa calça de couro escuro com um cinturão que tampa seu abdômen deixando visível — através de um corte bem detalhado — a linha em formato de “V” que liga sua cintura ao seu membro.

— Temos uma missão. — Os lhycans que antes não faziam nada sorriem com a informação e logo começam a preparar-se.

    Não demora muito para os quatro homens partirem pelo grande portão da cidade e marcharem pela entrada principal assumindo a forma de sua fera interior. A viagem é de horas que pode ser diminuída em minutos com a velocidade de quatro enormes lobos com cores amareladas. São corredores que partem em direção a onde um de seus líderes aguarda.

     Um uivo é suficiente para transmitir a mensagem através do ar. Estão a caminho.

     Um grupo de homens permanece acima de um planalto. E assim que escuta o uivo, entram em ação.

      Ocultando suas vestes, armas e desenhos tribais ao vestir uma capa de couro escuro — cujo capuz esconde boa parte de seus rostos — eles se dividem grupo de três e passam a andar em cinco direções diferentes.

    O único grupo com quatro membros dirige-se a taverna que encontra-se um pouco mais afastada da cidade. Os cavalos do lado de fora são os primeiros a notarem a presença dos homens e agitam-se. Mesmo estando presos, eles afastam-se o máximo que pode. Sente o predador. Os homens ignoram seu comportamento instinto e segue adiante.

     O interior do estabelecimento iria desapontar os lordes que buscam luxo. Contudo, conforto pode-se encontrar na presença de mulheres, bebida e comida em abundância desde que tenha dinheiro suficiente para ser protegido das confusões e discussões.

    O som da fina bota de nobre pousando sobre a madeira rangente chama atenção. Três cachorros estavam em baixo da mesa de um homem que diverte-se com uma mulher. Ambos os três rosnam, ameaçados. E como os cavalos ao lado de fora, os homens ignoram.

     Continuam seu caminho Ignorando qualquer olhar em sua direção. Não importam-se de ser o centro das atenções humanas. 

    As mesas aos arredores, principalmente aos fundos, são onde localiza-se os homens mais temidos. Talvez lordes desejando bebida e mulher depois se cansar de suas esposas ou grandes guerreiros gastando seu ouro com o prazer da carne após dias de viagem. A folga que eles obtinham junto da qualidade de sua comida revelavam que tinha poder.

     Um dos cachorros começa a latir.

— Jorge! — Seu dono repreende. Os homens continuam a ignorar e seguem até o fundo onde um grupo de garotas prostitutas dançam.

     Permitiam continuar passando e ignorando tudo, desde olhares, murmúrios, risos e mulheres. Até o horrível música e o fedor de humano. Mas o cachorro continuou a latir e o dono chamou-os.

     Eles pararam onde estavam. Não olham para trás. Nenhum deseja saber o que o ser de uma raça repugnante deseja.

— Nunca tinha-os visto por aqui. Quem são? — Da mesma forma como havia ignorado os cavalos, os cachorros, os olhares e até os murmúrios, o grupo de homens encapuzados ignora o homem e seguem o caminho também ignorando a possível possibilidade do homem ficar com raiva. O que acontece. Mas eles não se importam.

     É quase raro alguém ignorar alguém como o homem rodeado de três cães. Inconformado, ele empurra a mulher de seu colo, levanta-se e bateu seu punho na mesa. O lugar fica em silêncio.

— Ei! — Novamente os encapuzados pararam de andar ao ouvir o rosnado dos cães. — Respondam!

    O último dos quatro com uma estrutura um pouco menor virá-se por completo. Sem descobrir seu rosto, ele observa o homem e seus cães. Três grandes e musculosos feras pretas que deixam seus dentes — sujos — a mostra quando rosna. Já o homem, um pouco pançudo que traja roupas com um considerado custo. O lugar onde ele encontra-se sentado é requentado com peles de animais. Provavelmente é um caçador.

     Não há dúvida que a inquietação dos cachorros é intrigante quanto aos misteriosos homens. São feras treinadas e obedientes que não ameaçavam qualquer pessoa. Não sem um motivo. Talvez os homens encapuzados estivessem portando algo perigoso?

— Vá chupar o saco do cachorro! — É tudo que o encapuzado diz antes de virar-se e seguir seu líder, adentrando cada vez mais na taverna.

    S.

    A postura de despreocupação dos encapuzados já estava incomodando. A atitude de agir como se fossem superiores a qualquer homem da taverna já estava irritando. Os cachorros fugirem deles de tal maneira foi o limite e agora, todos no estabelecimento desejam ensinar-lhes uma lição.

— Digam de uma vez quem são! — O olhar do único homem cujo rosto não é ocultado pelo capuz cai sobre o dono da voz. Foi o suficiente para saber que haveria derramamento de sangue.

    Mas não o seu sangue…

    Pouco tempo depois do ápice solar, sobre os cantos dos pássaros e a calma dos animais, três cachorros fogem em direção a floresta onde é cercado por quatro enormes lobos com cores próxima ao amarelado. Pela expressão calma, o máximo de interesse que os enormes lobos tem por seus parentes distantes é tê-los como aperitivo.

    O nervosismo dos animais é claramente notável quando tentam manter o máximo de distância ao encolhem-se e rosnam como defesa. Mas todos sabem que não há nada que possam fazer para sobreviver. A única chance é os lobos ficarem desinteressados é algo a mais ganhar sua atenção.

     E esse “algo” vem na forma de dois homens que correm desesperadamente para longe da taverna. O motivo de seu desespero é claro no cheiro de sangue que inunda seus corpos. Mas tudo apenas confirma-se quando a visão dos corpos estraçalhados dentro da taverna é vista.

    O pavor de ambos aumenta quando avistam os quatro gigantescos lobos cercando os cães do caçador, que sente-se encurralado. Por experiência de caça, ele sabe que não há como fugir.

    Ao sentir seus longos cabelos castanhos serem pegos e puxados para trás, o caçador sente suas calças molharem.

— Q-Quem… — Sua pergunta é interrompida. O homem ao lado também é segurado por um dos encapuzados e tem sua cabeça puxada para trás até soltar o resto do corpo.

    Enquanto isso, o alvo de sua pergunta não finalizada caminha calmamente até os cães que não hesitam em demonstrar o medo. Eles latem na esperança de afastá-lo, mas ao ver seu fracasso, encolhem-se e choram de medo. O desespero aumenta quando o homem abaixou-se, ficando próximo da altura deles.

    Um dos cães, com o pelo preto um tanto áspero e sujo, encolhido em seus companheiros, grue altamentente quando as mãos do homem desconhecido toca em sua cabeça.

    Mas permanece paralisado e sem reação quando recebe gostosas carícias atrás da orelha.

— Meu nome não importa-lhe. — Anuncia o lhycan. Seus cabelos balançam pelo vento e os olhos, por uma fração de segundos, mudam de cor. Ele se vira para o humano e observa as calças molhadas.

     O homem tenta lutar para soltar-se, mas é inútil. Ele dá ordens aos cães para atacar, contudo, não obedecem. 

     O lhycan caminha até o humano e analisa sua feição.

— Não sou humano e você já desconfia disso. Viu algo que não deveria a algum tempo. E agora irá dizer-me com riquezas de detalhes. — Decreta.

— E se eu não quiser? Vai me matar de qualquer jeito!

— Se não disser, vamos ver o quão bem treinou para mim os cachorros. — Ele encara os animais que imediatamente respondem-no. A linguagem corporal e dominância os fazem entender o que devem fazer. Os cães agora era dele a partir do momento que ele colocou-se como novo líder.

     O humano estremeceu sobre a ameaça.

     Ele é o Bhetta de um Titã e não será um mero humano que o deixará um passo a menos de encontrar sua companheira!

+-+

    A noite, para muitos, parece normal. As estrelas são vistas entre as nuvens que pouco a pouco cobrem o céu. Enquanto alguns sentem calor, outros sentem frio. Mas o antigo caçador que agora torna-se escravo tem mais o que preocupar-se quando é lançado sobre a rocha de uma arena de combate.

— Onde está Katharyna?! — Mesmo machucado, ele encara o homem virando-se e caminhando até a saída.

    Foi a oportunidade que ele esperava e pretende aproveitar. Fazendo uso de sua raiva, ele levanta-se a tenta atacar o homem.

    Mas apenas tenta…

    Desviando perfeitamente do soco indo em sua direção, o homem vira e acerta um chute certeiro no abdômen do humano, lançando-o novamente contra a rocha. Ele não decide perder mais tempo com essa raça e deixa o humano quase desmaiado no chão antes de seguir seu rumo.

    O homem apenas percorre seu olhar pelo local em busca de algum conhecido, mas tudo que encontra é a escuridão da inconsciência. Uma escuridão espantada com um líquido quente em seu rosto com barulhos ao fundo. Quando nota a claridade do novo dia surgindo, nota os jato quente com um gosto um tanto amargo atinge seu rosto. Ele acorda assustado.

    Raiva domina seu corpo quando percebe que, assim como muitos outros, seu rosto está sendo alvo da urina matinal do que ele julga ser pragas.

— Hora de trabalhar, vagabundo. — É o que ouve antes de ser puxado para o seu primeiro dia como escravo.

    O dia que ele provavelmente não esquecerá…

    Ele sempre imaginou como era a escravidão, mas não havia visto-se como escravo. Seus planos era casa-se com Katharyna e gerar filhos. A escravidão não o impediria disso, mesmo que tenha que fugir com sua amada futura esposa. Mas não poderia fazer nada sem Katharyna.

    Katharyna, por ser uma mulher, é fraca e idiota e isso o faz temer a possibilidade de ela não sobreviver. Talvez ela nem esteja viva e logo ele não estará se não cumprir o que os demônios em forma de homem desejam. Por isso ele não questiona quando o mandam empurrar uma carroça com enormes pedras sobre a pressão de chibatadas.

     Ele sabia que era apenas o começo e pretendia sobreviver até arquitetar uma rebelião ou uma fuga. Ele jamais aceitaria ser um escravo, pois não é mulher para aceitar tudo que colocam contra ele.

    Seguindo com seu trabalho de carregar pedras, ele refugia-se em seus pensamentos de fuga enquanto analisa o local em informações. Preferia lidar com armas e caça do que ficar andando de um lado para o outro com o carregamento de pedras, entretanto isso permitiu a ele encontrar alguns de seus amigos e vizinhos enquanto tinha uma noção do que ocorre na cidade antes de ser espancado por conversar invés de trabalhar.

     Mas a rápida troca de informações foi útil. Os homens-lobo falam entre si em uma língua diferente, embora um tanto familiar para ele. Tinha certeza que já ouviu essa língua antes, mas não lembra-se de onde. Mas a rápida troca de informação apenas confirmou o que suspeitava; as feras estão reconstruindo e reforçando a cidade.

     Mas por quê?

     Essa era a pergunta sem resposta que permanecia na mente do humano durante a dura semana de trabalho pesado na escravidão. Durante a semana, ele notou que mulheres não trabalham pesadamente. Mulheres apenas são encarregadas de fazer comida, limpar e agradar os demônios e, por essa razão, ele perguntava-se como deve estar sua Katharyna.

     Porém, infelizmente, seu tormento não parou, pois não havia nem ao menos escutado o nome da mulher que ama. Provavelmente deve estar morta, mas não deseja perder as esperanças de que esteja viva mesmo que seja destinada a ser uma escrava ao lado dele. Mas os boatos e a falta de informação diminuíram suas esperanças.

     Mas soube que Katharyna havia sido levado ao castelo. Ao suposto rei. O rei que, segundo os boatos, é uma criatura tão horrenda que não sai da escuridão do castelo. Dizem que as próprias bestas tomem seu rei que deixou traumatizado os poucos humanos que teve contato com ele.

     Segundo aos poucos homens e mulheres que tiveram contato com o interior do castelo e retornaram, tudo lá dentro é escuro. A sala do trono é cercada por corpos estraçalhados. Ouve-se gritos de pessoas sendo devoradas vivas e um certo homem afirmou ser obrigado a ver sua esposa e filhas sendo estupradas enquanto uma outra besta, em sua forma humana, as devorava vivas. Tudo por que ele não cumpriu um trabalho que, devido ao pavor, não lembra-se qual era. Mas sabe que é algo envolvendo uma mulher inconsciente.

     Não era segredo que esses homens havia voltado do castelo apenas para causar medo com o que supostamente viam. As bestas faziam questão de afirmar que tais acontecimentos não são nada comparado ao que acontece quando enfrentam seu Alpha.

    Ele tinha quase certeza que Katharyna havia sido levada para a sala do trono que, segundo as bestas, é o lugar mais escuro que se tem permissão para entrar. É o lugar onde os humanos encontram seu líder e, devido ao escuro, não veem nada além dos olhos tão vermelho quanto o sangue fresco que suja o chão da sala. 

    É lá onde Katharyna havia sido levada. Ela foi levada até ao Alpha e não retornou.

     Seu cadáver provavelmente deve ter sido jogado na carroça que todo dia retira corpos e distribui entre as bestas no centro da cidade para serem devorados. Talvez a carne de sua Katharyna esteja na barriga de alguém.

     Mas o humano pouco sabia que esse não era o destino de sua amada…

    Na temida escura sala do trono onde os poucos humanos entram e retornam, o antigo rei encontra-se com o Alpha oculto pela escuridão. A única prova de que o rei está em seu trono é o par de olhos vermelhos como o sangue que ele pisa no chão só andar. As cortinas e janelas estão fechadas, assim como a porta com marcas de sangue em formato de mãos dos prováveis humanos que tentaram fugir. Não há como entrar mosquitos e parasitas na sala, porém, o cheiro é forte demais para certos insetos ignorarem.

     O humano encontra-se completamente desconfortável nesse ambiente, diferente de seu demônio. Ele gosta do cheiro do sangue de suas vítimas. Gosta da sala completamente escura. Mas nenhuma sensação é melhor do que ver o medo dos humanos ao entrarem na sala sabendo que pode não voltar. Deparar-se com as poças de sangue no chão rodeando alguns órgãos que são consumidos por parasitas e sentir náuseas. Tudo é diferente até a parede manchada do mesmo sangue e até uma cabeça de mulher próximo da porta.

    Como um predador que é, o atual rei sente o medo e pavor que causa quando olham seus olhos vermelhos. Ele ouve claramente os batimentos cardíacos nervosos do humano e vê claramente o nervosismo e a leve tremedeira em suas mãos.

     Não vê a face fria do homem e segmente continua a questionar seus hábitos. Ele não respeita os humanos. Não deu a resposta do casamento com a princesa, contudo permitiu uma farra refeição. 

    Uma refeição em que obrigou a princesa Mary a cometer canibalismo em troca da vida de sua família.

     Mas continuar enchendo sua paciência não é a melhor ideia.

     O humano houve um rosnado e sente o aperto em seu pescoço. A porta ser aberta não impediu-o de lançar o humano. Seu Delta teve que ser rápido ao desviar do corpo e, mal teve tempo de respirar quando afirmou:

Ela acordou!

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