Alexander riu e então apoiou a mão sobre o ombro de Caelan, empurrando-o para trás.
— Não seja idiota. Malthus estava morrendo; eu só adiantei isso. Precisava que ele escolhesse o filho certo.
— Você o matou — Caelan repetiu, sentindo o gosto amargo em sua boca, os lábios se repuxando em um rosnado.
Ele partiu para cima de Alexander, que o empurrou para trás sem resistência. Caelan não conseguia manter o corpo ereto e se equilibrou outra vez na poltrona da cabana.
— Precisava que ele estivesse alucinando quando dissesse meu nome para se tornar o alfa do clã.
Alexander deu de ombros.
— Mais cedo ou mais tarde, sabia que você descobriria isso, por isso considerei que seria melhor que você também morresse se dissesse que não ficaria ao meu lado.
— Alexander... — Caelan sibilou e reuniu toda a raiva em seu corpo.
Todo seu corpo tremia por aquelas palavras:
— Você matou nosso pai?
— Eu o desafiei como seu filho para liderar este clã.
— Ele estava morrendo.
— E foi por isso que eu ganhei.
Caelan não conseguiu se conter, e nem queria. Toda a dor daquelas semanas cinzentas, quando o pai se foi, brotou em seu peito. A dor de perdê-lo, de não ouvir mais sua voz... Tudo aquilo o fez acertar Alexander no meio do queixo com uma força que seu corpo não tinha, não naquele estado.
Alexander foi para trás, e Caelan começou a tossir. Estava zonzo e caiu aos pés de seu irmão.
— Seu filho da puta! Como? — Caelan não conseguia elaborar a frase, não conseguia sequer olhá-lo.
Quando finalmente conseguiu se levantar, Caelan agarrou seu irmão pelo colarinho da camisa e o puxou para fora da cabana, empurrando-o em direção ao chão.
— Eu o desafio!
O sorriso de Alexander se estendeu ainda mais sobre seu rosto, e o coração de Caelan batia rápido demais em seu peito. Queria matá-lo, estrangulá-lo, mas nada conseguiria trazer seu pai de volta. Quando avançou para cima dele, Alexander não recuou, e, por ser maior, já esperava qual ataque viria. Seu soco atingiu o peito de Caelan e o jogou para trás, não deixando que ele respirasse, e o segundo soco veio, tomando todo o ar de seus pulmões, fazendo-o dobrar o corpo e tossir sem parar.
Alexander segurou Caelan pelos ombros e envolveu o braço sobre seu pescoço, deixando-o de joelhos no chão.
— Você quer a liderança dos Fúrias da Noite, Caelan?
Ele apertou ainda mais seu pescoço, fazendo com que sentisse a perda da pressão no corpo. Caelan não conseguia revidar, não com a droga que corria em suas veias.
— Então se torne um homem para desafiá-la.
Seu irmão o empurrou no chão. Caelan estava fraco, a visão distorcida. Tentava sorver o ar, mas era como se o gosto amargo se espalhasse por sua garganta, impedindo-o de respirar. Quando avançou outra vez para seu irmão, Alexander se virou rápido demais, fazendo com que Caelan perdesse o equilíbrio. Ele só sentiu o corte da adaga tarde demais em suas costelas.
Caelan levou as mãos às costelas. O ar parecia escasso agora em seus pulmões. Respirar doía. O sangue vertia em sua camisa branca, deixando um rastro em seu corpo.
— Obrigado por isso, Caelan.
Alexander estava próximo e havia uma vitória em seu rosto. Uma vitória que Caelan nunca pensaria que o irmão precisasse. Quando o homem cortou o rosto, os braços e rasgou a própria blusa para manter a encenação, Caelan ouviu os gritos e o burburinho ao redor.
"Caelan desafiou Alexander"
— Você me desafiou e perdeu.
A voz de Alexander era baixa, como a de uma fera enjaulada, mas Caelan sabia que era pura encenação.
— Eu o deserdo, Caelan. — Aquelas palavras o surpreenderam, e Caelan segurou firme o cabo da adaga ainda em suas costelas, tentando se manter de pé na frente de seu irmão. Talvez o orgulho fosse a única coisa que o mantinha ali.
— Você tentou me matar — Alexander apontou para a adaga no corpo de Caelan e então ergueu o rosto para as pessoas do clã, que agora se juntavam ao espetáculo. — E eu venci. Não há lugar nos Fúria Escarlate para dois alfas.
Seu irmão cuspiu aos seus pés e virou as costas quando as pessoas que o apoiavam o levaram para longe.
Caelan sentia a cabeça pender, todo seu corpo formigar. Já quase não sentia as próprias mãos ou a própria respiração. Estava envenenado.
Lembrou-se do gosto agridoce do licor, da sensação queimando por sua garganta.
Wolfsbane.
Alexander tinha previsto aquilo, armado aquela cena. Seu irmão havia o envenenado para vencer a luta e acabar com um possível problema futuro contra sua guerra.
Lyra acordou tremendo, o suor ensopava suas roupas no colchão em que estava deitada. Seus olhos vasculharam ao redor, como se estivesse procurando aqueles mesmos olhos de seus sonhos. Todas as noites de lua cheia, ela sonhava com um lobo, e, em todas as noites, ele trazia a escuridão ao seu lar. Amélia se revirou na cama ao lado e, quando viu que Lyra estava acordada, espreguiçou-se com um sorriso. — Pesadelos novamente? Lyra anuiu, ainda sentia o corpo todo tremer das cenas que permeavam sua mente como um lembrete do que poderia acontecer com seu clã. Com o clã que a havia acolhido depois da morte de sua família. Lyra não havia nascido sacerdotisa, foi acolhida pela Mãe daquele clã. Mesmo que todas as noites ainda se sentisse uma forasteira, seu coração se enchia de alegria por ter um lar. Amélia levantou-se da cama e estendeu a mão para Lyra, espantando um bocejo. — Vem, vamos caminhar. A lua está bonita hoje. Lyra sorriu; a amiga sempre conseguia tirar os pesadelos de sua me
O mundo parecia vago diante de seus olhos. Seus sentidos iam e voltavam, como se Caelan estivesse em um limbo. Quando Alexander virou as costas e o deixou sangrando no meio do clã, Caelan foi interceptado por seus homens e levado para um quarto escuro. Quando acordou, estava em movimento pela Floresta de Espinhos.Sua respiração estava espaçada e, mesmo nos períodos de lucidez, a dor em seu abdômen o deixava zonzo. Movimentar-se doía, respirar doía, qualquer movimento fazia seu corpo responder à dor.Havia um curativo ao redor do local onde Alexander havia enfiado a adaga, mas o sangue já encharcava as gazes brancas ao redor das costelas. Não sabia quanto tempo havia passado, se é que havia se passado algum tempo. Caelan apenas observava alguém carregá-lo, sentindo a dor em seus pulmões tornar-se mais frequente. Era difícil respirar.Quando acordou novamente, seus olhos focaram no céu distante do anoitecer. Parecia que haviam se passado eras enquanto ele estava ali, sozinho no meio da
Lyra sonhava, em todas as noites de sangue, com um lobo negro. No momento em que a lua se tornava vermelha sobre o céu, o lobo negro vinha. Cada sonho era diferente, mas, em todos eles, Lyra se lembrava da maneira como ele a tocava, de suas mãos marcando seu corpo, dela pertencendo a ele.Mas também era nas noites de sangue que ela acordava tremendo, o corpo suado, os gritos e o fogo ainda tumultuando sua mente, seus sentidos. Era como uma bênção e uma maldição.— Lyra — chamara a grande Mãe uma vez, depois do primeiro sonho que tivera — O que você viu?“Você, morta”, ela queria dizer, mas a Mãe apenas assentiu, como se soubesse o que Lyra havia sonhado. Quando a trouxe para mais perto, em um abraço, Lyra não recuou e se reconfortou no colo daquela mulher.— Seus sonhos mostram o futuro. Mas não tenha medo deles.O lobo viria, ela sabia. Mas também o fogo.Então, quando se viu diante do lobo negro, no meio da Floresta de Espinhos, Lyra já sabia quem ele era.— Quem é você? — Ele ros
— Caelan?Alguém muito distante chamava seu nome.Era aquele então seu nome, ele se lembrava.Quando seu pai disse o que significava seu nome, Caelan nunca esqueceu. “Guardião”, na língua dos lobos.Cada vez que o escutava, se lembrava do porquê havia sido escolhido, do porquê seu pai agora estava morto.— Caelan! Tornaram a chamar, e ele rosnou em resposta, mas, quando sacudiram seu ombro, entendeu onde estava.Na Floresta de Espinhos.Dylan o olhava assustado, o peito subindo e descendo como se tivesse se esforçado para acordá-lo. Seus olhos castanhos o circundavam, procurando algo em seu corpo. Os cabelos loiros estavam caídos na face, embolados, como se Dylan tivesse corrido o caminho todo até o encontrar. Caelan o encarava ainda absorto nas próprias sensações, sem conseguir discernir se aquele era outro sonho ou realidade.— Caelan, por favor. Dylan implorou e foi a primeira vez que viu seu melhor amigo implorar.Eles haviam se conhecido na primeira brincadeira de batalha em q
Lyra ouvia os gritos das sacerdotisas ao redor. Corria em direção ao nada, como se seus pés estivessem presos na terra. Não conseguia enxergar Amélia, não conseguia enxergar a Mãe e as outras garotas. O fogo tomava tudo, a fumaça cobria seu rosto, seus pulmões, fazendo-a tossir sem parar.— Amélia! — gritou em meio à cacofonia de ecos e vozes, de homens que corriam para lá e para cá. O medo pesava em seu peito, fazendo-a não se afastar um passo.As cabanas, que antes eram o orgulho da Mãe, estavam pegando fogo. Labaredas lambiam cada parte da madeira e deixavam um rastro que afundava em seu coração.Lyra viu as lágrimas tomarem seus olhos e o ódio crescer em seu coração. Os jardins antes floridos agora eram algo morto, sem vida, seco. Ela engoliu em seco duas, três vezes, tentando afastar o choro que preenchia seu peito e sua garganta. Os gritos ao redor pareciam longe demais, enquanto suas mãos tremiam, todo o seu corpo tremia. Ela não viu quando um homem se aproximou e a agarrou por
O fogo parecia engolir tudo enquanto Caelan andava no meio dos destroços daquele clã. Alexander havia cumprido a promessa de que invadiria o clã sagrado das sacerdotisas. Seu irmão não se importava com a lei de Seraphire, não se importava com nada além de si.Caelan inspirou, ignorando a raiva que borbulhava em seu corpo, que crescia a cada passo que dava ao ver a destruição que seu irmão havia causado, por pura demonstração de poder. O pior eram as mulheres feridas ao seu redor e seus homens, que não se importavam com nada, um reflexo de seu líder.Dylan e Alina vinham atrás, não havia nada em seus rostos que demonstrasse o que sentiam, apenas Caelan tentava controlar suas emoções, pois sabia que seu rosto era um espelho do que sentia.Alexander estava sentado como um rei no meio daquele fogo que consumia tudo. O s
A morte da Mãe se repetia diversas vezes em sua visão. A impotência de alcançá-la, de conseguir tirar a faca das mãos daquele macho. Lyra sentia seu estômago se embolar, o gosto de sangue e fumaça em sua boca faziam-na arfar enquanto era empurrada à frente por um dos homens de Alexander.Cada passo era dado com esforço, e seu coração estava em pedaços. Não conseguiu salvá-la, assim como em seus sonhos. A Mãe havia dito para não temê-los, mas Lyra continuava acreditando que era uma desgraça a cada um que cruzava o caminho, inclusive sua família.Todos mortos, todos, menos o seu lobo.O pensamento morreu quando o homem que a segurava a empurrou em uma cova no meio da Floresta de Espinhos. Lyra caiu com um baque surdo, o joelho batendo na terra, fazendo seus ossos reverberarem e a dor povoar sua mente.Seus dentes trincaram. Não havia mais gritos em sua garganta, apenas o pesar e o vazio do luto. Era tudo o que restava.Ela se aninhou no próprio corpo, abraçando as próprias pernas enquan
No momento em que Caelan olhou nos olhos de sua loba, ele sabia que não conseguiria matá-la. Sabia que precisava encontrar uma saída para o que quer que fosse fazer. Ainda queria proteger sua irmã, mas também precisava protegê-la.Ela era sua.Diante de Alexander, dizer aquelas palavras, oferecê-la a seu irmão havia doído em todo o seu corpo.— Torne-a sua parceira — Caelan disse.Seu lobo rosnou e mordeu as entranhas de seu corpo por aquelas palavras. Caelan queria arrebentar a garganta de Alexander, matá-lo por sequer pensar que ela poderia ser dele.Ela era sua.