Eu não podia estar perto do meu pai agora, não depois dessa quebra de confiança. Ele dizia querer me manter segura, mas aqui estava ele, colocando-me nas mãos de uma das maiores famílias mafiosas existentes. A família Morunaga era o centro da violência e crueldade, e só um tolo se envolveria de bom grado com eles.
Segui a música fraca que vazava pela casa, sabendo que vinha do salão. Precisava conversar com meu avô sobre isso. Talvez ele pudesse esclarecer a situação. Que maneira infernal de começar as férias. Nenhuma lágrima caía agora, mas meus olhos ainda ardiam e meu coração doía. Não conseguia imaginar em que tipo de confusão meu pai se meteu para causar esse caos.
Ao longo dos anos, fui mantida afastada do trabalho dele, aprendendo a não fazer perguntas. Era irônico que, depois de tantos anos fechando os olhos para o trabalho de meu pai, agindo ignorante durante toda a minha infância e adolescência, fosse agora amaldiçoada a pagar suas dívidas assim que entrei na idade adulta.
Suspirei novamente antes de levantar a cabeça e puxar os ombros para trás. Eu era uma Carbone, apesar de tudo. Era forte e suportaria o que fosse, como muitas mulheres antes de mim nessa situação. Não era a primeira mulher colocada em um casamento forçado e não seria a última. Claro, esse encorajamento fraco morreu assim que adentrou em minha mente.
Enquanto procurava meu avô, pensava que casar com um homem que não conhecia já era difícil, mas casar com um Morunaga era uma perspectiva totalmente diferente.
Quando entrei no salão, esperava ver o belo sorriso do meu avô, mas, em vez disso, fui recebida com os rostos sombrios de quatro homens incrivelmente familiares. Estavam todos bem vestidos com ternos e gravatas, apesar do clima escaldante. Todos, exceto meu avô, ficaram de pé quando entrei.
Senti o sangue escorrer do meu rosto enquanto olhava assustada para os rostos impassíveis da família Morunaga. Sentado ao lado de meu avô, que estava no centro da mesa, estava Gojou. Ele me fixou com um olhar inquiridor no minuto em que entrei em seu campo de visão.
— Boa tarde, senhor Morunaga — cumprimentei fracamente, me arrastando para a frente. Era evidente em meu rosto o desgosto pelo casamento do qual acabara de ser informada.
— Por favor — ele acenou, dispensando as formalidades, com um sorriso que só podia imaginar ser reconfortante. No entanto, a intensidade de seus olhos negros traía a tentativa amigável. Ele ainda me avaliava, como se decidindo o que fazer comigo. — Me chame de Gojou.
— Claro, senhor Morunaga — respondi, sem me sentir muito confortável.
Meu avô me olhou com censura. Gojou sorriu, mostrando os dentes de uma maneira não muito gentil. Apesar de tê-lo desafiado — mesmo sem intenção — ele não disse nada e continuou com sua expressão de alegria forçada. Gesticulou para os homens ao seu lado, todos permitindo que seus olhos traçassem minha forma tensa enquanto me avaliavam.
— Meus filhos: Fukui, Nitta e, claro, Ryuu.
Mal olhei para os dois primeiros, pois meus olhos foram imediatamente atraídos para meu futuro marido. Sua expressão parecia menos do que satisfeita enquanto me encarava por trás de óculos escuros, sem dúvida caros. Apertei os lábios, segurando qualquer comentário sarcástico que queria escapar.
— Claro — meu avô tossiu, lançando-me um olhar de advertência. Era o segundo do dia. Será que o terceiro seria meu fim?
— Desculpe — comecei, tentando conter a irritação na minha voz. — Como podem imaginar, estou um pouco… surpresa com sua presença repentina. — Surpresa, horrorizada, a dois segundos de expelir o café da manhã.
— Entendo. Mas Ryuu achou melhor se conhecerem quanto antes. Afinal, é natural que o noivo queira estar perto de uma noiva tão linda — disse Gojou, avançando e me envolvendo em um abraço apertado. Pisquei, confusa e repelida. Com os lábios perto da minha orelha, ele sussurrou em advertência: — Espero apenas coisas boas de você, Beatrice.
O clima sombrio passou assim que ele deu um passo para trás e aquele sorriso enganoso esticou-se em seu rosto envelhecido mais uma vez. O peso por trás de suas palavras permaneceu, e mordendo os lábios de fúria, não me deixaria enganar novamente pela falsa gentileza daquele homem.
Depois de um tenso momento de silêncio, meu avô finalmente falou:
— Você já conversou tudo com Giacomo? — Seu olhar estava preocupado, e fiquei aliviada ao ver que pelo menos uma pessoa ainda estava do meu lado. Sempre podia contar com meu avô.
— Sim, papai e eu trocamos muitas palavras — respondi secamente e notei o leve sorriso no rosto de Nitta enquanto ele olhava pela janela, fingindo estar interessado em algo lá fora. Todos os outros permaneceram visivelmente sem graça.
Queria revirar os olhos. Se não fosse morta por um dos inimigos dos Morunagas primeiro, então tinha certeza de que morreria de tédio nesta família rígida. Era uma linha de trabalho séria em que todos participavam, mas isso não significava que tinham que permanecer tão estoicos o tempo todo, certo?
— Vou desfazer as malas e colocar algo mais confortável. — Olhei os homens de cima a baixo. Nitta e Fukui não tinham os paletós e as mangas das camisas estavam arregaçadas, mas Ryuu ainda estava vestido com o que supus ser suas roupas de negócios. — Se me permitem — finalizei, virando-me bruscamente e saindo correndo dali, uma carranca profunda já escurecendo minha expressão.
&RYUU&Eu estava sentado em uma cadeira, a camisa desabotoada e as mangas arregaçadas até os cotovelos, contemplando as notícias das minhas próximas núpcias. Fazia apenas dois dias que meu pai havia abordado o assunto. Embora a reunião tivesse sido estritamente profissional, o que ele pedia era profundamente pessoal.Não conseguia entender por que Gojou Morunaga queria que eu me casasse com tanta urgência. Certamente nada tinha a ver com a fusão dos negócios Morunaga e Carbone, como ele alegara. Eu sabia da situação desesperadora em que Giacomo Carbone se encontrava. Meu pai poderia ter tomado a empresa dele facilmente. Mas, ao invés disso, ele tinha claramente um motivo oculto, um plano que tinha certeza de que funcionaria da maneira que Gojou pretendia.Beatrice Carbone. O nome era atraente, combinando perfeitamente com a mulher que eu sabia ser extremamente bela. Eu havia visto uma foto dela antes. Jovem e bonita, mas nada para se envolver emocionalmente. Era o tipo de mulher facil
— O que é tão engraçado? — perguntou Nitta, com um sorriso divertido.— Todos vocês, Morunagas, são facilmente distraídos? — devolvi, com um toque de sarcasmo.— Infelizmente, não — ele respondeu, rindo com vontade. — Ryuu é um homem muito… focado. Você não terá vida fácil. Ele não é exatamente o tipo para um casamento — comentou, arqueando as sobrancelhas infantilmente. — Nem eu.Ignorei seus flertes.— Se ele é tão inadequado para o casamento, então, por que estamos fazendo isso? — perguntei, tentando entender a lógica absurda.Nitta deu de ombros.— É bom para os negócios, imagino. As empresas Carbone e Morunaga estão se fundindo. Você não esperava que seu pai arranjasse um casamento mais cedo ou mais tarde? Afinal, você é a herdeira dele. É assim que as coisas são feitas.Seu tom condescendente me irritou, mas mantive meu temperamento sob controle.— Você vai se sair bem, confie em mim. Pelo que ouvi, tem uma boa cabeça. Ryuu pode parecer duro no começo, mas isso é apenas para aqu
— Seu irmão está certo. Mostre um pouco mais de respeito pela noiva dele! — disse Gojou. Eu preferia que ele tivesse permanecido calado. Não precisava de um lembrete de que agora era a noiva de alguém da família Morunaga.Meus olhos começaram a arder com a ameaça de lágrimas, mas não iria chorar. Repreendi-me silenciosamente e corri de volta para a cozinha para me recompor, usando o pretexto de pegar o vinho. Quando voltei, um silêncio incômodo pairava no ar. Pelas feições sombrias de Nitta, deduzi que palavras mais duras haviam sido trocadas na minha ausência. Toda essa situação era profundamente desconfortável. Eu entendia a necessidade de me familiarizar com Ryuu antes do casamento, mas não gostava nem um pouco daquilo.— Então — disse eu, quebrando o silêncio assim que todos começaram a comer, sem direcionar a pergunta a ninguém em particular —, quando será o casamento?— Não agora, Beatrice — repreendeu meu pai imediatamente.Encolhi-me com o tom afiado de sua voz, um lembrete cl
&RYUU&Eu estava alheio à conversa ao meu redor. Todos, exceto minha futura esposa, tinham se reunido no salão para beber antes de se retirarem para seus quartos. Mas conversar não me atraía.Beatrice ficou retraída durante o jantar, e eu sabia que a culpa era da pressa com que tudo estava acontecendo. Eu podia entender seu medo ao se casar comigo. Não era justo esperar que ela aceitasse uma mudança tão drástica e rápida em sua vida. Não era algo pessoal, e eu não deveria me ofender com sua relutância. Qualquer um sentiria o mesmo, independentemente de quem fosse se casar. Claro que ela estava assustada.Eu também precisava aceitar a perspectiva do casamento. Nunca havia considerado isso antes e, com certeza, não queria pensar nisso agora.Uma dor aguda na nuca me trouxe de volta dos meus pensamentos. Virei-me irritado para encarar o agressor, mas minha expressão esfriou ao perceber que era meu pai.— Estávamos falando com você — resmungou ele.— Papai estava dizendo que você precisa
Esperei em silêncio, torcendo para que ele me dirigisse um olhar ou tentasse puxar conversa, mas isso não aconteceu. Lutei contra a vontade de fechar aquele maldito notebook e jogá-lo pela janela, direto na água lá fora.Observei-o com atenção, analisando cada detalhe: o formato da mandíbula, os lábios finos, a cor penetrante dos olhos, a força do olhar. Seus braços eram musculosos, decorados por tatuagens de dragões que serpenteavam até a camisa bem ajustada ao peito. Não podia negar que ele era bonito, especialmente com aqueles óculos de aro grosso. Não parecia nada com um mafioso. Um leve sorriso ameaçou escapar dos meus lábios, mas balancei a cabeça vigorosamente, tentando afastar pensamentos indecorosos.— Então… — Quebrei o silêncio, estalando a língua em frustração quando Ryuu continuou a trabalhar. — Entendo vagamente por que seu pai pode pressionar por este casamento, mas por que você concordou?Finalmente, Ryuu ergueu os olhos para mim, desviando-se do notebook. Recostou-se
&RYUU&Depois da conversa com Beatrice, concentrei-me no trabalho, mas ela não saía da minha cabeça. Por mais que meu pai e Giorgio me alertassem, eu parecia incapaz de fazer qualquer coisa além de irritá-la, como um garoto provocando sua paixão no pátio da escola. Mas o que sentia por Beatrice não era exatamente afeto.Suspirei profundamente, afastando o notebook e apertando a ponta do nariz na tentativa de aliviar uma dor de cabeça que se aproximava. Ainda tinha muito trabalho a fazer, mas o casamento iminente ocupava todos os meus pensamentos, dificultando a concentração.— Você simplesmente não consegue evitar, não é? — A voz de Nitta quebrou o silêncio, e eu mal contive um gemido. Lancei um olhar irritado para meu irmão, mas isso não o impediu de entrar na sala com aquele sorriso presunçoso no rosto. — Deveria ter ouvido, Ryuu. Ela te chamou de idiota para o avô dela. O que você fez para irritá-la tanto? Você tem sorte que fui eu que ouvi isso, e não o papai.— Isso não tem graça
Durante toda a semana, engoli minha raiva. Mantive-me educada com meu avô, Gojou e os outros homens Morunaga, enquanto sufocava as lágrimas que ameaçavam cair a cada segundo. A fúria que meu pai pensava sentir não era nada comparada ao tumulto que fervia dentro de mim. Ele estava sofrendo agora por causa dos próprios erros. Um homem que cometera tantos enganos e este não seria o último. Eu estava sofrendo por culpa dele, e isso não esqueceria.Durante dias, estive à mercê de outros, obrigada a obedecer a esses homens, temendo ofender os Morunaga e enfrentar as consequências de sua ira inevitável, como meu avô sempre lembrava. Sem uma palavra ou mesmo um olhar para meu pai, passei por ele e me dirigi à praia, onde risos altos e uma música distante ecoavam. Meu coração acelerou a cada passo, rezando para que minha tia e meus primos tivessem chegado. Precisava do apoio deles mais do que nunca. Sabia que meu avô me amava, mas sua lealdade estava com meu noivo. Se queria alguém ao meu lado
&Beatrice&Dario, o segundo mais velho, sempre fora mais reservado do que os outros irmãos Carbone, e por isso, eu me sentia menos à vontade com ele. No entanto, hoje, sua presença era um alívio. Anton e Lex, com dezenove e dezessete anos, respectivamente, eram mais irmãos para mim do que os dois mais velhos.— Prazer em finalmente conhecê-lo — disse Ryuu, estendendo a mão para Bion. Notei a expressão cansada no rosto do meu noivo, como se estar entre a minha família exigisse mais dele do que podia suportar.Bion apertou a mão de Ryuu com firmeza, respondendo apenas com um grunhido baixo de desaprovação. Era impressionante como Bion conseguia soar desrespeitoso sem dizer uma palavra. Para minha surpresa, Ryuu não reagiu. Ele apenas segurou minha mão e inclinou-se, provocando um arrepio com a possibilidade de seus lábios se aproximarem demais.— Vou deixá-la com sua família — sussurrou Ryuu em meu ouvido, sem maiores explicações, deixando-me entre aliviada e confusa. Não fazia sentido