Respirei fundo, completamente horrorizada com a sugestão de meu pai. Exceto que eu sabia que não era apenas uma sugestão. Giacomo não falaria sobre isso se tivesse realmente alguma escolha. Ele não ousaria perguntar se fosse apenas uma opção. Em último caso, gostando ou não, eu me casaria com o homem chamado Ryuu Morunaga. Meu pai estava errado ao comparar isso com seu relacionamento com minha mãe. Não era um casamento arranjado, mas forçado.
Eu já ouvira falar do temido herdeiro Morunaga durante minha estada em Palermo. A família Morunaga não residia lá há anos, mas o nome ainda era temido e respeitado. Histórias assustadoras sobre tráfico de humanos, prostituição e outras atividades ilícitas estavam associadas a essa família. Embora trouxessem boa sorte àqueles que seguiam suas regras, a família Morunaga não era minha família e certamente não me amavam. Eles eram estranhos, e eu já temia a maneira como poderiam me tratar caso eu cometesse algum erro aos olhos deles.
A família Morunaga consistia em Gojou, o patriarca, sua esposa e seus três filhos: Ryuu, Fukui e Nitta. Eles administravam uma grande construtora e outros empreendimentos como fachada para seus negócios ilegais. Gojou, embora não estivesse mais oficialmente no comando, ainda era visto como o líder. Ele tinha apenas alguns anos a mais que meu pai e, pela última fotografia que vi, não parecia acolhedor. Sua carranca profunda e as linhas duras no rosto sugeriam que ele nunca sorria. Seu corpo volumoso indicava o quão perigoso poderia ser mesmo sem uma arma.
O filho mais novo, Nitta, era frequentemente visto na mídia, geralmente em relação a casos judiciais na qual os suspeitos misteriosamente caíam antes de qualquer dano real. Ele era o mais público dos Morunaga, um ano mais velho que eu, com cabelo mais claro e um bronzeado natural herdado do pai. Fukui, o filho do meio, era raramente mencionado. Além de sua imagem ocasional na mídia e os boatos que circulavam entre meus primos, não sabia muito sobre ele. Embora tão atraente quanto seus irmãos, ele mantinha seus cabelos negros bem curtos.
E por fim, Ryuu Morunaga. Não havia dúvida em minha cidade natal de que ele seria tão cruel e impiedoso quanto seu pai, Gojou. Já havia começado a expandir o império Morunaga e estava no poder há menos de um ano. Sua aparência era mais assustadora que atraente. Apesar de suas feições afiadas, pele clara em comparação aos irmãos e cabelos espessos como obsidiana, sua reputação com mulheres era praticamente inexistente. Ele já estava casado com seu império, o que me fazia questionar por que meu pai desejava que eu me casasse com ele. Certamente Ryuu não havia concordado com tal absurdo.
— Pai, você não pode estar falando sério…
— Beatrice… — sussurrou ele, cansado. — Não preciso de uma resposta agora, apenas pense sobre o assunto.
Por que ele estava mentindo para mim? Eu podia ver o brilho suplicante em seus olhos. Giacomo estava desesperado. Se precisava que eu concordasse com este casamento, por que me daria a ilusão de escolha?
— Mas, papai — comecei, minha voz se tornando firme.
Eu não recuaria e não permitiria que meu pai evitasse uma conversa tão séria. A família Morunaga era perigosa. Minha mãe morreu devido ao envolvimento no trabalho dele. Não foi por isso que ele ficou tão ansioso para permitir meu retorno a Palermo? Certamente ele não desejava que o mesmo destino recaísse sobre mim. Eu não podia me casar com um homem tão frio e cruel quanto o filho mais velho dos Morunagas. Seria miserável e um alvo fácil para quem quisesse prejudicar aquela família.
— Beatrice! — meu pai estalou, um olhar afiado superando suas feições. Não era comum ele levantar a voz para mim.
Giacomo suspirou pesadamente.
— Não quero discutir sobre isso. Só quero saber se aceitará a proposta de casamento da família Morunaga ou não.
— Exceto que não é realmente uma escolha, não é? — retruquei, minha voz tremendo. — Nunca é quando se trata do seu trabalho. O que acontecerá se eu disser não? Minha vida ou a sua estará em perigo?
Meu sangue borbulhava forte em minhas veias. Eu podia sentir o calor ardente em minhas bochechas e as lágrimas esperando para cair. Traição. Isso era todo o sentimento de raiva e vergonha que me consumia. Traição do homem em quem mais confiava.
Os olhos de meu pai estavam apertados com força, um rosnado em seus lábios enquanto dirigia toda sua fúria para mim, sua única filha. Eu nunca o vira assim antes. Isso mostrava o quão crucial este casamento era. Ambos estávamos dolorosamente conscientes da pouca escolha que nos restava. Eu poderia entregar minha vida nas mãos do diabo ou morrer.
Eu sabia que os negócios do meu pai voltariam para me atingir um dia. Foi ingênua ao pensar que poderia escapar de tal destino, quando tantas mulheres antes de mim sofreram a mesma situação.
Com o coração pesado, baixei o olhar para os desenhos na mesa de madeira, meus dedos seguindo as linhas lentamente enquanto reunia a vontade de falar.
— Eu… — engoli seco antes de continuar — eu aceito, pai.
As palavras eram como ácido em minha língua. Falei sem que minha voz quebrasse sob a dor que pesava em meu espírito. Toda a emoção de voltar para casa seria para sempre manchada por este momento. Limpando a garganta e controlando as lágrimas que molhavam minhas bochechas, levantei-me, mantendo os olhos baixos enquanto saía da sala sem dizer mais nada.
Eu não podia estar perto do meu pai agora, não depois dessa quebra de confiança. Ele dizia querer me manter segura, mas aqui estava ele, colocando-me nas mãos de uma das maiores famílias mafiosas existentes. A família Morunaga era o centro da violência e crueldade, e só um tolo se envolveria de bom grado com eles.Segui a música fraca que vazava pela casa, sabendo que vinha do salão. Precisava conversar com meu avô sobre isso. Talvez ele pudesse esclarecer a situação. Que maneira infernal de começar as férias. Nenhuma lágrima caía agora, mas meus olhos ainda ardiam e meu coração doía. Não conseguia imaginar em que tipo de confusão meu pai se meteu para causar esse caos.Ao longo dos anos, fui mantida afastada do trabalho dele, aprendendo a não fazer perguntas. Era irônico que, depois de tantos anos fechando os olhos para o trabalho de meu pai, agindo ignorante durante toda a minha infância e adolescência, fosse agora amaldiçoada a pagar suas dívidas assim que entrei na idade adulta.S
&RYUU&Eu estava sentado em uma cadeira, a camisa desabotoada e as mangas arregaçadas até os cotovelos, contemplando as notícias das minhas próximas núpcias. Fazia apenas dois dias que meu pai havia abordado o assunto. Embora a reunião tivesse sido estritamente profissional, o que ele pedia era profundamente pessoal.Não conseguia entender por que Gojou Morunaga queria que eu me casasse com tanta urgência. Certamente nada tinha a ver com a fusão dos negócios Morunaga e Carbone, como ele alegara. Eu sabia da situação desesperadora em que Giacomo Carbone se encontrava. Meu pai poderia ter tomado a empresa dele facilmente. Mas, ao invés disso, ele tinha claramente um motivo oculto, um plano que tinha certeza de que funcionaria da maneira que Gojou pretendia.Beatrice Carbone. O nome era atraente, combinando perfeitamente com a mulher que eu sabia ser extremamente bela. Eu havia visto uma foto dela antes. Jovem e bonita, mas nada para se envolver emocionalmente. Era o tipo de mulher facil
— O que é tão engraçado? — perguntou Nitta, com um sorriso divertido.— Todos vocês, Morunagas, são facilmente distraídos? — devolvi, com um toque de sarcasmo.— Infelizmente, não — ele respondeu, rindo com vontade. — Ryuu é um homem muito… focado. Você não terá vida fácil. Ele não é exatamente o tipo para um casamento — comentou, arqueando as sobrancelhas infantilmente. — Nem eu.Ignorei seus flertes.— Se ele é tão inadequado para o casamento, então, por que estamos fazendo isso? — perguntei, tentando entender a lógica absurda.Nitta deu de ombros.— É bom para os negócios, imagino. As empresas Carbone e Morunaga estão se fundindo. Você não esperava que seu pai arranjasse um casamento mais cedo ou mais tarde? Afinal, você é a herdeira dele. É assim que as coisas são feitas.Seu tom condescendente me irritou, mas mantive meu temperamento sob controle.— Você vai se sair bem, confie em mim. Pelo que ouvi, tem uma boa cabeça. Ryuu pode parecer duro no começo, mas isso é apenas para aqu
— Seu irmão está certo. Mostre um pouco mais de respeito pela noiva dele! — disse Gojou. Eu preferia que ele tivesse permanecido calado. Não precisava de um lembrete de que agora era a noiva de alguém da família Morunaga.Meus olhos começaram a arder com a ameaça de lágrimas, mas não iria chorar. Repreendi-me silenciosamente e corri de volta para a cozinha para me recompor, usando o pretexto de pegar o vinho. Quando voltei, um silêncio incômodo pairava no ar. Pelas feições sombrias de Nitta, deduzi que palavras mais duras haviam sido trocadas na minha ausência. Toda essa situação era profundamente desconfortável. Eu entendia a necessidade de me familiarizar com Ryuu antes do casamento, mas não gostava nem um pouco daquilo.— Então — disse eu, quebrando o silêncio assim que todos começaram a comer, sem direcionar a pergunta a ninguém em particular —, quando será o casamento?— Não agora, Beatrice — repreendeu meu pai imediatamente.Encolhi-me com o tom afiado de sua voz, um lembrete cl
&RYUU&Eu estava alheio à conversa ao meu redor. Todos, exceto minha futura esposa, tinham se reunido no salão para beber antes de se retirarem para seus quartos. Mas conversar não me atraía.Beatrice ficou retraída durante o jantar, e eu sabia que a culpa era da pressa com que tudo estava acontecendo. Eu podia entender seu medo ao se casar comigo. Não era justo esperar que ela aceitasse uma mudança tão drástica e rápida em sua vida. Não era algo pessoal, e eu não deveria me ofender com sua relutância. Qualquer um sentiria o mesmo, independentemente de quem fosse se casar. Claro que ela estava assustada.Eu também precisava aceitar a perspectiva do casamento. Nunca havia considerado isso antes e, com certeza, não queria pensar nisso agora.Uma dor aguda na nuca me trouxe de volta dos meus pensamentos. Virei-me irritado para encarar o agressor, mas minha expressão esfriou ao perceber que era meu pai.— Estávamos falando com você — resmungou ele.— Papai estava dizendo que você precisa
Esperei em silêncio, torcendo para que ele me dirigisse um olhar ou tentasse puxar conversa, mas isso não aconteceu. Lutei contra a vontade de fechar aquele maldito notebook e jogá-lo pela janela, direto na água lá fora.Observei-o com atenção, analisando cada detalhe: o formato da mandíbula, os lábios finos, a cor penetrante dos olhos, a força do olhar. Seus braços eram musculosos, decorados por tatuagens de dragões que serpenteavam até a camisa bem ajustada ao peito. Não podia negar que ele era bonito, especialmente com aqueles óculos de aro grosso. Não parecia nada com um mafioso. Um leve sorriso ameaçou escapar dos meus lábios, mas balancei a cabeça vigorosamente, tentando afastar pensamentos indecorosos.— Então… — Quebrei o silêncio, estalando a língua em frustração quando Ryuu continuou a trabalhar. — Entendo vagamente por que seu pai pode pressionar por este casamento, mas por que você concordou?Finalmente, Ryuu ergueu os olhos para mim, desviando-se do notebook. Recostou-se
&RYUU&Depois da conversa com Beatrice, concentrei-me no trabalho, mas ela não saía da minha cabeça. Por mais que meu pai e Giorgio me alertassem, eu parecia incapaz de fazer qualquer coisa além de irritá-la, como um garoto provocando sua paixão no pátio da escola. Mas o que sentia por Beatrice não era exatamente afeto.Suspirei profundamente, afastando o notebook e apertando a ponta do nariz na tentativa de aliviar uma dor de cabeça que se aproximava. Ainda tinha muito trabalho a fazer, mas o casamento iminente ocupava todos os meus pensamentos, dificultando a concentração.— Você simplesmente não consegue evitar, não é? — A voz de Nitta quebrou o silêncio, e eu mal contive um gemido. Lancei um olhar irritado para meu irmão, mas isso não o impediu de entrar na sala com aquele sorriso presunçoso no rosto. — Deveria ter ouvido, Ryuu. Ela te chamou de idiota para o avô dela. O que você fez para irritá-la tanto? Você tem sorte que fui eu que ouvi isso, e não o papai.— Isso não tem graça
Durante toda a semana, engoli minha raiva. Mantive-me educada com meu avô, Gojou e os outros homens Morunaga, enquanto sufocava as lágrimas que ameaçavam cair a cada segundo. A fúria que meu pai pensava sentir não era nada comparada ao tumulto que fervia dentro de mim. Ele estava sofrendo agora por causa dos próprios erros. Um homem que cometera tantos enganos e este não seria o último. Eu estava sofrendo por culpa dele, e isso não esqueceria.Durante dias, estive à mercê de outros, obrigada a obedecer a esses homens, temendo ofender os Morunaga e enfrentar as consequências de sua ira inevitável, como meu avô sempre lembrava. Sem uma palavra ou mesmo um olhar para meu pai, passei por ele e me dirigi à praia, onde risos altos e uma música distante ecoavam. Meu coração acelerou a cada passo, rezando para que minha tia e meus primos tivessem chegado. Precisava do apoio deles mais do que nunca. Sabia que meu avô me amava, mas sua lealdade estava com meu noivo. Se queria alguém ao meu lado