O silêncio na sala pesava como uma sentença. Eu podia ouvir minha própria respiração, rápida e descompassada, enquanto os olhos frios de Dante Vasquez me avaliavam. Cada segundo que passava me fazia sentir mais presa, mais vulnerável, mas eu sabia que demonstrar medo seria o pior erro que poderia cometer.
Ele se inclinou ligeiramente para frente, descansando os cotovelos sobre os joelhos e entrelaçando os dedos. Era uma pose casual, mas carregada de poder. Um sorriso torto se formou em seus lábios, e não havia nada de conforto nele.
— Você diz que pode ser mais útil viva do que morta. — Sua voz era baixa, mas cortante. — Explique-se, Clara.
Engoli em seco. Minhas mãos tremiam levemente, mas mantive a postura o mais firme possível. Eu não podia hesitar. Meu cérebro trabalhava em alta velocidade, buscando qualquer argumento que pudesse convencê-lo a não me descartar como um problema descartável.
— Eu trabalho em um supermercado. Eu vejo rostos todos os dias, pessoas que entram e saem, que fazem compras, que conversam. — Fiz uma pausa rápida, medindo sua reação. — Eu sou invisível, mas observo tudo. Sei quem paga em dinheiro, quem usa cartões, quem parece nervoso ao comprar algo simples. Posso ser útil para você.
Dante ergueu uma sobrancelha, claramente intrigado, mas não totalmente convencido. O homem ao seu lado, um brutamontes que ainda não havia dito uma palavra, bufou com desdém.
— E por que eu confiaria em você? — Dante perguntou, inclinando-se para trás, cruzando os braços. O olhar dele se fixou em mim com uma intensidade sufocante.
Essa era a pergunta crucial. Como convencer um criminoso de que eu não era um risco? Minha mente girava, buscando qualquer coisa, qualquer detalhe que pudesse funcionar a meu favor. Finalmente, decidi que o único caminho era a honestidade – ou, pelo menos, uma versão dela.
— Porque eu não tenho escolha. — Minha voz saiu mais firme do que eu esperava. — Você poderia me matar agora e encerrar essa questão. Mas se me deixar viva, eu posso ser útil. Posso passar informações, posso ajudar sem levantar suspeitas. Você pode me ensinar a ser parte disso, e eu posso aprender.
O silêncio voltou, mais pesado do que antes. Meu coração batia tão forte que parecia ecoar pela sala. Dante continuou me observando, seus olhos analisando cada expressão, cada gesto, cada respiração minha. Então, algo inesperado aconteceu.
Ele sorriu. Um sorriso preguiçoso, levemente divertido, como se tivesse acabado de ouvir algo interessante.
— Sabe, Clara... Você é mais esperta do que parece. — Ele se levantou lentamente, e instintivamente, meu corpo se encolheu. Mas ele apenas caminhou até um pequeno carrinho de bebidas no canto da sala. Pegou uma garrafa de uísque e serviu-se, sem pressa. — Mas esperteza não é o suficiente nesse mundo. É preciso provar lealdade.
Minhas entranhas se reviraram. Eu sabia o que vinha a seguir. Nenhum homem como Dante Vasquez aceitaria alguém em seu círculo sem uma prova concreta de submissão e fidelidade.
— Como posso provar isso? — perguntei, tentando manter a voz estável, embora por dentro eu estivesse tremendo.
Ele virou-se, me analisando por um momento antes de apontar para a porta.
— Lorenzo vai te levar para um pequeno trabalho. Considere isso seu teste. Se você falhar... Bem, nem preciso dizer o que acontece com quem me decepciona.
Engoli em seco, mas assenti. Não havia saída. Se quisesse sobreviver, teria que jogar o jogo dele.
**
Fui levada por Lorenzo para um carro escuro estacionado na frente do prédio. A tensão no veículo era palpável, e o homem ao meu lado não parecia disposto a tornar as coisas mais fáceis.
— Ouça bem, garota. — A voz dele era grave, ríspida. — Você vai entrar naquele café ali na esquina e entregar essa bolsa para o homem de terno cinza sentado na mesa do fundo. Não fale com ninguém, não olhe para ninguém, apenas entregue e saia. Se fizer algo errado, eu mesmo acabo com você. Entendido?
Assenti rapidamente. Minhas mãos suavam enquanto eu pegava a pequena bolsa preta que ele me entregou. O couro era macio, caro. O que quer que houvesse ali dentro, não era nada bom.
Saí do carro e caminhei até o café. Meu coração martelava contra as costelas. Eu nunca tinha feito nada ilegal antes. Nunca tinha sequer pego algo que não me pertencia. Agora, eu estava prestes a me tornar cúmplice de algo que nem compreendia completamente.
Entrei no estabelecimento. O aroma de café fresco e pão recém-assado me atingiu, mas meu foco estava apenas no homem de terno cinza. Ele estava sentado calmamente, lendo um jornal. Parecia completamente alheio à minha presença.
Respirei fundo e me aproximei. Quando cheguei perto o suficiente, deslizei a bolsa sobre a mesa. Ele ergueu os olhos apenas por um instante, pegou a bolsa e a colocou ao lado sem dizer uma palavra.
Meu trabalho estava feito.
Virei-me e saí o mais rápido que pude sem parecer suspeita. Ao voltar para o carro, minhas pernas tremiam. Lorenzo me observou com olhos avaliadores antes de dar a partida.
— Nada mal. — Ele murmurou. — Talvez você tenha mesmo chance de sobreviver.
Eu não sabia se isso era um elogio ou um aviso. Mas uma coisa era certa: eu tinha acabado de cruzar uma linha sem volta.
O silêncio dentro do carro era esmagador. Lorenzo dirigia com o olhar fixo na estrada, sua expressão ilegível. Eu, por outro lado, tentava controlar a respiração. Meu coração ainda pulsava freneticamente depois do que acabara de acontecer. Eu tinha cruzado uma linha, uma que jamais poderia desfazer. Agora, eu fazia parte daquilo.Meu olhar se desviou para fora da janela, observando as luzes da cidade passando rapidamente. O mundo lá fora parecia normal, como se nada tivesse mudado, mas para mim, tudo estava diferente. Eu não era mais apenas Clara, a caixa de supermercado que levava uma vida pacata. Eu era alguém que havia acabado de fazer um favor para um mafioso.— Você fez direitinho. — A voz de Lorenzo quebrou o silêncio, me trazendo de volta à realidade.Virei-me para ele, hesitante.— É sério?Ele soltou um riso baixo, mas sem humor.— Pelo menos não nos colocou em apuros. Isso já é alguma coisa. Mas não se engane, Clara. Você ainda tem muito o que provar.Assenti, mesmo sem sabe
O Jogo de PoderEu não sabia exatamente quando tinha começado a jogar, mas já estava no tabuleiro.Os últimos dias haviam sido um teste atrás do outro. Pequenas missões, favores perigosos e situações onde eu precisava provar minha lealdade. Eu não era ingênua a ponto de achar que Dante me mantinha por perto apenas por simpatia. Havia algo que o intrigava em mim, e eu precisava descobrir se isso jogava a meu favor ou se apenas me tornava um alvo mais fácil.Naquela noite, Lorenzo me buscou para mais um encontro com Dante. Eu já estava começando a reconhecer os padrões. Ele gostava de me observar, testar minhas reações, me puxar para o limite apenas para ver se eu quebrava. Mas eu ainda estava ali. Ainda intacta.— Você está diferente — Lorenzo comentou enquanto dirigia.— Diferente como?Ele me olhou de soslaio.— Antes, parecia assustada. Agora... parece que está aceitando isso.Engoli em seco. Será que estava? Ou será que era apenas uma forma de sobrevivência?O carro parou em frente
Ficar.A palavra ficou pairando no ar entre nós, carregada de significados não ditos.Dante me observava como um predador paciente, esperando minha reação, testando se eu recuaria ou se aceitaria sua oferta velada. Eu sabia que, se dissesse sim, cruzaria mais uma linha invisível. Não era apenas sobre permanecer fisicamente naquele lugar; era sobre ceder a algo que crescia entre nós e que eu não podia mais ignorar.Mas eu não podia demonstrar hesitação.— Só minha presença? — perguntei, mantendo meu tom neutro.Dante sorriu, aquele sorriso que me irritava tanto quanto me atraía.— Por enquanto.Aquelas duas palavras me fizeram prender a respiração. Meu corpo reagiu antes mesmo da minha mente processar. Um arrepio subiu pela minha espinha, e eu engoli em seco, tentando ignorar a forma como ele parecia se divertir com a minha reação.— Certo — murmurei, cruzando os braços, tentando esconder o nervosismo. — Mas não espere que eu durma no sofá.Ele soltou uma risada baixa e balançou a cabe
O sol invadia o quarto pelas frestas das cortinas, projetando sombras suaves no lençol bagunçado. Meu corpo estava pesado, e minha cabeça latejava levemente, como se eu tivesse passado por uma tempestade e só agora estivesse emergindo para a superfície. Piscando algumas vezes, tentei me situar. O cheiro amadeirado impregnado no travesseiro e a firmeza do colchão eram evidências de que eu não estava em casa.A lembrança veio em ondas: Dante, o quarto, a exaustão me arrastando para um sono inevitável. Meu coração bateu mais forte por um instante, um medo irracional de que algo tivesse acontecido. Mas, ao me mexer, percebi que minha roupa estava exatamente como antes. Um suspiro escapou dos meus lábios. Dante havia sido respeitoso.Passei a mão no rosto e me sentei devagar, sentindo o ambiente silencioso ao meu redor. A casa de Dante parecia um outro mundo, afastado da realidade que eu conhecia. Me levantei e ajeitei minhas roupas, sentindo um leve frio ao tocar o chão de madeira com os
Minha rotina era simples. Acordar cedo, pegar o mesmo ônibus lotado, sorrir para clientes mal-humorados e repetir o processo no dia seguinte. Eu nunca esperei que minha vida mudasse drasticamente em uma noite qualquer, muito menos que uma simples maleta jogada no lugar errado pudesse virar meu mundo de ponta-cabeça.Era tarde quando saí do supermercado. Meu turno se estendeu por tempo demais, como sempre acontecia quando o gerente resolvia me sobrecarregar. Caminhei para casa com os fones de ouvido e os pensamentos vagando entre o que faria para jantar e o quanto desejava um banho quente. A rua estava deserta, apenas alguns postes piscando intermitentemente iluminavam o caminho. Foi quando tropecei.Olhei para baixo, confusa. Algo duro havia esbarrado no meu pé. A luz fraca revelou uma maleta preta, aparentemente intacta, de couro reluzente. Não havia ninguém por perto. Ela estava ali, como se tivesse sido esquecida por alguém com muita pressa.Meu coração disparou com uma mistura de