A tensão entre mim e Dante era quase tangível. Sua presença parecia preencher cada espaço do ambiente, tornando o ar ao meu redor mais pesado, carregado de algo que eu ainda não sabia nomear. Depois de concordar em ficar, uma parte de mim queria se convencer de que essa era apenas uma solução temporária. A outra... bem, essa parte parecia intrigada demais com o perigo que ele representava.
Dante se afastou, voltando sua atenção para um dos celulares sobre o balcão. Sua expressão, sempre tão controlada, se fechou ainda mais quando ele leu alguma mensagem.
— Preciso resolver umas coisas — ele disse, sem levantar os olhos para mim. — Não saia daqui.
Fiz menção de protestar, mas ele ergueu um olhar afiado.
— Clara, não estou pedindo. Estou avisando.
O tom de sua voz me arrepiou, mas não de medo. De algo que eu não queria admitir. Ele não era apenas um homem perigoso. Era um homem acostumado a ter controle sobre tudo ao seu redor. E agora, de alguma forma, isso incluía a mim.
Antes que eu pudesse responder, ele pegou a jaqueta de couro jogada sobre uma das cadeiras e saiu, batendo a porta atrás de si. Suspirei, sentindo um misto de frustração e alívio. Estar perto dele era desgastante, mas a sensação de estar completamente sozinha naquela casa desconhecida também não era reconfortante.
Andei pelo espaçoso apartamento, observando os detalhes. Era um local sofisticado, mas sem excessos. Cores neutras, móveis de couro, prateleiras com poucos livros, um bar bem abastecido. Nada de fotos, nada de memórias visíveis. Como se Dante vivesse em um espaço sem passado.
Curiosa, me aproximei da grande janela que dava vista para a cidade. O sol brilhava forte, mas nada ali parecia verdadeiramente iluminado. Tudo parecia opaco, como se eu estivesse observando um mundo do qual não fazia mais parte.
Uma batida na porta me tirou dos meus pensamentos. Meu coração disparou.
Ninguém deveria estar ali.
Engoli em seco e me aproximei devagar, tentando pensar no que fazer. Dante havia sido claro sobre não sair, mas não mencionou nada sobre atender a porta. E se fosse algo importante? Ou pior, e se fosse alguém perigoso?
A batida se repetiu, mais firme desta vez.
— Clara, abra a porta. Sei que você está aí.
Meu coração pareceu parar por um instante.
A voz era de uma mulher.
Aproximei-me da porta, hesitante.
— Quem é você? — perguntei, sem abrir.
— Uma amiga. Ou uma inimiga. Depende de como você vai lidar com isso.
Minha mão estava suada quando girei a fechadura e abri a porta apenas o suficiente para enxergar a dona da voz.
Ela era alta, esguia, vestindo um terninho preto impecável. Seus cabelos escuros estavam presos em um coque bem feito e seus olhos avaliavam cada detalhe meu com um misto de diversão e curiosidade.
— Clara, não é? — Ela sorriu de lado. — Eu sou Valentina.
O nome não me dizia nada, mas algo em seu tom de voz me dizia que ela sabia muito mais sobre mim do que eu sabia sobre ela.
— Dante não está. — Falei, mantendo a porta parcialmente fechada.
— Eu sei. É com você que quero falar.
Meu estômago revirou.
— Sobre o quê?
Ela apoiou uma mão no batente da porta e inclinou levemente a cabeça.
— Sobre o seu lugar nisso tudo. É isso que você quer, não é? Caso contrário, já teria fugido.
Meus lábios se separaram, mas nenhuma resposta veio. Eu sabia que ela esperava que eu negasse, mas a verdade era mais complexa do que isso.
Eu deveria fugir.
Mas não queria.
Valentina sorriu de um jeito enigmático, como se tivesse lido meus pensamentos.
— Vejo que fiz a leitura certa.
Antes que eu pudesse responder, ouvimos um barulho no corredor. Valentina deu um passo para trás e, em um movimento rápido, retirou um celular do bolso e fingiu estar mandando uma mensagem.
Dante apareceu na esquina do corredor, sua expressão se fechando instantaneamente ao vê-la. Seus olhos voaram para mim e, em seguida, para a porta aberta.
— O que diabos você está fazendo aqui, Valentina? — Sua voz era pura hostilidade.
— Apenas conhecendo sua nova... hóspede. — Ela sorriu, mas havia algo de afiado em sua expressão. — Clara parece uma mulher interessante.
Dante se moveu rápido. Em um instante, ele estava entre nós duas, sua mão segurando a porta com força.
— Saia.
Valentina deu um passo para trás, erguendo as mãos em um gesto de rendição.
— Sempre tão protetor, Dante. Isso é adorável. Mas não se preocupe. Clara e eu ainda teremos muito tempo para conversar.
Ela piscou para mim antes de se afastar pelo corredor, seus saltos ecoando pelo chão. Dante esperou até que ela sumisse de vista antes de se virar para mim.
— O que ela te disse? — Sua voz ainda carregava a mesma hostilidade de antes.
— Nada demais. Ela só queria conversar. — Cruzei os braços. — Quem é ela, Dante?
Seu maxilar ficou tenso.
— Alguém com quem você não deveria se envolver.
Soltei uma risada sem humor.
— É engraçado você dizer isso, considerando a situação em que estou.
Dante se aproximou, e de repente não havia mais espaço entre nós.
— Eu não estou brincando, Clara. Valentina é perigosa.
Senti minha respiração vacilar. Havia algo nos olhos dele, algo que misturava preocupação e posse.
— Então me diga a verdade, Dante. O que realmente está acontecendo aqui?
Ele me olhou por um longo instante antes de falar, sua voz mais baixa, mas carregada de intenção.
— A verdade é que você está no meio de um jogo muito maior do que imagina. E agora, Clara... você é parte dele.
O tempo parecia ter mudado dentro daquela casa. Não havia relógios visíveis, nem sinais da correria do mundo lá fora. Apenas um silêncio cortado pelo som ocasional do gelo se movendo no copo de whisky que Dante segurava entre os dedos. Eu estava sentada no sofá de couro da sala, tentando absorver suas palavras.Eu não podia mais voltar para minha casa.— Você precisa aceitar que sua vida mudou, Clara — ele disse, recostando-se na poltrona de forma casual, mas eu sabia que nada nele era realmente relaxado. Cada movimento, cada olhar, era calculado.— Eu não escolhi isso — murmurei, sentindo uma pontada de raiva subir pela minha garganta.Dante soltou uma risada baixa, inclinando a cabeça para o lado.— Ah, não? Quem foi que abriu a maleta, mesmo sabendo que não deveria? Quem foi que, em vez de fugir, ficou e jogou esse joguinho de moralidade comigo?Fechei os olhos por um instante. Ele tinha razão, mas eu odiava admitir. Desde o primeiro instante em que vi o dinheiro e os documentos na
O caminho de volta para a casa de Dante foi silencioso. O motor do carro roncava suavemente enquanto a cidade passava por nós, as luzes piscando como estrelas distantes. Meu coração ainda batia acelerado, as imagens do que vi no galpão presas na minha mente.Eu sabia que o mundo de Dante era cruel, mas ver aquilo de perto era diferente de apenas imaginá-lo. O homem amarrado, os olhos vidrados de medo, a frieza na postura de Dante… Era como se ele fosse uma sombra, alguém que já havia mergulhado fundo na escuridão e se acostumado a ela.Mas o que me assustava mais do que a violência que presenciei era o fato de que, por mais que meu estômago se revirasse, eu não estava fugindo.E Dante sabia disso.Ele dirigia tranquilo, como se tivéssemos acabado de sair para um jantar comum. O silêncio entre nós era carregado, mas confortável de uma forma estranha.— Você não disse nada desde que saímos de lá — ele quebrou o silêncio, os olhos ainda focados na estrada.Eu respirei fundo, ainda absorv
O dia amanheceu nublado, como se o próprio céu soubesse que algo importante estava prestes a acontecer. Eu mal havia dormido. Meu corpo estava cansado, mas minha mente não desligava. A promessa de Dante ecoava na minha cabeça: Amanhã começamos.E agora, esse amanhã tinha chegado.Levantei-me e vesti roupas confortáveis antes de sair do quarto. O cheiro de café pairava no ar, misturado ao leve aroma amadeirado que sempre parecia cercar Dante.Encontrei-o na sala, sentado na poltrona, mexendo no celular. Assim que me viu, ergueu o olhar e sorriu de canto.— Bom dia, pequena. Pronta para sua primeira lição?
Os dias seguintes foram um turbilhão de aprendizado e tensão crescente. Dante não pegava leve comigo. Se eu havia escolhido ficar e aprender, então eu teria que me tornar forte o suficiente para não ser apenas uma peça no jogo dele, mas uma jogadora de verdade.Pela manhã, treinamento. Ele me ensinava a atirar, a manejar armas diferentes, a entender o peso de cada decisão. À tarde, eu aprendia a negociar, a ler as intenções das pessoas, a perceber mentiras escondidas atrás de palavras bonitas. À noite, jantares silenciosos em que nossos olhares diziam mais do que qualquer conversa.Eu podia sentir a mudança nele, assim como sentia em mim mesma. A obsessão de Dante por mim não era mais apenas um desejo de posse; era algo mais profundo.E eu…Eu já não sabia mais onde terminava a garota que caiu nesse mundo por acidente e onde começava a mulher que escolhia ficar.Naquela noite, Dante decidiu que eu estava pronta para algo novo.— Vamos sair — ele anunciou, encostado casualmente no bate
A adrenalina ainda pulsava em minhas veias quando saímos do clube. A noite estava fresca, e as luzes da cidade pareciam mais intensas do que o normal, como se cada lâmpada refletisse a mudança que havia acontecido dentro de mim.Passei no teste de Julian. Não sabia exatamente o que isso significava, mas a expressão de Dante deixava claro que eu tinha feito o que precisava ser feito.— Você gostou disso, não foi? — Dante perguntou enquanto caminhávamos até o carro.Parei por um instante, encarando-o.— Não sei. Foi… interessante.Ele soltou uma risada baixa, abrindo a porta para mim.— "Interessante"
Segurei o envelope entre os dedos, sentindo o peso de algo maior do que eu estava acostumada a carregar. Dentro dele, não havia apenas informações sobre um inimigo de Dante, mas um convite silencioso para um jogo do qual eu já fazia parte, mesmo sem perceber.Respirei fundo antes de abrir e puxar os papéis de dentro. As folhas estavam cheias de informações sobre um homem chamado Hector Salgado. Fotos, registros bancários, transações suspeitas. Um nome que eu nunca ouvira antes, mas que, pelo jeito, representava uma ameaça real para Dante e seu império.— Quem exatamente é ele? — minha voz soou firme, mas por dentro eu sentia uma onda de nervosismo crescendo.Matteo cruzou os braços, observando-me com um olhar calculista.— Hector costumava trabalhar com Dante. Um parceiro de negócios que decidiu que queria uma fatia maior do bolo.— Traição? — perguntei, analisando uma das fotos onde Hector aparecia ao lado de Dante em um evento elegante.— Ambição — Dante respondeu, pegando os papéis
Os segundos que se seguiram foram preenchidos apenas pelo som da nossa respiração. Dante ainda estava próximo, sua mão quente roçando levemente minha pele, como se esperasse que eu me afastasse. Mas eu não o fiz.Porque, pela primeira vez desde que tudo começou, eu tinha tomado uma decisão consciente: eu ficaria.Ficar significava mais do que simplesmente estar ao lado dele. Significava me aprofundar nesse mundo, deixar para trás a vida previsível que eu costumava levar. Não era apenas sobre Dante. Era sobre mim. Sobre o que eu me tornaria.— Você sabe que não há volta depois disso, não sabe? — sua voz era baixa, quase um aviso.Assenti lentamente.— Eu sei.Algo brilhou em seus olhos, um misto de satisfação e algo mais profundo, algo que eu não conseguia decifrar completamente. Ele se afastou apenas o suficiente para que eu pudesse respirar sem sentir o calor do seu corpo tão próximo ao meu.— Matteo deve trazer informações em breve. Mas enquanto isso… preciso que você esteja prepara
O nome Sofia Rivas ainda ecoava na minha mente enquanto analisávamos os documentos espalhados sobre a mesa. A foto da mulher parecia me encarar, como se desafiasse a nossa estratégia.Dante apoiou os cotovelos na mesa, girando um anel no dedo enquanto absorvia as informações. Havia uma tensão controlada em sua expressão, uma que eu começava a reconhecer como o momento em que sua mente trabalhava a mil por hora.— Se Hector está tentando calá-la, significa que ela tem algo importante — murmurei, cruzando os braços.— Ou está prestes a descobrir — Matteo completou, esfregando o queixo.Dante tamborilou os dedos na mesa antes de se levantar. Ele pegou a foto de Sofia e a estudou por u