O silêncio dentro do carro era esmagador. Lorenzo dirigia com o olhar fixo na estrada, sua expressão ilegível. Eu, por outro lado, tentava controlar a respiração. Meu coração ainda pulsava freneticamente depois do que acabara de acontecer. Eu tinha cruzado uma linha, uma que jamais poderia desfazer. Agora, eu fazia parte daquilo.
Meu olhar se desviou para fora da janela, observando as luzes da cidade passando rapidamente. O mundo lá fora parecia normal, como se nada tivesse mudado, mas para mim, tudo estava diferente. Eu não era mais apenas Clara, a caixa de supermercado que levava uma vida pacata. Eu era alguém que havia acabado de fazer um favor para um mafioso.
— Você fez direitinho. — A voz de Lorenzo quebrou o silêncio, me trazendo de volta à realidade.
Virei-me para ele, hesitante.
— É sério?
Ele soltou um riso baixo, mas sem humor.
— Pelo menos não nos colocou em apuros. Isso já é alguma coisa. Mas não se engane, Clara. Você ainda tem muito o que provar.
Assenti, mesmo sem saber o que responder. Minhas mãos ainda tremiam levemente. Eu queria acreditar que aquilo tinha sido um teste único, que agora eu poderia voltar para minha vida normal, mas no fundo, sabia que isso era impossível.
Quando o carro parou em frente ao prédio onde Dante me esperava, minha garganta se fechou. Engoli em seco, tentando me preparar para o que vinha a seguir.
**
Dante estava sentado no mesmo lugar de antes, na sala mal iluminada. Ele parecia relaxado, mas seus olhos, assim que pousaram em mim, tinham um brilho de expectativa. Eu parei na entrada, me obrigando a respirar fundo antes de dar alguns passos hesitantes para frente.
Ele inclinou a cabeça para o lado, estudando-me por um momento antes de falar.
— Sente-se, Clara.
Engoli em seco, mas obedeci. Ele segurava um copo com um líquido âmbar e girava o conteúdo de maneira distraída. O silêncio entre nós se prolongou até que ele finalmente sorriu, de um jeito que me deixou inquieta.
— Lorenzo me contou que você completou o trabalho sem hesitação. — Ele tomou um gole do uísque, observando minha reação. — Isso é... impressionante.
— Eu não tinha escolha, tinha? — minha voz saiu mais firme do que eu esperava.
Dante arqueou uma sobrancelha, claramente intrigado.
— Sempre há escolhas, Clara. O que me interessa é entender por que você escolheu fazer isso sem tentar escapar ou sabotar o trabalho. — Ele se inclinou um pouco para frente, sua presença dominando a sala. — Você tem medo de mim?
Meu coração disparou, mas mantive meu olhar fixo no dele. Eu tinha medo, claro que tinha. Mas não queria demonstrar fraqueza.
— Acho que qualquer pessoa com um mínimo de juízo teria. — Respondi honestamente, sem desviar os olhos.
Dante soltou uma risada baixa, como se minha resposta tivesse o divertido.
— Justo. — Ele se levantou, caminhando lentamente ao meu redor. — Mas vejo algo interessante em você. Você não parece o tipo que se envolve com esse mundo, mas, de alguma forma, está aqui. E o mais curioso é que não tentou fugir. — Ele parou atrás de mim, tão perto que pude sentir seu perfume amadeirado. — Você me intriga, Clara.
A presença dele me deixava nervosa, mas não apenas pelo medo. Havia algo mais ali, algo que eu não queria admitir para mim mesma. Meu corpo estava tenso, atento a cada movimento dele. Era como se ele estivesse testando meus limites.
— O que vai fazer comigo? — perguntei, tentando manter a voz firme.
Ele deslizou um dedo pelo encosto da cadeira onde eu estava sentada, como se ponderasse a resposta. Então, inclinou-se um pouco mais perto, sua voz saindo baixa e perigosa.
— Isso depende de você. Você provou que tem potencial, mas a questão é: está disposta a ir além? A aprender como esse mundo realmente funciona?
Eu deveria dizer não. Deveria pedir para ir embora, insistir que não queria fazer parte daquilo. Mas algo dentro de mim hesitou. Talvez fosse a adrenalina, talvez fosse a forma como ele me olhava, como se já soubesse que minha resposta não seria um “não” definitivo.
— E se eu disser que sim? — Minha própria ousadia me surpreendeu.
Dante sorriu de lado, satisfeito.
— Então, Clara, seja bem-vinda ao meu mundo.
**
Nos dias que se seguiram, minha vida mudou drasticamente. Não havia mais rotinas previsíveis ou turnos no supermercado. Agora, eu estava mergulhada em um universo onde cada palavra e cada ação tinham consequências. Lorenzo me ensinava os básicos – como reconhecer ameaças, como me portar nos lugares certos e, principalmente, como ganhar a confiança das pessoas certas.
Mas o que mais me perturbava era Dante.
Ele não me tratava como tratava os outros. Havia algo diferente na forma como me observava, como testava minha reação a cada palavra e gesto. Eu sentia o peso de sua atenção em cada conversa, em cada olhar que ele me lançava quando achava que eu não estava prestando atenção.
E o mais perigoso de tudo era que, apesar do medo, uma parte de mim gostava daquilo.
Certa noite, estávamos na mesma sala onde tudo começou. Dante estava recostado no sofá, um copo de uísque na mão, enquanto eu permanecia sentada na poltrona à sua frente. O silêncio entre nós não era desconfortável. Pelo contrário, era carregado de algo que eu não sabia nomear.
— Você está se saindo bem. — Ele disse, quebrando o silêncio.
Assenti, sem saber o que responder.
Ele sorriu, aquele sorriso lento que sempre me deixava inquieta.
— Mas ainda há algo que me intriga... Por que você ainda está aqui, Clara? Poderia ter fugido, poderia ter pedido para ir embora. Mas não pediu.
Engoli em seco. Não sabia exatamente a resposta. Ou talvez soubesse, mas não queria admitir.
— Talvez porque... eu ainda não sei o que quero. — Murmurei.
Dante inclinou-se ligeiramente para frente, seus olhos fixos nos meus.
— E se eu dissesse que já sei o que você quer? — Sua voz era baixa, sedutora, como um desafio.
Meu coração acelerou. Ele estava brincando comigo, testando meus limites. Mas a verdade era que, naquele momento, eu já não sabia se queria resistir ou me perder naquele jogo.
E foi assim que percebi que já não havia volta.
O Jogo de PoderEu não sabia exatamente quando tinha começado a jogar, mas já estava no tabuleiro.Os últimos dias haviam sido um teste atrás do outro. Pequenas missões, favores perigosos e situações onde eu precisava provar minha lealdade. Eu não era ingênua a ponto de achar que Dante me mantinha por perto apenas por simpatia. Havia algo que o intrigava em mim, e eu precisava descobrir se isso jogava a meu favor ou se apenas me tornava um alvo mais fácil.Naquela noite, Lorenzo me buscou para mais um encontro com Dante. Eu já estava começando a reconhecer os padrões. Ele gostava de me observar, testar minhas reações, me puxar para o limite apenas para ver se eu quebrava. Mas eu ainda estava ali. Ainda intacta.— Você está diferente — Lorenzo comentou enquanto dirigia.— Diferente como?Ele me olhou de soslaio.— Antes, parecia assustada. Agora... parece que está aceitando isso.Engoli em seco. Será que estava? Ou será que era apenas uma forma de sobrevivência?O carro parou em frente
Ficar.A palavra ficou pairando no ar entre nós, carregada de significados não ditos.Dante me observava como um predador paciente, esperando minha reação, testando se eu recuaria ou se aceitaria sua oferta velada. Eu sabia que, se dissesse sim, cruzaria mais uma linha invisível. Não era apenas sobre permanecer fisicamente naquele lugar; era sobre ceder a algo que crescia entre nós e que eu não podia mais ignorar.Mas eu não podia demonstrar hesitação.— Só minha presença? — perguntei, mantendo meu tom neutro.Dante sorriu, aquele sorriso que me irritava tanto quanto me atraía.— Por enquanto.Aquelas duas palavras me fizeram prender a respiração. Meu corpo reagiu antes mesmo da minha mente processar. Um arrepio subiu pela minha espinha, e eu engoli em seco, tentando ignorar a forma como ele parecia se divertir com a minha reação.— Certo — murmurei, cruzando os braços, tentando esconder o nervosismo. — Mas não espere que eu durma no sofá.Ele soltou uma risada baixa e balançou a cabe
O sol invadia o quarto pelas frestas das cortinas, projetando sombras suaves no lençol bagunçado. Meu corpo estava pesado, e minha cabeça latejava levemente, como se eu tivesse passado por uma tempestade e só agora estivesse emergindo para a superfície. Piscando algumas vezes, tentei me situar. O cheiro amadeirado impregnado no travesseiro e a firmeza do colchão eram evidências de que eu não estava em casa.A lembrança veio em ondas: Dante, o quarto, a exaustão me arrastando para um sono inevitável. Meu coração bateu mais forte por um instante, um medo irracional de que algo tivesse acontecido. Mas, ao me mexer, percebi que minha roupa estava exatamente como antes. Um suspiro escapou dos meus lábios. Dante havia sido respeitoso.Passei a mão no rosto e me sentei devagar, sentindo o ambiente silencioso ao meu redor. A casa de Dante parecia um outro mundo, afastado da realidade que eu conhecia. Me levantei e ajeitei minhas roupas, sentindo um leve frio ao tocar o chão de madeira com os
A tensão entre mim e Dante era quase tangível. Sua presença parecia preencher cada espaço do ambiente, tornando o ar ao meu redor mais pesado, carregado de algo que eu ainda não sabia nomear. Depois de concordar em ficar, uma parte de mim queria se convencer de que essa era apenas uma solução temporária. A outra... bem, essa parte parecia intrigada demais com o perigo que ele representava.Dante se afastou, voltando sua atenção para um dos celulares sobre o balcão. Sua expressão, sempre tão controlada, se fechou ainda mais quando ele leu alguma mensagem.— Preciso resolver umas coisas — ele disse, sem levantar os olhos para mim. — Não saia daqui.Fiz menção de protestar, mas ele ergueu um olhar afiado.— Clara, não estou pedindo. Estou avisando.O tom de sua voz me arrepiou, mas não de medo. De algo que eu não queria admitir. Ele não era apenas um homem perigoso. Era um homem acostumado a ter controle sobre tudo ao seu redor. E agora, de alguma forma, isso incluía a mim.Antes que eu
O tempo parecia ter mudado dentro daquela casa. Não havia relógios visíveis, nem sinais da correria do mundo lá fora. Apenas um silêncio cortado pelo som ocasional do gelo se movendo no copo de whisky que Dante segurava entre os dedos. Eu estava sentada no sofá de couro da sala, tentando absorver suas palavras.Eu não podia mais voltar para minha casa.— Você precisa aceitar que sua vida mudou, Clara — ele disse, recostando-se na poltrona de forma casual, mas eu sabia que nada nele era realmente relaxado. Cada movimento, cada olhar, era calculado.— Eu não escolhi isso — murmurei, sentindo uma pontada de raiva subir pela minha garganta.Dante soltou uma risada baixa, inclinando a cabeça para o lado.— Ah, não? Quem foi que abriu a maleta, mesmo sabendo que não deveria? Quem foi que, em vez de fugir, ficou e jogou esse joguinho de moralidade comigo?Fechei os olhos por um instante. Ele tinha razão, mas eu odiava admitir. Desde o primeiro instante em que vi o dinheiro e os documentos na
O caminho de volta para a casa de Dante foi silencioso. O motor do carro roncava suavemente enquanto a cidade passava por nós, as luzes piscando como estrelas distantes. Meu coração ainda batia acelerado, as imagens do que vi no galpão presas na minha mente.Eu sabia que o mundo de Dante era cruel, mas ver aquilo de perto era diferente de apenas imaginá-lo. O homem amarrado, os olhos vidrados de medo, a frieza na postura de Dante… Era como se ele fosse uma sombra, alguém que já havia mergulhado fundo na escuridão e se acostumado a ela.Mas o que me assustava mais do que a violência que presenciei era o fato de que, por mais que meu estômago se revirasse, eu não estava fugindo.E Dante sabia disso.Ele dirigia tranquilo, como se tivéssemos acabado de sair para um jantar comum. O silêncio entre nós era carregado, mas confortável de uma forma estranha.— Você não disse nada desde que saímos de lá — ele quebrou o silêncio, os olhos ainda focados na estrada.Eu respirei fundo, ainda absorv
O dia amanheceu nublado, como se o próprio céu soubesse que algo importante estava prestes a acontecer. Eu mal havia dormido. Meu corpo estava cansado, mas minha mente não desligava. A promessa de Dante ecoava na minha cabeça: Amanhã começamos.E agora, esse amanhã tinha chegado.Levantei-me e vesti roupas confortáveis antes de sair do quarto. O cheiro de café pairava no ar, misturado ao leve aroma amadeirado que sempre parecia cercar Dante.Encontrei-o na sala, sentado na poltrona, mexendo no celular. Assim que me viu, ergueu o olhar e sorriu de canto.— Bom dia, pequena. Pronta para sua primeira lição?
Os dias seguintes foram um turbilhão de aprendizado e tensão crescente. Dante não pegava leve comigo. Se eu havia escolhido ficar e aprender, então eu teria que me tornar forte o suficiente para não ser apenas uma peça no jogo dele, mas uma jogadora de verdade.Pela manhã, treinamento. Ele me ensinava a atirar, a manejar armas diferentes, a entender o peso de cada decisão. À tarde, eu aprendia a negociar, a ler as intenções das pessoas, a perceber mentiras escondidas atrás de palavras bonitas. À noite, jantares silenciosos em que nossos olhares diziam mais do que qualquer conversa.Eu podia sentir a mudança nele, assim como sentia em mim mesma. A obsessão de Dante por mim não era mais apenas um desejo de posse; era algo mais profundo.E eu…Eu já não sabia mais onde terminava a garota que caiu nesse mundo por acidente e onde começava a mulher que escolhia ficar.Naquela noite, Dante decidiu que eu estava pronta para algo novo.— Vamos sair — ele anunciou, encostado casualmente no bate