Noah sai pela porta da frente com uma mochila preta nas costas – roupas, imagino – alguns minutos depois. Ele para de postura curvada e abatida, os lábios entreabertos prestes a dizer algo, mas desiste. Entrego a caixa e o loiro a guarda no primeiro zíper da bolsa, em silêncio e remoendo palavras. Meu estômago ronca com o cheiro de massa doce frita e café e soa tentador devorar qualquer comida com muito açúcar agora.
— Quer a verdade? – Indago cruzando os braços. — Está bem, lhe direi a verdade. Mas, vou precisar de café, é uma longa e complicada história para se contar sem cafeína e açúcar no sangue.
Me viro, pronta para atravessar a rua para um café francês do lado oposto e seu toque me surpreende, enviando correntes de calor pelos poros despertos. Paro, desvio os olhos dos dedos paro o rosto dele, mais calmo e receoso.
— Desculpe. – O loiro diz cabisbaixo e suspira meneando a cabeça negativamente, decepcionado consigo mesmo. — Foi cruel o qu
Estou deslizando o dedo pela borda da xícara desde que terminara meu café, um tique nervoso expressando a necessidade de precisar fazer algo para distrair, mesmo que quase nada, uma mente perturbada quando o assunto é sério e o venho evitando por vários dias. Nos calamos, mas mantemos os olhos fixos um no outro e mesmo com a pressão intensa vindas do mortal, é como se um peso saísse dos meus ombros. Agora ele sabe. Ele sabe e ainda está aqui. Vozes baixas e irritantes se evidenciam pelo ambiente, direto da mesa das garotas jovens, com corpos lindos, cabelos sedosos e roupas de grife. A mesa contém restos de saladas e garrafinhas de água vazias. Uma delas pedira um suco e obviamente mal o está bebendo, já que o nível de bebida – visível pelo vidro do copo – continua o mesmo. Pedir coisas, apenas por pedir, por ser uma adolescente com problemas alimentares é algo óbvio e recorrente nos últimos anos. Às vezes, a humanidade consegue ser mais escr
DuvessaPosso ficar dias os observando andando pelas ruas e vivendo suas vidinhas normais. Humanos. Não passam de fantoches para mim, bonecas com cordas que puxo quando tenho vontade para os obrigar a seguir minhas ordens, ou pela simples e pura diversão de ver em seus rostos o pavor e o medo. Balanço a taça de cristal em meus dedos enquanto olho pela janela enorme de vidro. Uma parede inteira coberta por vidro e cortinas com vista do alto, para a cidade, o centro e os canais, no último andar de um prédio recém construído e inaugurado pelos mortais. Escolher um lugar para ficar pelos dias em que permaneço nesse mundo medíocre foi fácil e me certifiquei de que fosse bem debaixo dos narizes de todos eles. Afinal, o melhor esconderijo é diante dos olhos que te caçam.O liquido arroxeado desce queimando e esquenta meu corpo com sabor c
— Tenho certeza de que ambos os povos... — Errado. – A interrompo ficando em pé. Seus olhos estão sobre mim, confusos e a espera de um esclarecimento. Começo a andar pela sala em passos pequenos e aleatórios. — Para esse tipo de acordo, querida, os líderes preferem aparecer pessoalmente, para que não haja nenhum equivoco no futuro. Porém, Gabriel mandou uma vampira qualquer em nome dele. – A pressão em meus movimentos aumenta e reparo que a ofendo com a ironia em minha voz ao me referir a ela como uma qualquer. — Eu sou a conselheira pessoal dele. – Katrina inspira, um ato desnecessário para ela, mas instintivo, que usa para fingir ser uma humana ao caminhar por eles pelas ruas. Ela retém as más criações dentro dela, que é nítido que desejou dizê-las a mim nesse momento, mas não pôde. — Detalhes. – Gesticulo com a mão e ignoro sua intromissão. Ela faz menção de voltar a falar, mas a silencio com o indicador levantado. — Ou seja, você o convenceu de q
AmaraAbrir os olhos nunca foi tão difícil. Forço as pálpebras a se separarem minimamente, pisco lutando contra os cílios pesados e sonolentos e sinto que estou deitada sobre algo macio e gelado. Uma silhueta paira inclinada sobre mim, observando-me de cima e o perfume de alecrim e capim-limão entope minhas narinas, unindo-se ao da magia enjoativo.Hirion repuxa o canto dos lábios e acaricia minha bochecha com o indicador, o dedo calejado de segurar espadas e lutar nas batalhas da realeza de quando sua família servia á realeza. Um calafrio me percorre e nos distancio de supetão sentindo o coração acelerando ao me apoiar nos cotovelos afundados no colchão enorme e velho.— Enfim, acordada. – O feérico sibila, subindo e descendo os olhos por minhas curvas marcadas no vestido preto que eu usava, – os seios ressa
— Quando começou? – Expiro levemente, temendo que se deixar o ar sair dos pulmões, ele não volte a entrar neles.— O plano de conquista de Duvessa? – Ele especifica a pergunta. — Um dia depois que todos pensamos que você havia morrido. Ela levou cinco anos planejando os mínimos detalhes. Uma feérica excepcionalmente esperta, eu diria. A revolta e o caos da natureza? Doze meses. Doze meses, lutamos pela sobrevivência, pela comida e pelo resquício de magia que nos resta depois que a terra sugou cada gota de todas as fadas, restando apenas nossa essência e ela se esmaece a cada dia que usufruímos dela. O que sobrou, sua irmã roubou dos lordes e de Endaria, o que forçou a maioria inteligente de nós a nos juntarmos a causa dela. Resumindo, princesa – Seu hálito é quente ao falar de dentes cerrados e a mão se embrenha nos
Um calafrio banha meus nervos e noto, pela maneira como Hirion enrijece atrás de mim e hesita entre as minhas pernas, que não sou a única que se assusta. Saltos estalam na pedra lida e Duvessa aparece em meu campo de visão, com passos preguiçosos e perigosos.— Minha rainha! — O feérico salda embargado em tensão e surpresa, ainda mantendo-me imóvel.— Pretendia me contar sobre sua façanha com minha queria irmã, Hirion? – Ela cruza os braços e troca o peso para a outra perna. A ironia em querida soa normal, depois de tudo o que acontecera nos últimos dias e não espero qualquer carinho vindo dela. — Hedween me alertou sobre o seu desejo incontrolável e por um instante, pensei que alguém como você seria capaz de se conter.— Dispense o ciúme, flor da noite. – O feérico propõe
Noah me encara de cima. Seus olhos estão cheios de uma preocupação que me parece confusa de início. Pisco e sinto que estou deitada sobre algo macio e familiar, assim que o cheiro das árvores entra pela janela com a brisa fresca e costumeira. As cortinas balançam e o cheiro de pinheiro, terra molhada e lenha queimada me despertam.Casa. Estou em casa.Minha mente ainda gira e meu corpo reclama os movimentos ao me sentar entre os lençóis com a ajuda dele. Toco a parte de trás do topo da minha cabeça, onde os dedos de Hirion agarram meus cabelos e mais uma vez, a dói. Um calafrio desce pela espinha com as lembranças retornando a mente e passando diante dos olhos como um filme. Hirion e suas intenções, o estado deplorável de um reino em ruínas e Duvessa. Ela me salvara e sou grata a sua obsessão por mim, ou do contrário, não estaria
— Pouco importava! – Terence passa os dedos pelos fios negros com indiferença.— Pouco importava? – Repito indignada e respiro fundo evitando extravasar minha ira na face dele. Meus braços pendem ao lado do corpo trêmulo e começo a entrelaçar os dedos uns nos outros, contorcendo-os, estalando-os, descontando nas juntas esbranquiçadas.— Se eu tivesse te contado, teria feito você mudar de opinião! – O feérico replica apoiando o indicador violentamente no mapa de Nova Orleans, os olhos firmes nos meus. Uma movimentação os desvia para a porta e sinto o a magia dele nos rodear para batê-la, impedindo que Noah adentre o cômodo, bloqueando suas palavras em protesto chamando meu nome.— Óbvio! – Elevo a voz e um riso debochado fica preso na garganta dele, esboçando-se em parte num repuxar de canto de l&aa