Amara
— Entrar na floresta em meio a uma tempestade se formando e de calça branca não é o que eu imaginei para hoje.
Resmungo para ninguém em especial desviando de uma raiz alta sobre a terra úmida e fofa. As botas ajudam um pouco, mas o salto afunda no solo, dificultando meu caminhar entre os pinheiros largos que tocam as nuvens carregadas e negras acima de nossas cabeças.
— Certamente. – Terence concorda poucos passos à frente com uma facilidade extrema em desviar dos empecilhos no trajeto. — Você fica muito bem nela a propósito. Principalmente, quando chove. – O noto olhando por cima do ombro de soslaio com um sorriso no canto dos lábios. Encaro suas costas musculosas e praguejo, sentindo falta da minha destreza com a natureza de quando vivia com as fadas. Minhas bochechas coram com o elogio malicioso, mas tento ignorar e teria conseguido se não é a vergonha queimando em meu rosto. Dou uma olhadela rápida para minha
Terence é arremessado contra uma arvore, tão alto que galhos se partem com a violência do impacto e colide com a terra, rolando até a margem da cachoeira. Um grito desesperado escapa da minha garganta. Ele se apoia nos joelhos, os braços arranhados e tosse pela falta do ar que lhe fora arrancado. Quando tento avançar em sua direção, uma garota com roupas típicas do reino das fadas bloqueia a passagem.Ela sorri, perversa e com um brilho malicioso nos olhos acinzentados contrastando com a pele bronzeada. Os cachos marrons e volumosos modelam o maxilar delicado e as bochechas rosadas. A ponta da orelha feérica, visível por entre as mechas compridas e encharcadas.— Olá, Amara! Lembra-se de mim? – A voz suave me penetra com medo e estremeço ao reconhece-la.— Jordanna.A feérica permanece com o sorriso e indica Terence com a cabeça, liber
Voltar para casa sempre é uma das melhores sensações. O cheiro familiar diversificado de inúmeros aromas mesclados de velas, incensos e madeira invade meu nariz assim, que passamos pela porta. O estalar do piso sobre os pés, o chiado do vento gélido bloqueado pelas janelas fechadas e a tempestade caindo lá fora soa como se a natureza cantasse. Eu gosto disso, da paz que transmite, mesmo que estando enxarcada e pigando por todo o chão.Terence voou conosco o resto do caminho, apesar da intensidade da chuva e depois de seis anos sem asas, me lembro de como são extremamente resistentes. E delicadas. Fadas não são como passarinhos e podem voar em meio ao céu caindo em água, ou, em nevascas torrenciais. Contudo, suscetíveis a uma lâmina pronta para rasga-las e lanças para perfura-las. E mãos cruéis para arrancá-las. Minha consci&ecir
Não. Noah e eu nunca daremos certos, nunca ficaremos cem por cento confortáveis, mesmo que as coisas se resolvam de um modo consideravelmente bem. Ele é humano, mortal. E eu... Já cometi esse erro antes e insistir no erro acarretaria em consequências que eu me recuso a imaginar. Será tarde demais? Será que eu errara e sequer notei? Talvez, ou não me sentiria como me sinto nos momentos em que estou com ele. Não me sentiria tão culpada e com medo de estar com ele. Não! Ainda posso evitar isso!Passo tempo demais negando que possuo sentimentos pelo humano, que tampouco considero meus sentimentos pelo feérico. De formas distintas entre ambos, mas existentes. Com Noah é aconchegante, nostálgico e instigante; com Terence, desconhecido, provocante e ardente. A paz e a perturbação, uma de cada lado da balança. O errado
Terence desenha pequenos círculos em meu braço, ao mesmo tempo em que beija suavemente meu ombro. A água da banheira cobre o suficiente de nossos corpos com a espuma branca e aromática de jasmim depois que transamos de novo, enquanto o chuveiro a enchia e nos molhava, levando ralo abaixo toda a sujeira da floresta e o suor dos lençóis bagunçados.— Freya nos matará pela demora. – Falo observando o movimento que a palma da minha mão faz contra a superfície da água. Nem dentro e nem fora apenas boiando entre o limite que romperá o tênue contado se a puxar dali ou a afundar.— Fomos atacados na cachoeira e havia fila para comprar a comida. – O feérico sugere a meia verdade em que estou pensando desde que decidimos levar a indescritíveis sensações para fora do quarto. Sua boca toca meu pescoço, provocante e morna, enviando cur
O olho de relance e fixo a vista no trânsito relativa e estranhamente calmo para a quantidade de pessoas nas ruas. É quase dia das bruxas e todos se preocupam em entalhar aboboras, enfeitar as frentes das casas com esqueletos e teias de aranha e pendurar luzes em forma de morcegos. Ao pôr do sol no dia de Samhain, todas as crianças sairão fantasiadas para pedir doces e se entupir deles em menos de um dia. Victor costumava reclamar que seus amigos da pediatria ficavam infelizes e muito mais cansados com os plantões extras, apenas para diagnosticarem dores de barriga ou intoxicação alimentar. Sem falar nos dentistas, que com certeza ganham uma grana alta nas semanas seguintes. Sou injusta se negar ter consumido chocolates para um ano inteiro no meu primeiro halloween no mundo mortal. Victor não gostou de me ouvir reclamar por uma semana de dor no estômago. Por sorte, elas nunca voltaram. — Estava lembrando de uma pessoa. Alguém que não vejo faz séculos, literalmente. –
— Pelos ancestrais! O que aconteceu com vocês dois? Freya no aborda assim que passamos pela porta do apartamento com sacolas cheias da melhor comida mexicana que se é possível encontrar em Nova Orleans. Ela pula do sofá em frente a lareira flamejante como um gato pula de um muro, rápida e graciosamente. Noah apenas ergue os olhos do livro que lê e o fecha segundos depois, ainda assimilando nossa presença de volta. — Fomos atacados na cachoeira. – Terence responde e apoiamos as sacolas sobre o aparador ao lado da porta. A bruxa parece tão furiosa pelo atraso que sequer se opõe a gordura que ensopa seu móvel. Sinto os olhos do feérico sobre mim e mantenho os meus na bagunça de ervas, cristais e livros sobre a mesa de jantar e a mesinha de centro e finjo certo interesse em tudo isso. — A fila do restaurante estava enorme. Ninguém quer cozinhas perto do seu dia especial, Freya. Merda. Fixo a atenção na mulher de longos cabelos marrons e lisos e
—Você fala demais fadinha petulante! Conheço pessoas que pagariam altas quantias pela sua língua feérica! – Freya retruca torcendo o nariz para ele que sorri de canto sarcasticamente. Então será assim que a bruxa leva a vida? Comprando e vendendo itens – corporais ou não – para outros como ela. Estremeço com a ideia de como um mercado oculto de bruxas e feiticeiros pode se parecer e meu estômago reclama os tacos. Ninguém pode imaginar que essa linda morena é capaz fazer tais coisas, mas também, ninguém imagina que ela pode ser mais do que uma charlatã, iguais as outras na praça. Um belo e inteligente disfarce, Freya. — Adoraria assistir. – Noah murmura em meu ouvido e estremeço de novo, por não ter reparado que ele se movera para perto. Reviro os olhos. — Ignore-o. – Falo dando um passo à frente. Terence me lança um olhar divertido que finjo não notar. — Freya, porque nos mostrou o espelho? — Acredito que gostariam de sab
Dedicatória Para todos aqueles que, assim como eu, não sabem por onde começar, apenas comecem. 6 anos antes... — Amara Fleurwind, seus crimes serão punidos como manda a lei de Illinea! A rainha das fadas grita, a voz carregada pelo vento chega aos ouvidos de todos, exceto aos meus. Talvez, lá no fundo eu estivesse ouvindo algo que se assemelhasse a palavras engolidas pela água, mas eu sequer consigo distinguir o tom feroz e sádico dela dos vários em minha própria cabeça. Vozes agressivas e depois suaves, vorazes e suplicantes que vão e vem junto a cada passo que me obrigam a caminhar. — Que sua sentença sane o senso de justiça requisitado por todos. – A coroa dourada reluziu sob a luz do sol poente. Os cabelos negros como as trevas barram qualquer faísca solar que tenta penetrá-los e o escarlate do vestido fere a vis