— Acho que devemos entrar. – Sugiro já caminhando para as escadas. — Temos muito o que descobrir sobre as chaves.
— Uau! Você sabe mesmo estragar um momento. – Ouço seus passos me seguindo e olho por cima do ombro.
— Isso não foi um momento. – Franzo a testa subindo o primeiro degrau.
— Se acredita mesmo nisso, então tudo bem.
O feérico passa por mim e entra na casa. Paro na entrada por um segundo ao reparar na pequena cesta em formato de abóbora, apoiada num curto pilar de gesso. O restante dos doces estão ali. Suspiro para eles e vejo Terence desaparecendo para dentro da sala dos Amarimentos. Essa momento foi de cem a zero muito rápido. Devolvo o caramelo na cesta.
Assim que entro, fecho a porta e Pandora desliza entre minhas pernas com seu ruido costumeiro de raposa. A pego no colo e a acaricio no pescoço indo para a cozinha. Encho seu potinho de frutas silvestres e a solto no chão para se alimentar.
— Pro
— Você me encontrou. – Digo quase que em um murmúrio. — Poderia facilmente ter me matado e roubado o colar e entregado a Duvessa, para cair nas graças dela e mesmo assim, ficou aqui. – Minha língua faz menção de embolar as palavras e umedeço os lábios piscando repetida e rapidamente. Seguro seu olhar no meu, firme, como se o prendesse a mim. — Ficou, mesmo não tendo certeza de nada, mesmo sabendo que eu não confiava em você nem por um segundo. E ainda está aqui, mesmo após descobrirmos tudo isso. – Quero ver a verdade estampada neles, quero ver o que está oculto por trás do dourado hipnotizante. — Por que? O feérico suspira e para de me tocar, endireitando a postura e desviando os olhos para longe dos meus. — Está certa em tudo o que disse. Em cada detalhe. – Seus dedos tocam a madeira da mesa duas vezes e seu maxilar se tensiona na quietude curta que se segue. — Mas, eu não tenho interesse em cair nas graças da sua irmã e
A floresta voa do lado de fora da janela do carro como um borrão de verde e marrom e o preto do asfalto da estrada.— Amara, devagar! Pode ser apenas outra ameaça sem nexo! Como tem certeza de que é ela? – Terence pergunta ao meu lado, precisando elevar a voz sobre o ronco do motor. Ele segura o painel com uma mão, mantendo o equilíbrio com a tamanha velocidade.— Não me peça para ir devagar quando a vida de uma pessoa que eu amo está nas mãos de Duvessa! – Respondo no mesmo tom, as mãos firmes no volante e as jutas dos dedos brancas. — Ela disse que a atacaria e atacou e agora está como Dáhlia!— Sua irmã pode estar te manipulando como antes!Viro o queixo para olhá-lo e posso ouvir meu sangue pulsando nos ouvidos e acelerando meu coração desesperado.— Para o bem dela, espero que tenha raz&atild
Meus olhos seguem para uma das portas estreitas da varanda, aberta e a cortina balança, preguiçosa com o vento da noite. Porém, eles focam nas silhuetas paradas a frente dela. Duvessa segura uma afaga contra o pescoço de Dáhlia, a camisola ensanguentada, mas nada que justifique todo aquele sangue lá em baixo, – mais uma cordinha puxada em minha mente confusa e encantada – apenas um corte na bochecha e outro no lábio inferior. O sangue escorrendo e manchando a seda branca do traje de dormir. Marcas de arranhões avermelham a pele dos antebraços e as unhas de minha irmã estão fincadas no ombro esquerdo dela, mantendo-a presa contra a feérica. Dáhlia tentou lutar.— Não faça isso! – Imploro e engulo as lágrimas. Meu estômago se revira com o sorriso perverso no canto da boca carmim de Duvessa ao pressionar a ponta da lâmina na
— Amara! – Terence desce atrás de mim, assim que pulo do banco do motorista e bato a porta do carro com toda a raiva acumulada. O ignoro conforme cambaleio pelo caminho de pedrinhas até os degraus, os subo e entro em casa. O sinto me perseguindo pelas salas e pela cozinha. — Amara, espere! – Agarro um copinho de cristal pequeno e cilíndrico no armário e uma garrafa de tequila aberta na geladeira. Meu braço é envolvido pelos dedos dele e sou forçada a me virar. — Você pode se acalmar, por um minuto? Por favor, pelas quatro Luas! — Não me diga para me acalmar! – Solto-me bruscamente e a mão que segura o copinho b**e de encontro com a beirada do balcão de pedra polida. Ele se estilhaça e ruído faz meu coração saltar no peito. Encaro os cacos de cristal quebrado no chão por um instante, ouvindo minha respiração acelerada no silêncio do momento. — Ótimo! — Praguejo para o universo, apoio a garrafa no balcão e me abaixo para juntá-los. — Você se
Abro a garrafa de tequila e encho o copinho com o liquido transparente. O cheiro do álcool entope meu nariz no segundo em que viro o contudo na boca. O gosto é forte e amarra a língua. Fecho os olhos para engolir e Terence aparece detrás das pálpebras.Como ele pôde me machucar daquele modo, sabendo como estou quebrada? Como ele teve coragem de falar essas coisas estando ciente de que são mentiras? Talvez, não sejam. Talvez, ele veja dessa forma, porque eu não me importei muito em esclarecer a verdade. Esclarecer que preciso dele, da ajuda dele e da maldita magia dele para deter Duvessa. Mentira! Disse isso hoje mais cedo...Sou eu. Tudo nos últimos dias se resumiu somente a mim. Não perguntei uma única vez, suas impressões sobre a nossa situação. Fui incapaz de checar se a casa estava aconchegante o bastante, se precisava de comida, ou de
— Nem pense em tocar nele. Meu coração salta no peito e os batimentos aceleram por um instante com a voz de Terence vindo da porta. Ele adentra a sala de braços cruzados, olha para a mesa e depois para mim. — Eu não ia. – Minto tentando manter nosso contato visual. — Sei. – O feérico ironiza e me encolho segurando os cotovelos. — Eu não te dei banho ou troquei sua roupa, se quer saber. – A informação me faz franzir a testa. — Magia é uma benção, apesar de você não acreditar muito nisso. Parte de mim relaxa por saber que ele não me viu nua, ou algo similar e ter escapado dessa humilhação. — Eu acredito que seja uma benção. Nas circunstancias corretas. – Retruco e ele dá de ombros. — Certo. Só a repudia. – Terence replica indiferente e talvez, um tanto grosseiro demais. Mereço isso. A grosseria e a indiferença, então as aceito. Puxo o ar para os pulmões e eles se alegram com o aroma perfumado do ambiente. Dou um passo na direção dele e o
DuvessaAté que as ruas da cidadezinha que minha irmã decidiu se esconder são charmosas e agradáveis para caminhar. Planas, algumas com tijolinhos em tons de cinza e outros de concreto liso e negro, onde grandes caixas metálicas – levei pouco tempo para descobrir que se chamam carros e que transportam os mortais sem precisarem de asas, magia ou das próprias pernas – andam parando quando uma luz vermelha se acede em um poste e voltam a se mover quando se esverdeia. Que coisas mais estranhas e sem graça...Mais dessas luzes, amarelas quentes e brancas frias, iluminam o interior de algumas lojas, bares e cortiços, apesar dos relógios marcarem antes do meio-dia. Elas refletem nas janelas e nos metais das construções que me cercam por todos os lados. Os humanos estão por todos os lugares, comendo, rindo, conversando sobre
Paro por um instante de passar os dedos pelas coisas empoeiradas. Bem aqui! A voz murmura e encaro a caixa retangular entralhada em madeira envelhecida com uma fechadura pequena – uma lua e um sol juntos, se completando, decorando-a e protegendo-a de fadas como eu. Ferro. Frio e cortante que anseia por meu toque, para me ferir. Recuo a mão e me volto para o mortal, ainda detrás do móvel alto com um vaso de flores na ponta e um equipamento em bronze com números e gavetas na outra. Há uma tela fina e mais letras pressionáveis em um estreito retângulo preto debaixo dela. — Acredito que tenha. – Indico a caixa na terceira prateleira na altura dos meus braços. — Pode pegá-la para mim? — Quer mesmo que eu venda isso para alguém como... — Eu? – Completo sua frase e falho em conter outro riso. Me aproximo do balcão em passos pequenos e intimidadores, os saltos estalam pelos tacos do chão e a blusa preta em tecido mousseli