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Capítulo 01 - Rafael

Dezembro de 2010 – Rio de Janeiro

Não sei se ainda haveria um pior dia na minha vida, mas aquele estava sendo particularmente péssimo. Finalmente eu tinha recebido uma notícia da minha mãe. A garota de cabelos azuis que trabalhava com ela na rua, finalmente abriu o bico e deixou escapar o paradeiro dela.

Depois de dois meses de angústia e procura, agora eu sabia onde ela estava.

Apertei o pescoço da garota e levantei-a no ar, encostando as costas dela na parede suja do apartamento em que ela morava. Ela começou a tossir de olhos arregalados.

— Desgraçada! Por que não me disse logo?

Ela esperneava, meio sufocada e eu a soltei, fazendo-a despencar no chão.

Ela levantou cambaleante e se afastou, me olhando com aquela cara cínica de puta dissimulada.

— Ela pediu pra não falar — ela disse com voz engasgada.

Fechei os punhos, tentando me controlar para não partir pra cima dela de novo. Aquela menina era uma peste e eu não duvidava que foi ela que armou aquela ida da minha mãe para um pais estranho.

— Me conte tudo agora!

Ela sentou despreocupada, no único móvel que ocupava aquela sala feia e escura. Era ali que minha mãe viveu nos últimos cinco últimos anos e de onde eu tinha saído, por não aguentar presenciar tanta miséria.

Eu estava a ponto de surtar.

— Fala logo! Como minha mãe foi parar na Turquia? Você intermediou isso, não foi sua vadia?

Ela acendeu um cigarro.

— Rafinha querido, sua mãe está velha. Aqui não tem mais mercado pra ela. Lá os homens gostam de mulheres mais maduras, ela vai se dar bem.

O que ela considerava velha, eram os trinta e oitos anos que minha mãe tinha. Se bem que, ao olhar para ela qualquer um daria uns dez anos a mais. As drogas e a prostituição se encarregaram de cobrar seu preço.

Quantos anos aquela garota tinha? Não parecia ser tão mais velha que eu? No máximo teria uns vinte e cinco anos e já era considerada uma cafetina perigosa nas ruas do Rio de Janeiro.

Parei em frente à garota, cogitando a ideia de meter uma bala na cabeça dela e perder o emprego que eu tinha acabado de conquistar.

— Me dê nomes. Eu preciso ir buscar minha mãe.

Ela riu cínica.

— Você não é da polícia? Descubra onde ela está.

Inspirei profundamente e contei a até dez.

— Vamos garota, me diga como chegar até ela.

Ela levantou e se aproximou, encostando o corpo sensualmente no meu.

— Podemos negociar. Eu te falo e você me deixa provar esse seu corpinho delicioso.

Segurei-a com força, apertando o braço dela até ela gemer de dor.

— Eu prefiro ir procurar no inferno, antes de meter meu pau nessa sua buceta suja.

Ela me empurrou e voltou a sentar, de pernas cruzadas.

— Então não vou te dizer nada.

Se eu não saísse dali imediatamente, eu ia matar aquela piranha e eu não podia me dar ao luxo de ser expulso da polícia. Era lá que eu tinha poder para chegar até a Turquia e resgatar minha mãe.

Me dirigi à porta, desistindo por hora de apertar aquela garota até ela falar tudo que sabia.

— Eu tenho uma operação importante agora, mas eu volto e você vai me dizer tudo que sabe.

Bati a porta com tanta força, que o trinco caiu no chão. Aquela merda de trinco sempre me irritou.

Entrei na viatura e olhei para meu colega, Damon, de cara feia.

— O que temos agora?

Ele respirou profundamente. Ele também estava com problemas. O cara estava louco da vida por causa de uma garota que os pais não aceitavam o namoro.

 — Vamos ao aeroporto. Precisamos interceptar uma mala cheia de cocaína vinda da Turquia.

Inferno! Aquele país estava me perseguindo?

Liguei o carro puto de ódio.

— Vamos lá, esse bastardo não vai trazer essa mala de jeito nenhum, nem que eu tenha que estourar a cabeça dele.

Damon riu, a despeito de sua carranca assustadora.

— Até eu fiquei com medo dessa sua voz. Coitado desse turco, pegou você em um dia ruim.

Encarei-o rindo também.

— Seu dia está bom?

Ele fechou os olhos.

— Não. Está péssimo.

— Ótimo, vamos descontar nesse traficante de uma figa.

O aeroporto estava tranquilo demais e aquilo dificultava nossa ação. Passaríamos despercebidos se ali estivesse cheio de gente, mas por onde eu e o Damon passávamos, milhares de olhares se fixavam em nós. Todos sabiam que haveria uma abordagem ali, e estavam tensos. De acordo com as informações o homem desceria no próximo voo e era preciso ser certeiro na abordagem.

Alguns minutos depois o avião taxiou na pista e nós montamos guarda em frente ao desembarque.

Era um voo pequeno, não mais que cem pessoas e não foi difícil localizar Leonardo Ramazan. O homem estava a caráter, todo vestido de preto e caminhava imponente em meio aos passageiros.

Na esteira de bagagens nós entramos em ação.

Quando a mala dele se aproximou, o Damon pegou um segundo antes que o tal Leonardo tocasse nela.

Ele então virou-se e nos encarou.

Retirou os óculos escuros e se aproximou sem demonstrar nenhuma emoção.

— Poderia me dar minha mala, por favor?

Ele não era turco? Por que falava português tão fluentemente?

Olhei com atenção aquela figura quase cinematográfica. Era pouco mais alto do que eu e aparentava ter por volta de vinte e poucos anos. Era muito magro e a pele morena evidenciava os traços da raça turca, mas a voz falava um português, claro e fluente. Aquele homem poderia ser minha chave para entrar na Turquia?

Passei na frente do Damon e me aproximei dele.

— Sua mala será confiscada.

Ele arqueou uma sobrancelha.

— Posso saber o porquê?

Encarei-o, com um sorriso cínico.

— Nos acompanhe e você saberá.

Ele passou em nossa frente e já fora do prédio do hall do aeroporto, ele parou e virou-se.

— Senhores, poderiam me dizer o que está havendo?

Joguei a mala no chão, próximo à viatura e apontei a arma para ele.

— Abra a mala!

Ele cruzou os braços, desafiador. Era corajoso, eu tinha que admitir.

— Você não confiscou? Agora é sua. Abra.

Damon se aproximou por trás dele e deu uma coronhada na nuca dele, fazendo-o se curvar para a frente.

Ele cambaleou e levantou o corpo, sem demonstrar nenhuma emoção.

Algo me incomodou na frieza daquele homem. Ele era um cara que poderia ser bom, tanto para o bem quanto para o mal. Era o homem certo para o que eu precisava.

Fiz um sinal para Damon se afastar e então, abri a mala.

— Uau! Não perdemos a viagem afinal.

A mala estava cheia de tabletes de cocaína.

Leonardo Ramazan, não mexeu um músculo sequer e continuou de braços cruzados, esperando minha reação.

— Para quem você ia entregar isso?

Ele riu debochado.

— Para sua mãe é que não era!

Apertei o cano da arma, com força e cheguei perto dele.

— Não gosto de piadas, Leonardo Ramazan!

E desferi um soco no estômago dele, fazendo-os se ajoelhar aos meus pés.

Ele gemeu e levantou, lentamente.

— Se quiser, podemos negociar — ele falou ofegante.

Damon engatilhou a arma, e eu fiz sinal para ele parar.

Eu estava indo pelo caminho errado, mas ali estava uma oportunidade única. Aquele homem me levaria para a Turquia e me ajudaria a resgatar minha mãe. Ele era corajoso o bastante para uma missão daquele porte.

— Eu tenho uma proposta para você.

Damon se aproximou.

— Que porra é essa, cara? Que diabo de proposta é essa?

Virei para o cara, que não era só meu colega de trabalho, era um amigo que eu confiava.

— Me ajude, Dam, eu preciso fazer isso.

Ele balançou a cabeça contrariado.

— Merda! Isso não vai dar certo.

Olhei para Leonardo que ainda segurava o estômago, respirando pesadamente.

— Eu preciso de ajuda para resgatar alguém que está preso na Turquia.

Ele não demonstrou interesse em colaborar.

— Não tenho nada a ver com isso.

— Tem. Eu libero você dessa merda toda e você me ajuda a encontra a pessoa que eu preciso.

Ele deu uma risada cínica.

— Não estou interessado, pode me prender.

Apontei a arma para ele.

— Te prender é o mínimo, mas eu posso dificultar sua saída de lá e te garanto que não tenho nenhuma dificuldade em fazer isso.

— O que eu vou ganhar com isso? Não quero resgatar nenhum foragido da justiça, isso é trabalho seu.

— Não vou resgatar nenhum foragido da justiça.

Ele me olhou cético.

— Então?...

— Quero ajuda para libertar minha mãe das mãos de uma quadrilha de traficantes de mulheres.

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