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Capítulo 05 - Rafael

Janeiro de 2015 — Turquia

Olhei para o Leonardo fixamente pensando no que responder diante daquela pergunta.

— Você pode repetir o que falou?

Ele cruzou as pernas e me olhou sério.

— Estou te convidando para vim morar aqui na Turquia e trabalhar comigo.

Tive que soltar uma gargalhada. Aquele homem era mesmo uma figura.

— Você está me propondo trabalhar transportando drogas e coisas do tipo?

Ele arqueou uma sobrancelha rindo.

— Estou. Algum problema?

— Todos não é Leonardo, eu sou um policial, esqueceu?

Ele tinha levantado e começado a andar pela sala lentamente.

— Pense comigo. Você ganha uma merreca como policial e gasta tudo andando de lá para cá tentando fazer justiça contra um homem muito poderoso. Junte-se a mim e venha para perto dele.

Franzi a testa confuso.

— Como assim?

— Você não vai conseguir pegar Hilal estando longe dele Rafael, precisamos achar um jeito de você frequentar  aquela casa.

Ele tinha razão. Fazia três anos que estava naquela busca insana por vingança e nem sequer tinha visto a cara do assassino da minha mãe.

O que eu tinha a perder? Aquela vida de policial militar no Brasil realmente não estava me fazendo feliz. Não naquele momento. A profissão que eu sempre quis, veio em um momento um pouco conturbado da minha vida. Meu coração sangrava de dor e revolta pela morte da minha mãe de forma tão covarde.

Mas daí a sair do meu emprego e vim trabalhar com uma quadrilha na Turquia, não passou nem de longe pela minha mente.

Leonardo parou em minha frente.

— Você está exagerando um pouco. Eu não faço apenas esse tipo de serviço para meu avô. Ele tem uma fábrica de tecidos. Eu te coloco lá como segurança. Te garanto que você vai ganhar o triplo do que ganha hoje.

Era muito tentador.

Passei a mão pelo cabelo agoniado.

— Eu não sei, cara. Preciso pensar.

— Não tem o que pensar Rafa, é uma oportunidade única.

Ele tinha razão.

Fui em direção à cozinha.

— Vou fazer um café, venha.

Ele sentou e esperou calado que eu fizesse o café e então falou.

— Você pode morar aqui, eu praticamente nem uso esse apartamento mesmo.

Eu ri meio nervoso.

— Por que está fazendo isso por mim?

Ele não respondeu e olhou o café pensativo, depois encolheu os ombros.

— Eu me preocupo com você, acho que precisa de alguém pra não fazer besteira.

— Sei. Eu não sou um viciado em drogas, usei naquele momento por que estava no limite, mas eu sei me controlar.

Leonardo me olhou fixamente.

— Eu confio em você. Vivo no meio de cobras venenosas e preciso de alguém da minha confiança.

— Eu... preciso resolver questões legais do meu emprego. Vou ver se consigo uma licença, pra não precisar pedir demissão.

— Então aceita minha proposta?

Pensei alguns minutos.

— Aceito.

Ele levantou e pegou a chave do carro.

— Então fique ai e organize as coisas, eu preciso ir para a casa, estou muito preocupado com a Sula. Ela está cada vez mais triste e calada. Hoje pela manhã ela estava chorando e pediu que eu não a deixasse sozinha.

Aquela irmã ia acabar com os dias de vida do coitado.

— Irmã problemática, essa sua hein?

— Não fale assim, ela é uma menina cheia de traumas  e está passando por um momento difícil.

— Já levou ao médico?

— Inúmeras vezes. Desde os oito anos, que ela toma remédios e a coisa parece que só piora.

Cheguei perto dele e bati em seu ombro.

— Sinto muito cara, se eu pudesse te ajudava em alguma coisa.

Ele encolheu os ombros.

— Esquece isso, ela é problema meu.

Assim que ele saiu eu me deixei cair no sofá da sala exausto. Será que eu estava fazendo a coisa certa? Aquele era o melhor caminho a seguir? Eu deveria esquecer aquela vingança e seguir minha vida no Brasil? Não. Eu não sossegaria até matar Hilal Ramazan. Eu não deixaria o assassino da minha mãe impune. Faria tudo com calma. Me aproximaria daquela família, ganharia a confiança dele e no momento que eu pisasse os pés naquela casa e ficasse frente a frente com Hilal eu o mataria. Nada mais me importava ali. Minha missão terminaria no dia que eu entrasse na mansão dos Ramazan e metesse uma bala na cabeça daquele assassino.

Leonardo era muito paciente. Eu não tinha tempo para programar uma vingança a longo tempo. Ele tinha uma irmã para proteger, eu não tinha ninguém. Eu iria para a cadeia e ninguém sentiria minha falta. Talvez o Damon e mais ninguém.

Peguei o telefone e liguei para ele.

— Oi Dan, como vai as coisas por ai?

— Rafael, eu vou te matar. O que está na fazendo na Turquia de novo?

O Damon ia surtar.

— Eu... vou morar aqui.

— Como!? Você enlouqueceu?

Eu podia imaginar ele andando de um lado para outro.

— Não. Eu vou sair da polícia. Consegui um trabalho aqui.

— Que trabalho Rafa? Foi aquele merda do Leonardo não foi? Ele te arrastou para esse mundo do crime não é?

— Calma cara, não é nada disso, você sabe que eu preciso ficar aqui.

Ele perdeu a paciência.

— Precisa coisa nenhuma seu idiota, esquece essa porra de vingança e volta pra casa.

Respirei fundo.

— Não posso, me entenda amigo.

— Venha para casa, aqui nos conversaremos.

Minha decisão estava tomada.

— Está bem, amanhã estarei ai.

Joguei o telefone no chão e fechei os olhos. Esperava não me arrepender daquela decisão.

Sulamita

Entrei no chuveiro pela terceira vez desde que aquele homem horroroso tinha saído do meu quarto.

Minha pele estava vermelha e ardendo nos lugares onde eu tinha esfregado com as unhas para tentar  me livrar da sensação daquelas mãos nojentas me tocando.

Peguei o frasco do perfume e derramei metade na minha mão e passei em meu corpo para sufocar o cheiro do hálito dele perto da minha boca.

Meu estômago revirava e a ânsia de vômito voltou agora com mais intensidade. Sentei no chão do banheiro tremendo e me apoiei no vaso sanitário jogando tudo para fora. O suor descia pelo meu rosto e eu peguei a blusa que estava no chão e passei pela minha testa e os cabelos molhados.

Respirei fundo e encostei na parede sem ar.

— Calma Sula, calma, respira….

As consultas com a psicóloga deviam valer de alguma coisa. Ela disse que era para repetir as palavras de olhos fechados e pensar em algo bonito.

Até ontem eu pensaria no Kaan, um menino lindo que tinha entrado recentemente na minha turma, mas depois de tudo que eu tinha vivido momentos atrás eu voltava a sentir náuseas, só de imaginar um homem me tocando.

Não sei quanto tempo fiquei ali sentada no chão. Devia ser quase meia noite e a casa estava em silêncio. O Léo estava viajando. Eu estava sozinha.

Levantei lentamente e me enrolei na toalha saindo do banheiro.

Vesti um conjunto de moletom e calcei meias. Como um robô entrei debaixo da coberta e cobri minha cabeça.

Meu coração ainda estava acelerado e minhas mãos tremiam.

— Meu Deus! E agora? O que eu faço?

Como eu contaria para o Léo que o desgraçado do meu avô tentou me estuprar.

As imagens  do que tinha acontecido a pouco passavam como um caleidoscópio em minha mente.

Lógico que nunca gostei do meu avô, mas nunca imaginei que ele faria aquilo comigo. Eu tinha que fugir dali. Hoje. Naquela noite.

Fechei os olhos relembrando os momentos de terror que eu tinha acabado de enfrentar.

Naquela noite eu não tinha descido para jantar na sala e depois de um tempo que a Zaila tinha

 saído eu ouvi batidas na porta. Antes que eu pudesse fazer alguma coisa a porta abriu e a figura gigante do meu avô se colocou de pé na entrada na porta.

Sentei na cama encolhida e não olhei para ele.

— Chega de birra garota malcriada, de hoje em diante você janta na sala.

Ergui o queijo desafiante.

— Não vou, não gosto de comer com vocês.

Ele bateu a porta e girou a chave na fechadura.

Comecei a tremer de medo de que ele fosse me bater, pois ele começou a desabotoar o cinto da calça.

— Menina insolente, você é igualzinha a sua mãe.

Ele se aproximou da cama e estendeu a mão para me pegar. Eu pulei da cama e corri para um canto do quarto.

Ele parecia estar bêbado. A voz estava diferente e ele caminhava meio trôpego.

— Saia daqui, não se atreva a me bater, seu velho! Eu não gosto de você.

Ele tinha rido de maneira estranha e começou a andar para perto de mim.

— E quem disse que eu gosto de você sua pirralha, eu vou te mostra o que fazer com uma cadela como você.

A voz dele me causou medo e arrepio.

Ele me agarrou pelo braço com uma força desmedida e me arrastou me jogando em cima da cama. Quando eu pensei em levantar ele puxou uma arma e apontou para mim.

Paralisei feito uma estátua . Ele não estava brincando.

— Sua filha da puta, você vai me pagar a dívida da sua mãe.

Que dívida? Do que eles estava falando?

— ME SOLTE! EU VOU GRITAR!

Ele encostou o cano da arma em meu ouvido e  passou a mão em minhas pernas.

— Grite e eu aperto esse gatilho.

Meu corpo tremia e eu comecei a entender que estava em perigo.

_ Quieta sua vagabunda, tira a blusa!

Cruzei os braços sobre o peito.

— Nunca! Sai do meu quarto!

Ouvi ele engatilhando a arma e senti a mão dele puxando minha blusa e o som do tecido se rasgando.

Olhei para baixo e vi meus seios à mostra e aquele velho nojento me olhando como se eu fosse uma comida exótica.

Tentei cobrir os seios com as mãos, mas ele puxou meus braços e apertou meio seio com força, ajoelhando na cama e tentando deitar em cima de mim.

 — Vou fazer com você o mesmo que fiz com sua mãe. Você não presta, é uma puta safada igual a ela.

Eu não conseguia me soltar. O cano da arma apertava meu ouvido e ele continuava passando as mãos em meu corpo.

Deus! Me ajude! Faça alguma coisa!

— Sula?

Era a voz da Zaila do outro lado da porta.

— Por que trancou a porta, filha?

Ele levantou devagar com a arma ainda apontada para mim e ajeitou a roupa.

— Calada! Se não quiser morrer!

Levantei rapidamente e corri para o banheiro trancando a porta soluçando. Ouvi quando ele abriu a porta e falou com a Zaila.

— Vamos, deixa a garota. Ela está trancada no banheiro porque ameacei dar uma surra nela se continuasse se recusando a jantar na sala.

E então a porta se fechou e o silencio tomou conta do quarto.

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