Capítulo 02 - Clara

— Eu espero que sim...—  Mordi o lábio inferior, a insegurança ainda me corroendo por dentro. — Às vezes eu me sinto tão… inadequada perto dele, sabe? Como se nunca fosse o suficiente.

Isabella me encarou com seriedade. 

— Olha, você precisa parar de se menosprezar assim. Você é incrível, Clara, e merece muito mais do que esse chefe rabugento te tratando mal. —  Ela fez uma pausa, seus olhos brilhando com determinação. — Se ele não consegue enxergar o seu valor, o problema é dele, não seu.

Suas palavras me acalmaram um pouco. Ela sempre sabia o que dizer para me fazer sentir melhor. 

— Obrigada, Isa. Eu realmente não sei o que faria sem você.

— Ah, você sabe que eu sempre estarei aqui pra você.—  Ela me deu um abraço apertado. — Agora vá se trocar logo, antes que o Sr. Grinch volte e fique bravo por você estar demorando.

Ri da comparação, me sentindo um pouco mais leve. 

— Certo, certo. Já estou indo.

Me dirigi ao banheiro, a camisa de Isabella em mãos. Talvez, com o apoio da minha amiga, eu conseguisse lidar melhor com as exigências do meu chefe dificílimo. Eu precisava acreditar que, um dia, ele veria o quão capaz eu era.

Ao sair do escritório, meu coração ainda batia acelerado depois de mais um dia enfrentando as críticas implacáveis do Sr. Calderón. Aquele homem conseguia abalar minha confiança como ninguém. Mas, dessa vez, eu estava decidida a não deixar que suas palavras me atingissem tanto.

Ao chegar no hospital, meu estresse imediatamente se transformou em preocupação. Meu irmão Pedro, com apenas 17 anos, estava lutando contra uma doença misteriosa. Os médicos ainda não haviam conseguido diagnosticar seu problema, e eu me sentia tão impotente diante dessa situação.

Depois de me identificar na recepção, aguardei ansiosa pela chegada do médico. Quando ele finalmente se aproximou, meu coração afundou ao ouvir suas palavras.

—Senhorita Martins? Preciso te informar que Pedro irá precisar de uma cirurgia.

Cirurgia? Meu Deus, não. 

—Cirurgia? — Minha voz saiu trêmula, a angústia crescendo dentro de mim.

O médico assentiu, seu semblante grave. 

— Para ser exato, um transplante. Ele está entrando na fila para transplante de coração.

Senti meu mundo desmoronar. Transplante de coração? Isso significava mais despesas, mais contas a pagar. Com as dívidas do hospital aumentando e a clínica de dermatologia da minha mãe à beira da falência, não sei como conseguiríamos arcar com esse novo imprevisto.

Lembrando do dia em que meu pai partiu, sua luta contra o câncer, toda a dor e o sofrimento envolvidos, meus olhos se encheram de lágrimas. Agora, Pedro também precisava enfrentar uma batalha tão árdua. Eu não sei se teria forças para passar por tudo isso novamente.

Respirei fundo, tentando me recompor. Não podia me deixar abalar, precisava ser forte, não só por mim, mas por minha família. Eles estavam contando comigo.

— Obrigada por me informar, doutor. O que precisamos fazer agora? — Perguntei, a voz embargada pela emoção.

Ele explicou os próximos passos, os procedimentos e os cuidados que teríamos que ter. Eu ouvia tudo atentamente, determinada a fazer o que fosse necessário para ajudar meu irmão.

Ao final da conversa, caminhei lentamente até o quarto de Pedro, meu coração pesado. Quando o vi deitado naquela cama de hospital, tão frágil, não pude conter as lágrimas. Acariciei seu rosto, rezando para que ele conseguisse superar essa luta.

— Nós vamos ficar bem, Pedro. Eu prometo que vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance para te ajudar — Murmurei, minha voz embargada pela emoção. — Você é a minha força, meu irmãozinho. Não desista, por favor.

Não pude deixar de notar que Pedro não havia sequer tocado na comida do hospital. Ele sempre foi tão seletivo com a alimentação, nada daquele aspecto apetitoso.

—Ei, maninho, você já comeu alguma coisa?— Perguntei, me aproximando de sua cama.

Pedro sacudiu a cabeça, seus olhos cansados. 

—Não, não consigo comer essa comida daqui. Não tem gosto bom.

Meu coração se apertou ao vê-lo tão desanimado. Sabia que a internação e a incerteza sobre seu diagnóstico estavam o desgastando emocionalmente.

Disfarçadamente, chequei o saldo da minha conta bancária no celular. Infelizmente, não tinha muito a oferecer no momento. As dívidas do hospital e as contas da clínica de mamãe estavam me deixando cada vez mais preocupada.

Mesmo assim, não podia deixá-lo sem se alimentar direito. Precisava fazer algo.

—Espera um pouco, Pedro. Já volto, tá bom?— Dei-lhe um beijo carinhoso na testa e saí do quarto, rumando em direção ao corredor.

Ao virar a esquina, acabei esbarrando em alguém. 

—Oh, me desculpe, eu não...— Minhas palavras morreram quando encontrei um par de olhos negros me encarando.

O homem era extremamente alto e elegante, vestido impecavelmente em um terno escuro. Seus traços me lembram vagamente de alguém, mas não consegui identificar quem.

—Não, a culpa foi minha. Eu estava distraído.— Ele sorriu levemente, sua voz grave soando suave. —Espero não ter lhe causado nenhum incômodo.

—Ah, não, imagina! Eu que peço desculpas.— Senti minhas bochechas esquentarem, me repreendendo mentalmente por ter ficado tão atrapalhada.

Ele acenou com a cabeça em despedida e seguiu seu caminho. Fiquei ali parada por alguns instantes, observando sua imponente figura se afastar.

Sacudindo a cabeça, voltei a caminhar até a máquina de lanches. Peguei um pacote de salgadinhos de batatas, decidida a levar algo que Pedro pudesse comer com prazer.

Ao retornar ao quarto, encontrei-o contemplando uma enorme caixa de frango frito ao lado de sua cama.

—Olha só o que me trouxeram!— Ele exclamou, seus olhos finalmente brilhando. —Prefiro mil vezes isso do que a refeição do hospital.

Sorri, aliviada por vê-lo mais animado. 

—Quem trouxe?

— Melhor comermos antes que uma enfermeira nós pegue — disse mudando de assunto.

—Então vamos dividir essa delícia.— Entreguei-lhe o pacote de salgadinhos. —Espero que isso também ajude a matar sua fome.

Pedro pegou o pacote, seus lábios se curvando em um sorriso sincero. 

—Você é a melhor, irmã.

Sentei-me ao seu lado, observando-o degustar o frango frito com tanto prazer. Meu coração se encheu de gratidão por poder estar ali, cuidando dele. Mesmo com todas as dificuldades que enfrentávamos, ver Pedro se sentindo melhor já era o suficiente para me fazer sentir mais leve.

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