O fim de tarde era a melhor parte do dia de Kalinda, pois era o horário em que ela era liberada do serviço. Aos quatorze anos de idade ela começou a trabalhar para ajudar os seus pais nas dispersas, o pouco que ganhava era investido totalmente em mantimentos, e está sendo assim desde então.
Ela estava vestindo o fardamento da confeitaria em que trabalha, rosa bebê com um círculo de flores nas costas com o nome do estabelecimento, e em seu peito do lado esquerdo tinha seu nome em dourado, vestia também uma calça jeans azul surrada e quase sem cor, quase tão gasta quanto o seu tênis encardido.
No caminho para casa ela pôde notar muitos e muitos cartazes anunciando a chegada do príncipe Charles no reino. Ele esteve fora por muito tempo, não que ela ficasse horas e horas no I*******m em páginas de fofoca, era a vizinhança mesmo, a cada duas casas, uma tinha uma velhinha que fica metade do dia na janela e na outra metade roda o reino espalhando as boas novas.
Ela estava exausta, mesmo que seu trabalho seja apenas meio período, a escola pela manhã a matava, e saber que ainda teria de fazer algumas atividades não a deixava nem um pouco feliz.
O caminho de terra estava cada vez pior, com inúmeros buracos e esgotos improvisados. O saneamento básico era quase inexistente naquela área do reino. Um dos muitos motivos da jovem querer estudar e se formar para poder proporcionar melhores condições de vida para os seus pais.
ー Boa tarde, Kally! ー Disse um homem de meia idade passando por ela na direção oposta.
ー Boa tarde, Sr. Kibe. ー Respondeu a jovem acenando com a cabeça e sorrindo para ele, sem parar de andar.
Não demorou muito para que chegasse em sua casa, era bem simples e humilde. Tinha apenas um quarto, uma pequena cozinha, um banheiro e a sala, onde a garota dormia.
ー Mãe, pai, cheguei! ー Falou alto ao entrar em casa e fechar a porta.
Não contendo uma resposta chegou à conclusão que eles estariam em seus empregos. Ela largou a mochila ainda da escola sobre o sofá e foi rumo ao banheiro e tirando as roupas no trajeto.
Não demorou muito no banho, e mesmo se quisesse não poderia, o racionamento do bairro não permitia. Assim que saiu do banheiro vestindo um pijama que provavelmente seria um fardamento grande de algum dos empregos antigos do seu pai, e com uma toalha enrolada em sua cabeça.
ー Finalmente paz. ー Murmurou sorrindo ao secar os seus cabelos.
Alguns minutos depois, cansada de estudar as funções das organelas, ela decide pegar o celular na mochila ao seu lado. Assim que o desbloqueia pôde notar o número exorbitante de notícias sobre a chegada do príncipe no reino.
ー Essa gente não tem vida própria não, é? ー Perguntou a si mesma, entediada por não ter nenhum babado escandaloso nas redes.
Quando estava quase guardando o celular, chegou uma mensagem por SMS. Ela franziu as sobrancelhas confusa.
"Em pelo século vinte e um, ainda existe gente que manda SMS?" ー Pensou ela antes de abrir a mensagem.
Ao abrir, se deu conta que era um documento em p*f, logo no topo ela avista o selo Real. O que explicava a forma em que a mensagem chega até ela.
"O Palácio de Keanu, abre os portões da academia Real Gold Crown, para jovens plebeias com vocação para a nobreza em potencial. Ao fim da mensagem se encontra o l**k da ficha que deve ser preenchida.
Com todos os materiais pagos incluídos na bolsa, a finalista do concurso deve se apresentar na recepção da academia com o seu RG e C. P. F.
Tenha uma boa sorte! Assinado: Núcleo gestor."
ー Puta que pariu… ー Disse ela com a boca aberta, em choque.
No mesmo instante em que Kalinda tentava processar a nova notícia, do outro lado do reino, no Palácio, estava o príncipe mais velho, sentado em sua cadeira de rodas próximo a enorme janela do seu quarto, observando o seu amor secreto vindo em direção ao palácio.
O seu peito já se acendia com a ansiedade, do seu coração batia acelerado. Um sorriso bobo brotou em sua face ao se lembrar da última vez em que viu ou conversou com o professor.
O jovem ficou tão distraído fantasiando um futuro perfeito com o "seu" homem sentado em seu colo, e os dois indo juntos na cadeira de rodas rumo ao pôr do sol. Que nem se deu conta que o mesmo que habitava em seus pensamentos estava nesse exato momento esmurrando a porta sem obter resposta.
ー Príncipe Arthur! Está aí? ー Indagou o homem já cansado de chamar por seu aluno.
ー Sim, estou, pode entrar Lorenzo! ー Respondeu o príncipe, manobrando a cadeira para encarar o homem que acabou de adentrar o quarto.
O homem era alto, mas não nada muito fora do comum, olhos verdes, cabelo ruivo claro curto, perfeitamente cortado e penteado em um topete baixo, poucas sardas na cara. Ele vestia uma camisa gola "V" branca por debaixo de uma jaqueta jeans com vários rasgões, uma calça bege e botas amarronzadas.
ー Espero que esteja pronto para mais uma sessão de "Estrelas da literatura Keanourana no século vinte". ー Dizia o ruivo se aproximando com um sorriso encantador.
ー Com você? Sempre! ー Diz o jovem convicto. Ele gira as grandes rodas da cadeira ficando ao lado da cama. ー Senta.
ー Desse jeito vou acabar com o ego nas alturas! ー Alertou Lorenzo com um sorriso debochado e um tom de voz irônico.
ー Sério? Nossa, eu sabia que esse homem perfeitinho não passava de uma farsa. ー Provocou Arthur com puro escárnio.
ー Perfeito? Imagina, parcialmente… talvez. ー Disse o mais velho de forma pensativa, fazendo o aluno rir facilmente.
Após um falatório quase sem fim e flertes leves e de certa forma até inocentes. Eles deram início a aula, não era nada de outro mundo, apenas algumas citações filosóficas de pessoas que foram de extrema importância na literatura Keanourana, características, curiosidades e algumas referências. Ao fim, Lorenzo designou algumas atividades para fazer, era algo para exercitar a memória do príncipe e além de ajudá-lo a armazenar todo o conteúdo de forma prática e certa.
Kalinda já havia contado sobre o anúncio real. O seu pai não deu muita atenção, estava tão cansado que nem ao menos jantou, apenas tomou um banho rápido e capotou na cama. Já a Mérida, mãe de Kalinda, avisou que independente da escolha da filha, ele iria apoiá-la, em outras palavras: Você vai aceitar e ponto.
ー Não fique pensando muito nisso, vá dormir que amanhã tem aula cedo. Espero que faça a escolha certa. ー Diz Mérida com um sorriso singelo.
Ela deposita um beijo na testa da filha e vai para o seu quarto. Deixando Kalinda esparramada no sofá com o cabelo todo bagunçado tais como os seus pensamentos. Querendo ou não, ela já estava no jeitinho para dormir, era cedo, não passava das oito ainda, porém, se quisessem ter um dia no mínimo, suportável, era importante dormir o máximo que pudessem.
ー Bye, Bye, wi-fi da dona Eguiberta. ー Murmurou a jovem desligando a internet provida da vizinha, e travando o celular, ela se enrola no lençol e se entrega ao cansaço e sono.
O barulho matinal acaba por acordar Kalinda, na hora certa de ir à escola. Ela se levantou do sofá com o estofado um pouco precário e foi em busca de se arrumar.Não demorou muito, nem ao menos tomou o café-da-manhã. Vestiu apenas uma calça jeans com um azul fraquíssimo ー também gasta ー, e a blusa da farda, nas cores verde, amarelo e azul, e com o nome dela gravada na parte inferior de trás.ー Gostosa pra caralho! ー Disse confiante olhando o próprio reflexo no espelho. Logo em seguida começou a rir.A escola foi a mesma coisa monótona, chata e cansativa de todos os dias. Mas, necessária.&nb
Por conta das inscrições para o concurso, o conselho decidiu anunciar um feriado de última hora, possibilitando a inscrição de várias jovens, inclusive a de Kalinda, que se ocupavam com, trabalho, escola, ou qualquer outra coisa.O pátio enorme da instituição estava lotado, um grande tumulto tomou conta dos corredores. Kalinda observava tudo com muito medo, temia ser pisoteada, caso algo acontecesse, ou pior, ser morta por alguém, e não poderem identificar o responsável.A sua mãe havia se desprendido de si, assim que entrou, com a desculpa de ir se informar. E ela ficou ali, debaixo de uma árvore, sentada em um banco de mármore falso, com as pernas cruzadas e um livro em mãos, por mais que ela quisesse que fosse um belo livro de fantasia romântica, a realidad
Os dias passaram de forma rápida, mas, ainda sim, muito cansativos. A mãe de Kalinda a obrigou a ficar na imensa fila de espera, tinha jovens de todas as formas, tamanhos e etnias diferentes, cada uma mais bela que a outra. Todas elas tinham sonhos com a realeza, diferente de Kalinda que apenas usaria o diploma para entrar em uma universidade respeitada.Ainda que, pobres igualmente, ou até mesmo pior que Kalinda, todas estavam com suas melhores roupas, e maquiagens que até mesmo as princesas não usavam. Enquanto a morena usava apenas um vestido florido de um tecido vagabundo, nem de longe poderia ser comparado aos das demais candidatas, também usava tênis surrados e gastos, com o cabelo preso em um rabo de cavalo baixo.
O dia tão esperado tinha chegado, todas as candidatas do reino estavam alvoroçadas. O que o príncipe Charles mais temia aconteceu, as ruas estavam lotadas, nem mesmo as vielas clandestinas estavam livres.ー O que o conselho decidiu fazer em relação ao tumulto? ー Indagou o príncipe Arthur encarando o rosto sério do irmão.Charles vestia roupas formais na cor azul escuro quase pretas. O paletó estava justo em sua cintura, as lapelas eram grossas e brilhantes, a gravata era preta com minúsculos pontinhos brancos, e a calça na mesma tonalidade do paletó. Usava sapatos sociais devidamente engraçados. O seu topete molhado alinhado perfeitamente as laterais baixas.Arthur não sairia
As questões eram desafiadoras e poderiam fazer até mesmo grandes diplomatas terem uma dorzinha de cabeça para respondê-las corretamente. Kalinda poderia não ter acreditado de início, mas ali no meio daquela disputa acirrada ela percebe o quão bom foi ter estudado o máximo que pôde sobre táticas diplomáticas. Não que ela precisasse, já que as questões eram feitas apenas para jovens plebeias com um mínimo de conhecimento geral.Na primeira questão tinha uma situação hipotética, onde cabe somente à princesa impedir uma guerra contra países vizinhos. Sem rei, ou qualquer outra pessoa a quem ela poderia recorrer, tinha dez linhas onde ela deveria escrever sua tática. Segundo os ensinamentos que todo Genovyano deveria receber.Ao dar uma pausa para analisar suas adv
Arthur bebia de seu vinho tranquilamente, e sem medo de alguém pegá-lo no expediente de serviço. Quando ele decidiu cuidar pessoalmente das questões pendentes do concurso, não imaginou que seria tão entediante. Era cada resposta mais infantil e vulgar que a cada gole do vinho, seu cérebro implorava por mais para poder aguentar aquela tortura.Várias pilhas de papéis estavam sobre a imensa mesa de mármore legítimo. As vinte e oito cadeiras estavam vazias, estando ocupada somente a da ponta.ー Vossa alteza, ー Comprimentou um homem de aparência jovial invadindo a sala de reuniões. Só pela voz o príncipe já teve o desprazer de reconhecer o dono. ー Vejo que a rainha parou de te privar das delícias da coroa. ー completou com pura insistência, se sentando do out
O fim daquela rotina cansativa era sempre a melhor parte do dia. Em poucos minutos os nomes das candidatas que conseguiram passar estariam sendo anunciados em todos os veículos de informações, principalmente na rádio.ー Está ansiosa, filha? ー Luana senta no sofá ao lado da filha, estava com um vestido velho de ficar em casa mesmo. Seu sorriso gentil escondia uma ganância fora do normal, e Kalinda sabia disso.ー Não. As chances de eu passar são mínimas. ー Respondeu ela com um fio de voz, abraçou as pernas e apoiou o queixo sobre os joelhos.ー Não diga asneiras! ー Repreendeu com um tabefe, a jovem olhou com uma expressão confusa e desatenta. As notificações chegavam aos montes. Gael já não aguentava mais o celular de Kally tocando a cada segundo. Desde que acordou, a morena não olhava suas notificações. Não podia mesmo se quisesse, seu chefe não a deixaria. O horário proporciona mais calmaria, isto é, se a mera presença um do outro não os irrita sem.ー Mas que merda. ー Disse o gerente batendo os punhos no balcão. Não tinha cliente, apenas ele e a garota, e aquela zuada infernal.ー Eu posso colocar no silencioso… ー Propôs ela. Era cedo demais para criar mais uma briga com ele, era mais sensato conversar.ー Certo, mas nada de ficar lendo tabloides de fofoca. ー Alertou o moreno. Seus fios grossos estavam caindo sobre seusCapítulo 09 - Vermelho da Paixão.