McNemar juntou todos os alunos na sala com um breve bater de palmas, como se chamasse a atenção do público para um grande espetáculo, e eles, como se soubessem o que fazer, entraram na classe, sentando-se em seus respectivos lugares. Ela foi breve em anunciar os preparativos para o Halloween. Era de sua responsabilidade a decoração de toda a instituição e fazia por puro passatempo. Ela aproveitava de momentos como aquele, para observar o talento de alguns alunos. Naquele ano, tivera a ideia de fazer algo diferente, como leitora assídua, achou de grande valia inspirá-los a escrever redações sobre lendas urbanas ou histórias fantásticas e assombrosas que aconteceram na região. Sabia que se incitasse a imaginação deles, poderia desenvolver seus lados criativos, e ainda de quebra, ganharia histórias interessantes para ler durante o feriado de Dia das Bruxas, na companhia de seu inseparável gato, Little Ben.
Por orientação do diretor Evans, McNemar decidiu criar duplas para a atividade do final de semana. Dupla essa, que teria que escrever juntos, uma boa redação, concisa e objetiva. E a intenção do diretor era certeira, tentar unir dois ímãs de pólos diferentes: Adam e Bill Lewis. Qualquer um com educação básica em física saberia que isso era uma tarefa difícil. Bill mal podia acreditar que aquilo estava acontecendo, mas sua mente já arquitetava um plano. Talvez se ele assumisse todo o trabalho, o seu inimigo não precisaria fazer nada, a não ser, ficar o mais distante possível dele, isso seria sua maior e mais justa função naquele trabalho.— Não se esqueçam... Lápis quebrado ainda rabisca. — McNemar disse olhando para Bill, como se ele fosse alguma espécie de bicho-da-goiaba perdido em uma festa de piolhos. Ele sorriu internamente por saber que ela tinha um pouco de razão.Assim que o sinal tocou, alertando o fim daquela aula, Bill se levantou e teve coragem de ir até Adam, na intenção de lhe informar que ele mesmo faria todo o trabalho, mas a resposta do valentão o deixou surpreso.— Você pensa que eu sou o quê? Eu também quero um futuro. Eu quero e vou participar dessa atividade e você terá que me engolir.Talvez Bill pudesse insistir um pouco mais e eliminar de vez aquela dúvida de que o infeliz do Adam, fazia aquilo por pura pirraça, mas sua resposta foi breve.— Escolha o tema. Eu faço o resto. — Bill saiu dando alguns passos para trás. Ele não queria ficar de costas para seu rival, muito menos dar a oportunidade de Adam quebrar suas costelas, assim, facilmente antes mesmo de entregar a redação a senhora McNemar.Do lado de fora do colégio, debaixo de uma árvore pequena e de poucas folhas, como as demais na doce, estranha estação de outono. Edward Bailey retirava o cadeado do pneu de sua bicicleta e se preparava para ir para sua casa, pois em seguida tinha compromisso com seu pai. Edward esteve ocupado durante toda aquela semana. Ajudava o pai com a nova padaria que montaram em Liontown e batizaram de CasseteShow, incrível título, este que fez Bill decorar antes mesmo de estreá-la. Edward de longe não parecia feio, e de fato não era, talvez ele se escondesse muito atrás de todos aqueles aparatos de reparação.— Bill! — Edward acenou, assim que percebeu a presença do amigo, um pouco distante. Bill ainda se desligava do pensamento longínquo, focando sua atenção nas botas novas do Edward. Bill foi até ele.— Então você decidiu estreá-las — falou Bill, em um tom amigável, olhando novamente para as botas pretas e compridas, que iam até parte da canela de Edward e o fazia parecer mais baixo. Não que ele fosse alto.— Você gostou? É como pisar em pêssegos, meu camarada — respondeu Edward, com orgulho, namorando as próprias botas. — Ei! Se você quiser carona, pode subir na magrela.— Eu estou ficando pesado, Edward. — Bill estava mentindo. Não gostava de ficar muito com o Edward em público, depois que os garotos insinuaram que eles estavam tendo um “caso”. Pura bobagem deles.— Ah! Conta outra. — Edward gargalhou, fazendo Bill rir junto, em seguida apertou a buzina de sua bicicleta. — Atenção senhores passageiros, a magrela mais radical com destino ao subúrbio de Liontown já vai pedalar, por favor se apressem ao saguão de embarque...Bill subiu na garupa da bicicleta, quando Edward já estava montado. Edward imitou um maquinista e isso fez Bill rir ainda mais.Edward pedalou por cerca de três quarteirões. A casa de Bill ficava uma esquina antes da sua residência. Serem vizinhos tinha suas vantagens e desvantagens. A grande vantagem era que eles sempre brincavam juntos e isso era bom, afinal, eles por todo esse período de amizade, se davam bem, apesar de o gênio da adolescência ter moldado suas personalidades à de um gato arisco, fazendo-os com que agora, qualquer discussão acabasse em tolas brigas. A desvantagem era curiosa, mas não menos importante: Bill começara a sentir algo diferente por Edward Bailey, algo como uma paixão estranha. Quando da vez que ele se apaixonou pelo Doc, o personagem animado da embalagem de papel-higiênico. Contar isso para alguém seria estranho. Ninguém se apaixona por desenhos, muito menos se eles forem personagens de uma marca de higiene pessoal. Era o segredo mais bizarro que Bill tinha consigo mesmo. Talvez um segredo que ele um dia vai esquecer. Mas o Edward não era um desenho, e se perguntasse algo sobre como eles eram tão unidos, ele não se importava. Ele gostava dele. O perfume amadeirado do Edward, fazia-o querer mais próximo dele, mas Bill jamais ousou contar alguma coisa para ele ou para qualquer outra pessoa e supostamente esse segredo irá morrer com ele.— Sua mãe fez compras... — Edward disse, quando acabava de encostar ao fundo do carro da senhora Lewis. Ela carregava algumas sacolas de compras. — Boa tarde senhora, Lewis.
— Olá, Edward. Como está? — Ela perguntou equilibrando a sacola, enquanto segurava com o queixo. Bill correu para ajudá-la.— Estou bem. Obrigado por perguntar. Bom, tenho que ir ajudar o meu pai. Até depois, Bill. — Edward saiu pedalando mais rápido quanto chegara, pois, tinha cinquenta e cinco quilos a menos em sua bicicleta.— Até depois, Edward — Bill respondeu acenando, enquanto acompanhava com os olhos, o amigo se distanciar. Ele voltou a prestar atenção nas sacolas que sua mãe colocava em seus braços. Eram muitas.— Olha... Pasta de amendoim. Pensei que eu estava de castigo por enterrar o Pirulito no quintal, e a senhora iria me privar das guloseimas — falou ele, reparando o interior de uma sacola.— Não são para você, Bill. São para as crianças do bairro. Nós iremos fazer os docinhos, lembra? — Ela indagou, negando com a cabeça e colocando a quarta sacola, mas essa era pequena e fazia um barulho como um conjunto de objetos de ferro. Pregos talvez.— O que são? — Perguntou ele, não contendo a curiosidade.— São dobradiças e fechaduras novas para a janelinha do porão. As outras estão velhas e gastas e tenho a impressão de que foi forçada. Preocupo-me em deixá-lo só nos finais de semana — respondeu ela, enquanto caminhava até à cozinha. Bill a seguiu, equilibrando as sacolas em seus finos braços.— Obrigado, Bill. Poderia deixar essa sacola de ferramentas lá embaixo, na mesinha. Depois seu pai irá reparar a janela — completou ela, retirando as sacolas do braço de Bill e deixando-o com a outra pequena. O porão ainda lhe trazia uma má sensação, como se ali dentro morasse a morte. Talvez ele não estivesse tão errado assim.— Eu estou indo lá. — Falou colocando a mão na maçaneta e esperando meio segundo, ao tentar tomar coragem de entrar ali novamente. Bill desceu as escadas lentamente enquanto olhava para os cantos escuros. Havia um interruptor ali na parede, mas ele lembrara que não havia lâmpada encaixada no bocal. Ele olhou para o teto só para se certificar disso. Desceu mais alguns degraus e teve a breve sensação de que a escada era mais longa do que o habitual. Apressou o passo, descendo agora, a cada dois degraus, sacudindo a sacola e fazendo um barulho de tilintar, como os sinos da igreja no final da rua depois do colégio onde estudava. Ao chegar na mesa, ele pôs a sacola rapidamente e quando se virou... Bill viu uma silhueta sair debaixo da escada, chegando à luz que vinha da porta aberta da cozinha. Ele pensou em apenas correr, ou na maior das opções, gritar, mas se conteve, pois, sua mãe poderia não acreditar. Era o homem sinistro novamente. Homem ou coisa. Bill ainda não sabia ao certo, mas tinha medo. Aquela coisa era horrenda, como uma assombração vinda da quinta camada do inferno.— Bill... — disse a coisa, estendendo a mão. O garoto apenas deu um passo para trás, encostando a bunda na mesa, e percebendo estar acuado.— Quem é você? — Perguntou Bill, baixo, na intenção daquele diálogo ficar ali mesmo, no porão. Se aquilo era um delírio, certamente deveria passar logo. Pensou duas vezes no mesmo assunto referente a alguma doença que o fizesse estar delirando e tendo alucinações, mas não poderia afirmar.— Sou o Tommy-balão, não lembra de mim? Minha missão é informá-lo sobre breves acontecimentos que estão por vir.— Você não é real — disse Bill, rápido, querendo acreditar em si mesmo. Olhou para os lados e puxou o primeiro objeto que viu. Uma vassoura. Se esse tal Tommy-não-sei-o-quê viesse em sua direção, ele poderia acertá-lo com aquilo.— Os garotos do colégio bem que mereciam uma lição, Bill. O que fizeram com você foi injusto. Queria eu poder te defender, mas só você pode fazer isso. Eu imagino aquele cara rechonchudo rolando ladeira abaixo, lá na velha usina elétrica, próximo ao rio Wax. Você se lembra daquele dia em que ele esteve lá, se masturbando? Você reparou, não foi, Bill? Eu sei que sim.— Não... — Bill fechou os olhos e sentiu-se envergonhado. Ele estava com medo. Seja lá o que aquela coisa fosse, tinha consciência de fatos e parecia conhece-lo.— Ele costuma caçar lebres à beira dos penhascos que há por lá, como se desafiasse a morte. Ele é um garoto ousado. Adam. É, sim, ele realmente é ousado. Seria triste se um dia ele rolasse de lá de cima — Tommy-balão falou pausadamente, dando alguns passos a frente e Bill segurou firme o cabo de vassoura, ao ponto de fazer um calo em sua mão. — E se eu disser que eu vi ele colocar veneno para o Pirulito? Aquele menino malvado não gosta de caras como você, Bill. Eles têm impurezas em suas almas que precisam ser lavadas. Pobre Pirulito, se ele soubesse que aquele pedacinho de carne suculento e macio estivesse envenenado, talvez não estivesse aqui, do outro lado...Bill viu por um instante, Pirulito sair debaixo do grande casaco preto que a coisa feia vestia. O cão encarou ele, como se estivesse reconhecendo o dono. Bill chorou um pouco, muito mais de medo do que de emoção por revê-lo.— Sai daqui!! — Bill sacudiu o cabo de vassoura no ar, gritando como um doido, enquanto espremia os olhos o mais fundo que podia, na intenção de apagar tudo o que viu e ouviu. Ele só queria estar na cama agora, debaixo dos cobertores, como costumava fazer quando era uma criança assustada. O cobertor sempre tinha o poder de escudo contra monstros.A mãe de Bill apareceu na porta com os olhos arregalados e perguntando o que diabos estava acontecendo ali. Bill apenas correu para a escada, quando não mais via o Tommy-balão e passou por sua mãe, sem dizer uma só palavra. Ela notou em seu rosto um pouco de medo, misturado às lágrimas que escorriam por suas bochechas.Que tipo de acontecimentos aquele ser esquisito queria dizer, Bill não sabia, mas estes seriam, talvez, os mais horripilantes naquele principio de Dia das Bruxas.Um pouco de suco de laranja escorreu pela rachadura quase imperceptível que havia na jarra de vidro em formato de abacaxi, que Eva comprou na feira de artigos clássicos. Ela tinha a impressão que aquele objeto, vindo originalmente do Brasil, remetia belos dias de verão na casa de sua avó. O suco, como um rio, fez caminho pela mesa até alcançar o braço de Eva, que estava concentrada lendo uma revista de moda. Ela voltou para a realidade quando sentiu aquele toque gelado, e quando se deu conta do que estava acontecendo berrou o nome de Larry, seu marido, e ele apareceu, tão rápido quanto uma lebre que foge de um predador. Ela pegou a flanela que havia ali na pia e se debruçou sobre a mesa, interrompendo o fluxo.— O que houve, querida? — Larry perguntou espantado, mas conseguiu identificar o motivo do desespero dela. Ele soltou um suspiro breve ao saber que não era nada de mais. Pelo grito dela, ele jurou que ela tinha visto um intruso.— Aquela senhorinha mentiu para mim... ela havia di
A velha usina hidrelétrica da cidade, que fora desativada depois da instalação de mais duas novas em Scotland. Mas estas eram usinas nucleares. Não era algo bem visto, mas chegou sorrateiramente a região, como pragas — fato não muito agradável a maioria dos moradores do condado de Delaware. Acreditavam que aquelas usinas seriam em alguns anos, as responsáveis pelos novos casos de câncer. — Já a velha usina, pouco aproveitada, tornou-se abrigo secreto para estudantes foragidos e usuários de droga da fábrica de pneus que havia ali próximo. Era um lu-gar interessante quando ainda era possível ser visto à luz do sol, mas extremamente sombrio a noite, como se ali mesmo, existisse uma zona morta, onde o portal entre esse plano e um outro mundo se abrisse, tra-zendo à tona todas as almas que vinham em busca de prazeres carnais em outros humanos viciados em dro-gas, bebida ou pornografia. Mas para Adam, era o local ideal para praticar tiro ao alvo. Ele costumava ir para lá quase todo dia, semp
(Atenção: esse capítulo contém tema sensível)Um círculo. Havia um halo na lua da silenciosa noite de 14 de novembro de 1977. Um perfeito círculo que formava um anel prateado cintilava no céu, como se Deus olhasse a desgraça logo abaixo. Sob essa luz, haviam corpos. Estavam no estábulo dos Morris. Era o senhor Morris e sua filhinha, Anna de cinco anos. Tudo começou com uma relação peculiar entre um padre e uma devota da cidade. Eles costumavam se encontrar todo domingo, e não era para assistir à missa. Mesmo que soubessem ser errado fazer o que faziam detrás das curtinas da igreja, mantinham uma relação de muita intimidade, até o dia que Gayle Gardner ficou grávida. Ela não esperava aquilo, apesar das aventu-ras sexuais, não acreditava que no auge de seus qua-renta anos pudesse dar à luz a outra criança. Boris Cales, padre e cuidador de idosos da Santa Casa de Misericórdia, não gostou nada da notícia. Para ele, era um sinal de que deveriam ter dado um fim àquela rela-ção. Vindo de um h
Bill gostava do cheiro da lasanha de frango que Eva costumava preparar às terças, porque o fazia lembrar do dia em que eles saíram juntos para a lanchonete do Ed, quando acidentalmente ela queimou o que seria uma torta salgada. Talvez se a torta não tivesse queimado, eles não teriam saído, se divertido e aprendido uma nova receita. Bill acreditava que certas coisas aconteciam por um proprósito e aquele em especial, era o melhor deles. — Nada de celular à mesa — disse Eva, limpando a boca em um guardanapo e encarando-o. Ela estava preocupada com ele. Tinha recebido a notificação do colégio acerca da briga e um telefonema da senhora Bailey informando que ele esteve lá na casa dela, quebrando as coisas do Edward. Ele não estava na melhor das fases. Eva estava no limite e uma mãe no limite sempre faz algo que se arrepende depois, mas não por ser ruim ou má educadora, mas por querer poupar os filhos de desgraças quase inevitáveis.— Eu sei que estou de castigo, mas já terminei de comer —
Nos corredores do colégio, Bill percebeu que todos estavam fantasiados de algo, mas até onde ele se lembrava, o dia das bruxas seria em dois dias.— Doces ou travessuras? — Frank, o amigo beijoqueiro o surpreendeu por trás, mostrando uma cesta vazia. Ele estava vestido de Frankenstein — original...— Você não está um pouco grandinho para isso, Frank? — Bill indagou, olhando para a cara dele. Ele ainda mantinha a cesta estendida, como se esperasse um doce.— Você veio de quê? Diretor Evans? A cara você já tem, falta só o bigodinho... — Frank zombou, olhando para os outros alunos e suas fantasias esquisitas. — Não sabia que você estava tão distante. Hoje é sexta-feira! É dia de festa de halloween do colégio. Olha para a Elle. Ela está de coelhinha sexy.— E daí?— E daí que isso é um sinal. Coelhinhos trepam, zé mané. E muito. Ela sabe como me passar bons sinais — Frank era um retardado na maioria das vezes, até quando estava falando de sua própria namorada.— Isso é estranho — Bill olho
Na avenida Richard Bells, 122, Bill e Edward esperaram em pé. Cada um carregava uma mochila onde colocaram o que acreditavam ser essencial. Bill com a lanterna mágica e um par de estilingue e Edward, uma bombinha de asma e um óculos de mergulho — na verdade, nem ele sabia o que fazia com uma mochila nas costas.Eles esperaram por trinta minutos até se cansarem e se sentarem no chão da calçada frente ao velho posto de combustíveis, onde ainda era possível ver as bombas cobertas por poeira e casas de aranha, também havia uma grande placa onde estavam os preços dos combustíveis há sete anos — eles mudaram consideravelmente.Vez ou outra, Bill olhava para o relógio de pulso e pensava se aquele atraso seria parte da peça em que possivelmente Adam e John estavam prestes a pregá-los.— Olha lá, Bill! — Edward exclamou, cutucando repetidas vezes o braço do amigo e o chamando a atenção para o que estava prestes a acontecer em seguida. Bill estava preparado para o que quer que acontecesse, mas i
Quando o sol não está mais presente no céu e as estrelas são as únicas criaturas a preenchê-lo, brilhando como pequenos insetos luminosos, cheios de alegria pela satisfação da reprodução e execução de suas minúsculas e importantes atividades, é nesse momento, entre a beleza da vida e os mistérios da morte, que coisas estranhas acontecem. Ninguém pode prever o futuro e mesmo se previsse, certamente a vida arrumaria um jeito de mudar tudo, porque a verdade da existência sempre pende ao mistério, mesmo que seja doloroso, feio e assustador. Bill depositara umabomba-relógio sentimentaldentro dele — alguns costumam chamá-laculpa—. Esse sentimento é como um verme que se instala debaixo de sua pele e vai te devorando devagar. Primeiro começa como uma coceira, para depois se espalhar, e quando menos você espera, abre um buraco necrosado e em car
Avenida Clyde, 340 — Liontown. Residência dos Bayer. Melissa estava em seu quarto, arrumando algumas roupas que estavam sobre uma cadeira. Tinha a mania de organização e os dias na cama a deixavam maluca. Fazer aquilo ainda lhe causava uma sensação de controle. Ela estava melhor — assim ela falava, para si mesma, num mantra positivo —. Sentia-se bem em relação às dores que a incomodavam com hora marcada, mas via-se obrigada a tomar remédios para aliviá-las, ainda que não gostasse da ideia. A faixa na cabeça não lhe caia muito bem, mas ela achava até confortável em certos momentos. O silêncio de sua casa quando seus pais e irmãos não estavam mais presentes, era uma espécie de estado emocional da qual ela só vivenciava em raros momentos da vida. Ela podia ouvir o silêncio da rua e como os carros pareciam distan