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PARTE 06: MENINO AZUL

A velha usina hidrelétrica da cidade, que fora desativada depois da instalação de mais duas novas em Scotland. Mas estas eram usinas nucleares. Não era algo bem visto, mas chegou sorrateiramente a região, como pragas — fato não muito agradável a maioria dos moradores do condado de Delaware. Acreditavam que aquelas usinas seriam em alguns anos, as responsáveis pelos novos casos de câncer. — Já a velha usina, pouco aproveitada, tornou-se abrigo secreto para estudantes foragidos e usuários de droga da fábrica de pneus que havia ali próximo. Era um lu-gar interessante quando ainda era possível ser visto à luz do sol, mas extremamente sombrio a noite, como se ali mesmo, existisse uma zona morta, onde o portal entre esse plano e um outro mundo se abrisse, tra-zendo à tona todas as almas que vinham em busca de prazeres carnais em outros humanos viciados em dro-gas, bebida ou pornografia. Mas para Adam, era o local ideal para praticar tiro ao alvo. Ele costumava ir para lá quase todo dia, sempre quando tinha tempo li-vre, e, na verdade, ele sempre estava disponível. John, seu grande e leal companheiro, o acompanhava nessas saideras. No fundo, John sabia estar saindo dos trilhos, talvez se perdendo um pouco, pois Adam nunca foi santo e essa relação deles, apesar de exibir o mais alto patamar da vagabundice juvenil, onde as brincadeiras saudáveis se misturavam à insanidade de suas mentes tortas, cedo ou tarde traria grandes e difíceis histórias de serem contadas.

— Eu vou matá-lo — disse Adam para John, sem um pingo de ressentimento, enquanto atirava em latas postas à altura de seus ombros, a cerca de dez metros. Os tiros soavam como foguetes, e o eco que fazia nos precipícios e valas que existiam por ali, parecia caçoar de sua péssima pontaria. Ele fumava um cigarro barato que roubou do próprio pai. Fazia isso quando estava desesperado por algo que o fizes-se esquecer um pouco o fato de viver em um lar sem estrutura.

— Você só pode estar de brincadeira... — John não acreditou naquelas palavras, mas sabia que Adam era bastante lúcido nas coisas que dizia.  John pegou uma pedra no chão e atirou em um dos penhascos. Ele se colocou na ponta dos pés, esperando o som do im-pacto do objeto com as rochas que havia lá embaixo. — Esquece o carteiro, Adam! São apenas especu-lações. Você não pode matar um suspeito sem saber se foi ele. Você estaria sendo tão sujo quanto ele.

— Você parece ter convicção de que não foi ele. Mas aquele maníaco asqueroso sempre se fingiu de bom samaritano, mas eu sei quem ele é. Eu vejo como ele olha para você, John. Se você fosse tão burro quanto a filha dos Wattson, santo Deus, eu nem sei o que ele poderia fazer com você. — Adam atirou para o alto, espantando os pássaros, enquanto recordava-se da história mais sombria e triste de Liontown.

Havia um corpo semi-nu que flutuava no rio Wax, se enroscando em pedras, como se a natureza em sua cruel e justa sabedoria, o segurasse, impedin-do de continuar o trajeto a terras desconhecidas. Seus cabelos loiros e compridos, pareciam dançar junto à correnteza do rio. Era uma garota azul. Azul como o gelo, sendo tão frio quanto sua pele naquele estado final. Ele tinha dezessete anos quando foi assassi-nada. Disseram ser um crime brutal, pois as circuns-tâncias do ocorrido não eram suficientes para declarar um “mero” acidente, como muitos outros já ocorridos por ali. Crianças e jovens despencavam daqueles penhascos, como fruto de uma maldição que nem as pessoas mais velhas e céticas da cidade poderiam ex-plicar. Mas talvez nenhuma dessas mortes ou acidentes foram tão cruéis quanto a de Lea Wattson. Seu corpo estava em estado de decomposição avançado quando o encontraram. Foi preciso esperar sessenta dias de investigação da perícia para declarar que aquele era o corpo da garota desaparecida. Não era possível saber muito sobre o que aconteceu, mas entendia-se que morreu afogada, com os pés e braços amarrados, sem escolha de luta à sobrevivência. Boa parte de seu corpo foi devorado pelas piranhas que haviam no rio. Moradores de toda a cidade deixaram de comer pescados e as vendas dos pescadores locais despencaram em níveis históricos. Ninguém queria comer peixe de um rio onde se encontra garotas mortas devoradas. A família Wattson lutou na justiça em buscar pelo culpado, visto que haviam indícios de que ela fora abusada, morta e descartada. Essa sequência de palavras não deveriam ser o começo, meio e fim de nenhum ser humano — nem de qualquer outro ser concebido à terra. Desde o dia em que a enontraram, toda a região ficou sob sinal vermelho. Não era mais permitido perambular tarde da noite sozinho, muito menos matar aula para tomar banho no rio. Muitos pais proibiram que seus filhos saíssem de casa até que encontrassem o culpado por aquele crime. Havia alguns suspeitos, mas tinham alibes quase inquestionáveis. O que se falava na região era que dois homens andavam à noite em um dodge Dakota (98), de modo suspeito. Eles sempre eram vistos no parque ambiental de Liotown. Diziam que caçavam por lá, mas os policiais não tinham provas suficiente para enquadrá-los como potenciais suspeitos. Mas não só se falava deles, como também do carteiro. Daniel o nome dele. Todos o conheciam. Isto porque ele tinha um passado estranho e porque depois que perdeu o pai, começou a ter um comportamento duvidoso. Mas muitos afirmavam de pé junto que ele era um bom homem. O que essa gente toda não sabe é que de bons homens o inferno está cheio.

— Deixa os policiais tomarem conta do caso. Não podemos nos meter nisso, ainda mais porque não temos provas de que foi ele. — Se John pudesse fechar seus olhos, poderia imaginar o rosto de Daniel Smith o encarando, como se o desejasse, e isso talvez alimentava uma breve certeza de que ele não era um simples carteiro, senão um predador sigiloso.

— Eu comecei a ligar os fatos. Vamos fazer uma investigação pessoal em breve... — Adam completou.

— Vamos? Não! Me tire dessa. Temos que focar nos estudos, lembra? Você não disse que quer sair dessa merda de cidade? Que tal começar pelo certo? — John repetia aquele discurso toda vez que tentava motivar seu amigo, quase perdido, a seguir algo que valesse a pena, mas Adam parecia ter uma certa admiração pela insanidade.

— Você está com medo? Como a bichinha do Bill Lewis. — Ele cutucou John com o cano da espingarda, num movimento perigoso. — Sabe qual o engraçado disso tudo? É que depois que aquele infante me acertou na boca do estômago, minha vontade de quebrar a cara dele passou, e comecei a notar que ele tem mais coragem do que você.

John riu. Ele sabia que Bill era corajoso, e que o covarde sempre era o agressor, mas a verdade mais contundente era que Adam não conhecia nem a si mesmo, quem dirá os outros.

— Falando nele. Veja a oportunidade que a senhora McNemar deu de resolver qualquer rixa que vocês tenham — disse John, colocando a mão no cano da espingarda e abaixando-a, livrando seu corpo. —Você já pensou na lenda, ou sobre alguma história assustadora da região? Sem os casos atuais e bizarros, por favor.

Todas as histórias de terror sempre têm algo em comum: a maldade, e Adam sabia que todas as lendas que ouviram, não chegavam aos pés da podridão que poderia existir em certas pessoas. Lendas não eram nada comparadas as barbáries reais que existiam por aí. Uma escuridão que vez ou outra, parecia tocar o Adam, como um piche pegajoso e de difícil remoção.

— Bill... É, eu pensei na lenda que minha mãe contava sobre os Morris. Você sabe, não é só uma história para assustar crianças. A história aconteceu de fato e não foi muito longe daqui. — Naquela altura, Adam já desenvolvia seu outro plano, que seria assustar Bill ao ponto de tornar seu Dia das Bruxas memorável.

— Você está falando do caso dos Morris da menina bruxa? Aqueles caipiras mortos por uma garota de dezessete anos?

— Ou... mortos pela besta! Talvez não te contaram direito, mas foi desta maneira que eu ouvi:

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