Após sair da entrevista um tanto quanto perturbada, fui encarar meu próximo desafio que era pedir demissão do meu antigo emprego.
Não foi fácil sair e me despedir de todos assim de hora para outra, mas era necessário e urgente, afinal era a vida de uma criança que estava em jogo e não poderia mais pensar apenas em mim. Todos do escritório ficaram surpresos e curiosos para saber onde seria o meu novo trabalho, mas deixei o suspense no ar e fui embora o mais rápido possível para contar a novidade para a minha tia Luísa que já estava me esperando. — Luna, ainda bem que chegou, filha! Enquanto almoçamos, conte como foi a entrevista. — Tia Luísa fala e dei um abraço nela, que retribuiu. — Está desanimada. Não vai dizer que te maltrataram nessa entrevista de emprego. — Deu tudo certo, inclusive já começo amanhã. Vou passar por um período de experiência. Tive que mentir dizendo que não tenho filhos, o dono exige alguém que não os tenha. Inclusive, presenciei uma demissão por causa disso, acredita? Mas o salário é maravilhoso. Conheci o meu chefe, ele é... — Não consegui terminar a frase, pois me lembrei do Célio fazendo inúmeras exigências. — Ele é bonitão e educado, ou um velho feio e ranzinza que ninguém aguenta? — Ele é lindo, alto, sério, forte, cabelos castanhos bem-arrumados que nem o vento bagunça, seus olhos são claros, preconceituoso e jovem, mas com o espírito de um velho que ninguém aguenta. Porém, a minha meta de conseguir o que quero é maior que toda a arrogância dele. — Meu amor, o seu foco é a guarda da Elisa, mas não deixe ninguém te humilhar por mais que o dinheiro seja maior. — Eu sei, tia. — Peguei Elisa do berço e nos sentamos ao redor da mesa simples. Aqui o amor é maior que tudo, é uma pena os juízes não reconhecerem isso e não me darem a guarda definitiva da minha pequena. Pelo restante da tarde descansei bastante, organizei tudo e procurei saber mais sobre a empresa. No dia seguinte, eu me vesti de forma simples, mas condizente com a minha posição. Quando receber o primeiro salário comprarei roupas novas, pois as que eu tenho estão precárias. Faço um penteado simples e maquiagem leve, pretendo chegar bem antes do meu horário. Assim que entrei na empresa, recebi um recado do senhor Eduardo para ir até a sua sala e quando cheguei fui recebida pela sua simpática secretária, Lili, que me leva até ele. — Bom dia, senhorita Luna, vejo que você e Lily combinam e chegam muito cedo. Pedi para você passar por aqui para avisar que a minha secretária irá te auxiliar. — Nossa, ficarei eternamente agradecida. Ela pode ir comigo agora? — Sim, já avisei a ela. Cheguei na recepção e ela já estava na minha espera. Fomos para a sala da presidência e começamos a organizar a sala do Célio, atenta a tudo o que ela me ensinava. — Luna, não trabalho com o senhor Célio, mas vou dar uma dica de ouro. Hoje iremos arrumar a mesa dele do nosso jeito, mas fica atenta aos gostos dele, como ele gosta da mesa arrumada e tudo mais. — Obrigada, não sei como te agradecer. — Vamos ter mais trabalho pela frente. Ela me ensinou como funcionava a agenda eletrônica dele e vi que tinha uma reunião agendada para a parte da manhã. Teria que receber os executivos e foi um corre, corre. Lily foi embora me deixando sozinha e olhei para o relógio percebendo que ainda falta uma hora para a reunião. Entrei na sala de reuniões, organizei os documentos sobre a mesa enorme e percebi que o chefe estava atrasado. Quando voltei para a mesa, o telefone estava tocando, com várias pessoas querendo saber onde esse homem estava, mas até o telefone pessoal dele estava desligado. Olhei de lado e percebi que trabalho era o que não faltava, mas tive que adiar tudo com a chegada do executivo para a bendita reunião. — Olá, senhorita, temos uma reunião marcada com o senhor Célio daqui a alguns minutos. — Claro, peço a compreensão dos senhores, mas o doutor Célio teve um contratempo, caso de saúde. Ele vai demorar um pouco, mas enquanto não chega convido a todos que me acompanhem para conhecer melhor a nossa empresa, se não for um incômodo. Os homens se entreolham e fico pensando se fiz o certo, mesmo que não conheça nada aqui dentro. — Sim, por favor, nos mostre. Ficaremos felizes, assim poderemos ver com os nossos olhos a empresa com a qual fecharemos um grande negócio hoje. — Me acompanhe. — Estava sorridente e segura de mim, mas o coração estava batendo fortemente e cruzei os dedos, pedindo ajuda divina. No passeio pela empresa, cruzei com Eduardo, que me apoiou e conversou um pouco com os executivos. Ele nem perguntou o porquê de ter levado aqueles homens comigo, para visitar a empresa, pois certamente sabe do atraso do Célio e que fiz tudo isso para salvar a vida do chefe. No fim, saiu tudo como planejei e eles decidiram fechar o grande negócio, sem mesmo precisar da reunião. Na volta para a sala de reunião, eu já estava tensa, sem saber mais o que fazer ou falar, mas quando abri a sala de reuniões Célio estava presente, como um rei. Sorri timidamente, mas foi de felicidade. Parecia que um peso tinha saído das minhas costas naquele instante. Após isso, ele conduziu a reunião, enquanto fiz anotações e o contrato foi assinado. Recebi elogios e fiquei muito feliz. No final, o primeiro dia de trabalho não foi ruim, mas a arrogância do senhor Célio foi horrível. Me sentei na frente do computador e comecei a trabalhar entre atender um telefonema e outro, inclusive não parei nem para tomar água. Eduardo foi até a sala do chefe e, no horário do almoço, Célio saiu da sua sala parecendo um príncipe sem falar nada. Como a vida de secretária e assistente desse homem é horrível! Saí para almoçar e quando voltei vi o tanto de planilhas para organizar, mas fui informada que serei contratada e vibrei de felicidade por isso. Sentada na frente do computador, com meus óculos de grau, recomecei meu trabalho, dando o melhor de mim. As horas se passam e estava tão focada trabalhando que nem vi o chefe voltar para a empresa. É quando sinto que estou sendo observada e ao levantar a cabeça devagar, noto que seus olhos estão sobre mim, analisando-me. — Enviei documentos para o e-mail, imprima e leve-os para mim. Rápido. — Sim, senhor. — É a única palavra que sai da minha boca. Célio segue para o seu escritório, olho para o relógio e vejo que já é noite. Está quase na hora de ir embora. Levo os benditos documentos até a ele, bem organizados, que confere um a um. Fico feliz que ele não faça nenhuma reclamação. — Senhorita Luna, irá trabalhar como minha secretária e assistente de hoje em diante. — Mas, senhor Célio. — Quero questioná-lo sobre a alta carga de trabalho. — Não tem mais, senhorita Luna. Na hora que eu precisar de você, terá que vir ao meu encontro, o que inclui viagens e reuniões. Ah, o salário será ótimo. — Sim, senhor Célio. — Não contesto, lembrando-me da minha Elisa. Tudo é por ela. — Deseja mais alguma coisa? — pergunto. — Ele responde que não e saio. Estou exausta, imaginando que ainda tenho que ir para casa a essa hora. Passou o dia todo e ele sequer me agradeceu por tê-lo ajudado hoje pela manhã. Ele foi incapaz de agradecer tudo o que fiz.Após a reunião, tentei me concentrar no trabalho, respondi e-mails e notei que a minha mesa estava bem arrumada, a agenda organizada. Olhei meus compromissos um a um, atendi alguns telefones, fiz algumas ligações e o investimento de hoje foi xeque-mate. Mas as palavras do Eduardo voltavam à mente. “Para que tanto estresse se contratei um anjo para te salvar? Devemos bater palmas para Luna, pois se não fosse por ela, você perderia milhões.” A verdade é que se não fosse pela Luna, eu estaria ferrado. Sei que deveria agradecê-la, mas sou orgulhoso demais para me rebaixar a uma assistente que mal chegou. Saí para almoçar, sem falar com ninguém, e quando cheguei ao restaurante encontrei uma antiga amiga, Ivana, que veio rebolando em minha direção com o seu salto alto, assim que me viu. — Como vai, Célio? Qual é o segredo para tanta beleza? Está um gato como sempre — ela falou no meu ouvido pensando que ainda me causava arrepios. — Estou muito bem! Você também está maravilhosa, me
Após sair da empresa, faço o mesmo trajeto de antes, só que agora pela noite e chego em casa muito cansada. Entro na cozinha e vejo um recado deixado pela minha tia avisando que saiu com Elisa. Aproveito o momento para ir ao banheiro e tomar um belo banho. Ao sair me olho no espelho e meu semblante cansado diz o quanto foi duro o meu dia. Pergunto a mim mesmo se conseguirei permanecer trabalhando naquele local, pois já vi o quanto o doutor Célio é difícil e bipolar. Mas me lembro do salário e planos não me faltam para esse dinheiro, como me mudar para uma casa maior. Ouço baterem à porta e já imaginando que seja a minha flor que chegou. — É você, tia? Pode entrar. — Sim, minha filha. Olha, Elisa, sua mãe já está em casa. Como foi no trabalho? — Estou aprendendo bastante, é difícil, mas me saí muito bem. Tia, quando receber o meu primeiro salário, quero alugar uma casa maior, num bairro melhor... Talvez, assim eu consiga logo a guarda da Elisa. — Filha, você sabe que a avó da
Ficar sozinho é a melhor coisa, mas o único amigo que tenho do meu lado só vem à minha casa para me tirar a paciência. Já não bastava o tanto de problemas que tenho, ele veio insinuar que estou interessado na Luna. Era só o que me faltava! Mulheres, como ela, parecem ser inocentes, despertando assim a nossa atenção, mas nada que seja paixão. Luna, então, não tem nada a ver comigo. No fim, tirei da cabeça a mentira que Eduardo inventou e fui tentar dormir. Na manhã seguinte, levantei-me mais cedo do que o habitual e fui diretamente para a empresa antes de todos. Entrei na minha sala de descanso, que fica em um anexo no meu escritório e só eu tenho acesso a ela. Quer dizer, o rapaz da limpeza também tem. Após pegar uns documentos para analisar, percebi que Luna entrou no meu escritório e está organizando a minha mesa enquanto cantarola, parecendo estar muito feliz. Sai devagar do quarto e fiquei observando a sua dedicação. Vi quando ela deu passos para trás, observando se estav
Se Célio não fosse tão perfeccionista até com o seu cabelo, diria que ele está me testando, pois é trabalho por cima de trabalho e isso está me deixando quase sem tempo de cuidar da minha filha. Mas a gratificação é maravilhosa e não posso dizer não a ele. Por isso, quando fui convidada por Célio para trabalhar na sua casa logo a noite, foi algo que eu não esperava, mas fingi naturalidade em tudo, imaginando mil e uma coisas. Porém, ao chegar à sua casa foi um sonho ao ver o jardim perfeito. Acompanhei o senhor Célio que deve ser bipolar. Ele nunca sorri e muito menos sei decifrar o que está sentindo. Meu chefe foi entrando na imensidão da casa luxuosa, até entrarmos no escritório que é bem maior do que o da empresa. Ele saiu me deixando sozinha, enquanto olhava o porta-retratos, que com certeza, se tratava de sua família. Confesso que tenho muita vontade de saber um pouco da sua vida, mas ele tem um bloqueio que me impede de ao menos perguntar se está se sentindo bem. Trab
Estava me arrumando no quarto, quando Ilda, minha empregada, bateu na porta. Quando abri, ela veio me perguntar se Carlos, o meu motorista, poderia buscar Luna. Confirmei que sim, pois não tinha escolha. Eu a tinha convidado, por isso me restava esperar o que ela iria aprontar, já que percebi a sua simplicidade. Ela definitivamente não era uma mulher da sociedade. Vesti o meu smoking, deixei meu cabelo bem alinhado, escolhi o relógio mais valioso que tinha e coloquei no braço. Em seguida, me perfumei e quando desci tomei uma dose de uísque com gelo. Passaram-se alguns minutos até que finalmente Carlos chegou e fui até o carro. Ele abriu a porta do carro para mim, sentei-me do lado de Luna que olhei ela rápido de cima a baixo. Luna estava linda com o vestido decotado, que revelava demais os seus seios, mas não queria que ela percebesse que estava a admirando. Ela me desejou uma boa noite, mas não respondi, já que não poderia criar laços de amizade. Por mais que Luna pensasse o pio
Célio estava completamente raivoso e não sei explicar o motivo de tanto ódio no seu coração. Depois da noite de hoje, percebi que ele não gosta de mim, e se arrependeu de ter me levado como sua acompanhante. Durante o caminho para casa, segurei o troféu que ele não quis saber e ainda dói as palavras que proferiu contra mim. As lágrimas descem e enxugo uma a uma. — Chegamos, senhorita! — Obrigada, Carlos. Tenha uma ótima noite. — Igualmente, senhorita. Desço do carro agradecendo, e ele vai embora quando entro na minha casa. Vou imediatamente ver a minha pequena Elisa que dorme como um anjo no seu quarto, já minha tia dorme na sua cama, ao lado do berço. Elas não sabem o inferno que estou passando, já que quero muito poupá-las de todo o sofrimento do mundo. Ao chegar no meu quarto, choro copiosamente sentada no chão, onde me permito derramar toda lágrima que segurei durante a festa. *** Acordo bem cedo com o barulho da Elisa, que já está acordada. Me levanto, vou até o s
Dormir foi quase impossível depois da noite de ontem, em que pensei em Luna. Além de ser minha secretária, sinto que ela quer se aproximar de mim, para talvez tentar entender o mundo estressado em que vivo. Mas o meu lado frio não deixa. Ao acordar vou para a academia da minha casa, onde extravaso toda a tensão que está sobre os meus ombros. Ao terminar, tomo um banho e visto a minha armadura. É assim que chamo o meu terno. Sigo para o trabalho e ao chegar, vejo Luna com o cabelo trançado e observo que ela é linda. Ao passar do seu lado exijo a sua presença no meu escritório e a primeira coisa que vejo é o troféu numa prateleira. Sorrio ao entrar no escritório devido ao olhar da Luna, que esperava que eu brigasse com ela. Mas não fiz isso. Luna é rápida e pensa em tudo. Falamos somente de trabalho, sobre a minha agenda e ainda tem um almoço de negócios para hoje, que penso em levá-la comigo, mesmo sabendo que não irei precisar dela, só mesmo pela companhia. Assim que ela sa
Célio me viu com Eduardo e se isolou no escritório. Ele quase não me chamou para nada e imagino que talvez não tenha conseguido fechar a negociação ficando triste ou até mesmo estressado. Feliz ele não é. Mesmo ele me maltratando tanto sem razão, não consigo ter ódio dele. Não preciso tocá-lo nem viver sob o mesmo teto que ele para saber que é um homem vazio. Olho para o relógio e já está na hora de ir embora. Vou ao seu escritório e bato levemente à porta. Quando entro, ele está de costas olhando para os carros lá embaixo. — Senhor Célio, já estou indo. Ainda precisará de mim? — Pode ir — ele fala sem ao menos me olhar. Fico preocupada com ele. Será que está se sentindo bem? Vou embora com a cabeça cheia de interrogação, a vinda daquela mulher aqui, se eles dois tem um caso. Durante o caminho para casa, lembro-me dela, Ivana. Ela, sim, é uma mulher com classe e tem o homem que quiser aos seus pés. Talvez os dois tenham brigado, pois Célio estava muito distante. Chegando em