Parada na porta, está Doris, empregada designada para cuidar de Ava.
— Não, claro que não. Você chegou no momento perfeito, Doris. Minha noiva acabou de acordar e precisa de ajuda para tomar banho.
Ao ouvir a palavra “noiva”, vindo da boca de Hector, Doris franze a testa, mas permanece em silêncio. Ela o conhecia muito bem e sabia que o confrontar naquele momento traria complicações para ela mesma.
— Claro, senhor, farei tudo que precisar — diz Doris, lançando um olhar furtivo para Ava na cama, que parece ligeiramente confusa e desorientada. — Olá, senhora. Me chamo Doris e estou cuidando de você desde que chegou — revela, se direcionando à Ava.
Ava somente assente, sem responder nada.
Sentindo que já havia feito um pouco do seu trabalho ali, Hector decide sair, mas antes, olha para sua empregada e comenta:
— Podemos conversar um pouco a sós? — propõe, lançando um olhar mais sério para a empregada, que entende rapidamente.
— Claro, senhor.
Antes de sair do quarto, Hector se vira para Ava e comenta:
— Voltarei mais tarde, querida. Por agora, somente descanse — diz, deixando um beijo casto em sua testa.
Enquanto observa Hector sair do quarto, Ava tenta procurar por respostas, mas a sua mente está cansada demais para se lembrar de alguma coisa.
Do lado de fora do quarto, próximo à porta, Doris se vira para Hector com o olhar cheio de questionamentos.
— O que você está aprontando, Hector? — murmura, com medo de que Ava ouça do outro lado.
— Nada de mais — ele responde, abrindo um sorriso cínico nos lábios.
— Hector, eu te conheço desde quando você nasceu. Por que não levou essa moça para o hospital, ao invés de mantê-la aqui?
— Porque, se ela for para o hospital, a família a encontrará — revela.
— E isso não é o certo? A família dela está desesperada com o desaparecimento dela. Até nos jornais estão falando disso. As buscas estão acontecendo em todas as direções e até já começaram a considerar a possibilidade de que ela tenha sido levada pela correnteza ou os peixes tenham devorado-a após o veículo onde ela estava ter caído no mar.
— Que todos pensem! — ele exclama com desdém. — Eu não me importo com nenhum deles. Por mim, que eles sofram pensando que ela está morta.
Ao notar a expressão sombria no rosto de Hector, Doris fica assustada. Ela nunca o viu daquele jeito.
— Você devia ser mais humano, Hector. Aquela moça já está sofrendo demais por não se lembrar de nada.
— Mais humano? — ele questiona intrigado. — Fui eu quem a salvei. Não tenho culpa do que aconteceu com ela, está bem? Foi o desgraçado do noivo que tentou matá-la, se não fosse por mim, ele teria conseguido.
— Sim, eu sei disso, mas o que você ganha a mantendo aqui?
— Tenho meus próprios planos — revela.
— Hector… — a voz de Doris sai como uma repreensão.
— Ela perdeu a memória, Doris. Não se lembra de nada! Não foi culpa minha. — Interfere.
— Mas isso é um crime — insiste Doris. — Desde quando você se tornou tão ambicioso assim?
— Eu sempre fui — ele rebate. — Se nunca percebeu isso, é porque esse coraçãozinho mole não deixa. O desaparecimento da Ava fará com que as ações da empresa dela caiam e eu vou lucrar muito com isso.
Assustada com o plano ambicioso de Hector, Doris franze a testa. Ele nunca demonstrou compaixão por ninguém, mas aquela situação parecia estar passando dos limites.
— Hector, tenho medo de onde a sua ambição pode te levar. Deixe isso de lado, meu filho. Você é jovem e muito bem-sucedido. O que te falta?
— O seu problema é que você se contenta com pouco — protesta. — O que está em jogo nunca foi o dinheiro. É o prestígio, o respeito. Estou cansado de sempre estar em segundo lugar, eu quero o topo!
— Sua ambição me assusta, meu filho. Desde que sua mãe faleceu, fui eu quem cuidou de você. Você sempre foi um rapaz inteligente, pode muito bem conseguir as coisas do jeito certo.
Enquanto fala, Doris aproxima a sua mão do rosto de Hector e acaricia-o, contudo, aquele carinho o deixa incomodado a ponto de segurar o braço dela e afastá-lo.
— Embora tenha cuidado de mim, lembre-se de uma coisa, Doris. Você não é a minha mãe! — anuncia com frieza. — Não sou mais criança, então pare com essas demonstrações bobas de carinho. Embora eu a considere muito, não vou deixar que influencie em minha vida.
— Tudo bem… — diz ela, abaixando a cabeça um pouco envergonhada. — Às vezes me esqueço de que você já é um homem feito e toma as próprias decisões.
Hector percebe um tom de autopiedade em Doris, o que o deixa impaciente. Ele odiava a demonstração de fraqueza das pessoas.
— Pare de drama e faça o seu trabalho! Cuide da Ava e, caso ela pergunte algo sobre o nosso noivado, somente afirme e convença-a de que é verdade.
— O que fará, quando ela se recuperar?
— Não é da sua conta — anuncia, ríspido.
Mesmo acostumada com aquele tom nas respostas diretas de Hector, Doris insiste:
— Sei que não é da minha conta, mas eu me preocupo — rebate. — Não pude deixar de notar o quanto você estava próximo dela, quando entrei no quarto.
— Aquilo não foi nada, só estávamos conversando — ele explica.
— Precisavam estar tão próximos?
Uma bufada irônica escapa pelas narinas de Hector, que respira fundo para não perder o controle.
Pelo fato de Doris tê-lo criado desde a infância, ele sempre deu a ela liberdade para expressar abertamente suas opiniões como quisesse. Porém, naquele momento, sentia que ela estava ultrapassando os limites.
— Desde quando você se tornou tão enxerida assim? — indaga, cruzando os braços.
— Não estou sendo enxerida, só me preocupo com você e com o que possa fazer.
— Não se preocupe com nada. Sei bem os meus limites.
— Sei que sabe, mas ela é uma moça jovem e bonita, por isso me preocupo — insiste Doris. — Não acha que ela já sofreu o suficiente? — questiona. — Além de ter perdido a memória no acidente, também acabou perdendo o bebê que esperava.
Ao proferir essas palavras, a porta do quarto onde Ava se encontrava é aberta de maneira brusca, revelando-a em pé, com uma expressão visivelmente angustiada.
— O que acabou de dizer? — Ava pergunta. — Eu perdi um bebê? — questiona, com os olhos banhados pela dúvida.
Ver Ava de pé, em frente à porta do quarto, faz Doris ficar estática, sem saber o que fazer.Doris não sabe desde quando ela estava ali e o tanto que escutou daquela conversa.Já não bastava aquela preocupação, Doris olha para o rosto de Hector e vê o olhar sombrio que ele lhe lança, demonstrando que não está nada satisfeito com o que acaba de acontecer.Na intenção de contornar aquilo, Doris caminha até onde Ava está e toca o ombro dela.— Senhorita! Não pode se levantar da cama sem ajuda — diz ela, com a voz trêmula. — Seus ferimentos ainda estão cicatrizando.Ignorando a fala de Doris, Ava caminha com dificuldade em direção a Hector, que a encara com o olhar indecifrável.— O que ela disse é verdade, Hector? — insiste Ava, se aproximando dele. — Eu perdi um bebê nesse acidente?— Fique calma — ele pede. — Não acho que seja uma boa hora para conversarmos sobre isso.— Como não? — Ava indaga, com a voz mais firme. — Mesmo que eu não me lembre de nada, tenho o direito de saber tudo o
No quarto, Doris se aproxima da cama onde Ava está deitada, com os olhos fixos no teto, absorta em seus pensamentos.— Como está se sentindo, Ava? — pergunta, tentando iniciar uma conversa.— Perdida — responde, sem tirar os olhos do teto.— Não se preocupe com isso, logo você estará melhor — a tranquiliza. — Que tal tomar um banho para relaxar um pouco? No banheiro, há uma banheira enorme — revela, com um sorriso tímido. — Vai ser bom para você.Ava reflete sobre aquela sugestão. Seu corpo doía bastante e pensava que a água quente podia ajudá-la a relaxar um pouco.— Você tem razão — concorda, tentando se levantar.Rapidamente, Doris se aproxima e ajuda-a.— Não tente se levantar sozinha novamente — comenta. — Seu corpo está fraco, ainda mais após a curetagem — explica. — Vou pegar a cadeira de rodas.Ao ouvir o que a mulher acaba de dizer, Ava para e a encara com os olhos curiosos.— De quantos meses eu estava grávida? — pergunta.— Eram poucas semanas — revela Doris.Instintivament
Apressada, Doris tira os lençóis da cama de Ava e os troca por lençóis limpos, depois sai do quarto, na intenção de procurar por Hector e contar sobre o novo problema que tinha.Se dirigindo ao escritório, ela bate levemente na porta e, após ouvir a permissão de Hector, entra cautelosamente. Lá dentro, nota que Hector não está sozinho; ao seu lado está Mark Harrison, médico responsável pelo cuidado de Ava e melhor amigo de Hector. Confortada pela presença de Mark, Doris sabe que pode falar livremente.Notando a expressão ansiosa de Doris, Hector apoia os cotovelos sobre a mesa, entrelaça as mãos e a encara, esperando que ela fale.— O que aconteceu, Doris? Não me diga que cometeu mais uma indiscrição? — Hector indaga com uma severidade controlada na voz. Deixando visivelmente claro que não aceitará mais nenhum erro.— Não, Hector, eu não fiz nada — ela responde rapidamente, demonstrando estar ansiosa. — Só que estamos com um problema.— Que tipo de problema? — ele questiona, alterando
Mesmo que não quisesse admitir, as provocações de Hector traziam um efeito hipnotizante em seu corpo. Se ele era o seu noivo, não teria problema algum em deixá-lo tocá-la, não era mesmo? Mas… Por que, em seu subconsciente, sentia que aquilo não era certo? Algo dentro dela dizia que havia algo em Hector que não o tornava cem por cento confiável. Contudo… enquanto os lábios dele tocam a sua pele, ela fecha os olhos e não consegue resistir àquela sensação tão confortável.— Me deixe ficar mais perto de você, Ava — ele pede, deslizando suas mãos pela cintura dela.Ao perceber que está se deixando levar pela atração física, Ava abre os olhos e percebe no que está se metendo.Rapidamente, o empurra e se levanta.O movimento brusco faz o seu corpo sentir um leve desconforto, mas ela disfarça bem.— Acho que devemos ir com mais calma — ela diz. — Ainda estou fraca e o médico me disse que o meu corpo está muito debilitado.— Sei disso, Ava, mas isso não impede que eu fique mais perto de você.
Constrangida por aquela situação, Ava pega o álbum, mas não o abre de imediato.Ela sente que deve um pedido de desculpas por sua desconfiança, mas não sabe como fazer.— Obrigado por trazer, amigo, eu estava justamente indo buscar — Hector diz com um leve sorriso de gratidão.Antes de sair do quarto, Mark sente a tensão no ar e decide sondar um pouco mais.— Aconteceu alguma coisa aqui? — ele pergunta, notando o clima pesado.— Nada além do esperado — Hector responde rapidamente, visivelmente irritado. — Ava não se lembra de mim, e ela desconfia de tudo que digo.— Não é exatamente isso — Ava interrompe, querendo esclarecer sua posição. — Eu só disse a ele que estou confusa sobre tudo isso.— Entendo ambos os lados — Mark intervém, tentando mediar a situação com sua voz calma. — Como médico, vou pedir que vocês tenham paciência. A amnésia da Ava não afeta só ela, mas todos ao redor. É crucial que aprendam a conversar de forma mais tranquila. Digamos que digerir essas informações já é
Sem entender por que Hector resolveu falar sobre aquele assunto, Ava levanta a cabeça e encara os olhos dele. De repente, nota uma mudança sútil; o olhar dele não está mais tão frio como estava mais cedo. Tem algo lá, uma profundidade meio sentimental que não havia notado antes.Suavemente, ela se afasta e o segura pela mão, conduzindo-o até o lugar onde havia deixado o álbum.— Vi as fotos que tiramos juntos, e mesmo não lembrando de nada, sinto que tudo o que vivemos foi muito lindo e sincero — ela diz, enquanto um sorriso tímido ilumina seu rosto.Hector permanece em silêncio, engolindo em seco. A sinceridade de Ava e o peso de suas próprias ações fazem com que a mentira que ele mesmo sustentou se torne cada vez mais difícil de manter.— Me conte mais sobre essas fotos — ela pede, abrindo o álbum com entusiasmo.Enquanto Ava folheia o álbum, Hector observa as imagens editadas pelo especialista em IA. O trabalho é impecável, cada foto foi perfeitamente manipulada para mostrar uma re
Na cama, Ava se revira, incapaz de pegar no sono. A cena de Hector saindo apressado do quarto, como se estivesse escapando de algo, continua a ecoar em sua mente, perturbando-a. Ela realmente não queria que ele fosse embora, não após ter visto nas fotos o quanto eles pareciam felizes juntos.Ela desejava poder passar a noite inteira conversando com ele, descobrindo como se conheceram, como foi a primeira conversa, o primeiro beijo. Quem havia tomado a iniciativa primeiro? Tudo ainda parecia tão novo e, ao mesmo tempo, provocava uma agitação interna que ela não conseguia acalmar.Doris havia passado no quarto mais cedo para ajustar sua medicação e depois mencionou que estaria na cozinha caso ela precisasse de algo.Frustrada pela insônia e impulsionada por uma curiosidade crescente, Ava decide se levantar e explorar a casa. Desde que despertou do coma induzido, ela se limitou a ficar somente no quarto e sentia que conhecer outros espaços poderia, quem sabe, ajudar a desencadear alguma
— Ava, me responde! O que você está fazendo aqui? — Hector pergunta com uma voz grave que ecoa pelo cômodo um pouco mais alto do que deveria.Sua surpresa é óbvia e Ava nota um traço de pânico em seus olhos.— Por que você desligou a TV assim que me viu? — Ela indaga, cruzando os braços, sentindo que algo não está certo.— Ah, eu desliguei porque te vi entrando… — Hector começa, claramente lutando para encontrar uma desculpa plausível.— Então liga de novo, por favor? — Ela pede, movendo um passo em direção a ele, demonstrando estar curiosa. — Quero ver o que estava passando, e especialmente, também quero saber sobre aquele homem que estava chorando na tela.— Não, eu não posso fazer isso — Hector responde rapidamente, enquanto a expressão no seu rosto se endurece.— Por que não? — Ava desafia, sentindo sua frustração nascer. — Por que você não quer que eu veja?— Porque isso não é bom para você — ele solta, tentando mascarar a verdadeira preocupação.Antes de continuar, ele faz uma p