6: Mentiras e mentiras

No quarto, Doris se aproxima da cama onde Ava está deitada, com os olhos fixos no teto, absorta em seus pensamentos.

— Como está se sentindo, Ava? — pergunta, tentando iniciar uma conversa.

— Perdida — responde, sem tirar os olhos do teto.

— Não se preocupe com isso, logo você estará melhor — a tranquiliza. — Que tal tomar um banho para relaxar um pouco? No banheiro, há uma banheira enorme — revela, com um sorriso tímido. — Vai ser bom para você.

Ava reflete sobre aquela sugestão. Seu corpo doía bastante e pensava que a água quente podia ajudá-la a relaxar um pouco.

— Você tem razão — concorda, tentando se levantar.

Rapidamente, Doris se aproxima e ajuda-a.

— Não tente se levantar sozinha novamente — comenta. — Seu corpo está fraco, ainda mais após a curetagem — explica. — Vou pegar a cadeira de rodas.

Ao ouvir o que a mulher acaba de dizer, Ava para e a encara com os olhos curiosos.

— De quantos meses eu estava grávida? — pergunta.

— Eram poucas semanas — revela Doris.

Instintivamente, Ava toca a barriga e, quando se dá conta, uma lágrima solitária escorre pelo seu rosto.

— Eu não me lembro de nada, mas sinto que queria muito esse bebê — comenta, tentando conter o choro que ameaça vir.

— Não pense nisso, minha querida. Lembre-se de que você é jovem e pode muito bem engravidar novamente — diz Doris, auxiliando-a a se sentar na cadeira de rodas que havia pegado no canto do quarto.

Com cautela, Doris a conduz até o banheiro e começa a encher a banheira. Enquanto a água corre, auxilia Ava a se despir. Já quase sem roupas, Ava se levanta com certa dificuldade e caminha até o espelho. O reflexo que a encara de volta a deixa atônita. Seu rosto está visivelmente inchado, com marcas roxas ao redor dos olhos, e seu corpo revela uma série de arranhões e hematomas espalhados. O choque da imagem refletida intensifica sua respiração, enquanto tenta absorver a extensão dos ferimentos que seu corpo sofreu.

Ela queria saber como havia sofrido aquele acidente, queria saber como Hector a resgatou. Havia tantas perguntas em sua mente e nenhuma delas tinha resposta.

Quando a banheira enche, Doris a ajuda entrar nela. O contato com a água quente ameniza a dor que sente no corpo e, por alguns minutos, permite-se fechar os olhos e relaxar.

Doris ajusta as cortinas do banheiro cuidadosamente enquanto Ava chama sua atenção com uma voz suave.

— Doris, pode me falar um pouco sobre o meu relacionamento com o Hector?

A empregada sente um aperto no estômago, numa mistura de medo e lealdade. Enquanto nota que Ava observa-a com os olhos curiosos, Doris sente pena dela e do que lhe aconteceu. Queria lhe contar a verdade sobre tudo, mas a lealdade que tinha em relação a Hector a impedia. Sempre detestou mentiras, mas quando se tratava de proteger e ajudar Hector Moreau, quem criou desde bebê, estava disposta a fazer qualquer coisa, inclusive comprometer seus próprios princípios. Para ela, o bem-estar dele justificava essa difícil escolha.

— O senhor Hector sempre foi muito atencioso com a senhora. Ele realmente a ama muito.

Ava olha para ela, esperando mais do que palavras genéricas.

— Mas como éramos, Doris? Em relação à vida diária.

Sentindo um suor frio formar-se em sua testa, Doris luta internamente entre a verdade e a fidelidade a Hector.

— Vocês são um casal normal — responde. — Hector faz tudo para vê-la feliz. Ele é um homem muito dedicado. E a senhora… a senhora é muito apaixonada por ele.

Ava ainda parece insatisfeita, as palavras de Doris não preenchem os vazios de sua memória.

— Nós brigamos? Como lidamos com desavenças?

A respiração de Doris torna-se mais pesada. Ela sabe que qualquer deslize pode levantar suspeitas.

— Toda relação tem seus momentos, mas nada que não se resolva com um pouco de conversa. O amor sempre prevalece, senhora.

A resposta parece ensaiada, até para Doris, que começa a se sentir cada vez mais nervosa sob a pressão de Ava.

— Você poderia ser mais objetiva? — pede Ava. — Com todo o respeito, as suas respostas são vagas demais para mim.

— O que quer que eu diga? — questiona Doris, sentindo-se inquieta. — Sou somente uma empregada que não sabe sobre a vida particular dos patrões.

A curiosidade de Ava era nítida, refletindo-se em cada palavra cuidadosamente escolhida, mas ela entendia que Doris podia não saber muita coisa.

— Tudo bem… mas me diz uma coisa. Por quanto tempo eu e o Hector somos noivos?

Doris sente um nó se formar em sua garganta a cada pergunta que Ava proferia.

— Há bastante tempo — responde, tentando manter a voz estável.

— Mas quanto tempo exatamente?

— Eu… eu não sei ao certo — Doris gagueja, a pressão das perguntas a faz desviar o olhar. — Que tal a senhora aproveitar para relaxar no banho agora? Pode deixar essas perguntas para quando o senhor Hector chegar.

A sugestão de Doris alimenta um tom de urgência. Ela queria sair dali e fugir de todas aquelas mentiras.

— Para onde ele foi? — pergunta Ava.

— Eu não sei. Possivelmente foi resolver algo importante no escritório.

— Qual é a profissão do Hector?

— Ele é o CEO de uma grande empresa.

— Que tipo de empresa? — questiona, tentando se lembrar de algo, mas não consegue.

— Uma imobiliária — explica. — Ele é um homem muito importante. A senhora tem sorte de ter um noivo como ele.

— Queria me lembrar dele… mas para mim, o Hector não passa de um estranho. — murmura.

— Vou aproveitar enquanto você está aqui, para arrumar o quarto — diz Doris, querendo fugir de todas aquelas perguntas.

Mas, quando está prestes a sair, Doris escuta a voz de Ava, dizendo:

— Você poderia trazer algumas fotos minhas e do Hector? Talvez elas auxiliem a me lembrar de algo.

A pergunta a deixa surpresa, mas ela responde com naturalidade:

— Claro, senhora. Farei isso agora mesmo — diz, quase aliviada por ter uma desculpa para sair daquele ambiente cheio de mentiras.

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