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Rio de Janeiro - Brasil, 1991*****Terminada a inspeção, Mark decidiu permanecer mais um pouco no Brasil. Assim se encaminhou até a cabine de Anytha e Alanis.
— Com licença! Me desculpe incomodar outra vez, mas gostaria de saber se você poderia me indicar um bom hotel para que eu possa passar a noite? — Mark perguntou para Anytha enquanto Alanis ouvia. — Conhece algum?— Está me achando com cara de guia turística, né? — Anytha sorriu e respondeu em português. — Quem sabe?— Ah, não faça isso! — Mark comentou, meio atrapalhado. — Só vim pedir auxílio, porque conhece bem minha língua!— Obrigada! É um prazer conhecer sua língua! — Anytha se abaixou, mexendo numa gaveta, continuando a seguir. — Está aqui! O mapa da capital! Está em inglês também e vou marcar um hotel próximo! Aí, você procura!Alanis olhava ambos calada. Não sabia o motivo, mas pressentia aquilo que Mark queria de verdade.— Não, não! Você não entendeu! — Mark procurou medir um esforço para ponderar. — É que vou permanecer pouquíssimo tempo no Brasil e preciso de alguém para gentilmente me fazer companhia! Só que até agora conheço vocês apenas!Anytha sorriu pensativa. Seria um estranho, mas estava sozinho num país estrangeiro.— Está bem! Se sente e espere mais uns minutos! — Anytha cedeu, meia ressabiada. — Quer café?— Sim! Se sente enquanto Anytha traz café, por favor! — Alanis indicou uma cadeira. — Fique à vontade!— Obrigado... — Mark se sentou e depois de uns instantes, já estava saboreando a tão comentada bebida brasileira. — É muito bom esse café...Como já estavam no final de seu plantão, meia hora depois, caminhavam pela praia. Mark começou contando sobre sua profissão e que não se sentia muito seguro.— Ora, por quê? — Anytha encarou-o, bem curiosa. — Alguma dificuldade? Precisa de auxílio?— Sim! Por que está com essa sensação? — Alanis quis saber também. — Está acontecendo algo errado?— Existem coisas tão complexas, que às vezes, eu temo muito! — Mark desviou seu olhar para o mar, desconversando. — Eu temo bastante! Devo confessar!— Teme? E por comentar isso, o que aconteceu hoje à tarde realmente? — Anytha indagou. — Soube que o mar estava bom e que não havia nenhum problema com seu barco!— Nada! É que quando estou de serviço, trabalho em terra geralmente! — Mark disfarçou sua voz depressa, tentando se explicar. — Eu queria mesmo era parar, pois a viagem estava se tornando longa e cansativa! E como viu, estava sozinho!— Mas sua missão era aqui mesmo? — Anytha questionou estranhando. — Tem certeza?— Não... — Mark baixou sua cabeça e Anytha escolheu cessar sua curiosidade. — Como disse a você, vou passar pouco tempo no Brasil, já que meu itinerário é outro...Por fim, deram carona para Mark num velho fusca branco que possuíam. Chegaram a um hotel barato chamado Venezia e Alanis pegou um táxi para avisar aos pais que Anytha tinha levado Mark para o local onde se hospedaria, deixando o carro com ambos. Só estranhou o caso de Mark haver selecionado permanecer num hotel tão simples. Anytha fez menção de ir embora assim que chegou lá, mas Mark implorou para que permanecesse e jantassem juntos. Como não tinha compromisso, Anytha resolveu aceitar o convite e esperá-lo no restaurante do hotel Venezia. Meia hora depois, Mark entrou no restaurante, com um ar ansioso, procurando por Anytha, que sentada à mesa ao fundo, sinalizou. Anytha analisou-o bem. Era um homem charmoso. E por que não dizer, muito bonito também? Sorriu, com seu cavalheirismo tão peculiar de inglês. Já fazia tanto tempo que não saía com alguém. Tanto, que se sentiu suspirando.— Você e Alanis moram sozinhas? — Mark perguntou assim que fizeram os pedidos. — Parecem tão solitárias!— Sim! Nossos pais moram num bairro próximo da capital do Rio de Janeiro! — Anytha respondeu, estranhando o tom "solitárias". — Por que da pergunta?— Já pensou em morar noutro país? — Mark perguntou de novo como quem não queria nada. — Gostaria disso?— Sim! — Anytha sorriu com satisfação. — Nos Estados Unidos! Meu maior sonho de consumo!— E na França? — Mark se endireitou na cadeira e continuou. — Ou na Inglaterra?— Ainda não, mas gosto muito dos costumes de lá! — Anytha deu uma garfada na macarronada antes de levar à boca. — E essa interrogação toda?Mark ficou analisando-a em silêncio por alguns momentos. Então, num fio de voz, pronunciou tentando parecer firme.— Preciso de uma esposa! — Mark declarou sutilmente, indagando a seguir. — Quer ser minha mulher? O que acha?Anytha piscou três vezes apenas, antes de começar a rir. Mark, com suavidade, continuou prontamente, alisando sua mão.— Entenda! Preciso de uma companheira! — Mark ficou acariciando sua mão, tentando tocar seu coração. — E você, me parece perfeita!Anytha imaginou ter ouvido coisas. Não queria pensar em compromisso tão cedo, desde que... Ou melhor, nem queria completar o pensamento.— Sinto muito não poder auxiliá-lo! — Anytha preferiu dar um gole no vinho, respondendo calmamente e puxando sua mão, por fim. — Porém, não estou à sua disposição tanto assim!— Escute Anytha! Por favor, não me interprete mal! — Mark se desesperou. — Mas há alguém ou alguma coisa que impeça-a de sair do país?Anytha continuou perplexa até que Mark resolveu explicar seus reais motivos. Aos poucos, Anytha se deixou levar pelo seu carisma. Afinal, a proposta interessou muito à sua pessoa. Conhecer outro país e esquecer o passado de vez, seria muito bom. Depois de terminarem o jantar, Anytha pretendia ir embora com seu velho fusca branco, mas Mark insistiu em acompanhá-la e deixou-a na porta de seu apartamento com a proposta de irem para a França, voltando em seguida para o hotel Venezia. Mas por detrás de tudo, havia outra coisa que Mark não revelara a Anytha. Com o casamento, se livraria de seus perseguidores, se fazendo passar por um turista em lua de mel.No dia seguinte, Mark veio procurá-la em seu trabalho. Anytha nem esperava pela sua chegada, mas quando viu-o, se sentiu alegre.— Mark! — quase gritou, se assustando com sua chegada repentina. — Tudo bem?— Olhe só! Quem está aqui! — Alanis estava surpresa, ainda mais quando Anytha contou-lhe da proposta inesperada de Mark. — Como vai?— Olá, garotas! Vim ver minha lancha! — Mark sorriu, deixando as moças encabuladas. — E aproveitei para ver Anytha também!— Se sente aí! — Anytha apontou-lhe uma cadeira. — Mas é só enquanto não recebo nenhum chamado!— Sabia que sua voz me deixou mais contente naquele dia? — notando a cabine, Mark comentou com carinho. — Foi graças a isso que cheguei em terra são e salvo!— É meu trabalho! — Anytha abaixou a cabeça com vergonha. — Não fiz mais do que minha obrigação!— Você é linda! — Mark se levantou e se aproximou naquele espaço tão apertado, com Anytha encarando-o séria. — Pensou no que disse?Alanis olhou ambos. Parecia que Mark nem sabia que tinha outra pessoa na sala, sentindo uma pontada no peito.— Por favor, Mark... Não vou me iludir com suas palavras, já fui muito enganada... — Anytha respondeu. — Contei para Alanis sua proposta, pois não escondo-lhe nada...— Seria por essa desilusão que resolveu trabalhar aqui? — Mark se afastou, sem propensão, continuando o assunto. — Me conte tudo!— Mais ou menos! — Anytha suspirou. — Não gostaria de conversar isso! Por favor, chega!— Olhe, o passado passou e eu preciso de você! — Mark preferia encerrar o assunto, mas pegou em sua mão de modo insistente, para depois perceber Alanis como uma mera telespectadora, só que aparentou nada notar. — O que acha do que prometi até agora?— Mark, eu não conheço você direito... — Anytha tentou retirar sua mão e Mark segurou mais forte. — Por favor...— Confie em mim! Vai dar tudo certo! — Mark ainda persistia. — Me diga que sim? Hein?— Você está me pressionando... — Anytha se levantou impaciente, puxando sua mão finalmente. — As coisas não são bem assim...— Não gosta de mim! Eu sei! — Mark compreendia aquilo. — Mas eu preciso de uma companheira! Apenas isso!— Eu preciso pensar! — Anytha mal acreditou em suas próprias palavras, mordendo um lábio e respondendo-lhe sem encará-lo. — Tem Alanis também! Não quer propor-lhe esse casamento?— Anytha, me tire fora dessa! — Alanis bufou, indo para o fundo da sala, mas engolindo em seco pela perda da oportunidade. — Isso é problema de vocês dois!— Você têm três dias... — Mark disse, beijando-lhe as mãos e indo embora. — Até mais tarde...Ao sair, Mark deixou Anytha preocupada. Estava dando esperanças a alguém que pensava não possuir chance alguma de ser feliz. Precisava esquecer o passado, tinha sido desprezada uma vez, mas agora poderia ser útil à outra pessoa. Quem sabe, amar de novo? Desde que Murillo deixou-a, se sentia frustrada acerca dos homens, pois já se passaram quase dois anos. Se lembrou com lágrimas da promessa de que Murillo voltaria e se sentia uma tola agora, esperando todo esse tempo. Murillo sumiu, depois de tudo. Até então, Anytha não entendia como um amor que parecia eterno, acabou daquele modo. Mas desconfiava de Eduardo, que perdeu sua vez para Murillo e nunca se conformara em ter sido trocado. Como moravam no mesmo bairro em Nova Iguaçu e Murillo morava na capital do Rio de Janeiro, havia sempre uma insegurança por parte de seu grande amor com relação à Eduardo. Sendo assim, sem nenhuma explicação lógica, saiu da vida de Anytha, alegando apenas negócios. Sem notícias, Anytha decidiu se afastar de vez. Tudo isso fazia parte de um passado doloroso e sem futuro, que nesse momento poderia acabar definitivamente, se resolvesse ir para França com Mark. Quando começou a pensar nessa possibilidade, recebeu um chamado e teve que deixar para mais tarde.*****Rio de Janeiro - Brasil, 1991*****Os três dias marcados por Mark foram preenchidos com passeios e muita diversão. Todas as noites, Mark vinha pegá-la para jantar e dançar nas mais badaladas discotecas do Rio de Janeiro. Até Alanis acompanhava-os, aproveitando a companhia de Mark também, mas algo dentro de si mesma estava crescendo em atenção por aquele homem, mesmo tendo sonhos em que passeavam por vários lugares. Mark era alegre e cavalheiro. Além do mais, havia uma intimidade única entre os três, que seria o idioma inglês. Mark não conversava e nem entendia nada de português. Assim todos se divertiam muito, mas Anytha e Alanis começaram a notar um comportamento meio estranho em Mark, que quando se via rodeado de pessoas, parecia cismado, tenso, não estando seguro. E numa noite, Mark foi buscar Anytha mais uma vez, com Alanis rode
*****Rio de Janeiro - Brasil, 1991*****Eram umas sete e meia da manhã quando Anytha acordou e tratou de tomar seu desjejum, pensando no pedido de Mark. "Como esconderia o verdadeiro motivo dos dois irem à França para seus pais?", pensou aturdida. Tinha conversado com Alanis e não chegaram à nenhuma conclusão, mas terminou dizendo-lhe para aceitar o pedido, porque com isso, seria uma chance de esquecer a dor que Murillo causou-lhe. E assim Anytha ligou para sua mãe Marina e avisou que iria com Alanis até Nova Iguaçu para visitá-los. Aquele bairro trazia-lhe muitas lembranças, boas e ruins, só que teria que de alguma maneira se despedir de vez daquele lugar, pois afinal de contas, seus pais moravam lá. Quando desligou o telefone, sentiu uma ansiedade tomar conta, querendo expor tudo à sua mãe Marina, talvez para que entendesse sua decisão. E
*****Rio de Janeiro - Brasil, 1991*****Um dia antes da data do casamento no Consulado Britânico do Rio de Janeiro, apesar de animada, Anytha daria seu último plantão e a primeira chamada que recebeu, deixou-a apreensiva. Conhecia o navio brasileiro que acabara de ancorar. Era o navio que Eduardo, onde seu ex-namorado, viajava. Alanis notou algo estranho em seu olhar e pediu que tivesse muita calma, pois não podia se impacientar, já que afinal de contas, estaria casada no dia seguinte. Mesmo chateada com a ideia de se encontrar com Eduardo, assumiu sua função, dando boas-vindas aos tripulantes. Após desligar seu transmissor, permaneceu examinando pela janela da cabine os marinheiros que desciam do navio com aquela farda branca. Avistou Eduardo, que se aproximava cada vez mais. Alanis continuou do lado, segurando sua mão em apoio, com Anytha sentindo até firmeza pela quentura do toqu
*****Rio de Janeiro - Brasil, 1991*****Já pela manhã, Anytha percebeu que Mark não estava mais na cama. Se levantou e viu um bilhete escrito em francês."Fui comprar as passagens e volto em breve, Madame Anytha.Um beijo do seu Mark".Anytha tratou de arrumar suas malas e dar uma vistoria no apartamento. Parou um pouco e permaneceu analisando as pessoas pela sacada. Da altura em que se encontrava, pareciam formigas indo para a praia, para aquele mar imenso. Assim sorriu e continuou decidida nas suas tarefas. Sentiria falta do Brasil, mas nem tanto. Quando estava terminando de fechar a última mala, Mark chegou.— Bom Dia, querida! — Mark se aproximou e deu-lhe um beijo no rosto. — Desculpe não ter chamado você, mas trouxe umas coisas para beliscarmos na viagem!— Que horas é o voo? — Anytha se sentiu meia ansiosa. — Estou muito animada c
*****Paris - França, 1991*****Ao chegarem no centro de Paris, na França, Anytha e Mark desembarcaram do avião aninhados. E assim pegaram um táxi direto para o Hotel Ritz. No caminho, Anytha contemplava a cidade pela janela do carro. Tinha que se conformar com a pressa de Mark para chegar logo. Mas quando atingiram seu destino, Mark deixou-a no quarto escolhido e prometendo que voltaria depressa, saiu sem dar maiores explicações. Se sentindo cansada da viagem, Anytha desfez as malas e se deitou. Olhou para o relógio, notando que já eram cinco da tarde. Com isso, aproveitou o friozinho da capital europeia e a cama macia para dar um cochilo. No momento que despertou, com o telefone tocando, descobriu ser o recepcionista. — Madame? Quer que sirvamos seu jantar no quarto? — o recepcionista disse. — O Senhor Mark Wilson deu permissão para perguntar-lhe!— Mar
*****Paris e Giverny - França, 1991*****Quando Anytha despertou, o Sol estava encoberto de nuvens. Já eram mais de sete horas da manhã e Mark ainda não havia chegado. Sentiu uma ponta de preocupação, mas se lembrou da carta e do desabafo com Alanis. Olhou pela janela de seu quarto e viu densas nuvens se aproximarem. Mesmo assim estava resoluta. Se agasalharia e poria a carta no correio. Colocou o casaco de pele sobre o conjunto de lã bege e desceu direto para a rua, nem querendo tomar desjejum. Já fora, vendo o movimento das pessoas na rua, suspirou. Não se sentia bem sozinha, mas adorava caminhar. No dia anterior, Mark havia mostrado-lhe uma agência de correios bem próximo dali. O que Anytha não sabia, seria que Mark estava correndo perigo. Naquela mesma noite, Mark foi se encontrar com um agente, seu amigo da Inglaterra. Juntos, passaram a noite esquematizando como
*****Giverny, França - 1991*****Como a casa já tinha sido faxinada um dia antes, Anytha nem teve o que fazer depois do almoço. Então, resolveu ir deitar quando ouviu um barulho estranho na sala.— Mark! — Anytha olhou tudo aquilo assustada. — O que é isso? O que está fazendo? Mark!Mark estava sentado no chão, junto da porta, com uma furadeira na mão. Anytha teve que se aproximar para ver se Mark estava bem mesmo.— Olá, querida! — Mark desligou a máquina. — O que houve? Algum problema, meu amor?— O que é tudo isso? — Anytha olhou aquela bagunça, sem compreender nada. — O que está acontecendo aqui?— Ah! — Mark colocou a mão na testa, tirando uma gota de suor. — Estou colocando umas trancas para o nosso bem!— Não sabia que aqui era t&atil
*****Rio de Janeiro, Brasil - 1991*****E num escritório do Rio de Janeiro, alguém tinha planos para mudar a vida de Anytha, onde quer que estivesse.— Tem certeza de que quer isso realmente, Murillo? — o homem que estava à sua frente coçou o queixo. — Não mudará de opinião?— Claro, Carlos! — respondeu, cheio de animação. — Você lembra daquelas promessas todas? Eu disse à Anytha que voltaria!— E não voltou... — Carlos continuou incrédulo. — E parece que nunca voltaria, pelo tempo que passou…— Tudo bem! — Murillo se sentou na cadeira, em frente à sua mesa. — Me atrasei, apenas isso! Eu amo aquela garota! Não tem solução! Nunca consegui esquecê-la! Estava dando um tempo para mim mesmo! Você sabe que eu não queria me c