3. O Jogo Virou

Brenda

Desço os longos degraus da escada flutuante e caminho até a cozinha, pegando uma fruta. Olho em volta daquele gigantesco cômodo, todo revestido com pastilhas de vidro nas cores marfim e branco, sentindo uma certa alegria ao pensar que, muito em breve, tudo isso e muito mais me pertencerá.

Dou uma mordida na suculenta maçã e mastigo tranquilamente, deliciando-me com o sabor adocicado que somente uma fruta de qualidade pode proporcionar. Por um milagre, a casa está silenciosa como há muito tempo não via.

"Será que, enfim, encontraram algo melhor para fazer do que bisbilhotar a vida uns dos outros?"

Penso enquanto abro o refrigerador de inox, pego um iogurte desnatado e o abro calmamente, adicionando algumas granolas retiradas de um pote de cristal disposto no tampo de granito do armário aéreo acima da pia.

Puxo uma banqueta branca junto à ilha e me sento. Vagarosamente, começo a comer o iogurte e, quando estou na última colherada, sinto alguém se aproximar. Um perfume cítrico inconfundível toma conta do ambiente, causando-me náuseas no mesmo instante.

Permaneço imóvel, terminando minha primeira refeição da manhã, mas, quando faço menção de me levantar, sinto uma mão asquerosa segurando meu braço. Olho por cima do ombro, arqueio a sobrancelha e puxo meu braço no mesmo instante, sem dar importância à sua presença nefasta.

Deixo o copo de iogurte vazio sobre a ilha e saio mordendo a maçã, quando ouço aquela voz anasalada e irritante tentando ditar ordens.

— Será que não sabe o que se deve fazer quando terminamos de comer, empregadinha? — diz ela, irônica.

— Claro que sei, minha querida! Deixamos no mesmo lugar para que os verdadeiros empregados limpem. Afinal, essa é a obrigação deles e é para isso que estão sendo pagos. Não é mesmo? — retruco à altura.

— E o que você pensa que é nesta casa, queridinha? Que eu saiba, aquele que te protegia já não está mais entre nós. Ou estou enganada? — a m*****a Carmen diz num tom de superioridade.

— O que sou ou deixo de ser não lhe diz respeito, senhora! Seu falecido pai deixou bem claro no testamento que eu teria todo o direito de continuar morando nesta casa e usufruindo de todo esse conforto como se fosse um membro desta família. Então, gostando ou não, sou considerada também uma Montreal — digo, sarcástica, percebendo o semblante da megera mudar.

— Uma Montreal? — sua voz sai mais alta do que o esperado, e eu sorrio por dentro ao perceber o quanto deixo aquela mulher, que imaginava ser inalcançável, fora do lugar.

Carmen faz uma pausa e, em seguida, continua com sua altivez.

— Não seja ridícula. Pode estar vestida de ouro, mas nunca deixará de ser uma mera empregadinha. Se ainda não te coloquei para fora desta casa, é simplesmente por duas razões: a primeira, por consideração à sua mãe, que é uma mulher inigualável e não tem culpa de ter uma filha ordinária como você. E a segunda, por esse maldito testamento que meu pai, em sua insanidade, ousou te adicionar. Mas Gregório, meu marido, está cuidando disso junto aos nossos advogados e, muito em breve, conseguiremos anular esse testamento alegando falta de lucidez por parte do meu pai. Pois apenas um homem senil colocaria alguém tão imoral no seu próprio testamento — ela diz, de queixo erguido, me olhando com desdém.

— Queridinha, não seja patética, mais do que já é. Aceite que, dessa vez, você não foi a preferida da família e que seu papai preferiu a filha da empregada a você. Desça desse pedestal, porque agora, meu bem, esse lugar, muito em breve, terá uma nova dona — falo, pegando meus óculos.

Novamente, ela segura firme meu pulso, me fazendo perder o equilíbrio e, por pouco, não me levando ao chão.

— Você é uma atrevida e abusada. Infelizmente, esse maldito documento me impede de te expulsar desta casa, mas muito em breve você terá o que realmente merece — sinto meu corpo balançar com a força com que Carmen me segura.

Mas não abaixo a cabeça e a enfrento.

— O que realmente mereço? Tem certeza de que pode me oferecer? Essa mansão, um palácio ou, quem sabe, seu marido? — falo, sarcástica, tentando puxar meu braço, mas ela segura com mais força.

— A SARJETA! CRETINA! — ela responde com fúria, e sinto meu rosto queimar com o tapa que recebo.

— Esse tapa não vai ficar assim. Você vai me pagar onde mais dói, Carmen. — falo, com a mão no rosto, na tentativa de diminuir a ardência do golpe.

— Vou aguardar deitada, porque sentada cansa a minha lombar, querida — ela fala e solta uma gargalhada irônica.

— Vamos ver quem vai rir por último... Você, uma velha acabada e caquética, ou eu... uma jovem linda, gostosa, deliciosa e que deixa qualquer homem louco... Principalmente o seu marido. — falo com deboche.

Novamente, Carmen tenta me agredir, mas seguro seu punho com força e a empurro, encostando seu corpo na coluna de mármore.

— DESCARADA! ORDINÁRIA! COMO PODE FALAR ASSIM DO MEU MARIDO BEM NA MINHA CARA? NÃO OUSE SE APROXIMAR DO GREGÓRIO, SENÃO... — ela grita, mas eu a impeço de continuar.

— Vai fazer o quê? — retruco com altivez. — Você nunca será párea para mim, Carmen. Desista de me enfrentar, saia do meu caminho, e será muito melhor para você — a advirto.

— EU MATO VOCÊ, SUA CACHORRA! — ela torna a gritar. — Te destruo como um animal peçonhento, sem dó ou piedade. Não brinque comigo, Brenda, pois você não me conhece de verdade e não sabe de tudo o que sou capaz para proteger a minha família de tipos como você.

— Ui! Que coisa feia! A senhora Carmen Montreal, uma mulher tão requintada e digna, descendo ao nível da empregadinha? Que feio, dona Carmen! — estalo a boca. — Agora, te advirto que terá que batalhar bastante para que seu filho e seu marido acreditem que sou uma pessoa tão má e perversa quanto a senhora diz. Mas vou logo avisando que será muito trabalhoso, porque para eles e todos os outros nesta casa sou quase uma freira de tão boa menina. E, por essa razão, até providenciaram uma comemoração à altura do meu aniversário. Aliás, tenho que lhe agradecer, meu bem. Realmente, tudo está perfeito do jeito que a filha da empregada aqui merece. Mas, dessa vez, os papéis acabaram se invertendo, pois, enquanto eu me deliciava com seu filho no meu quarto, a senhora trabalhava para que tudo saísse perfeito no meu dia. Vai se acostumando, porque isso acontecerá muitas outras vezes — falo, caminhando para fora da casa. Novamente, ela segura meu braço e me puxa com força.

— Sua desgraçada! O que você estava fazendo com o meu filho? Por sua culpa, Jorge largou a faculdade, o trabalho e, a cada dia, se afunda no vício do álcool, transformando-se em um verdadeiro alcoólatra. Agora há pouco, Alice saiu aos prantos desta casa e não compreendia o motivo. Mas, neste momento, consigo entender tudo. Você é a razão da nossa desgraça. Desde que entrou nesta casa, só tem nos destruído pouco a pouco, e ninguém nunca percebeu isso — ela fala, segurando firme no meu braço. Eu a encaro com fúria.

— Já lhe disse para não me tocar. Será que, além de velha, é surda? Se não me soltar imediatamente, vai se arrepender. — a advirto, trincando o maxilar em fúria.

— O que vai fazer? Me matar? Pois é somente isso o que falta, porque a sua verdadeira face eu conheço desde o dia em que colocou os pés nesta casa e tem cometido uma desgraça atrás da outra — ela fala com altivez.

— Vontade não me falta, senhora, mas jamais sujaria as minhas mãos justamente no dia do meu aniversário. Sei que é isso que a senhora deseja, mas não irei me sujeitar à sua vontade.

Barulho de pisadas próximas à cozinha.

— Tudo bem por aí, senhora? Precisa de alguma ajuda? — João, o mordomo, se aproxima carregando um jarro de flores.

— Não, João! Está tudo bem, pode continuar o seu trabalho. — Carmen fala sem olhar para ele.

— Tudo bem, senhora. Com licença. — João se retira e me olha sorrindo, percebendo tudo o que estava acontecendo.

— E você, empregadinha, é melhor ficar com os olhos bem abertos, pois a sua hora vai chegar. — ela diz, segurando novamente meu braço.

— Já disse para me soltar, ou vai se arrepender, senhora.

— O que pretende fazer, queridinha?

— Vou fazer ISSO... — puxo o meu braço e, com minhas duas mãos, a empurro com força, fazendo-a perder o equilíbrio, caindo sobre o jarro de flores que João havia deixado no chão e batendo a cabeça na quina da mesa de granito da cozinha.

Olho em volta, sentindo uma certa alegria ao notar que, justamente, a pedra que havia no meu salto estava com o corpo completamente imóvel, aparentando ser um cadáver. Sorrio, notando fragmentos de sangue que seu cabelo loiro deixava ainda mais evidentes.

Me agacho bem próxima ao ouvido dela e, sorridente, sussurro, como se pudesse ouvir:

— Isso é só o começo, senhora. A descarada aqui vai triunfar antes mesmo do que imagina. Porém, é uma pena que não esteja viva para presenciar o meu reinado ao lado do meu neném. Ninguém menos do que... o seu marido.

Me levanto, pego os óculos de sol e os coloco sobre o rosto. Transpasso meus pés sobre seu corpo pálido e caminho em direção à saída, onde há acesso à piscina. Mas, antes de sair completamente da mansão, ouço os gritos dos empregados ao se depararem com a patroa caída no chão revestido de taco da cozinha, que parecia um espelho de tão bem lustrado que era.

Sigo meu caminho triunfante, com um leve sorriso nos lábios e na esperança de boas notícias, principalmente de um breve funeral.

Já na área de lazer, retiro minha saia, ficando somente de biquíni, e me sento em uma espreguiçadeira, aproveitando um pouco o sol. Fecho os olhos e ouço a voz baixa de João no meu ouvido, me fazendo sorrir:

— Parabéns, minha rainha! A hora da megera está quase chegando. Esse plano foi perfeito, logo você estará no lugar que lhe pertence e terá tudo o que merece.

João deixa um suco de frutas na mesa ao meu lado e se levanta, seguindo seu caminho. Enquanto isso, permaneço ali, deitada, aproveitando o meu belo dia de aniversário, que, por sinal, está sendo perfeito e saindo muito melhor do que havia planejado.

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