Olivia
— Me conte tudo! — A empolgação na voz d minha irmã é palpável. Isso é aceitável, já que a rigidez da nossa família não nos permite ir a festas e menos ainda a clubes ou danceteria.
— Minha nossa, Kim, o que você quer saber? — retruco achando graça da sua ansiedade e a fito deitada na sua cama de solteiro que fica ao lado da minha.
— Eu quero saber sobre tudo. Você sabe, as luzes, as músicas. Quero que me conte sobre o sabor das bebidas e sobre como é dançar com um homem. Ai Ollie, me conte! Não me esconda nada! — Termino de escovar os meus cabelos e vou imediatamente para a minha cama, para debaixo do cobertor, virando-me no colchão para ficar de frente para ela.
— A boate é exatamente como vimos nos filmes — falo e o seu sorriso se amplia. — Tinha toda aquela fumaça esbranquiçada, as luzes que corriam de um lado para o outro causando uma sensação esquisita na nossa cabeça. As minhas amigas optaram por beber cervejas e nossa, elas são horríveis! — Rimos do meu comentário. — Mas a bebida me deixou mais à vontade, então não reclamei.
— E o estranho, como ele era? — Puxo a respiração e me lembro dos olhos claros sempre intensos e rígidos. Da sua boca que falava palavras firmes mescladas de meiguice e de compreensão, porém, elas eram envolventes demais. Do seu toque sempre possessivo na minha cintura na hora da dança e também nos momentos quentes naquele quarto. E até da maneira como ele respirava perto demais da minha pele.
— Ah, ele era lindo, realmente muito lindo! E era alto, tão alto que eu me sentia minúscula perto dele.
— E ele te não disse o nome? — Fiz não com a cabeça.
— Ninguém disse. Na verdade, eu não sabia nada sobre ele e nem ele sabia nada sobre mim.
— Você é maluca, sabia? — Rio. Talvez eu seja mesmo. Penso. Um leve giro no trinco nos faz apagar as luzes dos abajures e se deitar imediatamente, fingindo estar no décimo sono. Então a luz do corredor invade o nosso quarto e logo a porta se fecha outra vez.
— Quando vai arrumar um emprego? — Kim inquire agora mais baixo e com um tom frustrado.
— Na próxima semana começo a procurar um. — Ela abre outro sorriso, esse esperançoso.
— Tá! Eu te amo, Ollie!
— Também te amo, Kim! Boa noite!
— Boa noite!
Sair de casa para ir atrás de emprego será mais um desafio para mim, pois é incrível como o meu pai exerce grande influência sobre as pessoas aqui do bairro, principalmente os comerciantes. Então, se tiver de arrumar algo que valha a pena terei que procurar fora desse lugar. Mas como farei isso será um problema. Eu preciso encontrar o momento certo para sair de casa e voltar antes que eles percebam a minha ausência em casa. Ou seja, terei poucas horas para me dedicar a procurar um bom emprego e quando conseguir, terei que procurar um lugar para morar. Contudo, o desafio maior virá quando eu realmente conseguir algo para fazer e será nesse momento que comprarei uma briga séria com eles. Inquieta com os meus pensamentos saio da cama e me sento na pequena e envelhecida poltrona perto da janela. Lá fora o bairro ainda está acordado, mas parte do comércio começa a se fechar. Bufo quando penso que apenas a nossa família dorme junto com as galinhas, quando alguns jovens da minha idade fazem coisas de jovens da minha idade. Sem ter muito o que fazer, pego o velho celular que a minha tia Julian me deu escondida dos meus pais antes de partir e decido praticar um pouco de francês.
***
Um mês depois...
Não é possível que o destino queira me maltratar tanto assim, pois estou à beira de um colapso só de pensar em me aventurar por esse bairro em busca de algo que me ajude a conquistar os meus objetivos e por mais que eu implore por uma mísera vaga de emprego, ela me é negada ou me oferecem uma ninharia pelo meu trabalho. Eu não me esforcei por tantos meses, arriscando ser severamente castigada para ser explorada por esse sanguessugas.
— Meu Deus, Ollie, você demorou dessa vez! — Kim reclama nitidamente nervosa assim que entro em casa, mas estou desanimada demais para rebater.
— Eles ainda não chegaram? — Livro-me dos meus sapatos e os seguro com dois dedos. Em resposta ela faz um não para mim.
— Vá para o quarto e troque de roupa antes que eles passem por essa porta.
— Tá, prometo que serei rápida! — digo, porém, antes de correr para as escadas, beijo o seu rosto e lhe agradeço. — Obrigada por me cobrir, sei que ficou sobrecarregada com a minha parte nas tarefas de casa.
— Só, vá se trocar antes que ponha nós duas em apuros.
— Eu te amo! — sibilo e faço o que me pede. Em três dias Kim fará vinte e um anos e se eu realmente conseguir algo que nos garanta um lugar confortável para ficar e o nosso sustento, ela virá morar comigo. Assim que entro no quarto, livro-me das minhas roupas e rapidamente ponho outra mais simples e comportada. Contudo, ao caminhar apressada para a porta a minha cabeça dá um leve giro e eu me apoio em uma parede, puxando lentamente a respiração, sentindo as batidas do meu coração descompassar.
— Por Deus, Ollie, você quer me castigar?! — Kim adentra o quarto completamente esbaforida. Entretanto, o mal-estar parece me absorver e eu corro imediatamente para o banheiro. — O que foi? O que há de errado com você? — Ela inquire vindo atrás de mim. No entanto, não tenho tempo para responder, pois logo me prosto diante do vaso sanitário e simulo um vômito que não vem, a final, estou de estômago vazio. — Você está gelada, Ollie! — Kim parece bem preocupada.
— Eu não entendo o que está acontecendo comigo — digo com um pouco de dificuldade, quando mais uma ânsia vem subindo pela minha garganta.
— Céus, você está doente, irmã? — faço não com a cabeça e respiro fundo algumas vezes, na esperança de que essa agonia passe logo.
— Me ajude a ir para a cama, Kim — peço lhe estendendo a minha mão. Minha irmã, me ajuda a ficar de pé e na sequência, ela envolve a minha cintura e me leva para me deitar um pouco.
— Eu vou chamar a mamãe! — Ela pensa em se afastar, porém, seguro na sua mão e ela me olha aturdida.
— Não precisa, Kim, já está passando.
— Você tem certeza? — Faço um sim, sentando-me no colchão e respiro fundo, sentindo o calor voltar a aquecer o meu corpo gradualmente. Não demora para estarmos descendo as escadas com cuidado para irmos à cozinha, onde mamãe me recebe de cara fechada e o meu pai olha de mim para Kim com um olhar repreensível.
— Por que demoraram tanto? — Ela ruge irritada. Kim balbucia sem saber o que dizer e eu resolvo falar a verdade.
— Me desculpe, mamãe e papai, eu não estava me sentindo bem e a Kim ficou para me ajudar.
— O que você tem, está doente? — Imediatamente a Senhora Martin se levanta da sua cadeira, para levar uma mão a minha testa, verificando a minha temperatura.
— Eu não estou doente, foi só um mal-estar.
— Sente-se, venham tomar café da manhã. E coma bem, Olívia. Quero que fique bem forte, a final, para se casar com um homem como o Edie, você precisa ter forças para agradá-lo. — Praticamente me engasgo com o café quando escuto essa sandice.
— Que história é essa de casamento? — Olho para a minha mãe e depois para o meu pai.
— O Senhor Durand virá nesse final de semana com a sua família aqui em casa para pedir a sua mão, filha.
— Eu não quero! Eu não vou me casar nem com ele e nem com ninguém! — rebato baixo, porém, impulsiva.
— Você não tem de querer, Olívia. O mundo não está fácil e dê-se por feliz por encontrarmos um bom homem para cuidar de você. — Irritada com essa conversa me ponho de pé e fito os dois.
— Eu não preciso que cuidem de mim! — rosno entre dentes.
— Sente-se ai, garota insolente! — Papai ordena quando penso em me retirar e bufando por dentro o obedeço. — Escute bem o que vou lhe dizer, Olívia. Eu sou o seu pai e enquanto viver debaixo do meu teto, você fará tudo como eu bem quiser. E quando a família Duran entrar nessa casa quero que a receba com sorrisos, e que sirva o seu futuro marido com muito amor, entendeu bem?! — Apenas trinco o maxilar e engulo o choro.
— Eu posso ir para o meu quarto agora? — retruco, segurando uma malcriação e ele faz um gesto desdenhoso me liberando. Saio do cômodo com passos largos e corro pelos batentes da escadaria, direto para dentro do meu quarto
Olívia— Não acha que deveria ir a um médico? — Kim pergunta preocupada andando de um lado para o outro. No entanto, não tenho condições de respondê-la, porque a ânsia não me permite. — Que droga Olie, algo está se passando dentro da minha cabeça e eu não estou gostando dos meus pensamentos! — Ela respira alto e profundo, se encostando em uma parede e se arrasta por ela, até sentar-se no chão. — Me diga, quando menstruou pela última vez? ok, essa foi a pergunta do século e sinceramente eu não entendo por que não me atentei a esse detalhe antes. Quer dizer, eu não tenho uma menstruação regulada com dia e hora marcados para descer. No entanto, ela nunca falha. Seja no início, no meio ou no final do mês ela sempre surge, mas não esse mês.— Por Deus, Olívia por que você não exigiu que ele usasse a droga da camisinha?! — Minha irmã ralha sem conter o seu desespero e volta a andar dentro do banheiro, onde continuo prostrada, esperando uma nova onda de ânsia de vômito me acometer.— Estávam
Olivia.— Olivia?! Querida, o que está fazendo aqui? — Pois é, a minha única solução nesse momento foi atravessar a cidade e recorrer a única pessoa que poderia me acolher nesse momento. Tia Ju. A minha reação nesse instante foi de correr para os seus braços de chorar por longos minutos, enquanto ela tentava me acalmar e arrancar de mim tudo que precisava saber, mas era praticamente impossível.— Tome, querida, beba. Isso vai te acalmar. — Ela me estende uma xícara de chá que eu bebo calmamente e logo o meu corpo agitado sente o efeito tranquilizante do líquido morno e adocicado. — Me conte o que aconteceu, Olivia? — Respiro fundo e penso por onde começar toda essa história.— Eu estou grávida, tia.— Santo Deus! — Ela resmunga com um resfolegar.— E o papai me expulsou de casa.— É claro que aquele ogro dos infernos fez isso! — Irritada, ela se levanta do sofá e anda pela sala.— Eu preciso de um lugar para ficar só até conseguir um empreg...— Você ficará comigo essa noite, Olívia.
OlíviaUm ano e meio depois... — Bom dia meus amores, como vocês estão essa manhã? — A voz animada de Victória me faz abrir um sorriso e após encostar-me no espaldar da porta, levo a xícara de café fumegante a boca, a assistindo brincar com os meus filhos durante a troca das fraudas. Eu não podia imaginar que um encontro casual com um estranho fosse mudar a minha vida tão radicalmente assim. Em um ano muita coisa aconteceu na minha vida, porém, a melhor de todas foi trazer Liam e Levi para esse mundo. Contudo, o fato de não conseguir falar com a minha irmã ao longo desses meses está me inquietando muito.— Desse jeito você vai estragá-los — Decido alertar sobre a minha presença no quarto e adentro o cômodo que divido com os meus filhos.— Ora, o que eu posso fazer se eles são uns fofos, não é meus amores? — Ela ralha diretamente para eles me fazendo sorrir e me aproximo do berço, recebendo os sorrisos dos meus bebês.— Mamã. — Levi fala estendendo os seus bracinhos para mim e eu não
Athos— Senhor Mazza, aqui está a tradução do documento que pediu. — Barbara, minha assistente avisa assim que entra na minha sala. Contudo, faço um gesto para ela pedindo-a para esperar um pouco e continuo falando no telefone.— Senhor Eron, essa cláusula não existe no nosso contrato. Você não pode me cobrar, porque não tem esse direito.— Athos, eu exijo uma retratação imediatamente!— Eu não vou me retratar nada, porque o erro não foi meu!— Que droga, Athos!— Eron, faça o seguinte. Peça para o seu advogado lhe explicar detalhadamente essa situação. Eu não tenho tempo para ensinar um leigo idiota como você.— Ora, seu... não ouse...— Já chega, Eron! Se quiser fique à vontade para me processar, mas eu garanto que se fizer isso, posso tirar tudo de você, até mesmo as suas calças se assim desejar. Pense bem, Eron! — bufo irritado e encerro a ligação. E após soltar uma respiração audível fito a minha secretária que me olha um tanto apreensiva. No entanto, pego o papel que acabara de
Olívia — Bom dia, Senhor Mazza!Escuto Barbara dizer para o seu chefe assim que as portas do elevador se abrem. Curiosa, tiro os meus olhos de cima do arquivo e me viro. Quem sabe dessa vez consigo ver a face do meu futuro chefe? Devo dizer que o seu olhar rígido é realmente impactante. A barba cerrada que adorna seu maxilar quadrado faz um contraste exacerbado com o semblante extremamente fechado e as sobrancelhas grossas, e firmes indicam que ele não parece nem um pouco paciente essa manhã. Ou esse seria esse o seu normal? A final os funcionários que estavam trabalhando relaxadamente de repente transformaram-se em robôs e enfiaram as suas caras nas pilhas de papéis sobre suas mesas.— Bom dia! Barbara, pode me trazer um comprimido para dor de cabeça e um pouco de água? — A voz imponente que surgiu logo em seguida, misturou-se a uma voz dentro da minha cabeça....O que você acha de sairmos desse barulho?— Não é possível! — sibilo sentindo o meu coração frear bruscamente dentro do m
AthosAlgumas semanas...— Bom dia, Senhores e me desculpem pelo meu atraso. Eu tive um pequeno inconveniente.— Tudo bem, Mazza! Agora me diga que tem boas notícias para mim?— Ótimas, na verdade — falo com orgulho para Igor Caruso, meu cliente. — A causa já está ganha, então se prepare para receber as suas empresas de volta. Cada uma delas. — O homem abre um sorriso largo e vitorioso.— Eu sabia que você conseguiria!— Eu sempre consigo o que quero, Igor.— E eu nunca duvidei disso, meu advogado. Agora me diga, quando esse tormento se acabará de vez?— Nossa última audiência será em três dias. Depois, virão os tramites legais e você poderá assumir o seu lugar de direito na presidência das indústrias.— Você foi o meu melhor empreendimento, Senhor Mazza!— Só fiz o meu trabalho, Senhor Caruso.— E além de tudo, o homem é modesto. — Meu cliente comenta fazendo a minha pequena equipe rir.— Encerramos por hoje, certo?— Antes, gostaria de convidá-lo para comemorar a minha vitória em um
Olívia— Bom dia, querido Liam! Bom dia, meu pequeno Levi! — falo para os dois bebês sorridentes e sorrio também. — Dormiram bem, hã? A mamãe teve uma péssima noite, mas não fiquem preocupados, isso nunca vai abalar a minha alegria de vê-los assim todas as manhãs.— Mamã!— Sim, meu amor! Está na hora do banho e a tia Anne vai passar por aquela porta em... três, dois, um.— Onde estão os bebês mais lindos desse mundo?— Viram, a mamãe sabe de tudo.— Hora do banho seus fedorentinhos fofinhos e depois, nós vamos papa. A tia Victória já está fazendo uma comida deliciosa para vocês. — Logo eles se agitam com a alegria esfuziante da Anne e enquanto a ajudo, aprecio a animação dos garotos dentro da banheira cheia de água e espuma perfumada.— Prontinho. — Ela diz satisfeita depois de um tempo, fechando o último botão do macacão de Liam, enquanto eu termino de pentear os cabelos finos de Levi. Uma batida leve na porta nos faz olhar na mesma direção e Victória passa por ela. No entanto, espe
Olívia— O que vocês acham, terninho ou macacão? — pergunto para os meus filhos colocando as opções de vestuário na frente do meu corpo. Em resposta, recebo dois sorrisos com poucos dentes miúdos e sorrio. — Terninho então. Hoje é o segundo dia da mamãe na empresa. Até que não é tão ruim. O que acham, cabelos soltos ou presos? — Liam me responde fazendo um barulho engraçado com a boca, mas Levi me olha com curiosidade.— A mamãe está enchendo vocês outra vez? — Victória invade o nosso quarto e os meninos fazem a sua festa para recebê-la. — Na minha opinião você fica linda de cabelos soltos. — Ela pisca um olho para mim e tira os meninos de dentro do berço, saindo do cômodo em seguida.— Cabelos presos então — digo contrariando a sugestão da minha amiga e faço um coque severo atrás da minha cabeça. Dou uma breve olhada no espelho e gosto do que vejo. Minutos depois, jogo meu celular dentro da bolsa, minha carteira e um batom para sair do meu quarto. Com esse novo ritmo, resolvi acordar