Sílvio segurou firmemente o braço de Abelardo, estabilizando-o de forma rápida e precisa. No entanto, Abelardo não demonstrou nenhum agradecimento, sua testa franzida e o olhar de desdém deixavam claro o quanto ele não apreciava a ajuda. Com um movimento brusco, ele afastou a mão de Sílvio, lançando-lhe um olhar duro e reprovador.O rosto de Sílvio escureceu instantaneamente. Ele não conseguia acreditar na falta de gratidão daquele velho teimoso.As mãos de Abelardo, secas e envelhecidas, encontraram o apoio da cadeira de rodas, mas logo se esticaram até alcançar uma bengala com a cabeça de um dragão pendurada ao lado. Com esforço, ele começou a caminhar em direção à entrada da casa. Seus movimentos eram lentos, desajeitados, como se a coordenação entre seu corpo e mente estivesse ausente. A bengala foi colocada primeiro no degrau da escada, enquanto ele, com toda a força que ainda lhe restava, segurava firmemente o apoio e levantava um pé com extrema dificuldade, tentando subi-lo n
Abelardo se lembrava da primeira vez que viu Sílvio, quando ele ainda estava no ensino médio.Foi Giovana quem o apresentou, dizendo que Sílvio era talentoso, mas órfão, com os pais falecidos há muito tempo. Comovido pela história, Abelardo decidiu marcar um encontro.Naquele dia, em pleno inverno, a neve cobria o chão. Sílvio não tinha um casaco grosso para se proteger do frio, vestia apenas uma jaqueta jeans fina, calças pretas e um par de tênis desbotados. Seu rosto estava pálido, quase sem cor, por causa do frio.Mas o olhar de Sílvio era firme, e ele mantinha a postura ereta.Naquele momento, Abelardo soube que aquele garoto não era comum, estava certo de que ele teria um grande futuro.Por isso, desde o momento em que o conheceu, Abelardo começou a financiar sua educação e dar-lhe uma mesada, apoiando-o até que se formasse na universidade.Mais tarde, ele conheceu Lúcia.Lúcia se apaixonou por ele à primeira vista. Para se aproximar, insistiu para que Sílvio se tornasse seu segur
Sílvio levantou a mão para se defender, mas a bengala atingiu em cheio sua palma.Ele sentiu uma dor intensa na mão, seguida de um torpor que o deixou completamente insensível, sem nem mesmo perceber a dor.Mas a raiva de Abelardo não passava. Ele pensava na promessa que aquele desgraçado havia feito de cuidar bem de Lúcia, mas, no fim, a empurrou para a beira do desespero, a ponto de ela escrever uma carta de despedida! E ainda teve a audácia de dizer a Giovana que entre ele e Lúcia, só um poderia sobreviver.Esse desgraçado era um lobo em pele de cordeiro. Se não fosse por Abelardo que pagou os estudos, deu oportunidades e permitiu que ele se casasse com Lúcia... Se não fosse pelo amor cego de Lúcia, que não queria outro homem... Onde esse miserável estaria agora?Abelardo se lembrava das palavras de Giovana: eles já tinham até feito fotos para o álbum de casamento! E ele nem havia se divorciado ainda! Como esse homem ousava exibir seu romance com a amante, como se Abelardo estivesse
No entanto, ele havia se apaixonado pela filha de seu inimigo.Agora, Lúcia estava esperando um filho dele.Sílvio não queria mais odiar, nem buscava vingança.Se pudesse, ele desejaria apenas uma vida simples, como a de qualquer pessoa comum, com sua esposa e filho vivendo felizes.Por isso, mesmo que ele decidisse deixar o passado para trás, na mente de Sílvio, Abelardo ainda lhe devia algo.Sílvio olhou para Abelardo com um olhar afiado, como se quisesse matá-lo inúmeras vezes com aquele olhar penetrante.Ele havia decidido que, depois das festas de fim de ano, levaria Lúcia de volta ao apartamento. Quando o bebê nascesse, eles se separariam de Abelardo.Sílvio providenciaria as melhores babás e empregadas para cuidar de Abelardo e, dali em diante, evitaria vê-lo com frequência.Ele acreditava que, com o nascimento da criança, o ódio que sentia diminuiria, e, finalmente, poderia deixar tudo para trás. Lúcia, por sua vez, voltaria a concentrar seu amor na família, deixando Basílio no
Abelardo viu o esforço desesperado de Sílvio para puxá-lo de volta. O rosto de Sílvio estava tomado por preocupação e ansiedade.Naquele momento, Abelardo realmente acreditou que Sílvio queria que ele vivesse.Mas, se ele não tivesse visto a carta de despedida de Lúcia, se não tivesse ouvido as amargas reclamações de sua esposa, se não tivesse presenciado as lágrimas dela…E se não tivesse encontrado Giovana no café, nem tivesse sido humilhado por ela ao levar um banho de café, se não tivesse escutado da própria Giovana que Sílvio já havia tirado fotos de casamento com ela…Talvez, só talvez, Abelardo teria se emocionado com a atuação de Sílvio naquele instante.— Uuuuuuh! Uuuuuuuh! — Abelardo gritou furioso com Sílvio, suas palavras distorcidas pela raiva.Ele, na verdade, queria dizer que estava entregando sua vida a Sílvio, para que ele parasse de atormentar Lúcia! E também deixasse sua esposa em paz!Sílvio, concentrado em puxar Abelardo de volta para a varanda, mal conseguia prest
No consultório do médico.- Sra. Lúcia, suas células cancerígenas já se espalharam para o fígado. Não há mais o que fazer. Nos dias que lhe restam, coma o que quiser, faça o que desejar, sem arrependimentos.- Quanto tempo eu ainda tenho?- Um mês, no máximo.Lúcia Baptista saiu do hospital. Sem tristeza, sem alegria, pegou o celular e ligou para seu marido, Sílvio. Pensou que, apesar de não estarem mais apaixonados, era necessário contar a ele sobre sua condição terminal.O celular tocou algumas vezes e foi desligado.Ligou novamente, mas já estava na lista de bloqueio.Tentou pelo WhatsApp, mas também estava bloqueada.O amargor em seu coração aumentou. Chegar a esse ponto no casamento era triste e lamentável.Sem desistir, foi à loja e comprou um novo chip, ligando novamente para Sílvio.Desta vez, ele atendeu rapidamente: - Alô, quem fala?- Sou eu. - Lúcia segurava o celular, mordendo os lábios, enquanto o vento cortante batia em seu rosto, como lâminas geladas.A voz do homem no
Lúcia fixava intensamente a foto, com um olhar afiado e sereno, como se quisesse perfurá-la.Ela realmente se arrependia de não ter enxergado a verdadeira natureza das pessoas ao seu redor.Sílvio era seu marido, Giovana era sua melhor amiga, e ambos, que sempre diziam que a retribuiriam, agora a traíam pelas costas, causando-lhe uma dor atroz!A amante se sentia tão no direito de exibir sua conquista na frente da esposa legítima, era uma desfaçatez sem igual!Lúcia era orgulhosa. Mesmo que a família Baptista agora estivesse nas mãos de Sílvio, ela ainda era a única herdeira legítima da família.Giovana não passava de uma aduladora que sempre a seguia, bajulando e tentando agradar.Lúcia bloqueou todas as formas de comunicação com Giovana. Porque ela sabia que Giovana, sozinha, não teria coragem de agir. E Sílvio era a mão que impulsionava as ações de Giovana.Para esperar Sílvio, ela não jantou, apenas tomou o analgésico prescrito pelo médico.O relógio na parede marcava onze horas. L
- Eu vou soltar fogos de artifício por dias e noites no seu funeral para comemorar sua morte! - Disse Sílvio.Ao ouvir isso, o coração de Lúcia, que já estava pendurado por um fio, se despedaçou completamente. Cada pedaço, ensanguentado, parecia impossível de juntar novamente.Era difícil imaginar o quão frio Sílvio poderia ser. Ele desejava sua morte com tanta indiferença, falando com um sorriso sarcástico.- Sílvio, se quer casar com a Giovana, vai ter que esperar eu morrer.O homem que ela havia moldado com suas próprias mãos havia sido seduzido por uma mulher sem escrúpulos. Ela não podia suportar essa humilhação.Se estavam destinados ao inferno, que fossem os três juntos.- Lúcia, ainda vai chegar o dia em que você vai chorar e implorar de joelhos para se divorciar de mim!O olhar penetrante de Sílvio estava frio como gelo. Sem qualquer hesitação, ele bateu a porta ao sair.Aquela noite, ela não conseguiu dormir. Não era por falta de vontade, mas porque simplesmente não conseguia