Capitulo 3

Ariel Smith

— Realizei um parto hoje.

— Nossa, deve ter sido exaustivo. - Noah disse. 

— Exaustivo foi para a paciente que teve sua buceta rasgada. - disse Gio com seu exagero. 

— Para ambos foi exaustivo. 

— Nem me fale. - Digo.

 

 Noah e Giovana haviam feito o pedido antes que eu chegasse, o que para mim foi ótimo já que não aguentaria esperar nem mais um minuto. O almoço transcorreu normalmente. Em meio a refeição conversávamos sobre o trabalho de Gio. Ela é empresária executiva na empresa do seu pai. Também havia algumas desavenças com seu pai, contudo é mais difícil se verem pois Giovana morava sozinha no centro de Los Angeles.

 

Noah, Giovana e eu nos conhecemos no ensino médio. Somos praticamente os três mosqueteiros, Noah era de Miami, mas decidiu sair de casa por problemas familiares. Seus pais eram religiosos e não apoiavam Noah pela sua diferença de sexualidade, o que para mim e para Gio não foi problema. 

 

A cada minuto que se passava meus pensamentos me crucificavam em decidir ir morar com Gio ou continuar na minha casa. Bem, não considero bem a minha casa. Não me sinto à vontade com a presença dele, meu pai. Sempre insultos e ordens, sou acordada da pior forma como fui hoje. Eu quem o alimento e não recebo sequer um "obrigado".

 

Talvez Gio tivesse razão. Não tenho obrigações de sustentar um viciado, já sou de maior e não tenho obrigação nenhuma com ele

 

— Você está bem? — Gio me tira dos pensamentos preocupada.

 

— Sim, sim! Estou bem. - Olho para o relógio em meu pulso e arregalou os olhos com o horário. — Nossa! Tenho que ir! Meu horário de almoço já acabou.

 

Levanto da cadeira e deixo a parte do dinheiro do almoço em cima da mesa. Despeço-me e saio às pressas.

 

— Me ligue quando largar do trabalho. 

 

Noah grita em meio ao restaurante deixando-me envergonhada. Sentindo as pessoas que estavam alí me olharem, trato logo de sair do local entrando no carro. 

 

(...) 

 

Já de volta ao hospital, trato de ir para a ala da pediatria. Sempre levei jeito com crianças embora eu não tenha chegado a ter um irmãozinho. Para mim as duas alas, pediatria e maternidade, são uma benção. Nunca cogitei formar uma família, ou melhor, ter filhos. Nunca tive um namorado ou algo assim pois sou tímida e isso sempre foi um obstáculo. Algumas vezes que fui para alguma boate com Gio e Noah eles tentavam me arrumar uma paquera ou ficante, mas sempre dispensava. A forma como sempre me olhavam como um pedaço de carne me incomodava bastante. Quero me envolver com um homem simples, atencioso e romântico que lembre das datas comemorativas. E o principal de tudo; que me ame.

 

Os homens de hoje em dia só querem saber de sexo, bebidas e drogas. Para Giovana esse era o currículo perfeito para se envolver com ela. Não que me incomode, longe disso, apenas temos gostos diferentes. 

 

O meu turno já havia encerrado às 19h30. Depositei minha bolsa no banco do passageiro e fechei a porta do carro. Coloco o celular no suporte e ligo para Noah avisando que acabei de terminar meu turno. Conversamos por longos 40 minutos seguidas pelo telefone sobre seus esquemas de onde trabalha. Escutava atenta suas fofocas chocada. 

 

Por um momento distraí-me e me perdi em pensamentos pelo meu pai. O fato de estar voltando para meu inferno privado me deixava desconfortável. Ao estacionar na garagem continuei no carro, pensativa decidindo entrar ou não dentro da casa. 

 

— Ariel? VALENTE! - Noah gritou do outro lado da linha.

— Desculpe, meu anjo. Me distrai um pouco. 

 

Recomponho-me e direciono o carro para o estacionamento da garagem. 

 

— Acabei de chegar em casa.

— Entendo você, minha anja. Mas olhe, pense direitinho na oferta de Gio, tá bem?

— Vou pensar. Bem, vou ter que entrar agora. Até amanhã, anjo.

— Até amanhã minha valente. Se cuide. - Ele desliga o telefone.

 

Saio do carro e pego minha bolsa. Tranco o carro e sigo até a porta de entrada. Não tenho força e nem ânimo para continuar. Lá é o motivo de minhas noites mal dormidas, estresse diário e dor de cabeça. Passar o dia trabalhando e voltar para casa sem aborrecimentos seria fantástico.

 

Ao entrar em casa tenho a visão de todos os móveis revirados. Meus olhos ficam pesados e a exaustão atinge meu corpo. Lidar com suas implicâncias era difícil. Sempre havia torres de pratos sujos na pia ou roupas por todo lugar. Mas aquilo era novo. A raiva que sinto é revoltante.

 

Pareço a mãe de uma criança que tem o dobro da minha idade. Eu quem sustento, lavo suas roupas e limpo a lousa enquanto ele apenas insulta-me e me ofende. Mas agora... isso...

 

Ando pela sala olhando todos os móveis revirados e quebrados. Vejo e não acredito. Suspiro evitando que uma lágrima caia de meus olhos. Não daria gosto a ele de me ver derrotada; exausta. Sigo as escadas para o quarto e adentro vendo tudo em seu devido lugar.

 

Ao menos isso...

 

Contudo, notei apenas uma coisa diferente. Em minha penteadeira havia três fotos minhas. As três haviam desaparecido. Provavelmente caiu.

 

Deposito minha bolsa na cadeira da penteadeira e me livro da roupa de trabalho, substituindo por uma de casa. Arrumaria logo aquela bagunça. Desço as escadas indo para a cozinha. Não havia um prato sequer na pia. Olho para a panela do fogão e percebo que ele não havia tocado na comida. Estranho... Sempre que chegava do trabalho via enormes pratos sujos na pia. É a primeira vez em anos.

 

Volto para a sala com os acessórios de limpeza e começo a arrumar a bagunça. Os que estavam quebrados fui me livrando. Coloquei uma música eletrônica e sem perceber terminei de arrumar. Já eram 22h e eu já havia arrumado toda a casa. Ao voltar para a cozinha, esquento a comida faminta.

 

Enquanto eu guardava alguns pratos e copos limpos, meu pai adentra a cozinha e senta na cadeira.

 

— O que tem para comer? Estou faminto. - Estranhei sua voz baixa. Realmente não entendia suas alterações de humor.

 

— Já vou servi-lo. 

 

Pego um prato e deposito a comida. Me viro para andar até a mesa e, ao olhar para seu rosto, levo um susto. Seu rosto está horrível! Claro, algo comum. Mas ele estava machucado. Parecia que havia levado uma surra e, agora segura um pano com gelo estancando o sangue de sua testa.

 

— O que aconteceu? Deixe-me ajuda... — Quando deposito a comida na mesa e tento tocar em seu rosto, ele se levanta me empurrando com fúria.

 

— Não me toque, vadia!

 

Suas palavras trazem revolta a mim.

 

— Só quis ajudar, não me trate dessa maneira! 

— Não estou pedindo para que me ajude sua insolente! E abaixe seu tom de voz! 

— Abaixe você, acha que só porque é meu pai pode gritar comigo? 

— O que foi? Só porque tornou-se médica acha que pode me ajudar? Idiota! 

— Se mamãe estivesse viva teria nojo do que você se tornou! 

 

Falo tomada de ódio. Ele se aproxima em passos largos e acerta meu rosto em cheio. Engoli seus insultos, deboches, humilhações, mas não engoliria uma bofetada. Ah não! Isso não! 

 

Suspendo o prato de comida que ainda estava quente e despejei todo em seu corpo, ele gritou e esperneia gemendo de dor. Enquanto ele corre para o banheiro mais próximo, eu saio da cozinha em passos largos e subo as escadas entrando no meu quarto.

Chega!

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