▪︎ Capítulo 2 ▪︎
Já é quase hora do almoço, escuto um leve barulho nas escadas, olho para cima encontrando a garotinha, seus cabelos estão bagunçados, ela passa as mãozinhas nos olhos azuis e finalmente me encara, vejo a dificuldade em descer os degraus da escada e vou ao seu encontro. Essa casa é bem velha, cheia de tábuas soltas no piso, além de insetos e coisas que podem machucá-la, ainda mais que não sei de onde ela saiu então todo cuidado é pouco para ela não se machucar.-Vem cá, eu ajudo você. -digo, vejo sua carinha de medo mas mesmo assim ela deixa que eu a pegue no colo e ande com ela até a sala. -Lembra de como chegou na beira da estrada?Vejo ela balançar a cabeça em negativa, suspiro frustrada em saber sua resposta. Ela não deve falar ou apenas não confia em mim para falar algo, talvez não se lembra de nada antes de acordar por ser pequena. O que vou fazer agora?–Está com fome? Não havia muita coisa no armário, fiz macarrão para nós duas. Gosta de macarrão? -vejo ela concordar duas vezes, não acho que vou obter resposta . Parece que ela não irá falar mesmo. –Vamos comer então.Divido o macarrão em dois pratos, sento ela na cadeira do balcão, a casa não é grande, acho que meus pais queriam mais espaço para a estufa e o plantio do que conforto para eles, então acabaram deixando a casa pequena.–Sabe comer sozinha? -ela afirma com a cabeça e começa a comer o macarrão em silêncio, seu rosto está vermelho e seus olhinhos curiosos olham tudo atenta e desconfiada. Enquanto ela dormia fiz trinta potes de geleia de maçã, doze de mamão, seis de abóbora e ainda fiz macarrão. Geralmente essas frutas não dão na região, mas por conta da estufa de meus pais tem um pouco de tudo, só não vendo as próprias frutas e legumes porque não dão a quantidade pedida pelos mercadinhos.Há um total de três estufas em volta da casa, uma de frutas, uma de legumes e uma de verduras, as sementes compradas fora do país, o esforço de anos atrás que meus pais fizeram depois de suas viagens malucas. Esse lugar é o que eles sonharam a vida toda, mas pouco puderam desfrutar. Olho a garotinha na minha frente sem saber bem o que fazer com ela, tenho que ver se no grande baú dela tem alguma coisa que me diga quem é, de onde veio ou quem são seus pais.–Quer mais? -questiono ao ver seu olhar para o prato, ela confirma. –Porque não pediu? Você não fala ainda?–Eu... falo. -diz baixinho mas audível.–Bom, então quando quiser comer ou fazer alguma coisa deve me falar tudo bem. -ela balança a cabeça e sorri, um sorriso doce, cheio de sentimentos reprimidos. –Enquanto termina de comer vou dar uma olhada em sua mala, talvez lá tenha algo que me ajude a encontrar de onde você veio.Coloco um pouco mais de macarrão pra ela e vou em direção a sala, onde deixei o grande baú dela, suspiro olhando a grande bagunça. Vejo que é bem grande, mas não parece ter tanta coisa, já que é bem leve. Sento no chão abro as fivelas que fecham o baú, a primeira coisa que vejo é um pequeno bauzinho de madeira, o pego vendo que está fechado com chave, coloco de lado. Tem roupas, cremes de cabelo, escova de dentes, alguns brinquedos. A resposta deve estar no bauzinho, olho atentamente para vê se há outra maneira de abrir, mas parece que é somente com a chave, suspiro frustrada.Escuto os passos meio hesitantes vindo em minha direção, olho para trás observando melhor a roupa que ela usa, um cardigã de lã e uma roupa de balé, nos pés um sapato fechado marrom antes parecia uma sapatilha mas agora olhando melhor é diferente, na beira da estrada ela segurava um ursinho de pelúcia branco escrito mamãe que deve ter ficado no quarto, somente agora reparo que ela usa um cordão em seu pescoço.–Tem a chave? -ela confirma e tira o pequeno cordão de dentro da roupa, sorrio quando ela me entrega uma chave pequena e dourada. –Vamos descobrir o que tem aqui dentro.Pego ela no colo a colocando sentada em meu colo e tiro o cordão dela, depois pego a chave respirando fundo antes de colocar a pequena chave na fechadura que destrava com duas voltas da mesma, abro me deparando com alguns papéis, pedaços de notícias, uma roupinha de bebê, uma caixinha de música a qual ela pega abrindo. A melodia de Mozart começa a tocar lenta, doce, macia aos ouvidos, uma pequena bailarina dança pela extensão da caixinha de espelhos dourados, é lindo e parece caro. Coloco ela ao meu lado depois de colocar apenas o cordão em seu pescoço sem a chave, parece se divertir com o toque doce da caixa de música.Ela sorri ao escutar a próxima música e volto minha atenção aos papéis. O primeiro que pego é a notícia de um jornal de um casamento, na notícia diz :"O maior empresário de Londres Christopher Hutton casou-se com top model Isa Monet no dia doze de outubro desse ano."Já ouvi falar desse cara, na época meus pais ainda eram vivos, pego o próximo jornal vendo uma notícia estranha: "Filha de Christopher Hutton desapareceu misteriosamente depois de ser mandada a um colégio interno para jovens bailarinas na França.", será que? Não pode ser possível? Ou pode?Pego o próximo papel, todos com tópicos de notícias sobre o tal Christopher e a esposa, nada mais sobre a filha. Uma última matéria que está no fundo do baú diz: "As duas da manhã de ontem (vinte dois de Janeiro de dois mil e dezenove), o colégio interno para jovens bailarinas onde filha do renomado Sr. Hutton pega fogo matando alguns funcionários e a filha do Sr. Hutton a qual o corpo foi encontrado em um porão. Depois de dois meses desaparecida.". Deus isso não pode ser o que estou pensando que é, respiro fundo olhando dentro do bauzinho novamente e então vejo um registro de nascimento e o pego.“Júlia Antonella Hutton, (09/04/2017) Nove do quatro de dois mil e dezessete, às oito da manhã.Filha de Christopher Hutton e Paola Antonella Oliveira, neta de avós maternos, Giovanna Oliveira Antonella e Luiz Antonella, neta de avós paternos Emília Silva Hutton e Jonas Hutton.Local do nascimento, hospital de base de Londres, bairro nobre, número 455-B.Enfermeiros responsáveis e...”Paro de ler, olho a menina na minha frente que ainda brinca com a caixinha de música, será que ela se lembra do pai? Parando para pensar, pelas datas ela ainda não fez aniversário, onde será que ela estava todo esse tempo, um ano após ser dada como morta, aparecer na beira de uma estrada quase do outro lado do estado do seu lugar de nascimento, será que o pai dela desconfia que esta viva? Será que alguém maltratou ela durante esse tempo? Onde será que ela estava até hoje?–Tia? -sua voz tímida me despertou de meus devaneios e sorrio olhando seu rostinho rosado.–Oi minha linda, vamos tomar um banho? -ela confirma devagar mas vejo seu corpo tremer de leve.Não sei o que fazer com tais informações, por enquanto ficarei com ela, depois temos que ir até o xerife falar sobre ela, hoje ainda tinha que resolver isso. Escuto uma forte trovoada e logo a chuva cai forte, olho o relógio na parede marcando duas da tarde. Acho que meus planos foram frustrados por uma tempestade repentina.–Vamos tomar banho e dormir. O dia acabou por hoje. -digo para ela que apenas sorri. Deus por favor ilumine meus caminhos, não deixe nada de mau nos atacar nesse momento de tormenta, tome conta de nós. Amém.Faço uma pequena a oração antes de pegar ela no colo e fechar a caixinha de música, deixo os papéis jogados mesmo sem me importa, talvez amanhã eu consiga resolver isso, mas talvez não. Não sei o que fazer agora mas irei apenas dar um banho quente nela e tomar um também, acho que vou me sentir melhor depois que fizer isso.•°•• ♤ ••°•▪︎ Capítulo 3▪︎Gosto de chuva, mas hoje não é um dia bom para ter chuva, preciso ir até a delegacia falar com o delegado e entrar em contato com aquele homem sobre sua filha, mas com esse tempo não vou conseguir nem chegar no carro. Dei banho em Julia e o pequeno corpo dela me deixou atordoada, há várias marcas em suas costas e braços, seus pés estão machucados e cheios de calos, mas ela só tem três anos e meio.Como alguém pode fazer mau a uma criança? Praticamente um bebê. Olho sob a bancada os vidros de geleia agora frios, os pego colocando na caixa que levarei para a cidade amanhã. Julia está brincando com seus brinquedos na sala, praticamente cai um dilúvio ao lado de fora, meu coração está apertado por imaginar quanta dor essa criança passou até agora.–Tia, posso te ajudar? -escuto a voz baixa e doce de Julia perto de mim, olho para ela despertando dos meus pensamentos tristonhos e sorrio.–Oh, claro. Venha. -coloco ela sentada sob o balcã
▪︎ Capítulo 4 ▪︎"Uma semana depois"Uma semana cuidando de Julia, não a levei ao delegado por medo do telefonema que recebi, não sei quem são nem o que podem fazer comigo e com a pequena menina. Não sei do que essas pessoas são capazes, apesar de todos ficarem meio encabulados com a aparição repentina dela em minha vida. Mas depois de toda uma história, consegui fazer com que todos esquecessem as questões de sua presença. Claro que foi difícil no começo mas depois de um tempo quem desconfiaria de uma fofura como Julia, ela praticamente virou minha garota propaganda andando por aí vestida com roupas de frutinhas.Respiro fundo olhando pela janela o sol nascendo, hoje vai ser um dos dias de venda movimentado porque o clima está bom, por enquanto as vendas das geleias e pães doces estão indo muito bem, consigo nos manter com a venda deles enquanto pago minhas dívidas, mesmo que devagar está dando certo. Se eu tivesse um forno melhor conseguiria fazer bolos,
▪︎ Capítulo 5 ▪︎ Acordei bem antes de Julia, fiz o café da manhã para nos duas e me sentei no sofá enquanto bebia meu café, olhava no relógio esperando dar o horário de ontem mas o tempo parecia não passar. Minha ansiedade está me deixando nervosa meu rosto está um pouco inchado devido a noite mal dormida, Julia sempre acorda às nove, toma café, banho, então nos arrumamos juntas e quando da doze horas saímos essa vem sendo sua rotina desde que chegou aqui, mas ontem fiz ela dormir um pouco mais tarde, então hoje irá acordar mais tarde e não irá ver aquelas pessoas. Escuto as batidas na porta e respiro fundo me levanta limpando as mãos na calça moletom, agora me sinto nervosa, mesmo que tenha que fazer essa coisa absurda para cuidar de Julia, aceitar dinheiro para ficar com meu anjo não me parece certo mas irei fazer isso pela segurança dela. Irei fazer de tudo para protege-la dessas pessoas a todo custo. Abro a porta dando espaço para os dois passarem, o homem t
▪︎ Capítulo 6 ▪︎ Já faz um mês desde que assinei o contrato, estamos caminhando bem por enquanto, comprei um forno industrial, agora faço bolos e pães, além de outras coisinhas para vender na barraca que montei. Foi então que me perguntaram o porque de não comprar um local e montar uma doceria, fiquei pensando nisso por alguns dias e me decidi.Hoje irei na cidade para ver o local que Jhon me falou para dar uma olhada, irei montar meu negócio de bolos, pães, doces e tortas, tudo que minha mãe sonhou em fazer antes irei conseguir por ela, mas claro se eu gostar do local. –Júlia, vamos querida. -ela aparece com seu vestidinho rosa rodado, seus cabelos estão presos em uma trança lateral embutida, calça uma sapatilha preta e de meia-calça rosa. Tão lindinha, minha princesa. A primeira coisa que fiz depois de comprar o forno foi me livrar das roupas velhas dela e comprar novas, nos demos um banho de loja. –Estou bonita? -ela pergunta, mesmo que eu tenha ajudado e
▪︎ Capítulo 7 ▪︎Hoje já vai ser a inauguração do restaurante e doceria Meu Anjo, coloquei esse nome por causa de Julia que veio para iluminar meus dias e regalos de alegria. Ela foi um anjinho que invadiu minha vida e meu coração me deixando sem escolhas além de aceitar seu amor com todo meu coração. Além de que hoje é o aniversário dela, nove de abril, depois de quatro meses esperando as reformas finalmente Vamos conseguir abrir no dia previsto sem falha.–Vamos minha linda, hoje é seu dia. -digo a pegando no colo, está vestida em uma roupa linda, comprei essa roupa para esse dia, um vestido branco na altura dos joelhos de saia cheia, usa meia calça e sapatinhos que brilham quando bate luz, esse ela mesmo escolheu, seus cabelos loiros estão começando a escurecer, fiz um coque bem arranjado e coloquei a pequena tiara de pedras brilhantes, usa um par de brincos de bailarina, o cordão que antes tinha uma chave agora tem um pingente de uma garotinha abraçada a uma mulh
▪︎ Capítulo 8 ▪︎Tudo esta indo bem, as mesas estão todas ocupadas, é exatamente nove da noite e Julia dorme no escritório no quarto andar depois de correr por aí, fiquei de acorda-la, mas acho que a festa de aniversário terá que ficar pra amanhã pelo jeito que as coisas vão agora.–Chloe, temos um problema. -o senhor Pedro aparece nervoso na cozinha, saio de trás do grande balcão passando a massa de bolo para um dos meninos terminarem de bater e tiro o avental, sim estou ajudando na cozinha mesmo que não precise, mas não consigo ficar sem fazer nada.Esse vai ser o primeiro problema da noite, arrumo meu vestido verde no corpo, tiro a touca saindo da cozinha e soltando os cabelos do coque, parece que meus saltos batem no chão no ritmo do coração com o nervosismo que me bate agora.–O que ouve? -pergunto andando ao lado do senhor Pedro que me parece um pouco pálido.–Um casal chegou e foi levado para uma mesa, nosso garçom foi entregar as bebidas da mes
▪︎ Capítulo 9 ▪︎Depois de conversar o suficiente com Christopher o restaurante fechou e apesar de Julia estar cansada, ainda tinha energias para o parabéns e comer o bolo como ela mesma disse então acabamos por descer para comemorar seu aniversário com os outros. Quando fomos para o salão ela foi no colo de Christopher e meu coração se apertou, eles haviam criado um carinho um com o outro em tão pouco tempo de conversa que me deixou desconcertada.Chegamos no salão e todos já esperavam a pequena, o bolo está no centro da sala assim como os docinhos e outras coisas, todos os funcionários e algumas pessoas de fora estão ali para parabenizar Julia pelo seu quarto aniversário, Christopher colocou ela no chão e a mesma foi parabenizado por todos enquanto ia até a mesa do bolo.Estranharam o fato do homem alto dos olhos azuis estar segurando Julia quando o elevador abriu as portas mais ninguém comentou, meu medo é que alguém note a semelhança entre os dois e pergunt
▪︎ Capítulo 10 ▪︎–Menina do céu, que homens. -assim que saio da sala vejo Anally se abanar e dou risada, sempre animada como sempre.–Quer vir comigo ate a cozinha? Eles vão pra lá. -ela se levanta e pega o celular, entramos no elevador direto para cozinha. Quero avisar a todos que teremos alguns convidados andando por ali antes do almoço.–Bom dia amores, temos visitas hoje espero que isso não atrapalhe o desempenho de vocês. -digo alto ao entrar, todos me cumprimentam sorrindo. Tiro o casaquinho que usava e penduro, substituindo por um avental, meus cabelos que estavam soltos amarro em um coque alto colocando uma touca.–O que temos aqui Dimi? -olho o molho de tomate no fogo e sinto o cheiro adocicado dos tomates recém colocados.–Molho à bolonhesa. -diz sorrindo. Dimitri sempre quiz comandar uma cozinha, apesar de não ter diploma ele é um excelente cozinheiro, tem apenas trinta e sete anos, assim como Jhon que também arrasa na cozinha, só que fazend