Capítulo 0002
As palavras de Juliana, misturadas ao som da chuva torrencial, fizeram o humor de Gustavo despencar.

Ele observou a silhueta decidida dela se afastando, e um riso frio escapou pelos seus lábios.

— Muito bem, Juliana. Só não se arrependa!

Juliana hesitou por um instante, mas não se virou. Continuou andando até desaparecer na chuva forte que caía lá fora.

Com uma mão pressionando o abdômen dolorido e a outra tentando chamar um carro pelo aplicativo, ela esperou, mas o tempo passava e ninguém aceitava a corrida.

Após meia hora de tentativas frustradas, ela aumentou o preço para duzentos reais e finalmente conseguiu um motorista.

No quinto minuto de espera, seu celular tocou. Era Sarah.

— Você estava com o Gustavo agora há pouco? — A voz do outro lado já chegou em tom de acusação.

Juliana abaixou os olhos com desdém e, enquanto se agachava para tentar aliviar a dor no abdômen, respondeu com ironia:

— E o que você tem a ver com quem eu encontro?

Desde que Viviane voltou para a família Rodrigues, Juliana havia se mudado para morar sozinha.

As interações com a família Rodrigues limitavam-se, na maioria das vezes, a cobranças para que ela rompesse o noivado com Gustavo.

Para eles, Juliana não passava de uma impostora, ocupando o lugar que não lhe pertencia. Agora que a verdadeira filha estava de volta, ela deveria ceder o espaço.

A troca de noivas já era um plano discutido em segredo entre as famílias Rodrigues e Costa, sem que Juliana fosse sequer consultada.

No entanto, Michel Costa, avô de Gustavo, insistia que Juliana era a nora ideal para a família, tornando a situação ainda mais complicada.

— Juliana! Que atitude é essa? A família Rodrigues cuidou de você por mais de vinte anos. Se não fosse por sua culpa, Vivi não teria sofrido tanto lá fora! — A voz de Sarah era afiada e acusadora.

Juliana soltou uma risada sarcástica.

— Está dizendo que foi minha culpa ser trocada quando eu ainda era um bebê?

Sarah sempre soube como manipular as emoções de Juliana, jogando a culpa nela.

Por anos, Juliana acreditou que tudo fosse sua responsabilidade.

Mas, no fundo, ela também era uma vítima.

E, além disso, a família Rodrigues nunca a tratou bem.

— Juliana! Lembre-se de uma coisa: você sempre estará em dívida com a Vivi! Rompa logo esse noivado com Gustavo. Pare de sonhar com o que nunca será seu!

Nesse instante, o carro de Juliana chegou.

Ela entrou rapidamente no veículo, fechando a porta com força, enquanto dizia ao celular:

— Já joguei o lixo na lixeira. Deixe que a Viviane pegue, se quiser. Ah, não precisa agradecer..

Sem esperar resposta, ela encerrou a chamada e bloqueou o número de Sarah sem hesitar.

Do lado de fora, o som da chuva tamborilava contra as janelas do carro. A paisagem parecia envolta em uma névoa cinzenta e opressiva.

Juliana recostou-se no banco, exausta, com o rosto pálido.

Os acontecimentos do dia pesavam sobre ela como um fardo impossível de carregar.

Era tudo tão absurdo, tão surreal.

Todos acreditavam que ela e Gustavo estavam destinados ao altar. Até ela acreditava nisso.

Mas a realidade mostrou-se cruelmente mutável.

Gustavo havia mudado.

Com os olhos fechados, Juliana reprimiu as emoções que ameaçavam transbordar. Quando finalmente chegou ao seu apartamento, já havia estava mais calma.

Depois de entrar, tomou um analgésico para aliviar a dor.

Em seguida, começou a eliminar todas as lembranças de Gustavo que ainda estavam ali.

Ele raramente passava noites naquele apartamento.

Nas poucas vezes que isso acontecia, era por insistência dela.

Juliana abriu o guarda-roupa e retirou um casaco masculino. Enquanto o colocava em um saco de lixo, algo caiu de um dos bolsos.

Dois itens.

O primeiro, um preservativo.

O segundo, um brinco de pérola feminino.

Ela já havia visto aquele par de brincos antes, nas orelhas de Viviane.

— Argh.

Juliana correu para o banheiro, segurando-se na pia enquanto o corpo se curvava em ânsias de vômito.

Os olhos ficaram vermelhos, o estômago revirava sem piedade.

Era repulsivo.

Tudo o que ela pensava ser um término relativamente digno dos sete anos juntos revelava-se uma ilusão patética.

Sem hesitar, Juliana jogou no lixo tudo o que tinha qualquer conexão com Gustavo.

Depois, pediu comida delivery e passou a noite desinfetando e limpando o apartamento de cima a baixo. Somente quando terminou sentiu que podia respirar um pouco melhor.

“Uma semana depois.”

Juliana estava ocupada organizando informações de um novo cliente. A tabela que analisava destacava claramente dados como idade, aniversário, signo e tipo sanguíneo do casal.

Enquanto digitava e fazia anotações para o planejamento, o celular vibrou na mesa, iluminando-se com uma chamada de um número desconhecido.

Sem dar importância, ela rejeitou a ligação, mas o número insistiu, ligando repetidamente.

Franzindo a testa, Juliana finalmente atendeu no último toque, com o dedo pairando entre a irritação e a curiosidade.

— Alô...

Ela mal pronunciou a primeira palavra quando uma voz familiar do outro lado a fez engolir o restante.

— Juliana! Você me bloqueou?

Do outro lado da linha, Gustavo estava em seu escritório, com o rosto tão sombrio que fazia o assistente, que observava a cena de canto de olho, tremer de medo.

A resposta de Juliana foi direta e tranquila:

— Bloqueei. Algum problema?

Ela havia bloqueado Gustavo no mesmo dia em que romperam.

Desde então, sete dias haviam se passado, e hoje era a primeira vez que ele tentava entrar em contato.

O canto da boca de Juliana se ergueu em um sorriso carregado de ironia.

Gustavo conteve a raiva e ordenou:

— Amanhã é o aniversário do meu avô. Você vai comigo.

O septuagésimo aniversário de Michel Costa seria um evento gerarandioso, reunindo os maiores nomes da alta sociedade da Cidade A.

Como neto, a presença de Gustavo era indispensável.

— Você não contou para o Sr. Michel sobre a nossa separação? — Juliana estreitou os olhos, incrédula.

Uma risada fria escapou de Gustavo.

— Juliana, você não tem coração? Ele acabou de passar por uma cirurgia. Não pode se abalar com esse tipo de notícia.

Juliana ficou em silêncio.

Ela desejava cortar completamente os laços com Gustavo.

Mas, ao mesmo tempo, tinha um enorme respeito e gratidão pelo Sr. Michel, que sempre a tratou como uma neta de verdade. Não seria capaz de machucá-lo deliberadamente.

Após refletir por alguns instantes, ela respondeu:

— Eu posso dizer a ele que surgiu uma viagem de emergência. Assim evito causar problemas.

Quando Gustavo ouviu a negativa disfarçada, cerrou os punhos com tanta força que os nós dos dedos estalaram audivelmente.

— Juliana, você acha que esse seu trabalho tem algo tão urgente assim? Meu avô ainda não está com Alzheimer. — Interrompeu Gustavo bruscamente.

Juliana havia se formado em Psicologia, mas sua carreira tomou um rumo completamente diferente.

Como terapeuta de relacionamentos, ela ajudava casais a resolverem conflitos emocionais. Para Gustavo, essa profissão era desgastante e pouco valorizada. Ele chegou a insistir diversas vezes para que ela largasse o trabalho, prometendo sustentá-la.

Mas Juliana recusou todas as vezes.

Essas discussões foram motivo de um longo período de tensão entre eles. Naquela época, Juliana enfrentou seu momento mais sombrio.

Os problemas no trabalho e as pressões familiares a levaram a uma depressão severa. No fim, ela acabou cedendo, aceitando temporariamente a sugestão de Gustavo para evitar mais conflitos.

Respirando fundo, Juliana respondeu com calma:

— Gustavo, eu vou ao aniversário do Sr. Michel, mas não vou com você.

Sem esperar qualquer resposta, ela encerrou a ligação.

E, para evitar mais transtornos, imediatamente bloqueou também o número novo de Gustavo.

No mesmo momento, o assistente de Gustavo conseguiu um pequeno prêmio de consolação: uma nova chance com um telefone novo, já que o antigo havia sido vítima da fúria de seu chefe.

“À noite.”

Após um banho quente, Juliana estava relaxando quando ouviu a campainha. Ao atender, encontrou um entregador segurando dois pacotes.

— Você tem certeza de que não houve engano? — Ela perguntou, desconfiada, pois não tinha comprado nada recentemente.

— A senhora é a Srta. Juliana Oliveira? — Confirmou o entregador.

— Sim, sou eu.

— Então não há engano. O pacote da esquerda foi enviado pelo Sr. Costa, e o da direita, pelo Sr. Mendes.

Juliana arqueou as sobrancelhas. Gustavo era o “Sr. Costa”, obviamente.

Mas quem seria o “Sr. Mendes”?

Sentiu uma vontade imediata de recusar ambos.

Percebendo sua hesitação, o entregador tirou do bolso uma folha dobrada e a entregou.

— O Sr. Mendes pediu para que você lesse isto antes de tomar qualquer decisão.

Juliana abriu o bilhete.

A caligrafia era impecável, os traços firmes e precisos.

Depois de ler, ela fechou os olhos por um momento, respirando fundo para conter as emoções. Quando voltou a olhar para o entregador, declarou com firmeza:

— Recuso o pacote do Sr. Costa. O outro, aceito.
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