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Capítulo 4: Ecos do Passado

A floresta, com suas sombras ancestrais, parecia envolvê-los em um abraço silencioso. Os sons da perseguição haviam se afastado momentaneamente, e o manto da noite se estendia mais uma vez, trazendo consigo a sensação de um passado que nunca fora completamente deixado para trás. Yara e Tupã, ali, em meio ao silêncio perturbador da selva, sentiam o peso invisível de suas histórias.

Sentados sob uma árvore gigantesca, cujas raízes emergiam da terra como braços de gigantes adormecidos, ambos pareciam ser tragados pelos seus próprios pensamentos, como se os ecos de tempos antigos viessem à tona. A quietude ao redor trazia memórias, como ventos que sopram de longe, carregados de cicatrizes antigas.

Yara apertou a mão contra o peito, sentindo o coração bater com a mesma intensidade de quando fugira de sua aldeia. Os olhos, que agora fitavam as estrelas por entre os galhos das árvores, não enxergavam apenas o presente, mas também a imagem nítida de seu passado.


Ela era jovem, cheia de sonhos e desejos. Yara, filha do chefe da tribo, fora prometida ao mais poderoso guerreiro da aldeia, Caiapó, um homem temido e admirado por sua força. No entanto, aos olhos de Yara, ele não era mais que uma cela dourada. A ideia de casar-se com ele, de se submeter ao que o conselho tribal determinava, era sufocante. Seus pés ansiavam por caminhar por caminhos desconhecidos, longe das tradições que amarravam sua liberdade.

Naquela noite, sob o brilho do fogo que crepitava no centro da aldeia, as mulheres cantavam canções de casamento. Mas o coração de Yara batia em outro ritmo, um ritmo selvagem que ressoava com a batida da selva. Ao olhar para o futuro que estava sendo decidido por ela, Yara soube que aquele não era o seu destino. O vento parecia sussurrar em seus ouvidos, chamando-a para algo maior, para algo além dos limites impostos.

Com a coragem de uma tempestade e a suavidade de uma brisa, Yara tomou sua decisão. Ela não seria presa pelo destino traçado por outros. Naquela mesma noite, com a lua cheia como testemunha, fugiu. Deixou para trás a promessa de uma vida confortável, mas vazia. A liberdade, com todos os riscos e perigos, era a única amante à qual ela prometia sua fidelidade.


Do outro lado da clareira, Tupã olhava para o chão, como se as folhas caídas contassem histórias que apenas ele podia decifrar. Ele também carregava suas próprias cicatrizes, invisíveis, mas profundas, nascidas da traição e do exílio.


Tupã era o filho mais talentoso da sua tribo. Líder natural, seu domínio sobre a floresta era admirado por todos. Ele caminhava como se a selva o conhecesse, e suas habilidades com o arco eram lendárias. Os anciãos da tribo já o viam como o sucessor, o líder que guiaria seu povo por gerações.

Mas foi justamente essa confiança cega que o deixou vulnerável. Kurupi, seu amigo de infância, o homem que ele mais confiava, cobiçava o mesmo poder. Tupã não viu os sinais, os olhares de inveja, as palavras sussurradas no escuro. E quando a armadilha foi armada, foi ele, Tupã, quem caiu.

Acusado de traição contra sua própria tribo — um crime que nunca cometera —, ele foi expulso, desonrado diante daqueles que um dia o respeitaram. Kurupi assumiu o lugar que sempre quis, enquanto Tupã foi forçado a vagar sozinho pela selva, sem lar, sem tribo.

O exílio era uma dor profunda, mas a traição de alguém que ele considerava um irmão era uma ferida que jamais se fecharia.


Yara e Tupã, agora sentados lado a lado, compartilhavam o silêncio daqueles que haviam perdido tudo, exceto sua liberdade. Era um silêncio que não precisava de palavras, pois ambos entendiam o que era carregar o peso de um destino que não escolheram, mas que também se recusaram a aceitar.

— Às vezes, a floresta nos dá o que precisamos — disse Tupã finalmente, sua voz baixa como o vento que soprava entre as árvores. — Mesmo quando parece que ela nos toma tudo.

Yara desviou o olhar das estrelas e o fixou nele, percebendo nas palavras de Tupã o mesmo sentimento que ecoava em seu próprio peito. O destino havia lhes roubado muitas coisas, mas os unira, e na união deles encontraram forças que talvez nunca teriam descoberto sozinhos.

— Talvez seja isso que a floresta faz — respondeu Yara, com um leve sorriso no canto dos lábios. — Ela nos quebra, para depois nos refazer à sua maneira.

Tupã a olhou, e naquele momento, os dois compreendiam algo profundo. Suas histórias, tão diferentes, estavam unidas pelo mesmo fio invisível da luta por liberdade, da rejeição ao destino imposto. Eram foras da lei, mas, acima de tudo, eram sobreviventes. Dois espíritos livres, moldados não pelo que perderam, mas pelo que escolheram lutar.

E naquele instante, sob a proteção das árvores ancestrais, eles souberam que, enquanto estivessem juntos, não importava o quão poderosos fossem os inimigos. Estavam prontos para enfrentar o que viesse, pois a liberdade, por mais dolorosa que fosse, ainda era a única vitória que realmente importava.

A floresta, como sempre, os acolhia em seu misterioso seio, sussurrando suas canções antigas, como uma mãe que embala seus filhos rebeldes.

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