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Capítulo 5: O Preço da Liberdade

A floresta, até então cúmplice silenciosa de Yara e Tupã, parecia respirar com um peso diferente naquela manhã. O ar, carregado de umidade e segredos, não trazia o frescor habitual. O vento que costumava sussurrar suas canções ancestrais agora se calava, como se os espíritos da selva pressentissem o que estava por vir.

Yara e Tupã haviam fugido por tempo suficiente para conhecer o gosto amargo da liberdade. Mas, naquele momento, sob o céu cinzento que mal deixava o sol atravessar as nuvens, eles sabiam que não poderiam correr para sempre. A escolha que se aproximava era inevitável, como a maré que lentamente engole a areia da praia.

Tupã, — Yara começou, seus olhos fixos no horizonte incerto, — até quando poderemos escapar? Até onde podemos ir sem nos perder de nós mesmos?

A voz dela era suave, mas as palavras traziam consigo uma carga pesada. A pergunta que ela fizera não era apenas sobre a fuga física. Yara sentia, como um peso em seu peito, que cada passo dado na direção contrária aos seus perseguidores era também um passo mais longe daquilo que ela um dia fora. Eles estavam deixando para trás mais do que rastros na terra. Estavam deixando para trás partes de si mesmos.

Tupã, parado ao lado de uma árvore de tronco largo e antigo, observava o movimento da floresta ao redor. Sabia que Yara tinha razão. Fugir não era mais uma opção que os preservaria. Os caçadores e guerreiros estavam mais próximos a cada momento, e a floresta, por mais amiga que fosse, não poderia mantê-los escondidos para sempre.

— A floresta nos deu tempo — disse ele, sua voz baixa, mas firme como uma rocha. — Mas agora, ela nos chama a fazer algo mais.

Yara o olhou, e o que viu nos olhos de Tupã a fez entender o que ele estava sugerindo. A escolha que tanto temiam estava diante deles: lutar ou continuar fugindo, se desgastando pouco a pouco até que nada mais restasse além da exaustão. O amor deles florescera no meio dessa fuga, mas, como uma flor delicada nascida entre pedras, começava a ser sufocado pelos desafios da sobrevivência.

— Estás pronto para derramar sangue, Tupã? — Yara perguntou, a mão instintivamente tocando a adaga em sua cintura. — Porque eu não sei se estou.

Tupã se aproximou dela, suas mãos calejadas tocando o ombro de Yara com a ternura de quem compreendia o dilema que ela carregava. Ele também lutava com isso. Desde que fora banido de sua tribo, evitara se tornar o monstro que seus inimigos diziam que ele era. Mas agora, a linha entre moralidade e sobrevivência parecia cada vez mais tênue.

— Não há honra em matar por prazer ou vingança, — disse ele, com um peso na voz. — Mas há momentos em que a única escolha é lutar, não por ódio, mas por amor... por aquilo que queremos proteger. Tu és o que tenho de mais precioso, Yara. E se lutar significa te salvar, então é um preço que estou disposto a pagar.

Aquelas palavras calaram fundo em Yara. A escolha não era entre o bem e o mal, entre fugir e lutar. Era uma escolha sobre o que eles estavam dispostos a sacrificar. E, naquele instante, Yara compreendeu que o preço da liberdade, da verdadeira liberdade, era maior do que ela havia imaginado.


O som de passos apressados e o farfalhar das folhas os tirou de seus pensamentos. Não havia mais tempo para indecisão. Os caçadores estavam próximos, e Yara e Tupã, escondidos entre os arbustos espessos, podiam ver as sombras dos homens se movendo pela floresta, como lobos famintos.

— Eles estão nos cercando, — sussurrou Tupã, seus olhos analisando rapidamente as rotas de fuga que a floresta oferecia. Mas, pela primeira vez, ele não estava pensando em fugir.

Yara sentiu o coração acelerar. Sabia que aquele era o momento. Se não agissem agora, seriam pegos. Seriam levados, mortos ou vivos, para as tribos ou para as cidades dos homens brancos. Seu futuro seria selado. Ela olhou para Tupã, e com um aceno silencioso, ambos decidiram.

A emboscada foi rápida e brutal, como uma tempestade inesperada. Yara, com sua agilidade de guerreira, deslizou entre as árvores, sua adaga refletindo a luz fraca que atravessava a copa das árvores. Tupã, com o arco em mãos, disparou flechas precisas, cada tiro silencioso como o voo de um falcão.

Mas logo, o confronto deixou de ser apenas flechas e lâminas. Um dos caçadores conseguiu se aproximar, e Yara, num movimento desesperado, cravou a adaga no peito dele. O som do suspiro final do homem encheu o ar, misturado ao rugido abafado da selva. Ele caiu aos pés dela, seus olhos ainda abertos, fixos no vazio.

Yara ficou parada, o corpo rígido, enquanto o sangue quente escorria pelas suas mãos. Tupã correu até ela, mas a expressão de Yara dizia tudo: o peso daquele ato agora recaía sobre ela, mais pesado do que qualquer perseguição.

— Ele teria nos matado, — disse Tupã, tentando encontrar as palavras que pudessem aliviar o fardo que agora se alojava no coração de Yara. — Não havia escolha.

Mas Yara não respondeu. Ela sabia que Tupã estava certo. Sabia que não tinham alternativa. Mesmo assim, algo dentro dela se quebrou. Talvez fosse a ideia de que a liberdade, pela qual tanto lutaram, não era tão pura quanto imaginavam. A liberdade, ao fim, vinha manchada de sangue.


A noite caiu novamente, e o som da batalha se dissipou na distância. Yara e Tupã, agora sozinhos em meio à vastidão da floresta, compartilhavam um silêncio pesado, um silêncio que falava de escolhas difíceis e da linha tênue entre moralidade e sobrevivência.

— O preço da liberdade... — murmurou Yara, seus olhos perdidos no escuro da floresta.

Tupã a olhou, percebendo a mudança nela. Ambos sabiam que, a partir daquele momento, nada seria como antes. Haviam cruzado uma fronteira, uma que não poderiam mais recuar.

Mas, apesar da escuridão que pairava sobre eles, havia uma chama que ainda ardia. O amor entre eles, agora forjado pelo fogo das batalhas e das decisões difíceis, era mais forte do que qualquer inimigo. E enquanto se abraçavam sob as árvores antigas, sentiam que, por mais que a luta fosse longa, ainda tinham um ao outro.

E isso, de alguma forma, fazia todo o sacrifício valer a pena.

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