Sem ocultar seu nervosismo, batendo o pé direito incessantemente no lustroso piso, Karen aguardava na recepção do elegante prédio permissão para falar com o maior traidor de todos os tempos.Consultou o relógio de pulso pela enésima vez desde que passou pelas portas eletrônicas. Já se passara meia hora e nada. Sabia que a demora em permitir sua passagem era proposital. Ele nunca gostou dela e censurava-se por demorar tanto a perceber esse fato, por ter um dia acreditado nas mentiras daquele verme egocêntrico.Andou até a bancada da recepcionista.— Não dá pra ser mais rápida e liberar a minha entrada?— Senhora...— Senhorita — corrigiu, completando com arrogância: — Futura esposa de Rodrigo Montenegro, dono de metade de tudo isso aqui.A atendente, levantando uma fina sobrancelha, analisou Karen de cima a baixo, logo depois executando o processo inverso até encarar os irados olhos dela com uma expressão neutra.— Informei a sua presença duas vezes, como a senhorita pediu — a mulher d
Com sua costumeira empolgação, Júlio entrou sem bater na sala de Rodrigo, largou-se na cadeira em frente ao amigo e questionou bem humorado:— Como está seu primeiro mês sem a coisa ruim por perto?Erguendo os olhos castanhos dos papéis que examinava, Rodrigo encarou o sócio sem muito interesse.— Falta serviço na sua sala? Tenho o suficiente para nós dois se precisar — disse, balançando os documentos em suas mãos.— Ranzinza como sempre — Júlio comentou com um falso biquinho de ressentimento. — Só vim comemorar o ar puro da empresa desde que Karen foi embora. Inspire fundo e sinta isso Rodrigo. — Respirou fundo e adornou a boca com um sorriso brilhante. — É maravilhoso!— Júlio, tenho uma pilha de documentos para revisar e nenhum tempo pra perder com bobagens — retrucou, voltando a atenção para os documentos em suas mãos.— Ok. Entendi que está super ocupado, mas já é hora de almoço, a melhor hora do dia — Júlio informou e, ao não obter reação do sócio, insistente, puxou os documento
Ficaram em total silêncio até chegarem a área externa dos fundos do hospital, que naquele horário estava parcialmente vazia. Sara sentou e aguardou Robson sentar antes de recomeçar a conversa. — Obrigada por proporcionar um pouco de alegria as crianças. — Não tem o que agradecer. Me diverti também. Fazia um bom tempo que não manejava meus amiguinhos — comentou, a mão batendo de leve na maleta com os bonecos. — Permiti sua passagem hoje, mas não é uma boa ideia que retorne — anunciou em parte incomodada por dizê-lo. Robson a encarou com atenção. — Diz isso por causa do seu marido? — Sim — confirmou, sentindo uma ponta de vergonha. A atitude de Robson, mesmo que com interesse suspeito, foi bondosa para com as crianças. Mesmo assim, foi obrigada a justificar: — Rodrigo não vai gostar de te ver por aqui. E não acreditará que você veio visitar um amigo internado e acabou, por acaso, na ala em que trabalho. Robson riu. — Vejo que continua esperta. Sara sorriu. — Sempre. Correspond
— Atrapalho?Sorridentes, Robson e Sara se voltaram para Tatiana.A médica se aproximava com as mãos no bolso do jaleco, o olhar desconfiado passeando pelos rostos dos dois.— Lógico que não, Tati — respondeu Robson pegando a maleta com os bonecos do chão. — Nos vemos amanhã, Sara! Até mais, Tati! — despediu-se antes de se afastar rumo à rampa da saída.— Sara Montenegro, o que pensa que está fazendo?Pega de surpresa pelo tom condenatório da pergunta, Sara afundou o corpo no banco.— Madri...— Pelos céus, Sara! Porque permitiu que esse homem passasse a tarde aqui? — Tatiana exigiu saber ao sentar do lado da afilhada. — O que Robson fazia aqui afinal?— Nada de mais, veio visitar um amigo e decidiu me ajudar a animar as crianças.— Esse amigo está internado em que quarto? — Ela perguntou desconfiada.— Não sei — confessou embaraçada, não querendo acrescentar que duvidou da veracidade e, por isso, não o questionou sobre o assunto. — O importante é que ele me ajudou a descontrair as cr
Dirigindo calmamente, Rodrigo tentava segurar a curiosidade em saber o que causava a expressão angustiada da esposa.Sara não dissera uma palavra desde que entraram no carro, um grande indicativo de problema, e não tinha dito quase nada antes disso, apenas deu um sorriso amarelo ao se despedir de Tatiana. Franziu a testa ao recordar que Tatiana também parecia preocupada.Faltava pelo menos dez minutos para chegarem ao apartamento, mas Rodrigo decidiu que era tempo demais. Precisava saber se aquele silêncio significava algo ruim.Tossiu para chamar a atenção de Sara, que olhava fixamente pela janela a movimentação noturna. Quando ela pousou o olhar sobre ele, perguntou com falso desinteresse:— Como foi no trabalho hoje?Mesmo concentrado na estrada, Rodrigo mantinha-se atento a cada gesto e expressão de Sara. Por isso percebeu, pelo canto do olho, quando ela apertou a barra da camisa branca, enrolando o tecido nos dedos. Era óbvio que a pergunta a deixou nervosa.— As crianças ficaram
— O que fiz! — Choramingou com as mãos em frente ao rosto.Uma mão pequena apertou seu ombro para transmitir conforto. Entreabriu os olhos e elevou a face para fitar a melhor amiga. Isabel Nandes, sua madrinha de casamento, usava um lindo vestido amarelo que descia pelo corpo curvilíneo até os pés enfeitados com uma delicada sandália de tiras douradas.— Foi por amor — Isabel justificou ajeitando uma mecha loira, que se soltara do coque frouxo e cobrira seu olho direito, atrás da orelha. — Rodrigo nunca vai saber se você não contar — argumentou para tranquilizar a amiga.— Mas e se ele estiver certo, se Rodrigo só desejar um filho e se separar de mim após ter o que quer. — Mordeu a parte interna dos lábios pintados de rosa claro com força. — Não sei se sobreviveria.— Por enquanto, deixe o "se" de lado. Hoje é o dia do seu casamento. — Sorriu disposta a anima-la. — Você conseguiu garota, agora curta sua vitória.~*~— Sara? — Rodrigo chamou preocupado com a palidez que tomara conta da
Remexia sua bebida com um canudo enquanto, ao seu lado, um homem trajando calça jeans e camisa polo vermelha narrava qualquer coisa que Sara nem sequer fazia questão de ouvir. Seus pensamentos estavam à milhas de distância daquele bar. Foi despertada de seus devaneios pelo estalar de longos dedos em frente aos seus olhos.— Quando vai parar de sonhar com o impossível?Sara encarou os olhos escuros com apatia e não respondeu. Não era necessário.— Ele se casa em duas semanas — Izaque rosnou entredentes. — Já passou da hora de desistir.Sara o entendia. Assim como ela, ele se apaixonou pela pessoa errada. Bebeu todo o conteúdo de seu copo e com um gesto para o garçom pediu outro.— O que tem de acontecer para que desista dele? — Com carinho ele pegou sua mão e a acariciou ao completar apaixonado. — E perceber o quanto te quero.Rápida removeu a mão.— Não te amo Izaque. — Voltou à atenção para o líquido âmbar em seu copo. — Não consigo amar ninguém além dele.— Você não se deu uma chanc
— Vá embora antes que Sara retorne — Rodrigo ordenou após ouvir o som alto e forte da porta batendo. — O apartamento ainda tem um escritório? Poderíamos conversar melhor lá? — Quase não uso o cômodo depois do acidente da Sara — informou, antes de completar entredentes: — E não pretendo alongar essa conversa. — Sara parece bem, embora um pouco tensa — Izaque comentou, sentando sem cerimônia no sofá. — Ficará melhor depois que você sumir. — Qual é o problema, Rodrigo? — Questionou pegando um dos álbuns de sobre a mesa de centro. — Está com medo do quê? Ainda de pé, se controlando para não agarrar Izaque e o expulsar, observou o irmão folhear tranquilamente o álbum com fotos da adolescência de Sara. Sabia que Izaque divertia-se com a situação. — Não tenho medo de nada — retrucou. — Só não quero perturbá-la. — É exatamente isso que vim evitar — Izaque pronunciou e, deixando o álbum de lado, completou encarando o mais novo: — Karen me procurou. — Se desejam a minha aprovação, a te