Dirigindo calmamente, Rodrigo tentava segurar a curiosidade em saber o que causava a expressão angustiada da esposa.Sara não dissera uma palavra desde que entraram no carro, um grande indicativo de problema, e não tinha dito quase nada antes disso, apenas deu um sorriso amarelo ao se despedir de Tatiana. Franziu a testa ao recordar que Tatiana também parecia preocupada.Faltava pelo menos dez minutos para chegarem ao apartamento, mas Rodrigo decidiu que era tempo demais. Precisava saber se aquele silêncio significava algo ruim.Tossiu para chamar a atenção de Sara, que olhava fixamente pela janela a movimentação noturna. Quando ela pousou o olhar sobre ele, perguntou com falso desinteresse:— Como foi no trabalho hoje?Mesmo concentrado na estrada, Rodrigo mantinha-se atento a cada gesto e expressão de Sara. Por isso percebeu, pelo canto do olho, quando ela apertou a barra da camisa branca, enrolando o tecido nos dedos. Era óbvio que a pergunta a deixou nervosa.— As crianças ficaram
— O que fiz! — Choramingou com as mãos em frente ao rosto.Uma mão pequena apertou seu ombro para transmitir conforto. Entreabriu os olhos e elevou a face para fitar a melhor amiga. Isabel Nandes, sua madrinha de casamento, usava um lindo vestido amarelo que descia pelo corpo curvilíneo até os pés enfeitados com uma delicada sandália de tiras douradas.— Foi por amor — Isabel justificou ajeitando uma mecha loira, que se soltara do coque frouxo e cobrira seu olho direito, atrás da orelha. — Rodrigo nunca vai saber se você não contar — argumentou para tranquilizar a amiga.— Mas e se ele estiver certo, se Rodrigo só desejar um filho e se separar de mim após ter o que quer. — Mordeu a parte interna dos lábios pintados de rosa claro com força. — Não sei se sobreviveria.— Por enquanto, deixe o "se" de lado. Hoje é o dia do seu casamento. — Sorriu disposta a anima-la. — Você conseguiu garota, agora curta sua vitória.~*~— Sara? — Rodrigo chamou preocupado com a palidez que tomara conta da
Remexia sua bebida com um canudo enquanto, ao seu lado, um homem trajando calça jeans e camisa polo vermelha narrava qualquer coisa que Sara nem sequer fazia questão de ouvir. Seus pensamentos estavam à milhas de distância daquele bar. Foi despertada de seus devaneios pelo estalar de longos dedos em frente aos seus olhos.— Quando vai parar de sonhar com o impossível?Sara encarou os olhos escuros com apatia e não respondeu. Não era necessário.— Ele se casa em duas semanas — Izaque rosnou entredentes. — Já passou da hora de desistir.Sara o entendia. Assim como ela, ele se apaixonou pela pessoa errada. Bebeu todo o conteúdo de seu copo e com um gesto para o garçom pediu outro.— O que tem de acontecer para que desista dele? — Com carinho ele pegou sua mão e a acariciou ao completar apaixonado. — E perceber o quanto te quero.Rápida removeu a mão.— Não te amo Izaque. — Voltou à atenção para o líquido âmbar em seu copo. — Não consigo amar ninguém além dele.— Você não se deu uma chanc
— Vá embora antes que Sara retorne — Rodrigo ordenou após ouvir o som alto e forte da porta batendo. — O apartamento ainda tem um escritório? Poderíamos conversar melhor lá? — Quase não uso o cômodo depois do acidente da Sara — informou, antes de completar entredentes: — E não pretendo alongar essa conversa. — Sara parece bem, embora um pouco tensa — Izaque comentou, sentando sem cerimônia no sofá. — Ficará melhor depois que você sumir. — Qual é o problema, Rodrigo? — Questionou pegando um dos álbuns de sobre a mesa de centro. — Está com medo do quê? Ainda de pé, se controlando para não agarrar Izaque e o expulsar, observou o irmão folhear tranquilamente o álbum com fotos da adolescência de Sara. Sabia que Izaque divertia-se com a situação. — Não tenho medo de nada — retrucou. — Só não quero perturbá-la. — É exatamente isso que vim evitar — Izaque pronunciou e, deixando o álbum de lado, completou encarando o mais novo: — Karen me procurou. — Se desejam a minha aprovação, a te
Tendo se livrado da vista inconveniente do irmão, Rodrigo soltou a cintura de Sara, cruzou os braços em frente ao corpo e perguntou com o olhar inquisidor.— O que lembrou sobre o Izaque?Acuada, Sara temeu a reação de Rodrigo se contasse. E de que adiantaria? Era um pedaço mínimo de algo maior que nem tinha certeza se aconteceu ou não. Deveria arriscar a tranquilidade de seu casamento?— O que diabos lembrou Sara? — Rodrigo bradou após alguns segundos de hesitação dela.— Não grite comigo — Sara explodiu diante do tratamento. — Não sou uma criminosa para ser interrogada. E, minutos atrás, você disse que poderia te dizer as coisas ou não, que a escolha seria minha.— Falei isso sobre o que a fez ter medo no dia do nosso casamento. Izaque esteve envolvido nisso?“Talvez”, era a resposta que bailou na ponta de sua língua, mas a conteve. Não podia dizer algo sem saber tudo. Se é que teria coragem de contar quando soubesse.— O que acha que lembrei que o faz ficar todo nervosinho?— Não i
Sara tentava se concentrar em Robson, ensinando as crianças a manipular as pequenas marionetes que trouxe para cada uma delas. No entanto, sua mente estava longe. Desde que acordou, Isabel e Izaque dominavam seus pensamentos, distraindo-a, girando a sua frente como fantasmas de olhos incriminadores. Tanta preocupação lhe causava uma sensação ruim no estômago, um enjoo que não cessava. Estava cansada física e mentalmente. Rodrigo teve a melhor das intenções ao lhe mostrar os álbuns, o problema foi o efeito que elas tiveram, aliados a visita do irmão de seu marido. Aproveitou quando trouxeram o almoço dos pequenos, para deixá-los com as enfermeiras e seguiu Robson até a cantina do hospital. Precisava de um chá gelado com urgência, para acalmar seus nervos e aliviar a indisposição. Sentou em um lugar que todos poderiam vê-los com clareza. Não queria mais ser motivo de falatório, já tinha problemas suficientes de seu passado, não criaria novos. —
O trajeto até sua residência pareceu demorar séculos, assim como o tempo dentro do elevador pareceu uma eternidade. Quando finalmente chegou ao seu andar, abriu a porta do apartamento com pressa e, sem fecha-la, foi de cômodo em cômodo atrás de Sara. Não a encontrou em parte alguma.Se exigindo calma, retornou a sala, cada neurônio trabalhando velozmente para descobrir em que lugar Sara estaria. Todos eles decidiram enviar imagens de Robson abraçando a sua mulher, beijando-a...— Argh! — Apoiou as mãos no encosto do sofá, apertando-o.Maldita a hora em que Robson entrou em suas vidas e se infiltrou no trabalho de Sara.Fechou os olhos com força e se obrigou a pensar com clareza. Os abriu ao concluir que se Sara passou no apartamento após sair do hospital com certeza Laura a viu.Nervoso, discou o número da casa dos Castro e foi atendido pelo mordomo. Sem paciência, ordenou que passasse o telefone para Laura.— Rodrigo, em que posso ajudar? — Laura perguntou com sua costumeira voz maci
Isabel revisava um artigo quando o telefone de sua mesa tocou. Sem desviar os olhos da tela do computador, atendeu e disse seu nome de forma automática, endereçando para a ligação somente uma parcela de sua atenção. Qualquer resquício de concentração em seu trabalho sumiu de imediato quando compreendeu a informação passada. A surpresa tomou sua face, se evidenciando em seus olhos arregalados e queixo caído. — Tem certeza? — Isabel questionou olhando para o fone como se pudesse ver a pessoa do outro lado da linha. Ao receber a confirmação, titubeou por um minuto e respirou longamente. — Pode permitir — disse com a voz estranhamente trêmula. Assim que encerrou a ligação se arrependeu. E se fosse envolvida em outro escândalo? Sua imagem permanecia arranhada e uma nova cena representaria seu fim na empresa. Ansiosa retirou o fone do gancho, levou o dedo indicador até o botão que chamava a recepção... E não conseguiu apertá-lo. Era sua chance de revidar, de fazer e dizer o que não