Capítulo 0003
Daniel estendeu a mão, com dedos bem definidos e a palma larga. Ao ouvir a voz dele, Beatriz ficou paralisada no lugar, incapaz de se mover.

Nesse momento, o delinquente, embriagado, correu em direção a eles.

— Você é cego? Não vê que estou aqui? Acredita se eu disser que vou te bater...

Daniel não disse nada. Apenas passou o guarda-chuva para ela e chutou o delinquente.

Ele pegou o celular e fez uma ligação, e a polícia local chegou imediatamente.

— Este homem estava assediando uma mulher. Provavelmente é um criminoso habitual. Levem-no para a detenção para um aviso.

— Claro, claro, vamos cuidar disso.

Os policiais foram muito educados e levaram o homem embora.

Nesse meio tempo, Beatriz deveria ter corrido, mas suas pernas não obedeciam, e ela permaneceu paralisada. — Posso te levar para casa?

— Quem é você, afinal? — Ela perguntou, tremendo.

— Sou um ex-colega de escola do Afonso. Éramos bastante próximos. Agora, estou aposentado, sem emprego fixo.

— Você era policial antes?

Daniel assentiu.

Beatriz ficou surpresa. Ele não era parecia ser o criminoso que ela imaginava. Talvez estivesse exagerando, pensando demais. Afinal, há muitas pessoas com vozes semelhantes no mundo.— Está chovendo muito. Me deixe te levar para casa. Não é seguro ficar aqui sozinha.

Beatriz queria recusar, mas pensando no que acabou de acontecer, acabou aceitando e entrando no carro.

Daniel tinha uma aura fria, parecia distante. Não disse uma palavra sequer durante o trajeto, mas lhe ofereceu um cobertor e uma garrafa de água.

Quando chegaram na Vila Silva, Daniel a e foi embora. Beatriz olhou para o lugar onde havia morado nos últimos três anos, sentindo seu coração apertado, como se estivesse sendo esmagado por uma mão invisível.

Três anos atrás, a família Rocha faliu. Seus pais estavam prestes a ser presos, e ela estava tentando juntar dinheiro de todas as formas, até mesmo vendendo o próprio corpo.

No clube noturno, seu primeiro cliente foi Afonso.

Naquela época, ela chorou de medo, e Afonso foi extremamente gentil e cuidadoso. Ele soube de sua situação difícil e não apenas salvou seus pais, como também lhe deu uma grande quantia em dinheiro, permitindo que o negócio de seu pai renascesse.

Foi então que ela se apaixonou por Afonso, de corpo e alma.

Afonso tratava-a bem, e os dois agiam como um casal apaixonado, saindo para jantar e assistir filmes. Mas Afonso era conservador, nunca dormia com ela.

Ele disse: — Bia, eu quero, na noite de núpcias, tirar seu vestido de noiva.

Naquele momento, ela sentiu como se tivesse ganhado o mundo inteiro. Sentia-se afortunada por encontrar um homem perfeito que a tratava como um tesouro.

No entanto, Afonso nunca assumiu publicamente a relação deles.

Ele explicava: — Com minha posição e status, há muitas pessoas que desejam a minha morte. Se souberem sobre nós, poderiam te prejudicar. Como eu poderia suportar ver algo acontecer com você?

Beatriz acreditou nele.

Mas, no final, tudo foi uma piada.

Ela era apenas uma substituta. Ele nunca a amou!

Beatriz pediu comida por delivery, comprou contraceptivos e alguns medicamentos para aplicação externa. Em seguida, começou a arrumar suas malas. Quando terminou, foi tomar banho, desesperada para remover do corpo o cheiro de outro homem.

Ao se olhar no espelho, viu seu reflexo desgrenhado , com cicatrizes cruzando umas às outras, coberta de marcas de beijos Ela fechou os olhos em dor, questionando se sobreviver ao sequestro havia valido a pena apenas para descobrir se Afonso realmente merecia seu sacrifício.

Ela vestiu um roupão, planejando medicar-se e trocar de roupa antes de partir.

Mas, inesperadamente, a porta se abriu e um Afonso embriagado retornou. Ele a viu e disse, claramente descontente:

— Por que você ainda não foi embora?

Sua voz, de repente, parou.

O homem, antes embriagado, de repente se tornou sóbrio. Seus olhos ficaram vermelhos de raiva, e ele rapidamente avançou em sua direção.

Beatriz apressadamente vestiu suas roupas, evitando exposição indevida. Mas, no segundo seguinte, Afonso rasgou a gola de sua roupa, rugindo:— O que é isso?

Ele viu as marcas de beijos em seu peito, e seus olhos quase saltaram de raiva.

Beatriz riu amargamente, com lágrimas nos olhos.

— Afonso, o que você acha que um bando de sequestradores faria com uma mulher nas mãos deles?

— Impossível! Eu os avisei, eles não tocariam em você.

— Você realmente acreditou que um grupo de desesperados não iria se aproveitar de mim?

Beatriz achou isso extremamente irônico.

Ela era uma mulher em um relacionamento não reconhecido publicamente. Afonso demorou a chegar, como os sequestradores poderiam deixá-la sair ilesa?

— Foi quem? Um deles ou todos eles. Você é uma desgraça! Você não pensou em morrer? Bater contra uma coluna? Cortar os pulsos? Pular no mar? Nada disso serviu? Você escolheu viver, e ao fazer isso, manchou minha dignidade!

Beatriz ficou chocada.

Ela pensou que Afonso se importava com ela, que ainda havia algum carinho. Mas agora entendia que ele a via como uma posse, envergonhado por sobreviver ao sequestro, o que para ele era um insulto à sua honra.

Sua vida, afinal, valia menos do que a dignidade dele!

Naquele instante, seu coração doeu tanto que ela mal conseguia respirar.

— E se fosse sua querida Débora que caísse nas mãos dos sequestradores? Se ela só pudesse sobreviver se submetendo a eles, você também desejaria que ela batesse contra uma coluna, cortasse os pulsos, pulasse no mar...

Ela não terminou de falar e foi interrompida por um tapa de Afonso.

Sua bochecha ardeu, e sua cabeça virou para o lado.

— Como você ousa amaldiçoá-la?

Beatriz perdeu toda esperança.

Débora não poderia passar por algo tão terrível, mas ela podia, não é?

Ela não sabia de onde veio a força, mas empurrou Afonso.

— Afonso, acabou tudo entre nós. Eu te desejo esterilidade, e que você nunca tenha descendentes!

Com isso, ela se virou para sair.

— Pare! Você pode ir, mas deixe as coisas. Tudo o que eu comprei para você, fica!

O passo de Beatriz parou bruscamente.

Não havia nada de valor na sua mala, apenas algumas roupas do dia a dia, todas providenciadas por Afonso. Agora, ele queria que ela deixasse suas coisas, que saísse como veio ao mundo?

— Quando minhas roupas chegarem, eu vou...

— Agora, tire!

Afonso se virou, com um olhar sombrio e ameaçador. O homem que antes era gentil como uma brisa de primavera, tornou-se um demônio.

— Afonso...

— Claro, você também pode me implorar.

Afonso a olhou com desdém, como um rei olhando do alto de seu trono. Ela sempre foi obediente, sempre seguindo sua vontade. Deveria saber o que fazer agora.

Beatriz mordeu o lábio, o gosto de sangue preenchendo sua boca, fazendo-a quase vomitar. Sua pele ficou pálida como papel, mas seus dedos lentamente começaram a desabotoar a roupa.

Pelo menos, a roupa íntima era sua.

Seu corpo, marcado e violado, também foi exposto diante dos olhos de Afonso.

A raiva de Afonso, que por pouco tempo havia se acalmado, inflamou-se novamente. Ele jamais imaginaria que as cicatrizes fossem tantas.

Afinal, quantos homens haviam feito isso com ela? E por quanto tempo isso aconteceu?

A mulher que ele não tocava há três anos, poderia ser deixada de lado, descartada. Mas os outros... não tinham o direito de pegá-la, de tocá-la! — Beatriz, você realmente merece morrer.

Afonso amaldiçoava enquanto se aproximava rapidamente. Ela queria se esquivar, mas não teve tempo. Afonso agarrou seu queixo, prestes a beijá-la, mas, para sua surpresa, Beatriz o evitou com desgosto.

A fúria de Afonso explodiu!

— Como assim, eles podem te beijar, e eu não posso? Eles tocaram você onde? Assim? Eles te tocaram aqui, certo?

— Sua mão continuava a descer, tornando-se cada vez mais atrevida.

Nesse momento, Beatriz realmente sentiu que se entregar a um sequestrador não era tão repulsivo; mas ser tratada dessa forma por Afonso era, de fato, repugnante!

Ela lutou com todas as suas forças, mas a diferença de força entre os dois era grande demais, e ela foi jogada na cama.

— Por que você deixa outros te tocarem, mas age como uma donzela virtuosa comigo? Hoje eu vou te ter, e o que você pode fazer contra mim...

Ele nem terminou de falar. Seus olhos se contraíram subitamente.

Um líquido morno escorreu.

Beatriz, em um ato de desespero, pegou o vaso de flores em sua mesa de cabeceira e o quebrou na parte de trás da cabeça de Afonso.

Afonso murmurou algo com os lábios, sem conseguir formar uma palavra no último momento antes de desmaiar.

Ele desmaiou.

Beatriz empurrou-o para longe e vestiu-se apressadamente. Ela desceu até a porta da frente no térreo e, apenas então, pediu aos empregados que verificassem o estado de Afonso.

Sozinha, com sua bagagem, ela caminhava sob a luz noturna, inquieta.

De repente, viu um carro estacionado na esquina.

Era o carro de Daniel.
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