Capítulo 2

Os dias passaram tão rapidamente desde que perdi meu trabalho, mas ainda é difícil acreditar que meu sonho tenha chegado ao fim. Tudo isso devido à má administração e à recusa dos proprietários em modernizar e transformar a revista em formato digital, levando eventualmente à falência, e junto com ela, a destruição dos meus sonhos de infância.

Às vezes, ainda me recordo vividamente de como essa revista marcou minha infância, das vezes em que corria pela enorme sala da vovó ao ouvir o som do correio chegando. Minha avó costumava sentar comigo, e juntas folheávamos as páginas grossas com modelos de todo o mundo.

Ela então me contava histórias sobre quando minha mãe trabalhava lá antes de se casar com meu pai, o que me fazia sentir mais próxima deles. Acho que me apeguei a esse sonho para manter viva uma parte da minha mãe junto a mim. Foi o jeito que uma criança de oito anos conseguiu lidar com o luto, e agora o vazio era ainda pior.

Esse foi o verdadeiro motivo desse trabalho ter se tornado um sonho, que acabou e me deixou desempregada, além de mais distante deles. Eu desejava uma mudança em minha vida, mas jamais imaginei essa. Nos últimos dias, passei por diversas entrevistas, e a cada uma, minha esperança se dissipava pouco a pouco. Para piorar, meus ex-colegas de trabalho já haviam conseguido emprego; alguns partiram para outros lugares, enquanto eu estava estagnada, sem destino, e sentindo que havia algo errado comigo.

Por isso, quando recebi uma ligação para uma entrevista de emprego, senti que era minha última chance na minha área. Depois disso, seria esquecer meus estudos, sonhos e aceitar qualquer coisa que surgisse.

Desapegar, eu não estava pronta para isso. Mas quem, em meu lugar, estaria?

Levantei cedo e corri para um banho rápido, ansiosa, nervosa, e carregando dentro de mim um turbilhão de emoções comuns nessas ocasiões.

Quando saí do meu prédio, fiquei feliz porque, para minha sorte, o trânsito estava tranquilo, algo raro nas manhãs, já que todos estão sempre indo a algum lugar nesse horário: trabalho, escola, academia, e assim por diante. Entrei no meu carro e iniciei meu trajeto tranquilamente.

Olhei para o lado esquerdo e um SUV prata me ultrapassou. A luz do sol batia em seu capô, deixando-o mais reluzente, parecendo ter acabado de sair da concessionária. O motorista, um homem alto, jovem, moreno e de óculos, conversava ao celular, aparentemente discutindo algum assunto importante.

Desviei meu olhar para a janela do lado esquerdo, onde o vento balançava as folhas das árvores do Grand Park. Algumas pessoas andavam apressadas rumo ao trabalho, enquanto outras corriam para se exercitar em sua rotina matinal, pareciam tão despreocupadas que as invejei.

Quando olhei para frente, subitamente um cartaz pousou sobre meu para-brisa, tapando minha visão, e mais uma vez ouvi meu nome ser sussurrado pelo vento: Kaya...

Com o susto, pisei no freio bruscamente, fazendo meus pneus cantarem no asfalto.

Meu corpo alavancou para frente, o cinto de segurança pressionou fortemente meu ombro e me impediu de bater o rosto no volante.

Outra freada se foi ouvida à minha frente e um estrondo horrível que fez meus batimentos tornarem- se mais rápidos, senti minhas mãos trêmulas e frias.

Uma confusão se iniciou e pessoas gritavam pedindo por socorro.

— Ai meu Deus! Eu bati? Eu bati? Eu bati? — repeti várias vezes. Estava em estado de choque e não conseguia formular mais nada além disso.

Puxei o máximo de ar possível pela boca e soltei devagar, tentando manter a calma para conseguir voltar ao normal ou qualquer coisa perto disso.

Tirei o cinto com dificuldade, levei a mão em meu ombro dolorido com a pressão anterior. E antes de abrir a porta ouvi uma voz fina e desconhecida gritar

— ELE ESTÁ MORTO!

Minha boca secou e senti um nó preso na garganta, um aperto doloroso no peito.

Ao sair do carro percebi que freei antes de um cruzamento e o carro que antes estava ao meu lado minuto antes encontrava se batido à minha frente, olhei para o semáforo que em frações de segundos se tornou vermelho.

Era evidente que estava verde então o motorista ao meu lado não estava totalmente errado.

Em um dos carros um rapaz de aparência de uns dezesseis anos com o corpo atravessando o vidro sobre o capô do carro com sua cabeça coberta de sangue, possivelmente ele ultrapassou o vermelho e acertou o rapaz moreno.

Meu estômago revirou e minha visão começou a escurecer. Nunca consegui ver sangue sem passar mal. Apoiei no meu carro abaixando a cabeça alguns minutos e foi quando uma mulher de meia idade segurando um guarda-chuva, se aproximou e tocou delicadamente meu ombro.

— Você está bem, querida? — Confirmei com a cabeça, ela me deu um sorriso terno.

Ela parecia querer conversar, mas naquele momento eu não tinha essa capacidade. Só queria ficar quieta e isolada, tentando digerir tudo, pois sentia minha mente funcionando devagar, com dificuldade para voltar ao normal, meus pensamentos ainda impactados por esse acontecimento.

— Deu muita sorte querida, se não parasse estaria morta. — Continuou mesmo eu não dando muita atenção.

Porém, foi sua observação que me fez perceber o que tinha acabado de acontecer.

Levantei a cabeça lentamente e observei o local, ainda atordoada; uma aglomeração de curiosos havia se formado em volta dos carros. Aquela senhora tinha razão: se eu não tivesse parado, aquele adolescente teria acertado meu carro antes do rapaz. Eu estaria morta.

— Infelizmente, é uma fatalidade ver dois jovens nesse estado. Você deve ter reflexos rápidos, e isso a salvou. — Ela insistia, mesmo sem eu querer conversar, e demonstrando isso claramente com meu silêncio.

— Eu não parei... — murmurei, quebrando meu silêncio, e olhei para o cartaz grudado em meu para-brisa. — Eu fui parada por isso! — Apontei para aquele papel enorme.

Ela abriu os lábios, e seus olhos se arregalaram tanto que seria impossível não perceber o seu espanto. Internamente, eu não estava diferente dela.

— Alguém lá em cima gosta de você, querida. Deve aproveitar, como dizem, ganhou uma nova chance. — Ela falou, e eu me calei, perdida mais uma vez em meus pensamentos, o que, por sua vez, a fez desistir e encerrar a conversa.

“Era isso mesmo que aconteceu? Tive minha vida salva por um cartaz?”

Quem em sã consciência poderia acreditar nisso? Eu não acreditava e meu espanto foi ainda maior quando estiquei o braço e o peguei em mãos.

Na parte da frente um anúncio escrito: Venha para Acácias o emprego dos seus sonhos espera por você.

Virei na parte de trás buscando qualquer letra minúscula onde indicasse o endereço e foi quando um mapa se desenhou diante dos meus olhos.

Eu não fazia ideia de como isso era possível e nem sabia se de fato gostaria de descobrir, porém algo no nome desse lugar me chamava.

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