Carregando os lençóis empilhados nos braços, Melody desceu as escadas com cuidado, sentindo o peso deles puxando seus ombros para baixo a cada passo. O ranger dos degraus se misturava ao burburinho distante vindo do salão, risadas arrastadas pelo álcool, o estalo dos copos, o tilintar das moedas trocando de mãos. O cheiro adocicado do perfume barato ainda impregnava o ar, misturado à poeira da madeira envelhecida e ao aroma forte de gordura vindo da cozinha.
Ao alcançar os fundos do bordel, seu olhar foi imediatamente atraído pelo poço onde teria que buscar água para lavar os lençóis. Seu estômago se contraiu, e um arrepio frio subiu pela nuca, como se a sombra da falecida ainda pairasse ali.
Jogou parte da roupa de cama dentro de uma tina enorme e pegou o balde. O peso da alça em sua mão parecia mais denso do que deveria, como se o passado estivesse puxando-a em direção ao poço.
Um arrepio involuntário percorreu sua espinha.
Pensar em Esperanza encontrada sem vida e cheia de hematomas dentro de um poço tão parecido com aquele, enquanto puxava água para lavar os lençóis usados das meninas parecia quase uma ofensa.
A cidade havia cochichado por semanas. Melody não precisou se esforçar para lembrar das palavras espalhadas pelo vento, sussurradas nos cantos das lojas e nos corredores abafados do salão:
"O corpo dela foi encontrado no poço… cheia de marcas de defesa."
"Não há provas, mas todo mundo sabe…"
"Você viu o jeito que ele olha pro nada? Como se ainda ouvisse os gritos dela."
"Esperanza tinha medo dele? Ou medo de alguma coisa que ele sabia?"
Mas nem sempre ele fora visto assim.
Antes da tragédia, Duncan Sinclair já era um homem de poucas palavras, alguém que passava mais tempo no campo do que na cidade. Não era exatamente sociável, mas havia uma compostura respeitável em sua presença, uma confiança dura e firme que fazia até mesmo os homens mais rudes evitarem bater de frente com ele.
Os comerciantes o conheciam pelo nome, e até mesmo os mais cínicos admitiam que sua palavra valia mais do que contratos. Ele era um homem de negócios, comprava e vendia gado a preço justo, adquiria suprimentos e pagava à vista, sem rodeios. Alguém confiável.
Mas agora havia aquele ar de perigo, de pessoa atormentada, algo que parecia impregnar cada passo seu, cada gesto contido e olhar distante. Mesmo de longe, Melody percebia a rigidez em seus ombros, o jeito como seus olhos varriam o ambiente, como se esperasse um ataque a qualquer momento.
Nunca fora um homem que transmitisse conforto, mas agora carregava algo a mais—uma sombra inquietante, um peso invisível que parecia arrastá-lo para um lugar ainda mais sombrio. Havia algo afiado em seus olhos verdes, algo que parecia medir tudo ao redor como se estivesse sempre pronto para uma luta. Não uma luta qualquer—uma luta que ele sabia que venceria.
Melody ajeitou o balde vazio no braço e caminhou com firmeza até o poço. A roupa não iria se lavar sozinha.
Ela descansou o balde que carregava ao lado do poço e conferiu a manivela, a carretilha e o balde de metal preso na ponta da corda. Fazia aquilo porque tinha quase certeza de que, se o balde se soltasse dentro do poço, madame a mandaria ir buscá-lo.
Jogou o balde dentro do poço e instintivamente se afastou da carretilha girando—era muito fácil perder alguns dentes ao receber o impacto da manivela enquanto o balde descia. O som do metal batendo na água lhe trouxe de volta o arrepio injustificado.
Que som o corpo de Esperanza Sinclair teria feito ao bater dentro do poço?
Melody fez o sinal da cruz e esfregou os braços. Não era do seu feitio ter esse tipo de pensamento mórbido, mas sentia profunda compaixão e tristeza pela mulher que havia falecido, mais uma vítima dos homens.
Olhou para a água escura. O balde havia submergido completamente. Era hora de puxar.
Sentiu a manivela áspera roçar em sua palma enquanto o peso do recipiente aumentava conforme o balde subia. O barulho do metal raspando contra as pedras internas do poço soou alto demais, cada estalo reverberando pelo ar parado. A água escura lá no fundo parecia mais negra que o normal. Ela engoliu em seco ao ouvir o som do balde tocando a superfície, como se aquele poço guardasse segredos antigos e sussurrasse histórias esquecidas.
Enquanto trabalhava, seus pensamentos ainda estavam presos nas fofocas que conhecia sobre o rancheiro que havia se mostrado tão indigno de confiança quanto os outros homens.
"Duncan Sinclair…" Seu nome reverberava em sua mente como uma maldição.
O peso do balde cheio de água fria puxava seus braços, e Melody sentia cada músculo protestar conforme o arrastava pelo quintal até a tina de lavar. Os dedos ardiam pelo esforço, e um suspiro escapou de seus lábios ao despejar o conteúdo na bacia já parcialmente cheia. Pequenos redemoinhos se formaram na superfície da água antes de se assentarem, refletindo a luz intensa do início da tarde que banhava o quintal em um dourado abafado.Ela pegou uma barra de sabão e a jogou na água, observando-a afundar lentamente antes de pegá-la de volta para esfregar nas roupas. Com as mãos, esfregou a barra contra as roupas, formando espuma entre os tecidos. Depois, prendeu a saia entre as pernas para evitar que se molhasse demais e descalçou as sapatilhas surradas, empilhando-as num canto seco antes de entrar na tina cheia de roupas. Os pés descalços encontraram o tecido encharcado, e Melody começou a pisotear as roupas, sentindo a água fria subir pelos tornozelos. O tecido pesado se retorcia sob s
Ajeitou a postura e seguiu pelo caminho mais discreto, esgueirando-se pelo corredor lateral até a cozinha. O calor do ambiente veio como uma onda abafada, trazendo o cheiro de carne sendo cortada e temperos queimando no fogão. A cozinheira estava ocupada cortando carne, mas ainda assim ergueu os olhos para fitar Melody por um instante.— Vai ficar parada aí feito uma estátua? — resmungou a mulher, voltando ao trabalho.— Só vim buscar um pano — respondeu Melody rapidamente, pegando um pedaço qualquer de tecido sobre a mesa antes de seguir adiante.Esperou um instante, certificando-se de que ninguém prestava atenção, antes de subir as escadas estreitas e empoeiradas até o sótão. Segurava o pano contra o peito, um disfarce simples caso fosse surpreendida no caminho. Era um dos poucos lugares onde poderia ter privacidade. Lá em cima, o calor era sufocante, mas não havia olhos curiosos. O colchão fino onde dormia estava estendido no chão, encostado contra a parede, e ao lado dele repousav
— Melody.O som de seu nome atravessou a porta, enchendo o pequeno espaço do sótão como uma ameaça palpável. Um frio intenso subiu por sua espinha, espalhando-se pela nuca e eriçando os cabelos em sua pele úmida de suor frio. Seu estômago revirou violentamente, e ela precisou engolir com força para conter a náusea imediata. Melody fechou os olhos, apertando os lábios em uma linha fina e trêmula enquanto tentava controlar a respiração acelerada.Medo. Um medo visceral, antigo e profundamente arraigado, espalhou-se rapidamente por suas veias como veneno, fazendo seus membros tremerem. Mas, abaixo dessa camada inicial de terror, ela reconheceu outra emoção igualmente intensa: raiva. Uma raiva impotente, sufocada por anos de silêncio, de humilhação e submissão forçada. As unhas curtas se cravaram nas palmas das mãos em punhos cerrados, e Melody sentiu um calor de revolta incendiar seu peito.Lutando contra o impulso de se esconder em um canto escuro e simplesmente desaparecer, endireitou
A luz do fim de tarde filtrava-se pelas frestas do sótão, tingindo de dourado os montes de poeira acumulada e os objetos esquecidos. Melody estava sentada sobre o baú, com o vestido ensopado colado à pele, os joelhos juntos ao peito, os braços envolvendo as pernas como se o gesto pudesse impedir que desabasse.O silêncio ali dentro era tenso, denso, como se a casa inteira esperasse o momento exato para esmagá-la. Seu estômago roncava, vazio desde cedo, e o cheiro distante de comida vindo do salão fazia a boca salivar. Madame sabia. Era esse o plano. Domar pela fome. Pelo cansaço. Pelo isolamento. Mas Melody não podia deixar isso acontecer. Não depois de tantos anos escondida, não depois de chegar tão perto.Levantou-se com energia renovada e quase com raiva, tirou o vestido molhado que largou sobre o chão. Escolheu outro, o menos rasgado dos dois que ainda restavam, e o vestiu com movimentos lentos. O calor insuportável do dia havia se convertido no frescor do início da noite. Seus de
O susto foi nublado pela dor.Melody piscou devagar, o corpo inteiro pulsando como um machucado exposto. Tentou se mover, mas o braço gritou alto, e ela parou. Os olhos demoraram a focar, mas logo voltaram para o homem parado na entrada da carroça.Jesus. Ele era enorme.A silhueta dele tomava conta do espaço. Largo de ombros, alto, com a mão segurando a aba da lona erguida. A luz do entardecer dourava as laterais do rosto rígido, os olhos verdes e atentos. Não parecia assustado. Parecia calculando.Melody sabia reconhecer o olhar de um homem medindo risco.Ela também sabia que era o risco.Estava desesperada demais para recusar ajuda, mas o medo dentro dela dava outro salto — um medo mais profundo, que não vinha do instinto, mas da memória. E se ele a devolvesse? Se ele pertencesse à Casa? Se fosse um dos deles?O braço latejava como fogo. Ela queria implorar, mas o corpo tremia de frio e esforço. Os lábios ardiam, rachados e úmidos de sangue. Ainda assim, ela os mordeu, tentando reu
A carroça avançava pela estrada de terra batida, o som dos cascos e das rodas marcando um ritmo constante na noite que chegava. O céu, já tingido de azul escuro, deixava os últimos fios de luz escaparem pelas copas das árvores. Era um silêncio de fim de mundo, só quebrado pelos estalos do couro e o ranger da madeira.A fazenda surgiu no horizonte.A casa grande de madeira mantinha sua dignidade cansada. A varanda ampla era sustentada por colunas grossas, e os degraus largos da entrada já conheciam muitos anos de pés e silêncios. À direita, o estábulo recortava-se contra o céu, e uma cerca baixa contornava o terreno com humildade.No jardim à frente da casa, resistia o cuidado antigo de Esperanza. As roseiras estavam secas. A lavanda, quase morta. Mas as margaridas — teimosas — ainda floresciam, como se recusassem a aceitar a ausência da mão que as podava.Duncan puxou as rédeas e fez Caleb parar diante da varanda. O cavalo bufou com gratidão.A poeira, erguida no último trecho da estr
Duncan passou a escova mais uma vez pelo flanco do animal, o braço trabalhando num ritmo mecânico, quase ritual. O cheiro de feno úmido, couro e suor ajudava a empurrar o mundo pra longe.Mas o grito que a jovem soltou quando Ida recolocou o ombro no lugar ainda o perseguia.Agudo. Cortante. Feminino.Ele odiava gritos de dor femininos.Mais do que os sons, odiava o que eles despertavam.Aquele som trazia lembranças. Não nítidas, mas claras o suficiente. Vozes abafadas por madeira grossa.Uma mão segurando Rose pela primeira vez, enquanto a mulher gritava do outro lado da parede.O tempo passou, mas os sons ficavam.Alguns se instalam no peito e cavam. Silenciosos. Pacientes.Forçou a escova com mais brusquidão por um instante, depois parou. Respirou fundo.O animal virou a cabeça, como se dissesse: chega.Duncan assentiu para o cavalo em concordância, o velho Caleb não merecia ser maltratado porque ele estava inquieto. Guardou a escova, soltou a trava da baia com um estalo e deu dois
O cheiro de lavanda foi o primeiro a alcançar Melody.Depois veio o toque dos lençóis limpos sob a pele, o peso gentil de uma colcha bem dobrada, a maciez inesperada do colchão sob o corpo dolorido.Era estranho. Quase íntimo.O ambiente tinha aquele tipo de silêncio que não amedrontava. Um silêncio de lugar vivido, organizado. A luz do sol filtrava pelas cortinas claras, cortando o quarto em faixas de calor e sombra. No ar, havia um fundo de cera de madeira — e mais distante, o aroma acolhedor e forte de café passado.Ela piscou devagar.Os olhos ainda pesavam.O ombro latejava com dor surda e constante, irradiando para o lado do pescoço e escorrendo pelo braço engessado.O teto era de madeira clara, bem conservada. Um lampião apagado estava sobre um dos armarios. À esquerda, uma cômoda com espelho em moldura gasta. Os móveis brilhavam com uma camada recente de cera, e o cheiro — aquele cheiro — era reconfortante demais.Ela tentou se erguer. O corpo inteiro protestou.Um gemido esca