Babaca, sempre babaca

Não sou o homem mais correto do mundo. Bem, longe disso, para ser honesto. Há mulheres em Nova York que dariam risada se ouvissem essa afirmação. Algumas diriam que eu sou o pior de todos — um exagero, claro. Eu só quero aproveitar. A vida é curta demais para ser desperdiçada com regras sem graça. Quero viver tudo agora, antes dos 40, depois... talvez eu pense em uma família. Se depender do meu pai, isso já teria acontecido. Na verdade, ele provavelmente me colocaria em uma camisa de força, se pudesse, e me moldaria no tipo de herdeiro que ele quer no comando da empresa.

Mas eu não o culpo; admito que sou uma dor de cabeça para ele. Não sou exatamente querido no meu próprio império. A presidência será minha um dia, e sei que deveria ser mais respeitado. Mas é impossível para eles ignorarem o meu estilo de vida — e, pensando bem, eles têm razão. No entanto, no lado profissional, sou o melhor. Eu assino os melhores acordos, tenho a educação certa e a mente afiada para isso. Eles podem me rotular pelo que quiserem, mas uma noite ou duas não definem quem eu sou.

Agora, neste exato momento, estou em um cenário que já virou clichê para mim. A mulher à minha frente está furiosa. Enrolada num lençol, ela me encara com olhos que poderiam queimar qualquer outra pessoa. Sua voz se eleva, mas a essa altura, o que ela diz é só ruído distante. Estou alheio, voando nos meus próprios pensamentos, quase imune aos gritos e à raiva dela.

— Como pode ser tão babaca? — finalmente ouço sua voz.

Respiro fundo, baixando os ombros, dando um sorriso amarelo.

— Muitos diriam que isso já nasceu comigo. — dou uma resposta bem humorada. Só que é baixinha na minha frente, fica ainda mais furiosa.

— Resume o que tivemos como uma "brincadeira"? — seu rosto, antes pálido, tomou uma coloração avermelhada. Parecia que a sua cabeça iria explodir. — "Brincadeira"?

— Sinceramente — depois de ouvir inúmeras vezes, as mesmas coisas, fica chato tentar achar argumentos, que não magoe ninguém. — Você conhece a minha fama. Sabia exatamente o que iríamos fazer aqui neste quarto. Você quis isso. Não me disse em um momento para parar. Então, não venha me dar chiliques agora. Estou de saco cheio, com dor de cabeça e tenho trabalho ainda hoje. Então... — me aproximei da baixinha, curvando o meu corpo em sua direção. — vista-se e saia do meu apartamento. Pois eu não vou ficar aqui. Tenho trabalho para fazer.

Sendo assim, saiu do quarto, a deixando lá.

Meu dia está absurdamente corrido; não posso perder tempo com sentimentalismos. Todas as mulheres com quem saio sabem bem onde estão se metendo. Sem repetição de nomes, sem expectativas vazias. Oferecer alguma cena dramática depois de uma noite que — admito — eu torno inesquecível, soa quase como um insulto. Não me dou ao trabalho de um café da manhã. Minha empregada já conhece o procedimento. No máximo, oferece uma xícara de café e as acompanha para fora do apartamento. Todo o edifício é meu, afinal. Fui eu que o construí. É um privilégio. Posso até dizer que um símbolo do poder que carrego e da responsabilidade que pesa sobre os meus ombros.

Ser o sucessor de um dos nomes mais fortes do mercado não é tarefa fácil, mas os benefícios... esses, eu sei apreciar. É parte do pacote. Sei bem que o que as pessoas chamam de arrogância e frieza é apenas a forma como decidi viver. Não me esforço para mudar — seria desperdício. Mas, confesso que há uma lembrança que me incomoda de verdade, algo que ficou para trás anos atrás. Não posso dizer que me apaixonei, porque, para falar a verdade, não acredito nesse conceito. Contudo, houve uma pessoa que me desafiou, que, sem eu perceber, se tornou especial. Talvez a única pessoa com quem eu compartilhava quem eu realmente era. O problema foi que, quando percebi, já tinha agido friamente e a afastado para sempre. Ela era a irmã do meu melhor amigo, e acho que isso a tornava ainda mais intocável.

— Se Harvey descobrisse, me mataria.

Chego ao escritório às dez. Minha secretária, diligente como sempre, me segue de perto, despejando uma lista interminável de compromissos e instruções do dia. As palavras se perdem no ar enquanto meu pensamento vai para outro lugar. Desde que Isabelle voltou à minha mente, não consigo me concentrar. Nem acho que conseguirei.

Foi um erro, e eu sei disso. Lembrar do que já passou, de um erro que cometi com ela, é como tocar em uma ferida que ainda não cicatrizou. Pior ainda, ela está perto. Em algum lugar da cidade, talvez até mais próxima do que imagino, e não tenho dúvidas de que, se ainda pensa em mim, é com desprezo. Ela deve odiar até respirar o mesmo ar que eu.

Isso me irrita profundamente, principalmente porque eu sou o único responsável. Tive minha chance de ser cuidadoso, mas deixei tudo desmoronar. Havia um pouco de álcool, e talvez ela estivesse vulnerável, talvez eu estivesse... bem, sendo o idiota que sempre sou. E então, o inevitável aconteceu. Eu agi como agi, e ela foi embora.

Não vou mentir, não diria que estava apaixonado por ela. O que sinto é outra coisa – é culpa. Culpa por ter destruído algo que, por tanto tempo, pensei ser inabalável. Uma amizade que muitos duvidariam ser possível entre um homem e uma mulher, mas que era, sim, verdadeira. Isabelle era uma das poucas pessoas que realmente entendia quem eu era, e seu irmão, meu melhor amigo, sempre me alertava: “Toma cuidado com a minha irmã. Um erro e eu juro que você não sai dessa vivo.”

Não eram apenas palavras. Ele teria cumprido a promessa se soubesse a verdade, se soubesse da minha estupidez. E o pai deles... pensar nele me deixa arrepiado. Era um homem justo, um empresário de talento e um amigo leal ao meu pai, mas, quando se tratava de Isabelle, ela era intocável, um verdadeiro cristal nas mãos daquele homem. E eu quebrei algo precioso.

— O senhor Morson deseja falar com o senhor.

Ouço a voz da minha secretária atrás de mim. Instantaneamente, viro-me sobre os calcanhares e dou de cara com a minha secretária, uma mulher de meia-idade, baixinha e de óculos de grau tão fortes que parecem lentes de microscópio. Claramente, a escolha do meu pai para evitar que eu... bem, caísse na tentação de me envolver com a minha própria secretária. Ponto para ele. A notícia, contudo, me deixou inquieto. Sempre que meu pai me chama, é para uma daquelas conversas que ele adora, recheadas de críticas. E sim, fiz algo que poderia justificá-las. Talvez não no trabalho, mas, digamos, no lado pessoal.

Respondo com um sorriso falso, aquele que uso quando prefiro não mostrar o que realmente penso. — Diz a ele que estou em uma reunião. — Dou a volta na mesa, acomodando-me na cadeira. — Ah, e menciona que tenho uma visita programada para a obra. Algo que vai levar um bom tempo, então, estarei fora pelo resto do dia.

Ela aperta os lábios, claramente contrariada. É uma das coisas que a minha secretária mais odeia: ter que mentir para o meu pai. — Ele é o chefe, senhor — diz ela, hesitante. — Sabe de tudo o que acontece na empresa.

Inclino-me para frente, apoiando os cotovelos na mesa e cruzando os dedos. — Ele pode ser o chefe, mas eu sou seu. — Vejo o desconforto dela e, antes que ela diga algo, completo: — E é verdade, vou estar em uma reunião. Não está anotado aí no seu caderninho porque foi uma decisão de última hora, mas está no meu calendário, prometo.

Ela ajeita os óculos, o olhar de quem sabe que não vai ganhar essa discussão. Com um suspiro quase inaudível, vira-se e sai da sala.

Assim que estou sozinho, abro o laptop e deslizo os dedos pelo teclado. Há um arquivo específico que preciso verificar, e só posso acessá-lo da empresa. Em casa, não tenho autorização para abrir esses documentos, e agora… também prefiro evitar o apartamento. Desde a última visita de uma amante, o lugar tem me incomodado. Não que eu me arrependa, mas a bagunça emocional que deixo lá não combina com a minha disposição hoje. Definitivamente, prefiro que a “visita” já tenha ido embora antes de eu voltar.

Depois de vinte minutos, pondo as coisas em ordem, saiu do escritório, indo para o elevador. A sala do meu pai fica no mesmo andar que o meu, então, era um risco esbarrar nele, por isso eu tinha que saiu dali o mais rápido possível. Ansioso, bato os pés no chão, olhando para o celular, até que sinto meu sangue gelar:

— Acha mesmo que vou cair em mais mentiras suas? — Não precisa virar para saber que meu pai está furioso.

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