POV Abigail.
A alcateia Umbra há dias andava bem agitada. Marcus fazia rondas constantes enquanto Benjamin era visto com alguns anciões. Jason estava sempre ao lado de Rafael e todos os lobos pareciam preocupados. Como eu vivia mais afastada, não tinha ideia do que estava acontecendo, mas ao que parecia, era algo muito sério.
Consegui encontrar um pequeno coelho e estava me alimentando quando o alarme soou. Um som que fez meu corpo inteiro tremer. A última vez que a alcateia foi convocada, foi para a execução da minha mãe diante de todos. Com relutância, me limpei e voltei para a alcateia. Todos estavam em suas formas lupinas para ouvir as palavras do alfa. Pensando bem, já tinha um bom tempo que ninguém via o alfa, desde que ele tinha partido em campanha para alfa supremo.
Os cochichos estavam espalhados entre os vários grupos que aguardavam ansiosos pelas notícias. No toco do grande carvalho, bem no centro da alcateia, Rafael e Jason surgiram, ambos tinham um ar de autoridade enquanto os lobos iam se calando. Meu coração saltou ao ver Rafael naquela posição de destaque, orgulhosa de como ele havia se tornado um lobo tão incrível. Benjamin e Evangeline também se juntaram a eles, porém um pouco mais afastados. O que significava tudo aquilo afinal?
― Lobos da poderosa Umbra, as notícias que trago não são boas. Recebemos notícias de que o nosso alfa, o poderoso Ragnar Angenna, foi abatido em uma emboscada por nossos inimigos. ― O tom sério e respeitoso de Rafael não escondia a dor que ele estava sentindo, assim como seus olhos.
A notícia deixou todos agitados e apavorados. Ragnar Angenna era um alfa implacável, alguém temido por outras alcateias e aquele que estava mais perto de se tornar o alfa supremo. Não era estranho que houvesse armadilhas e emboscadas, mas Ragnar jamais foi derrotado em nenhuma delas, voltando vitorioso todas às vezes com as peles de seus inimigos como um troféu bizarro.
Um estranho sopro passou por minhas orelhas, me fazendo olhar para trás, como se algo estivesse se escondendo nas sombras das árvores. Farejei desconfiada, mas não senti nada. Dei de ombros e voltei a olhar para frente. Todos estavam agitados, especulando o que aconteceria, se outros alfas tentariam conquistar a nossa alcateia ou se deveríamos eleger um novo alfa de imediato. O caos só crescia e eu não consegui evita o pensamento de fugir daquele lugar maldito para sempre.
― Todos quietos, não há necessidade de pânico. ― Rafael disse, projetando mais sua voz e erguendo o focinho orgulhosamente. ― Como herdeiro de Ragnar, estou assumindo como o alfa da alcateia Umbra. Ao menos que alguém deseje me desafiar. ― Todos se entreolharam e mantiveram o silêncio. Jason então deu um passo à diante, ficando ao lado de Rafael.
― Baixem suas cabeças para o alfa da alcateia Umbra, Rafael Angenna.
Todos se curvaram diante de Rafael, tocando seus focinhos no chão em sinal se submissão ao alfa. Queria gritar de alegria e o parabenizar, mas a profunda tristeza me dominou em seguida. Quem eu pensava que era? Uma simples ômega, uma ninguém, sonhando em trocar algumas palavras com o agora alfa.
A reunião foi encerrada e todos assumiram suas formas humanas. Todos, menos eu, é claro. Não sabia como fazê-lo e tinha muita inveja de todos ao meu redor. Evangeline surgiu com seus longos cabelos de um vermelho vivo e olhos castanhos. Suas curvas eram perfeitas, com seios fartos e quadris largos. Não era para menos que aquela loba era vista como uma candidata perfeita a companheira de Rafael e estando no grande carvalho com ele, deixava esses boatos ainda mais fortes. Suspirei, me sentindo ainda mais miserável do que antes.
Voltei para a minha pequena presa, que eu tinha escondido e me deliciei com sua tenra carne. Ainda havia muitas dúvidas rodando na minha cabeça, como quem tramou a emboscada e se Rafael iria em busca de retaliação pela morte de seu pai. A alcateia Umbra era famosa por não permitir ser vista como fraca e a morte do alfa claramente dizia isso para as demais alcateias.
― Você acha mesmo? ― Ouvi vozes não muito longe. Me aproximei com cuidado e vi alguns jovens lobos, em suas formas humanas, conversando enquanto vestiam roupas humanas.
― Claro. O novo alfa estudou no mundo humano, teremos muito mais liberdade, diferente do Ragnar que vivia preso aquelas tradições antiquadas. ― Um jovem de cabelos loiros disse enquanto vestia sua camisa. ― Rafael vai nos levar para outro patamar, acima até do que a Rivermoon.
― Seria uma boa ter a chance de ser alguma coisa além de um lobo ordinário nesse lugar esquecido, quem sabe até conseguir uma companheira de família distinta. ― Ambos riram e se afastaram.
Uma nova esperança nasceu em meu peito. Rafael era um lobo instruído, diferente de muitos na alcateia, viveu entre os humanos por muito tempo, o que lhe deu uma visão diferente do mundo, um mundo onde eu era uma eterna prisioneira, fraca e sem escolha. Talvez eu realmente pudesse mudar de vida, não ser mais uma ômega e receber treinamento.
Minha cauda não parava de balançar e eu saltava pela floresta, feliz com a nova possibilidade que surgia diante de mim. Eu finalmente poderia ser alguém, poderia até mesmo ser vista por Rafael com outros olhos. Voltei para a minha toca, animada pela primeira vez em anos para que o dia seguinte se apressasse a chegar.
POV Abigail.Trabalhei com afinco, decidida a mostrar para Rafael o meu valor dentro da alcateia. Mesmo a função de uma ômega era importante para o bem-estar de todos. Todos estavam como eu, animados e trabalhando duro, pois viam em Rafael uma nova era para a alcateia Umbra.Após levar as últimas carcaças para longe do território, fui até um riacho próximo para limpar meus pelos. Olhando meu reflexo, percebi o quão horrível eu estava. Meus longos pelos estavam emaranhados e cobertos por sangue seco e lama, meu corpo era pequeno e magro, por conta da desnutrição que passei desde filhote. Eu sabia que não era atraente para os machos por vários motivos, mas eu também sabia que tinha atributos que se destacavam, como meus olhos de cor dourada. Apenas minha mãe e eu dividimos essa característica, enquanto os demais tinham, em sua grande maioria, olhos verdes ou castanhos.Sentei-me sobre uma grande pedra, aproveitando os poucos raios de sol para me secar, quando ouvi alguém se aproximando.
POV AbigailPor mais que estivesse feliz, sentia uma barreira entre mim e Rafael. Minha cauda não parava de abanar enquanto o silêncio prolongava. Os lobos ao nosso redor estavam tensos, olhando para Rafael, esperando alguma palavra dele. Eu também estava.Conseguia entender o choque do Rafael, afinal ninguém espera ter seu destino ligado a uma loba ômega, mas o lobo por quem me apaixonei era justo e gentil, ele jamais olharia para um lobo e julgaria por sua casta, mas sim por seu real valor. ― Rafael. ― Marcus se aproximou de Rafael, o surpreendendo. Os pelos cinza de Rafael se eriçaram e um rosnado baixo ecoou pela floresta, como um aviso silencioso.― Vamos voltar. ― Rafael disse se virando, sem olhar uma segunda vez para mim. O medo me dominou por um momento e antes que pudesse me deter, saltei na frente dele o olhando diretamente e sentindo mais uma vez a forte conexão de destino que nos ligava.― Meu alfa, perdoe a minha ousadia, mas eu gostaria de solicitar um momento…― Saia.
POV AbigailTentei encontrar com Rafael no dia seguinte, mas ele havia partido para uma reunião com a aliança das alcateias. Sem um alfa supremo, as relações entre os alfas estava ficando cada vez mais tensa. Ragnar era o mais cotado, mas sua morte surpreendeu a todos e deixou uma grande dúvida sobre o futuro da aliança. Eu preferi me manter a margem, escondida de todos, afinal Rafael ainda não havia oficializado nada e eu não tinha o direito de falar pelo alfa. Mantive minha rotina e suportei os maus tratos dos lobos. Fui até o rio após cumprir meus deveres, em um local mais escondido e longe do caminho que alguns lobos pudessem tomar. Lavei meu pelo o melhor que consegui, afinal a futura companheira do alfa não podia ser vista suja. Aquele pensamento me fez pular na água, espalhando gotas por todos os lados enquanto eu dava gritinhos de alegria.― Eu serei a companheira do Rafael. Minha deusa! ― Continuei pulando feliz, até que ouvi passos se aproximando.Diferente da outra vez, nã
POV AbigailPassei aquela manhã me arrastando pela margem do rio. A dor por todo o meu corpo, até mesmo por dentro, era horrível. Me arrastei pela margem do riacho, até um trecho que eu sabia ser mais raso e tranquilo. Tentei me erguer, mas minha pata traseira direita estava quebrada, eu gemia e chorrava baixinho, com medo de que alguém pudesse me ouvir.Entrei no riacho e segui por ele, subindo até um grande lago. O sol estava alto, o calor e a fome já se tornando insuportáveis, mas eu não podia parar. Meu cheiro estava muito forte por conta do sangue e do abuso que sofri. Me sentia suja, então deitei na água corrente, deixando que o fluxo da água levasse tudo para longe. Acabei adormecendo e acordei com o anoitecer.O calor deu lugar ao frio, meus pelos encharcados e pesados dificultaram um pouco minha movimentação. Pelo menos o sangramento havia parado. Manquei para fora do riacho e entrei na floresta. Eu conhecia bem aquela região e logo encontrei uma pequena toca onde poderia me
POV AbigailMinhas patas batiam com força contra a terra seca da floresta, poeira subindo cada vez que eu deslizava, escapando de um ataque lateral. Ainda sentia muitas dores por todo o meu corpo, mas não podia me dar ao luxo de parar de correr, ou seria morta pelos lobos da alcateia Umbra, o lugar que um dia chamei de lar.Estava ficando mais difícil respirar, minhas costelas ainda doíam muito e tive medo que um movimento mais repentino pudesse causar algo mais sério. Os uivos e risadas ecoavam pela mata enquanto eu era caçada, mas nenhum deles conhecia aquela floresta como eu. Mesmo ferida, eu ainda tinha várias coisas ao meu favor e usei todas elas para me manter viva.Umbra fazia fronteira com outra grande alcateia, a Rivermoon. Maior em território e força, Umbra nunca teve o poder de ir contra o alfa da alcateia vizinha, mantendo assim a política do bom vizinho e respeitando as fronteiras, mas havia uma área neutra que poucos conheciam. Aquele lugar era utilizado para os descarte
POV FelixNão fazia ideia de onde aquele cachorro tinha aparecido, quando percebi já era tarde e não tinha mais como desviar dele. Tinha acabado de pegar minha moto no concerto e já estava destruída novamente. Minha vontade era chutar aquela bosta de cachorro, mas quando olhei com mais atenção percebi que se tratava de um lobo, uma loba para ser mais exato. Aproximei meu rosto de seu focinho, sentindo a respiração fraca.― Ei, loba. Você está viva? ― Não tive nenhuma resposta. Os batimentos estavam cada vez mais fracos e, mesmo que eu não quisesse me envolver com a merda de uma errante, não podia apenas ignora-lá.Peguei meu celular e mandei algumas mensagens, mas não tinha tempo para esperar uma resposta. Levantei minha moto, confirmando que tudo estava funcionando, então peguei a loba e tentei imaginar a melhor forma de colocá-la na minha moto. ― Que merda. ― Coloquei a loba no chão, tirei minha jaqueta e a vesti na loba, prendendo suas patas com cuidado. Depois de acomodar a gran
POV AbigailAchei que a morte seria silenciosa e tranquila, mas os barulhos ao meu redor estavam me perturbando, sem falar pelas dores que estavam por todo o meu corpo. Abri meus olhos lentamente, diante de mim estavam duas pessoas vestindo roupas azuis. A luz branca era muito incômoda, e grunhi com o desconforto, voltando a fechar meus olhos. Tentei me mover, mas algo prendia minha pata. Logo várias pessoas, todas com as mesmas roupas, estavam ao meu redor, falando alto, escrevendo em pranchetas e apertando botões aleatórios em máquinas.― Verifiquem os sinais vitais, administrem a medicação e chamem o médico responsável pelo caso. ― A voz de uma mulher distribuia ordens com firmeza.O cheiro de gesso misturado com o característico odor de hospital estava incomodando meu nariz. Escondi meu focinho embaixo da pata, tentando amenizar o mal-estar que sentia e tentei abrir os meus olhos novamente.Uma mulher de azul estava ao meu lado e pude ver a última pessoa saindo pela porta. O cheir
POV AbigailA cada passo sentia minhas patas tremerem. O beta ia à frente enquanto outro lobo nos seguia de perto. Não podia julgá-los, afinal eu era uma desconhecida em seu território indo me encontrar com seu alfa. Respirei fundo e mantive meu focinho erguido. Não queria mais passar a imagem de uma loba estúpida e fraca, como eu era antes, eu queria que o alfa me visse como alguém útil e me recebesse em sua alcateia.Quando chegamos mais perto, as grandes portas de madeira clara se abriram e um enorme espaço aberto se revelou. Aquele lugar se parecia mais com uma caverna gigantesca do que com uma casa. Pelas minhas contas, pelo menos quinze lobos conseguiriam viver com conforto naquele lugar. Estava tão encantada com tudo que o beta precisou chamar a minha atenção para voltar a segui-lo pelo labirinto de corredores e portas, até que paramos diante de uma porta inteiramente preta. Até mesmo os puxadores eram preto.― Meu alfa. ― O beta chamou, dando uma batida na porta, então ele a a