POV Abigail
Por mais que estivesse feliz, sentia uma barreira entre mim e Rafael. Minha cauda não parava de abanar enquanto o silêncio prolongava. Os lobos ao nosso redor estavam tensos, olhando para Rafael, esperando alguma palavra dele. Eu também estava.
Conseguia entender o choque do Rafael, afinal ninguém espera ter seu destino ligado a uma loba ômega, mas o lobo por quem me apaixonei era justo e gentil, ele jamais olharia para um lobo e julgaria por sua casta, mas sim por seu real valor.
― Rafael. ― Marcus se aproximou de Rafael, o surpreendendo. Os pelos cinza de Rafael se eriçaram e um rosnado baixo ecoou pela floresta, como um aviso silencioso.
― Vamos voltar. ― Rafael disse se virando, sem olhar uma segunda vez para mim. O medo me dominou por um momento e antes que pudesse me deter, saltei na frente dele o olhando diretamente e sentindo mais uma vez a forte conexão de destino que nos ligava.
― Meu alfa, perdoe a minha ousadia, mas eu gostaria de solicitar um momento…
― Saia. ― A voz de Rafael foi cortante. Meu corpo tremeu, o medo me dominando. Dei um passo para o lado, baixando minha cabeça enquanto a comitiva seguia em direção à alcateia.
A reação de Rafael me deixou preocupada, mas havia testemunhas da nossa ligação, a deusa sussurrou no meu ouvido e nada poderia nos separar. Esperei um pouco, apenas para ter certeza de que não encontraria ninguém em meu caminho de volta, e fui até a minha toca. Eu tinha algumas coisas que eram da minha mãe, como essências de flores e adereços que ela guardava em uma caixinha escondida. Ela nunca soube que eu tinha encontrado aquele tesouro e eu preferi que continuasse assim. Eram lindas peças que eu nunca a vi usando, então acreditei que eram lembranças do meu pai.
Batidas no tronco da árvore me surpreenderam. Escondi todas as coisas e fui ver do que se tratava. Para meu espanto e pavor, Benjamin estava de pé, em sua forma humana, do lado de fora. Sua expressão de desgosto e repulsa não eram uma surpresa para mim.
― O alfa a convoca, loba. ― Com isso ele deu as costas e começou a caminhar. Fui atrás dele, deixando uma distância segura entre nós.
A tenda central, mantida pelo alfa Ragnar como um lembrete de nossas origens, se destacava de maneira imponente e ameaçadora. Ali eram feitas as reuniões de guerra, julgamentos e todas as celebrações mais importantes da alcateia Umbra. Ser convocada pelo alfa, dependendo da situação que estivéssemos vivendo, poderia ser tanto uma benção quanto uma maldição. Eu estava muito nervosa por vários motivos, mas especialmente por que Rafael me chamou logo após nossa ligação de destino ter aparecido.
― Eu a trouxe, meu alfa. ― Benjamin falou em um tom solene, fazendo uma reverência. Segui seu exemplo e me curvei sobre as minhas patas dianteiras.
― Pode ir agora. ― Rafael diz em uma voz neutra, mas Benjamin não se moveu.
― Se me permite, meu alfa… ― Benjamin se levantou, dando um passo a frente.
― Não, eu não permito. Agora, saia. ― A voz de Rafael era poderosa, emanando toda a sua autoridade como o alfa. Meus pelos ficaram arrepiados e senti uma onde se euforia se formando no meu estômago. ― Se aproxima, loba.
― Sim, meu alfa. ― Me aproximei mais do trono onde Rafael estava sentado, mas não me atrevi a erguer os olhos. Estava tão nervosa e envergonhada, tinha medo de dizer alguma besteira na frente dele.
― Como se chama? ― Engoli em seco, achando que já tinha lhe dito meu nome na floresta, mas talvez ele não tivesse escutado ou eu tivesse falado em um tom muito baixo.
― Me chamo Abigail, meu alfa. Abigail Fears. ― Falei tentando projetar a minha voz da melhor maneira possível.
― Abi. É um lindo nome. ― Meu coração acelerou, então criei coragem e o olhei.
O lindo sorriso de Rafael aquecia meu peito. Ele estava sentado de uma forma relaxada e uma paz emanava dele, algo que jamais senti vindo do alfa Ragnar. Rafael se endireitou em sua cadeira e fez um sinal para que eu me sentasse, assim o fiz, sentando sobre minhas patas traseiras.
― Me dia Abi, você tem família? ― Rapidamente balancei minha cabeça negando.
― Não, meu alfa. Eramos apenas minha mãe e eu, mas ela… ― Não consegui concluir e Rafael apenas acenou concordando.
― E quanto ao seu pai? Tem algum Irmão? ― Neguei novamente com a cabeça. Minha cauda e orelhas caídas com as tristes lembranças da minha infância e juventude.
― Não sei quem é meu pai e nem se tenho algum irmão. Como eu disse, meu alfa, eramos apenas minha mãe e eu. ― Um pequeno sorriso surgiu do canto do lábio de Rafael, seu olhar doce brilhando para mim.
― Eu entendo. Acredito que nos veremos em breve, Abi. ― Rafael se levantou, descendo do pedestal onde ficava seu trono e indo em minha direção. Eu não fazia ideia do que fazer, então apenas baixei minha cabeça.
O toque suave em minhas orelhas fez todo o meu corpo vibrar, como se estivesse reconhecendo aquele lobo como o meu companheiro predestinado mais uma vez. Minha cauda abanava enquanto eu não conseguia mais conter a minha felicidade, então, Rafael se afastou.
― Melhor você ir agora. ― Acenei concordando, fiz uma reverência e sai da tenda.
Nunca me senti tão feliz em toda a minha vida, aquele era o momento com o qual todas as lobas sonhavam e eu fui abençoada pela deusa ao me unir com o lobo que eu estava apaixonada há tanto tempo. Não só o meu destino havia dado uma reviravolta inimaginável, como eu seria a loba mais feliz de toda a aliança de alcateias.
Fui me deitar naquela noite estranhamente fria, sem nem imaginar que os meus dias de felicidade e toda a minha esperança seriam dilacerados em poucas horas.
POV AbigailTentei encontrar com Rafael no dia seguinte, mas ele havia partido para uma reunião com a aliança das alcateias. Sem um alfa supremo, as relações entre os alfas estava ficando cada vez mais tensa. Ragnar era o mais cotado, mas sua morte surpreendeu a todos e deixou uma grande dúvida sobre o futuro da aliança. Eu preferi me manter a margem, escondida de todos, afinal Rafael ainda não havia oficializado nada e eu não tinha o direito de falar pelo alfa. Mantive minha rotina e suportei os maus tratos dos lobos. Fui até o rio após cumprir meus deveres, em um local mais escondido e longe do caminho que alguns lobos pudessem tomar. Lavei meu pelo o melhor que consegui, afinal a futura companheira do alfa não podia ser vista suja. Aquele pensamento me fez pular na água, espalhando gotas por todos os lados enquanto eu dava gritinhos de alegria.― Eu serei a companheira do Rafael. Minha deusa! ― Continuei pulando feliz, até que ouvi passos se aproximando.Diferente da outra vez, nã
POV AbigailPassei aquela manhã me arrastando pela margem do rio. A dor por todo o meu corpo, até mesmo por dentro, era horrível. Me arrastei pela margem do riacho, até um trecho que eu sabia ser mais raso e tranquilo. Tentei me erguer, mas minha pata traseira direita estava quebrada, eu gemia e chorrava baixinho, com medo de que alguém pudesse me ouvir.Entrei no riacho e segui por ele, subindo até um grande lago. O sol estava alto, o calor e a fome já se tornando insuportáveis, mas eu não podia parar. Meu cheiro estava muito forte por conta do sangue e do abuso que sofri. Me sentia suja, então deitei na água corrente, deixando que o fluxo da água levasse tudo para longe. Acabei adormecendo e acordei com o anoitecer.O calor deu lugar ao frio, meus pelos encharcados e pesados dificultaram um pouco minha movimentação. Pelo menos o sangramento havia parado. Manquei para fora do riacho e entrei na floresta. Eu conhecia bem aquela região e logo encontrei uma pequena toca onde poderia me
POV AbigailMinhas patas batiam com força contra a terra seca da floresta, poeira subindo cada vez que eu deslizava, escapando de um ataque lateral. Ainda sentia muitas dores por todo o meu corpo, mas não podia me dar ao luxo de parar de correr, ou seria morta pelos lobos da alcateia Umbra, o lugar que um dia chamei de lar.Estava ficando mais difícil respirar, minhas costelas ainda doíam muito e tive medo que um movimento mais repentino pudesse causar algo mais sério. Os uivos e risadas ecoavam pela mata enquanto eu era caçada, mas nenhum deles conhecia aquela floresta como eu. Mesmo ferida, eu ainda tinha várias coisas ao meu favor e usei todas elas para me manter viva.Umbra fazia fronteira com outra grande alcateia, a Rivermoon. Maior em território e força, Umbra nunca teve o poder de ir contra o alfa da alcateia vizinha, mantendo assim a política do bom vizinho e respeitando as fronteiras, mas havia uma área neutra que poucos conheciam. Aquele lugar era utilizado para os descarte
POV FelixNão fazia ideia de onde aquele cachorro tinha aparecido, quando percebi já era tarde e não tinha mais como desviar dele. Tinha acabado de pegar minha moto no concerto e já estava destruída novamente. Minha vontade era chutar aquela bosta de cachorro, mas quando olhei com mais atenção percebi que se tratava de um lobo, uma loba para ser mais exato. Aproximei meu rosto de seu focinho, sentindo a respiração fraca.― Ei, loba. Você está viva? ― Não tive nenhuma resposta. Os batimentos estavam cada vez mais fracos e, mesmo que eu não quisesse me envolver com a merda de uma errante, não podia apenas ignora-lá.Peguei meu celular e mandei algumas mensagens, mas não tinha tempo para esperar uma resposta. Levantei minha moto, confirmando que tudo estava funcionando, então peguei a loba e tentei imaginar a melhor forma de colocá-la na minha moto. ― Que merda. ― Coloquei a loba no chão, tirei minha jaqueta e a vesti na loba, prendendo suas patas com cuidado. Depois de acomodar a gran
POV AbigailAchei que a morte seria silenciosa e tranquila, mas os barulhos ao meu redor estavam me perturbando, sem falar pelas dores que estavam por todo o meu corpo. Abri meus olhos lentamente, diante de mim estavam duas pessoas vestindo roupas azuis. A luz branca era muito incômoda, e grunhi com o desconforto, voltando a fechar meus olhos. Tentei me mover, mas algo prendia minha pata. Logo várias pessoas, todas com as mesmas roupas, estavam ao meu redor, falando alto, escrevendo em pranchetas e apertando botões aleatórios em máquinas.― Verifiquem os sinais vitais, administrem a medicação e chamem o médico responsável pelo caso. ― A voz de uma mulher distribuia ordens com firmeza.O cheiro de gesso misturado com o característico odor de hospital estava incomodando meu nariz. Escondi meu focinho embaixo da pata, tentando amenizar o mal-estar que sentia e tentei abrir os meus olhos novamente.Uma mulher de azul estava ao meu lado e pude ver a última pessoa saindo pela porta. O cheir
POV AbigailA cada passo sentia minhas patas tremerem. O beta ia à frente enquanto outro lobo nos seguia de perto. Não podia julgá-los, afinal eu era uma desconhecida em seu território indo me encontrar com seu alfa. Respirei fundo e mantive meu focinho erguido. Não queria mais passar a imagem de uma loba estúpida e fraca, como eu era antes, eu queria que o alfa me visse como alguém útil e me recebesse em sua alcateia.Quando chegamos mais perto, as grandes portas de madeira clara se abriram e um enorme espaço aberto se revelou. Aquele lugar se parecia mais com uma caverna gigantesca do que com uma casa. Pelas minhas contas, pelo menos quinze lobos conseguiriam viver com conforto naquele lugar. Estava tão encantada com tudo que o beta precisou chamar a minha atenção para voltar a segui-lo pelo labirinto de corredores e portas, até que paramos diante de uma porta inteiramente preta. Até mesmo os puxadores eram preto.― Meu alfa. ― O beta chamou, dando uma batida na porta, então ele a a
POV AbigailNão gostei nem um pouco da forma como aquele lobo estava me tratando, mas eu tinha noção de que não podia reclamar de nada. Além de me ajudar, ele estava disposto a me acolher, a única coisa que estava me deixando preocupada, era o que ele planejava fazer comigo. ― Se me permite perguntar, meu alfa. ― Disse em um tom baixo, mas mantendo meu focinho erguido.― Não permito. ― Felix respondeu, voltando para sua mesa elegante de madeira. ― A partir de amanhã você vai começar o tratamento, preciso de você curada e saudável o mais rápido possível.Engoli em seco, pois sabia que não conseguiria levar a minha mentira por muito tempo quando um médico me examinasse mais de perto. Nem mesmo os planos do alfa salvariam a minha vida por mentir. Respirei fundo, juntando toda a coragem do meu corpo.― Meu alfa… tem algo que preciso contar. ― Felix arqueou a sobrancelha, aumentando a tensão que eu já estava sentindo. ― Eu não consigo assumir a minha forma humana.― Um filhote consegue as
POV AbigailRosnei frustrada, pois Felix estava certo. Ficar me vendo como uma vítima passiva não iria me ajudar, eu tinha que ficar mais forte, mesmo que para alcançar meus objetivos eu tivesse de passar por mais aquela humilhação. Baixei meus olhos e Felix sorriu, soltando a coleira e se afastando.― Agora que nos entendemos, tem mais uma coisa. ― Felix foi novamente para a caixa e pegou novamente a guia, que era da mesma cor da coleira. ― Quando eu tiver de sair da sede da alcateia, por qualquer razão que seja, você virá comigo.― E para que essa guia? ― Perguntei, o fazendo sorrir novamente enquanto ele estalava o couro em suas mãos com um olhar sádico.― Acha mesmo que eu andaria pela cidade com um cachorro fora da guia? Sabe o valor da multa para quem faz isso?Meus pelos se arrepiaram com a ideia de ser vista daquela maneira, por outro lado, também era a única forma de andar pela cidade sem chamar a atenção de outros lobos. Estando com Felix, um alfa tão poderoso, a minha prese