— Queimem tudo! Ninguém deve sair com vida desse castelo! — A voz de Magnus, o beta de meu pai, sobressaia aos gritos de desespero que inundaram o castelo. Seus lobos uivando em frenesi enquanto avançavam sobre qualquer um que cruzasse seu caminho.
Ainda não conseguia acreditar no que meus olhos viam, o lobo que vi ao lado de meu pai durante toda a minha vida estava liderando um ataque para derrubar o rei alfa. Como… Quando aquilo havia começado?
— Minha princesa, precisa fugir. — Minha babá entrou em meu quarto correndo, bloqueando a porta atrás dela. Sua voz tomada de desespero. — Se esconda na floresta até que o rei Alfa retome o controle da situação.
— É a minha mãe? Onde ela está? — O pânico me tomava, meu corpo tremendo, paralisado no chão frio do meu quarto.
A loba, já em idade avançada, segurou meu rosto entre suas mãos com carinho, acariciando minhas bochechas manchadas de lágrimas.
— Seja forte, minha pequena loba. — Com um beijo gentil em minha testa, minha babá me empurrou por uma estreita passagem na parede, que me levou até um dos corredores principais do castelo.
Enquanto a neve caía do lado de fora, uma densa fumaça negra se espalhava pelo céu, queimando meus pulmões. O cheiro de carne e madeira incineradas misturava-se ao ferro do sangue derramado pelo chão, e cada inspiração era um lembrete cruel de que tudo ao meu redor estava desmoronando. O som de gritos e garras rasgando carne ecoava pelos corredores do castelo, um pesadelo sem fim que transformava meu lar em um cenário de massacre.
Minhas solas batiam contra o chão de pedra enquanto corria o mais rápido que minhas pernas conseguiam suportar. Meus pés descalços golpeavam o chão, o sangue dos guerreiros caídos formando poças escorregadias sob meus passos, quase me levando ao chão várias vezes. Eu tentava não olhar para os corpos, não pensar nas expressões congeladas de dor e terror, mas era impossível. Essas imagens se cravavam em minha mente como farpas afiadas, e eu sabia que jamais as esqueceria.
O castelo que antes era meu lar se transformou em uma armadilha de fogo. Eu precisava chegar ao grande salão. Meus pais estariam lá. Eles sempre estiveram lá. Assim que os encontrasse, os convenceria para partirmos, abandonar aquelas terras de uma vez.
Virei um corredor ao ver uma movimentação a frente, e tropecei em algo macio. Bati com força contra o chão, minhas mãos se ferindo no impacto ao proteger meu rosto. Olhei sobre o ombro e meu coração congelou quando percebi que o objeto no qual tropecei era uma das servas da minha mãe. Seu olhar vazio me encarava, seu peito rasgado até a barriga, expondo seus órgãos. Levei a mão à boca para conter um soluço. Virando o rosto, me levantei. Não havia tempo para chorar.
“Continue correndo, Ayla. Eles precisam de você.”
Quando finalmente alcancei o grande salão, um calafrio percorreu minha espinha. A cena diante de mim era algo saído dos meus pesadelos mais sombrios.
Meu pai, o Rei Alfa, estava no centro do salão, sua imponente figura coberta de sangue e ferimentos. Sua respiração era pesada, seu peito subia e descia com dificuldade, mas seus olhos ainda carregavam a fúria e a força de um Lycan poderoso. Minha mãe, a Luna, estava ao seu lado, as mãos trêmulas segurando uma adaga prateada, os lábios movendo-se em um último cântico de proteção.
E diante deles estava o lobo a quem eles entregaram sua confiança e a minha mão.
Damian Blackthorn. O guerreiro mais letal do reino. O homem que eu deveria um dia chamar de companheiro. Meu prometido.
Seu olhar vazio encontrou o meu por um breve instante, mas ele não demonstrou nenhuma reação ao me ver ali. A lâmina em sua mão gotejava sangue, e meu corpo inteiro se recusava a aceitar a verdade que se mostrava diante de mim.
“Não pode ser. Ele não faria isso.”
Mas o corpo caído de um dos guardas reais aos seus pés dizia o contrário.
— D-Damian? — Minha voz saiu em um sussurro sufocado.
Ele piscou, levando a mão livre ao rosto por um instante. Mas antes que qualquer palavra deixasse seus lábios, meu pai rugiu:
— CORRA, AYLA!
Foi a última coisa que ouvi antes do som de metal contra metal ecoar pelo salão.
Meus pés congelaram no chão. Eu não podia deixar meus pais. Não podia deixá-los lutar sozinhos.
Então senti um golpe forte e ardente cortar minha lateral.
Meu grito rasgou o ar e fui jogada ao chão, minha visão turvando por um instante enquanto rolava pelo chão, para mais perto de onde meus pais e Damian estavam. A dor explodiu em minha costela, quente e latejante, e só então vi a figura sombria de um guerreiro inimigo se erguer sobre mim. Seu rosto estava manchado de sangue, e seus olhos brilhavam com crueldade. Ele ergueu sua lâmina para finalizar o trabalho, mas meu instinto reagiu mais rápido. Rolei para longe, ignorando a dor que queimava em minha carne, e chutei sua perna com todas as minhas forças.
Ele cambaleou, me dando a oportunidade de atingi-lo. O som da batalha continuava atrás de mim, mas eu sabia que não podia ajudar nas condições que estava. Eu não era forte o suficiente para salvá-los com meus míseros dezessete anos.
Me ergui com dificuldade, sentindo o sangue quente escorrer pelo meu flanco. Meus olhos buscaram desesperadamente por meus pais, e foi então que vi. Meu pai lutava com bravura, mas estava enfraquecido, seus golpes mais lentos, seu corpo já cedendo aos ferimentos. Minha mãe tentava protegê-lo, mas o medo brilhava em seus olhos.
Damian estava diante deles, segurando a espada firmemente. Ele não parecia o lobo que conheci, o lobo pelo qual me apaixonei.
— Damian, pare! — Minha voz saiu como um grito desesperado, mas ele nem sequer olhou para mim.
Meu pai atacou primeiro, um rugido poderoso ecoando pelo salão. Damian desviou com facilidade e, em um único golpe rápido e mortal, sua lâmina cortou a garganta do Rei Alfa.
O tempo pareceu desacelerar, os sons e cheiros desapareceram.
O corpo do meu pai caiu pesadamente no chão, e um grito de horror escapou da minha garganta enquanto eu caía de joelhos. Minha mãe correu para ele, mas antes que pudesse alcançá-lo, Damian cravou sua espada em seu peito.
Damian puxou a espada, fazendo o corpo da minha mãe cair sobre o do meu pai. Ambos inertes sobre uma poça de sangue. Meus pais estavam mortos.
E Damian Blackthorn foi quem os matou.
O frio cortante da noite não era nada comparado ao gelo que se espalhava dentro de mim. Meu corpo doía, cada respiração queimava meus pulmões, o ferimento no meu flanco dificultando meus movimentos, mas eu não podia parar. O cheiro de fumaça e sangue ainda impregnava minhas narinas, e os gritos de agonia ecoavam como um fantasma em minha mente. Corri para a floresta, o som de meus pés afundando na neve abafado pelo desespero que pulsava em minhas veias.A imagem dos corpos de meus pais marcada a fogo na minha mente, algo que jamais poderia esquecer. Por mais que desejasse estar com eles e lhes dar um enterro digno de quem eram, não podia, pois ele estava vindo.Eu podia senti-lo, seu cheiro me rodeava enquanto ele se aproximava mais um passo, e outro… e outro.Meu instinto gritava para cada célula do meu corpo, me alertando sobre a presença dele. Damian Blackthorn. O assassino dos meus pais. O homem que eu amava, em quem eu deveria confiar, havia se tornado a sombra que me caçava na e
A minha mente parecia flutuar entre fragmentos, minha consciência indo e vindo até que senti sendo atraída por algo. Primeiro, uma sensação de calor. Depois, o cheiro de ervas misturado ao som suave de uma lareira crepitando. Pisquei algumas vezes, mas, mesmo a luz fraca do ambiente, ainda me parecia intensa. Meu corpo pesava, como se chumbo estivesse preso aos meus membros.Tentei me mover, mas uma dor aguda percorreu meu flanco, fazendo-me soltar um gemido involuntário. A lembrança do frio cortante, do vento contra minha pele e da queda vertiginosa no precipício vieram em flashes. Mas tudo antes disso… era um vazio absoluto.— Ela acordou — a voz suave de uma mulher idosa encheu o cômodo.Meus olhos foram atraídos por um rosto gentil, enrugado pelo tempo, mas cujos olhos brilhavam com bondade. Ao lado dela, um homem de ombros largos e cabelos grisalhos me observava com uma expressão grave, mas não hostil.— Onde… onde estou? — minha voz saiu rouca, quase irreconhecível.A mulher sor
DamianO escritório estava silencioso, exceto pelo tique-taque distante do relógio e pelo zumbido discreto do ar-condicionado. O ar carregava um peso que eu não sabia explicar, como se algo estivesse fora do lugar, errado de uma maneira que eu não conseguia identificar.Quando a porta se abriu, me mantive de costas, ouvindo com atenção os passos suaves sobre o carpete. Virei o rosto, meu olhar vagando de forma automática, sem realmente me importar com a candidata da vez. Mas assim que meus olhos pousaram nela, algo dentro de mim se agitou.A mulher à minha frente tinha uma presença inquietante. Não por algo óbvio. Não era sua postura, ainda que ela mantivesse o queixo erguido, tentando parecer confiante, nem sua aparência, por mais que houvesse algo nela que me atraísse de maneira absurda. Era outra coisa que não conseguia explicar com palavras.Seus olhos verdes encontraram os meus, e por um breve instante, senti um choque percorrer minha espinha. Um alerta primitivo, como se um frag
LinO escritório parecia menor, como se o ar estivesse sendo lentamente drenado dali. Meu peito subia e descia em um ritmo que eu não conseguia controlar, e minhas mãos estavam frias, mesmo que o ambiente não fosse gelado. Não era apenas o escritório… era ele.Damian Blackthorn.Sentada naquela cadeira de couro impecável, eu sentia o olhar dele queimando sobre mim como uma lâmina afiada, analisando cada detalhe, esperando qualquer sinal de fraqueza. Mas eu não cederia. Não diante dele.A entrevista deveria ter terminado há muito tempo. Qualquer outro candidato já teria sido dispensado. Mas Damian parecia se divertir prolongando aquilo. Cada pergunta carregava um tom afiado, cada provocação trazia uma faísca de algo que eu não conseguia decifrar.Ele me estudava. Testava. E eu não sabia por quê.— Então, senhorita Lin — ele quebrou o silêncio, tamborilando os dedos na mesa. O som ritmado ecoava pelo ambiente, marcando cada segundo de tensão. — Além de nunca desistir, que outras qualida
O vento cortante da noite balançava as cortinas finas da janela do quarto, mas o frio que percorria minha pele vinha de dentro. Meus dedos apertavam a borda da mesa da cozinha, meus olhos fixos nos papéis espalhados à minha frente. Os números eram cruéis. O dinheiro que tínhamos não seria suficiente para pagar a dívida.Dois dias haviam se passado desde a visita dos homens do banco. Dois dias que passaram como uma névoa de preocupação e incerteza. Henry e Margaret tentavam agir como se tudo estivesse sob controle, mas eu via as olheiras sob seus olhos, os sussurros abafados quando pensavam que eu não estava ouvindo.Eles estavam assustados.E eu não sabia o que fazer para lhes dar o mínimo de paz.— Isso é um absurdo. — A voz de Eva me trouxe de volta à realidade. Ela puxou uma das cadeiras e se jogou nela, cruzando os braços. — Eles não podem simplesmente tomar a casa do nada!— Eles podem, sim. — Minha voz saiu baixa, cansada. Tudo que Henry e Margaret construíram poderia desaparece
O vento cortante da noite chicoteava minha pele enquanto eu caminhava de volta para casa. Mas o frio que percorria minha espinha tinha outro motivo. Meu peito pesava, como se um nó invisível apertasse cada vez mais meus pulmões."Case-se comigo."As palavras de Damian ainda ecoavam na minha mente. Ele as disse como se estivesse me oferecendo um contrato qualquer, como se minha vida fosse um detalhe insignificante diante de seus negócios. Não havia emoção, hesitação ou um traço sequer de humanidade na proposta. Apenas uma certeza cruel: eu não tinha escolha, apenas aceitar.O peso da decisão me esmagava. Eu sabia que ceder significava renunciar a qualquer chance de liberdade. Mas recusar… significava condenar Henry e Margaret.Ao me aproximar da casa, parei ao ouvir as vozes abafadas de meus avós. Eles raramente discutiam, mas o desespero nos tons baixos e trêmulos era inconfundível. Parei diante da porta, me mantendo em silêncio.— Não podemos contar para ela, Henry. — A voz de Margar
O silêncio daquela casa era ensurdecedor. Desde que me mudei para a mansão Blackthorn, tudo parecia sufocante, como se eu estivesse presa em um lugar sem vida. Era como se as paredes quisessem me lembrar constantemente de que eu não pertencia ali. Damian passava o tempo todo fora, saindo antes do amanhecer e voltando tarde da noite, evitando qualquer tipo de contato. Mesmo que tivéssemos assinado um contrato de casamento, éramos estranhos dividindo o mesmo espaço.No primeiro dia, tentei ignorar essa realidade. Me ocupei explorando os cômodos vazios e impessoais, buscando qualquer vestígio de que Damian realmente vivia ali. Mas não havia nada. Somente um ambiente impecável, sem qualquer rastro de personalidade. O lugar inteiro parecia um museu abandonado, onde ninguém deixava marcas de sua presença.No segundo dia, liguei para Henry e Margaret, sentindo um nó no estômago ao ouvir suas vozes. Eles pareciam aliviados ao saber que eu estava bem e empolgados com a promessa de que logo a d
Capítulo 8: Entre Quatro ParedesO som da chuva contra as janelas ecoava pela mansão silenciosa, cada gota estalando no vidro como um sussurro persistente. O vento uivava lá fora, sacudindo as árvores e fazendo as janelas vibrarem levemente. A tempestade havia começado há algumas horas, mas parecia que ficaria mais intensa com o passar da noite.A casa estava mergulhada em escuridão, exceto pela luz amarelada de um abajur no canto da sala. Eu estava encolhida no sofá, abraçando minhas pernas, tentando ignorar o peso que aquela noite trazia e a sensação sufocante de solidão que parecia se intensificar a cada trovão que cortava o céu. Havia algo de inquietante naquela tempestade, algo que mexia com meu subconsciente.Me deitei no sofá, sem coragem para subir para o quarto. Fechei os olhos, respirando fundo, tentando encontrar um pouco de paz, mas assim que o sono começou a me envolver, ele trouxe consigo imagens que não pareciam fazer sentido.Chamas. Sombras distorcidas. E olhos doura