Capítulo 4: O Jogo Começa

Damian

O escritório estava silencioso, exceto pelo tique-taque distante do relógio e pelo zumbido discreto do ar-condicionado. O ar carregava um peso que eu não sabia explicar, como se algo estivesse fora do lugar, errado de uma maneira que eu não conseguia identificar.

Quando a porta se abriu, me mantive de costas, ouvindo com atenção os passos suaves sobre o carpete. Virei o rosto, meu olhar vagando de forma automática, sem realmente me importar com a candidata da vez. Mas assim que meus olhos pousaram nela, algo dentro de mim se agitou.

A mulher à minha frente tinha uma presença inquietante. Não por algo óbvio. Não era sua postura, ainda que ela mantivesse o queixo erguido, tentando parecer confiante, nem sua aparência, por mais que houvesse algo nela que me atraísse de maneira absurda. Era outra coisa que não conseguia explicar com palavras.

Seus olhos verdes encontraram os meus, e por um breve instante, senti um choque percorrer minha espinha. Um alerta primitivo, como se um fragmento esquecido dentro de mim tentasse lembrar de algo que não existia. Mas o que mais me incomodava era a sua essência, ou a falta dela.

Ela era humana.

Nada em seu cheiro indicava uma loba. Nenhum traço do que eu reconheceria instintivamente. Apenas a suavidade do perfume de baunilha e algo mais sutil, algo que me fazia querer me aproximar, embora cada instinto em mim gritasse que aquilo era um erro.

— Seu nome. — Minha voz soou mais áspera do que eu pretendia.

Ela engoliu em seco antes de responder.

— Lin. — O nome saiu suave, mas o suficiente para causar uma reviravolta desconfortável no meu estômago.

"Lin".

O som não parecia certo. Como se fosse uma mentira ou um eco distorcido de algo que deveria ser diferente. Algo dentro de mim odiou aquele nome, e isso me irritou mais do que eu gostaria de admitir.

— Sente-se, senhorita Lin. Isso será interessante. — Me sentando, inclinei-me para frente, entrelaçando os dedos sobre a mesa, observando cada detalhe dela. Como seus cabelos avermelhados pareciam lutar para se soltarem do coque atrás de sua cabeça. O modo como suas mãos repousavam sobre o colo, os ombros rígidos, a forma como seu olhar se mantinha fixo em mim, como se quisesse me desafiar.

Ela não desviava o olhar.

Isso me fez sorrir, frio e calculado.

— Vejo que não tem experiência relevante para a vaga. — Passei os olhos pela pasta que minha assistente havia preparado. Era um currículo fraco, para dizer o mínimo.

— Eu aprendo rápido — ela rebateu, mantendo a voz firme.

Inclinei a cabeça levemente, avaliando sua expressão. Havia algo de familiar nela, mas por mais que tentasse puxar qualquer memória, encontrava apenas um vazio irritante.

— Aprender rápido não é o suficiente quando se trata dos meus negócios, senhorita Lin. — Me recostei na cadeira, observando-a com mais intensidade. — Me diga, por que exatamente decidiu se candidatar para esta empresa?

Ela hesitou por um momento antes de responder.

— Porque preciso do emprego.

— Isso qualquer um aqui precisa — retruquei de imediato, mantendo minha expressão impassível. — Mas você, especificamente, por que quer trabalhar na Blackthorn Enterprises?

Ela se mexeu na cadeira, desconfortável.

— Porque ouvi dizer que pagam bem. E eu preciso ajudar a minha família.

Minha sobrancelha arqueou ligeiramente.

— E o que exatamente faz a sua família?

Houve outra pausa. O leve franzir de sua testa me disse que ela estava escolhendo suas palavras cuidadosamente.

— São pessoas simples. Trabalhadores honestos.

Uma resposta vaga. Boa o suficiente para alguém sem algo a esconder, mas genérica demais para não chamar minha atenção. Cruzei os braços, analisando-a mais de perto.

— Interessante.

A mandíbula dela se contraiu levemente, mas sua postura permaneceu firme. Ela não gostava do que eu estava fazendo, e eu sabia disso. Mas o desconforto dela somente me incentivou a continuar.

— Me fale sobre você, senhorita Lin. — Deixei a pasta com seu currículo de lado e foquei minha atenção inteiramente nela. — Onde nasceu? Qual seu histórico profissional?

Ela piscou, e naquele momento, vi algo cruzar seus olhos. Algo que se assemelhava a... medo?

— Eu… morei em vários lugares — respondeu, desviando por um instante o olhar para a janela. — Trabalhei no comércio local, nada muito grande.

Outro lampejo de incômodo atravessou meu peito. Algo não estava certo.

— E antes disso? — continuei, forçando um sorriso afiado.

— Não acho que meu passado importe para a vaga, senhor Blackthorn. — Seus olhos voltaram para mim, desafiadores.

Meu sorriso aumentou. Ela era esperta.

— Oh, mas importa. — Mantive meu tom leve, mas firme. — Preciso saber com quem estou lidando.

Ela permaneceu em silêncio por alguns segundos, e aquilo me irritou. O modo como ela evitava as perguntas, como se estivesse deliberadamente tentando esconder algo. Havia um jogo acontecendo ali, e eu queria saber as regras.

— O que exatamente o senhor quer saber? — Ela quebrou finalmente o silêncio, cruzando os braços.

Me inclinei levemente para frente, aproximando-me o suficiente para sentir o leve perfume de baunilha que vinha dela.

— Quero saber o que exatamente você está fazendo aqui. — Minhas palavras saíram mais baixas, carregadas de intenção.

A tensão entre nós se tornou palpável. Eu podia ouvir sua respiração acelerar, ver a contração quase imperceptível de seus dedos contra a barra da saia.

E então, como se se lembrasse de algo, sua expressão se suavizou.

— Estou apenas buscando uma oportunidade — respondeu, agora mais controlada.

Mentirosa.

Mas uma mentirosa convincente.

Me recostei novamente, observando-a por mais alguns segundos. Havia algo nela que me atraía de maneira absurda, algo que fazia com que cada fibra do meu ser gritasse para que eu descobrisse mais.

E isso me irritava.

— Certo. Última pergunta. — Bati o dedo indicador sobre a pasta, inclinando levemente a cabeça. — Por que acha que alguém como você, sem experiência e sem um histórico profissional relevante, merece uma vaga na minha empresa?

Ela me olhou nos olhos, e por um segundo, vi um lampejo de desafio.

— Porque eu nunca desisto.

O brilho em seus olhos, tão determinados e atrevidos, até mesmo sua postura orgulhosa, mesmo que seu cheiro mostrasse hesitação e medo. A mulher diante de mim atraia a minha atenção como nenhuma outra jamais fez. Com exceção de uma.

Aquele mistério, eu desejava desvendá-lo de alguma maneira.

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