Praça central de Minerva...
Mousame Castlen desceu da carruagem que o conduzira até a praça central de Minerva, estava ali porque recebera uma mensagem de Orlock chefe da guarda da cidade comunicando-lhe que naquela manhã uma terrível fera fora aprisionada no litoral da cidade.
Orlock sempre fora um tanto exagerado, mas era também um militar extraordinário o que justificava sua importantíssima posição. Assim que fora avisado sobre o invasor, ele reunira seus homens e o perseguira pela praia até prendê-lo, depois enviara uma mensagem para lorde Castlen e outra para ordem sacerdotal de Minerva pedindo instruções.
Mousame Castlen era o lorde soberano do reino de Minerva, sua família datava dos sobreviventes do massacre imposto pelos deuses ao mundo, há mais de novecentos anos atrás. Eles haviam recebido da própria Minerva, deusa da humanidade, a missão de salvar os humanos da ira de sua irmã Nara, a deusa da natureza e governar sobre eles.
Ambas as missões haviam sido cumpridas com êxito fazendo dos Castlen a família mais poderosa de Minerva. Todas as outras famílias do reino lhe pagavam tributos e os reverenciavam como os escolhidos, os verdadeiros filhos de Minerva. Nada poderia ser decidido naquele reino sem o aval do lorde Regente.
Mousame olhou para multidão que o cercava e irritou-se, seria seu comandante incapaz de resolver um problema tão simples sem criar um grande tumulto?
Assim que o avistou Orlock correu ao seu encontro e prostrou-se respeitosamente, era um homem franzino de olhar opaco e pele amarelada, porém movia-se com a graça de um tigre. Mousame retirou a luva negra que cobria sua mão direita e estendeu a mesma para seu subalterno que a beijou respeitosamente e depois disse:
- Meu lorde, graças à Deusa, pudeste vir! Estávamos perdidos sem a vossa orientação.
- Deixe de tantos floreios, Orlock e diga-me de uma vez o que era tão importante para tirar-me da companhia de minha querida esposa - Ordenou Mousame irritado com aquela costumeira bajulação.
- Meu lorde, nunca vi nada igual antes, uma criatura horrenda, de estatura descomunal, corpo de homem, mas a cabeça não é humana! A cabeça é de um touro - disse Orlock apontando para a jaula onde se encontrava Isfahan - Feriu vários de nossos melhores homens e matou três antes que pudéssemos aprisioná-lo.
Mousame olhou para a jaula que o soldado apontava e achou difícil acreditar no que seus olhos viam. Aproximou-se admirando a fera que lá dentro se encontrava, devia ter mais de dois metros de altura, seus braços e pernas eram bem constituídos como os membros de um guerreiro, mas recobertos por uma pelugem castanha, a fera parecia querer se comunicar, mas estava debilitada por causa dos ferimentos que sofrera.
Mousame viu um enorme potencial, naquela criatura, sua força descomunal e sua incrível resistência faziam dele uma arma de guerra incomparável, já ouvira falar daqueles seres em lendas, mas nunca imaginara se encontrar frente a frente com um deles.
Os minervianos eram muito supersticiosos, portanto, Mousame concluiu que aquele acontecimento deveria ser um sinal da própria deusa, aquela criatura chegara do mar numa noite de intensa tempestade e naufragara exatamente nas costas da maior metrópole humana, o que fazia daquilo, aos olhos do regente, mais do que uma simples coincidência.
Aquele ser era alguém importante “o mensageiro de uma nova era!” Um sinal de uma grande mudança, que tanto poderia ser benéfica quanto uma completa tragédia.
- Que criatura mais magnífica! - exclamou admirado - Quantos homens disse que ele derrubou?
- Deixou pelo menos uns trinta gravemente feridos.
- Que força descomunal! - exclamou Mousame pensando nas inúmeras possibilidades-Imagine o que poderíamos fazer com tão poderosa criatura?!
- O que está dizendo, meu lorde, a criatura é insana e muito perigosa! - exclamou Orlock chocado.
- Bobagem, é um ser bruto! Com tempo e determinação podemos domesticá-lo e usá-lo como uma ferramenta.
Orlock encarava seu senhor espantado, mas Mousame preferiu ignorá-lo. Embora fosse um soldado extremamente habilidoso, o guerreiro não tinha nenhum tino para política.
A cidade de Minerva era formada por inúmeros feudos governados por senhores que possuíam sua própria força militar, algumas grandes o suficiente para desequilibrar o jogo de poder e infelizmente nem todos apoiavam o atual regente.
Até o momento seus opositores haviam respeitado o poder que o regente e seus aliados possuíam, mas Mousame não era ingênuo de acreditar que este respeito seria duradouro.
Era apenas uma questão de tempo até seus inimigos se sentirem preparando para quando a hora certa chegasse. Ele sabia que uma arma como aquela criatura poderia ser decisiva principalmente considerando a possibilidade dele não ser o único da sua espécie.
No entanto, antes que ele considerasse a ideia de explicar alguma coisa ao guerreiro, um novo som rompeu e dispersou mais uma vez a multidão assustada, dando passagem a outra carruagem.
Esta carruagem era toda dourada com uma margarida vermelha pintada no seu centro, todos os que observavam o veículo sentiram o temor e o respeito que a sagrada ordem sacerdotal de Minerva causava sempre que surgia. Ela era a segunda maior potência política naquele reino ficando atrás tão somente do poder do regente.
Entretanto, se no campo da política, o poder da ordem sacerdotal estava abaixo do Regente, no aspecto religioso ela era simplesmente inquestionável, a própria voz da deusa, aqueles que conversavam com Minerva e transmitiam seus desígnios ao regente e seu conselho.
A portinhola da carruagem abriu-se debaixo do som maravilhado que a multidão emitia, do seu interior desceram três homens trajados com as típicas vestes sacerdotais brancas ornamentadas com bordados dourados, porém o que mais chamava atenção era a margarida, o símbolo da deusa Minerva, bordada no peito.
O sacerdote que estava no meio dirigiu-se ao lorde Regente.
- Lorde Mousame é uma honra encontrá-lo aqui.
- Beldan, Harã e Joctã, o que fazem os três sumo-sacerdotes de Minerva tão longe do seu templo? - Indagou Mousame com desagrado, há muito que a ordem sacerdotal se tornara uma pedra no sapato do novo líder.
- Viemos por causa da criatura - respondeu Harã o mais eminente dos sumo-sacerdotes.
- E porque os porta-vozes de nossa deusa haveriam de incomodar-se com um assunto tão mundano? - Questionou Mousame desconfiado.
- A deusa nos falou sobre ele.
Toda a multidão que jazia calada começou a murmurar maravilhada com o poder dos sacerdotes.
- Silêncio! - ordenou Mousame - e o que disse nossa adorada Deusa?
-Disse que a tal criatura é uma maldição - respondeu Harã instigando ainda mais o murmúrio do povo - e como tal deve ser sacrificada.
- Maldição? - indagou Mousame perplexo.
- Sim, a criatura é uma mistura profana entre um humano e um animal, o que desagrada nossa deusa- explicou Harã como se falasse para uma criança.
- Sim, posso compreender, mas matá-lo?! Parece-me um tanto exagerado...
- Lorde Castlen, és muito jovem e não conheces ainda todos os nossos rituais como os conhecia o senhor seu pai, deixe que cuidamos disso para ti – ofereceu Harã.
- De forma nenhuma - retrucou Mousame - Esta é uma decisão do representante de Minerva na terra e este até onde me consta sou eu.
- Sim, meu senhor- respondeu Harã - e como representante de nossa deusa, é claro que irás apressar-te em realizar a sua vontade ou será que não?
A mão de Mousame escorregou rapidamente até o cabo da espada.
- O que estais a insinuar? Por acaso ousas faltar com o respeito devido a um Castlen?!
-Eu jamais ousaria desrespeitar um Castlen- assegurou o sumo sacerdote num tom de desdém – a menos é claro que este se negasse a cumprir para com o seu santo em relação á com nossa Deusa.
A atitude indecorosa do sumo sacerdote intensificou os burburinhos, mas o som de uma espada desembainhando silenciou todos ao redor.
O sacerdote afastou-se assustado, Mouse Castlen aproximou-se resoluto e exclamou:
- O que estais a insinuar alma pérfida?!Por acaso ousas acusar-me de heresia?
Harã era o mais eminente entre os sumo-sacerdotes de Minerva, o que fazia dele um homem arrogante e destemido, mas nem mesmo ele conseguiria manter-se impassivo diante de uma acusação de heresia, emitida pelo próprio lorde regente o que com certeza culminaria numa sentença de morte.
Mousame assistiu a arrogância ser drenada do rosto de seu oponente deixando - o branco como cera.
- Perdoe-me, meu senhor, por amor à Minerva! Não quis faltar-lhe com…
-Talvez eu devesse abrir-lhe as entranhas aqui mesmo - ameaçou Mousame - e lavar minha honra com o seu sangue na frente de toda essa multidão.
Harã desviou o olhar amedrontado e não foi capaz de continuar falando, mas o sumo sacerdote que estava à sua direita aproximou-se do lorde regente e com toda a dignidade pediu:
- Meu senhor, acalme-se! Por quem és, ordene que seja cumprida a ordem de nossa deusa e ponha um fim neste episódio lamentável.
O lorde regente percebeu que o sacerdote tinha razão e solapando a própria indignação fez sua espada retornar lentamente a sua bainha.
- Harã - disse lorde Castlen - A próxima vez que esqueceres o teu lugar e me faltares com o devido respeito serás deposto do seu cargo e executado em praça pública por traição, fui claro?
- Sim, meu senhor - disse ele, curvando-se respeitosamente- Obrigado por sua misericórdia!
Mousame Castlen olhou novamente para a jaula onde se encontrava a criatura, era um grande desperdício exterminar tão esplêndido ser, mas a vontade de Minerva era absoluta e incontestável até mesmo para ele, infelizmente esta vontade era interpretada pela ordem sacerdotal.
- Beldan, faça como disse a nossa deusa - Ordenou o lorde - amanhã ao pôr do sol a criatura será executada.
Mousame fez um gesto para multidão e contrariado voltou-se para a sua carruagem e deixou o lugar. Dentro da jaula, Isfahan não fora capaz de entender nada na discussão que ali se dera, mas sentiu que sua sorte o abandonara juntamente com o homem vestido de preto.
Centro de Minerva... Dentro dos muros de Minerva, havia uma capela oferecida à deusa Nara, esta política de disponibilizar um pequeno santuário a deusa da cidade vizinha surgiu aproximadamente cem anos depois da grande ruptura. Há mais de quatro séculos quando algumas famílias vassalas da família Castlen, revoltadas com a política de escravidão e os constantes sacrifícios humanos à deusa Minerva resolveram lançar-se ao mar para encontrar outro lugar onde pudessem viver conforme seus ditames. Certos de que eles não teriam outra opção senão voltar, o lorde regente de Minerva não se opôs a sua partida. Após dias à deriva em alto mar, já contando a morte como certa, deu-se uma tempestade que arremessou os barcos contra as costas de outra ilha salvando quase todos os que saíram de Minerva. Os sobreviventes vagaram durante uma semana por uma ilha devastada e deserta, até que encontraram uma imensa rocha de cristal transparente e dentro de
Masmorras da ordem sacerdotal de Minerva... A noite findava envolta num frio intimidante, dois guardas protegiam a entrada das catacumbas do pasto comunal. O pasto era uma imensa propriedade territorial que pertencia a ordem sacerdotal de Minerva e que era também onde ficavam as masmorras da cidade. Essas enormes grutas haviam sido transformadas em prisões onde costumavam colocar os criminosos condenados pela deusa. As masmorras eram protegidas pela guarda sacerdotal, um grupo de guerreiros de elite que serviam aos sumo-sacerdotes. Naquela noite, eles deveriam se revezar na guarda da infame criatura que seria sacrificada no outro dia. Os guardas na verdade estavam tranquilos pois julgavam impossível que alguém tivesse coragem de invadir o pasto comunal, ainda mais para resgatar um monstro. Estavam conversando distraidamente e não viram quando duas sombras se aproximaram no horizonte. Eram dois homens, vestidos de roupa sacer
Nas masmorras da ordem sacerdotal de Minerva... Dalson correu até a bifurcação central da prisão era lá que ficava o sino de prata que servia como alarme contra a fuga de prisioneiros, em poucos segundos as outras sentinelas despertariam e começariam a tocar seus respectivos sinos em resposta ao pedido de socorro do guarda, seria uma questão de minutos até Harã saber do ocorrido e enviar todas suas tropas para masmorra. Dalson não podia permitir que aquilo acontecesse, pois frustraria definitivamente os planos de seu senhor. O guerreiro acreditava em Joctã Blaster tinha plena convicção de que ele era um santo escolhido pela própria deusa para levar ao mundo sua vontade, por isso o seguira naquela empreitada mesmo contrariando todo o bom senso. Se Minerva realmente falava com o padre, coisa na qual Dalson apostaria a sua vida, então ela mostraria uma forma de se realizar aquela missão por mais suicida que fosse, era naquilo que o guerreiro
Nas masmorras da ordem sacerdotal de Minerva... Dalson corria freneticamente arrastando consigo o amigo ferido, atrás deles vinham Joctã, Mirles e Isfahan. Ao longe já se ouvia o ressoar dos inúmeros sinos que havia no pasto convocando os guerreiros, era apenas uma questão de tempo até encontrarem seu rastro e por isso ele precisava colocar o máximo de distância possível entre ele e seus perseguidores. O subterrâneo era um intricado de cavernas, um imenso labirinto para aqueles que desconheciam seus segredos, para Dalson, no entanto era sua segunda casa, entrou por uma intersecção, avançou numa espécie de corredor até desembocar noutra gruta. Esta estava ligada a uma bifurcação em cruz, escolheu o caminho da esquerda e prosseguiu avançando cada vez mais para dentro da terra, o solo descia como se fosse uma rampa de barro, as paredes se estreitavam, o ar se tornava rarefeito, os archotes na sua maioria apagados deixavam o ambiente numa penumbra mórbida. Isfah
Nas masmorras da ordem sacerdotal de Minerva... A explosão comprometeu toda a estrutura do túnel, o barulho foi inimaginável quase ensurdeceu Isfahan, o fogo alastrou-se rapidamente lambendo tudo ao seu alcance, o calor queimava, a fumaça sufocava, o cheiro de pólvora mesclou-se ao pouco de ar que ainda havia. Dalson e os outros humanos prenderam a respiração e continuaram a correr naquele breu, somente o som dos passos era seu guia. Continuaram sempre em frente, tateando, escorregando, mas sempre seguindo em frente. Dalson guiava o grupo, mas seu cérebro sem ar, sufocado pela fumaça começava a pregar-lhe peças, felizmente após uma curva encontraram um archote reluzindo, o guerreiro arrancou da parede e pode iluminar o caminho, em sua frente estendia-se uma bifurcação com três prováveis saídas, ele seguiu o do meio. Correram por túneis, grutas sem parar sequer para respirar, passando por várias curvas e bifurcações chegaram pôr fim a o
Litoral de Minerva... Dalson olhou para baixo sem acreditar, o Minotauro os levara a uma provável saída, mas não a que ele procurava. Mirles deixou-se cai junto ao paredão insuflando os pulmões de ar puro enquanto Joctã tentava dialogar com uma fera em pânico. Isfahan, passado o surto inicial, voltara correndo para a segurança do túnel. Seus olhos esbugalhados demonstravam seu pânico, o coração parecia querer saltar pela boca. Por mais que o sacerdote tentasse explicar que estava em segurança a fera parecia não conseguir ouvi-lo, tamanho era seu pavor. -Não adianta insistir com ele, padre - disse Dalson voltando-se para Joctã - Ele deve ser como os bois que enlouquecem quando são tirados do chão. -O que faremos agora? - indagou Mirles juntando-se ao grupo. -Temos que sair daqui - disse Dalson - Os soldados de Harã conhecem as catacumbas tão bem quanto eu e não vão demorar a perceber que estamos tentando chegar à praia, logo eles darão a volta por terra e n
Mar de Minerva... Mirles segurou-se no corrimão para não escorregar, o barco balançava incessantemente, reiniciou a descida com cuidado, fora muito difícil conseguir um comerciante nariano disposto a contrabandear o minotauro para fora de Minerva. Todos tinham muito medo da criatura, a aparência assustadora do minotauro não permitia a mais ninguém ver o que Mirles fora capaz de ver, uma alma boa, assustada, indefesa. Depois de horas de negociação e duma considerável soma em dinheiro que Joctã Blaster pagou sem titubear o negócio foi selado.O minotauro foi colocado no porão ainda preso a correntes muito grossas uma das condições imposta pelo capitão do navio. O padre Mirles era o único com autorização para descer até lá, não que a proibição fosse necessária os outros marinheiros estavam assustados demais para chegar perto do porão. O pequeno barco seguiu viagem, pesado e lento, estava com o porão abarrotado de frut
Cidade de Nara - Castelo Caarano... As ondas batiam contra o casco violentamente, Ulisses tentava manter o barco firme mais era uma proeza além dos seus conhecimentos de marujo. Os marinheiros corriam atemorizados, o cheiro da morte impregnava o ar, chocavam-se em desespero à medida que o barco os sacudia de um lado para o outro. De repente um rochedo apareceu em sua frente, tentou desviar, mas o barco parecia ser puxado em sua direção por uma força superior. O desastre era iminente, os gritos de surpresa e terror cortavam o ar, mas de repente estancaram frente à magnífica visão que se formou diante de seus olhos. Ela era sem dúvida alguma um ser divino, a mulher mais linda que