Centro de Minerva...
Dentro dos muros de Minerva, havia uma capela oferecida à deusa Nara, esta política de disponibilizar um pequeno santuário a deusa da cidade vizinha surgiu aproximadamente cem anos depois da grande ruptura.
Há mais de quatro séculos quando algumas famílias vassalas da família Castlen, revoltadas com a política de escravidão e os constantes sacrifícios humanos à deusa Minerva resolveram lançar-se ao mar para encontrar outro lugar onde pudessem viver conforme seus ditames.
Certos de que eles não teriam outra opção senão voltar, o lorde regente de Minerva não se opôs a sua partida.
Após dias à deriva em alto mar, já contando a morte como certa, deu-se uma tempestade que arremessou os barcos contra as costas de outra ilha salvando quase todos os que saíram de Minerva.
Os sobreviventes vagaram durante uma semana por uma ilha devastada e deserta, até que encontraram uma imensa rocha de cristal transparente e dentro dessa rocha de forma que qualquer um pudesse ler flutuava um pergaminho onde dizia:
“Sou Nara, irmã de Minerva, eu guiei seus barcos até essa ilha, onde poderão esconder-se da fúria de minha irmã. Construam sua cidade aos pés desta rocha e minha irmã saberá que estão sobre minha proteção.”
Aos pés daquela pedra foi construída a cidade que mais tarde seria capital do novo reino humano, a cidade de Nara assim chamada em homenagem à deusa que os acolhera.
A família que comandou a fuga foi também a que assumiu o governo de Nara, chamava-se família Carrano.
Depois de quase cem anos de constantes hostilidades os dois reinos chegaram à conclusão de que poderiam viver em paz inclusive se ajudando mutuamente, desde que cada reino respeitasse o jeito de ser do outro.
Como prova de boa vontade, cada reino ergueu uma capela em homenagem a deusa do reino aliado, para que os visitantes pudessem praticar sua fé mesmo longe de casa.
Nada disto, no entanto, passava pela mente de Joctã Blaster quando este se esgueirou pelos edifícios da cidade de forma a não ser visto.
Ele precisava chegar à capela de Nara antes que os outros sumo-sacerdotes dessem por sua falta, Joctã era o mais jovem dos sumos - sacerdotes de Minerva, por isso sua opinião quase não era aceita pelos outros dois.
Desde que assumira como sumo-sacerdote, Joctã percebera que Harã não gostava da sua pessoa, nunca dava atenção às suas opiniões e nunca perdia uma chance de ridicularizá-lo.
Com o tempo aprendera a ignorar o colega de oficio, o que aparentemente só fizera aumentar o seu rancor.
Na noite em que a criatura chegara a cidade, Joctã tivera um sonho, que acreditara ser uma mensagem da própria da própria deusa, onde ela o instruía a proteger a criatura que naufragaria nas costas da sua cidade.
O sacerdote, no entanto, sabia que não adiantaria contar para seus colegas sobre o sonho que tivera com o monstro, pois ambos já haviam decidido que ele deveria ser executado.
Joctã sabia que a muito a ambição e a arrogância os haviam cegado para que não enxergassem a vontade de Minerva.
O padre adentrou a pequena capela e avistou seu amigo Mirles, um sacerdote da deusa Nara, arrumando o altar para a cerimônia da tarde.
Assim que o viu, o amigo veio são seu encontro com um sorriso nos lábios:
- Joctã, que visita inesperada! A que devo esta honra? -disse Mirles
-Mirles, meu amigo, preciso que me ajude em algo muito complicado- Joctã foi logo dizendo.
- Do que se trata? - Indagou Mirles a medida que o sorriso fugia-lhe do rosto.
- Soubeste da criatura encontrada na praia? -Perguntou Joctã após certificar-se de que ambos estavam sozinhos.
- O monstro profano? Soube que será executado amanhã ao pôr do sol - respondeu Mirles.
-Não podemos permitir que isto aconteça, precisamos salvá-lo- avisou Joctã sem rodeios.
-Mas eu não entendo, por quê?
-Porque está é a vontade de Minerva! - Declarou Joctã com convicção.
***
Masmorras da Ordem sacerdotal de Minerva...
Mirles adentrou o buraco lúgubre que Joctã chamou de masmorra, nunca havia estado ali, sua autorização para transitar dentro de Minerva restringia-se da capela de Nara até sua residência, uma pequena casa paroquial, cedida pela família Castlen no centro da cidade.
Apesar da aparente trégua entre Nara e Minerva, a liberdade religiosa ainda era um sonho impossível.
Os Minervino eram um povo desconfiado e preconceituoso que não gostava de ver seus valores e crenças contestados, assim a simples existência de uma capela em honra a Nara em território Minervino representava uma vitória da fé e da diplomacia, principalmente depois da última guerra.
Este conflito durara mais de quarenta anos e arrebatara milhares de vidas tanto de uma cidade quanto da outra, a chuva de sangue só tiveram fim quando o avô de Mousame assinara com o pai do atual regente de Nara um tratado de paz que incluía entre outras clausulas a reconstrução dos respectivos santuários em cada cidade, bem como o envio de um representante de cada fé para reconstruir o culto á suas divindades.
Fora assim que Mirles acabara indo para na cidade vizinha e apesar das restrições impostas por sua situação de imigrante, ele não tinha de fato do que se queixar.
Nada lhe faltava e era tratado por todos com decoro e respeito embora soubesse que por suas costas era visto com antagonismo.
Sabia da importância de sua missão, levar a fé de Nara até os incrédulos, fora isto que o tirara de sua casa e o fizera atravessar o mar, mas não era uma missão fácil, os minervianos sequer reconheciam a existência da pequena capela.
Durante os dois anos que ali vivera como representante de Nara, Mirles nunca tivera uma oportunidade real de falar de sua deusa para as famílias minervianas, a capela era visitada exclusivamente por narianos que visitavam Minerva para fazer negócios.
Enquanto em Nara a capela em homenagem a Minerva chegava a ser visitada por uma pequena parcela da população, em Minerva não havia nenhum interesse em cultuar sua irmã.
Contudo Mirles acreditava que realizava um trabalho importante, gostava de representar um porto seguro para os poucos fiéis que o procuravam, almas atribuladas e distantes de casa que buscavam no amor de sua deusa uma forma de vencer a solidão.
E era este fato que fazia com que Mirles não visse com bons olhos o pedido de Joctã, intervir numa questão religiosa local seria um completo suicídio diplomático.
Lorde Mousame sentenciara a criatura a execução e não havia nada que Mirles ou qualquer outra pessoa pudesse fazer para salvá-lo, o sonho que Joctã tivera não mudaria nada, a fera já estava condenada.
O que provavelmente seria o melhor para todos, uma fera deste porte não deveria viver, era muito perigoso, apesar de suas convicções Mirles devia um favor a Joctã que o salvara no passado de um incidente que poderia ter causando-lhe a morte e obviamente não podia negar-se a ajudá-lo.
Por isso concordara em ir com ele para ver o monstro, ele havia sido preso nas catacumbas que ficavam abaixo da mansão paroquial, sede da ordem sacerdotal de Minerva, onde deveria ficar até o pôr do sol do outro dia quando seria executado.
O objetivo de Mirles era ir até o local e então após ver o terrível monstro assegurar a Joctã que nada poderia ser feito e que ele deveria se conformar com o triste fim da criatura, mas não contava com o que viu quando chegou lá.
Era um monstro de tamanho e formas imponentes, acorrentado a parede por correntes extremamente grossas, e cercado por uma jaula de barras de ferro muito resistente.
A criatura jazia caída ao chão exausta e encharcada numa poça de seu próprio sangue, era um imenso homem do pescoço para baixo algo em torno de dois metros de altura, mas tinha a cabeça de um touro com chifres grande o suficiente para abri um homem ao meio.
- Aqui está ele - disse Joctã - preciso de sua ajuda.
Mirles aproximou-se da grade, a criatura não se mexeu apenas olhou para ele com os olhos suplicantes e suspirou, ele esperava encontrar um monstro cruel e violento, uma terrível aberração, no entanto o que viu foi um uma criatura assustada, ferida, incapaz de machucar alguém.
A fera ergueu os olhos para ele e o sacerdote conseguiu ver a dor em seus olhos, era uma dor tão intensa que o comoveu profundamente, aquele ser era diferente, ele não era um monstro não merecia morrer daquele jeito, o amor de Nara falou-lhe ao coração naquele momento e ele soube o que tinha de fazer.
-Diga o que você pretende fazer - pediu Mirles penalizado.
Masmorras da ordem sacerdotal de Minerva... A noite findava envolta num frio intimidante, dois guardas protegiam a entrada das catacumbas do pasto comunal. O pasto era uma imensa propriedade territorial que pertencia a ordem sacerdotal de Minerva e que era também onde ficavam as masmorras da cidade. Essas enormes grutas haviam sido transformadas em prisões onde costumavam colocar os criminosos condenados pela deusa. As masmorras eram protegidas pela guarda sacerdotal, um grupo de guerreiros de elite que serviam aos sumo-sacerdotes. Naquela noite, eles deveriam se revezar na guarda da infame criatura que seria sacrificada no outro dia. Os guardas na verdade estavam tranquilos pois julgavam impossível que alguém tivesse coragem de invadir o pasto comunal, ainda mais para resgatar um monstro. Estavam conversando distraidamente e não viram quando duas sombras se aproximaram no horizonte. Eram dois homens, vestidos de roupa sacer
Nas masmorras da ordem sacerdotal de Minerva... Dalson correu até a bifurcação central da prisão era lá que ficava o sino de prata que servia como alarme contra a fuga de prisioneiros, em poucos segundos as outras sentinelas despertariam e começariam a tocar seus respectivos sinos em resposta ao pedido de socorro do guarda, seria uma questão de minutos até Harã saber do ocorrido e enviar todas suas tropas para masmorra. Dalson não podia permitir que aquilo acontecesse, pois frustraria definitivamente os planos de seu senhor. O guerreiro acreditava em Joctã Blaster tinha plena convicção de que ele era um santo escolhido pela própria deusa para levar ao mundo sua vontade, por isso o seguira naquela empreitada mesmo contrariando todo o bom senso. Se Minerva realmente falava com o padre, coisa na qual Dalson apostaria a sua vida, então ela mostraria uma forma de se realizar aquela missão por mais suicida que fosse, era naquilo que o guerreiro
Nas masmorras da ordem sacerdotal de Minerva... Dalson corria freneticamente arrastando consigo o amigo ferido, atrás deles vinham Joctã, Mirles e Isfahan. Ao longe já se ouvia o ressoar dos inúmeros sinos que havia no pasto convocando os guerreiros, era apenas uma questão de tempo até encontrarem seu rastro e por isso ele precisava colocar o máximo de distância possível entre ele e seus perseguidores. O subterrâneo era um intricado de cavernas, um imenso labirinto para aqueles que desconheciam seus segredos, para Dalson, no entanto era sua segunda casa, entrou por uma intersecção, avançou numa espécie de corredor até desembocar noutra gruta. Esta estava ligada a uma bifurcação em cruz, escolheu o caminho da esquerda e prosseguiu avançando cada vez mais para dentro da terra, o solo descia como se fosse uma rampa de barro, as paredes se estreitavam, o ar se tornava rarefeito, os archotes na sua maioria apagados deixavam o ambiente numa penumbra mórbida. Isfah
Nas masmorras da ordem sacerdotal de Minerva... A explosão comprometeu toda a estrutura do túnel, o barulho foi inimaginável quase ensurdeceu Isfahan, o fogo alastrou-se rapidamente lambendo tudo ao seu alcance, o calor queimava, a fumaça sufocava, o cheiro de pólvora mesclou-se ao pouco de ar que ainda havia. Dalson e os outros humanos prenderam a respiração e continuaram a correr naquele breu, somente o som dos passos era seu guia. Continuaram sempre em frente, tateando, escorregando, mas sempre seguindo em frente. Dalson guiava o grupo, mas seu cérebro sem ar, sufocado pela fumaça começava a pregar-lhe peças, felizmente após uma curva encontraram um archote reluzindo, o guerreiro arrancou da parede e pode iluminar o caminho, em sua frente estendia-se uma bifurcação com três prováveis saídas, ele seguiu o do meio. Correram por túneis, grutas sem parar sequer para respirar, passando por várias curvas e bifurcações chegaram pôr fim a o
Litoral de Minerva... Dalson olhou para baixo sem acreditar, o Minotauro os levara a uma provável saída, mas não a que ele procurava. Mirles deixou-se cai junto ao paredão insuflando os pulmões de ar puro enquanto Joctã tentava dialogar com uma fera em pânico. Isfahan, passado o surto inicial, voltara correndo para a segurança do túnel. Seus olhos esbugalhados demonstravam seu pânico, o coração parecia querer saltar pela boca. Por mais que o sacerdote tentasse explicar que estava em segurança a fera parecia não conseguir ouvi-lo, tamanho era seu pavor. -Não adianta insistir com ele, padre - disse Dalson voltando-se para Joctã - Ele deve ser como os bois que enlouquecem quando são tirados do chão. -O que faremos agora? - indagou Mirles juntando-se ao grupo. -Temos que sair daqui - disse Dalson - Os soldados de Harã conhecem as catacumbas tão bem quanto eu e não vão demorar a perceber que estamos tentando chegar à praia, logo eles darão a volta por terra e n
Mar de Minerva... Mirles segurou-se no corrimão para não escorregar, o barco balançava incessantemente, reiniciou a descida com cuidado, fora muito difícil conseguir um comerciante nariano disposto a contrabandear o minotauro para fora de Minerva. Todos tinham muito medo da criatura, a aparência assustadora do minotauro não permitia a mais ninguém ver o que Mirles fora capaz de ver, uma alma boa, assustada, indefesa. Depois de horas de negociação e duma considerável soma em dinheiro que Joctã Blaster pagou sem titubear o negócio foi selado.O minotauro foi colocado no porão ainda preso a correntes muito grossas uma das condições imposta pelo capitão do navio. O padre Mirles era o único com autorização para descer até lá, não que a proibição fosse necessária os outros marinheiros estavam assustados demais para chegar perto do porão. O pequeno barco seguiu viagem, pesado e lento, estava com o porão abarrotado de frut
Cidade de Nara - Castelo Caarano... As ondas batiam contra o casco violentamente, Ulisses tentava manter o barco firme mais era uma proeza além dos seus conhecimentos de marujo. Os marinheiros corriam atemorizados, o cheiro da morte impregnava o ar, chocavam-se em desespero à medida que o barco os sacudia de um lado para o outro. De repente um rochedo apareceu em sua frente, tentou desviar, mas o barco parecia ser puxado em sua direção por uma força superior. O desastre era iminente, os gritos de surpresa e terror cortavam o ar, mas de repente estancaram frente à magnífica visão que se formou diante de seus olhos. Ela era sem dúvida alguma um ser divino, a mulher mais linda que
Porto de Nara... O barco entrou no porto suavemente, o grito do capitão dando ordens varria o espaço, era um frenesi enlouquecedor de mercadorias sendo desembarcadas, Mirles postou-se ao lado do engradado de ferro no qual convencera Isfahan a entrar. Os carregadores olhavam com desconfiança para a caixa de metal que continha uma fera jamais vista naqueles mares. Isfahan ficou quieto sem demonstrar nenhuma atitude que pudesse ser encarada como agressão. Mirles olhava para além do porto como que buscando uma inspiração. A Cidade de Nara era a segunda maior metrópole humana, fundada numa ilha que ficava á quase um mês de viagem daquela onde ficava a cida