Depois que Carlos terminou de falar, sai do galpão, minha cabeça fervilhava. A traição de Heitor, a insistência de Carlos, as dúvidas que pareciam me cercar como um predador à espreita. Minhas mãos tremiam levemente, algo raro em mim, e eu sabia exatamente o que precisava fazer: encontrar um momento de escape, mesmo que fosse breve.
Assim que cheguei ao palácio, ignorei Matteo e os outros seguranças. Subi direto para o bar privativo, um espaço elegante no andar superior que raramente era usado, exceto por mim. A iluminação suave refletia nas prateleiras repletas de garrafas caríssimas, cada uma escolhida a dedo por meu pai antes de sua saúde começar a definhar. Era um lugar que cheirava a tradição, poder e solidão.
Servi-me de um uísque, sem gelo. O líquido âmbar desceu queimando, mas trouxe o alívio que eu buscava. Apoiei-me no balcão, encarando meu reflexo no espelho atrás das garrafas. A mulher que olhava de volta parecia inabalável, mas eu sabia que, por dentro, havia rachaduras.
— Sozinha, princesa? — A voz rouca de Carlos cortou o silêncio como uma faca.
Virei-me devagar, controlando a surpresa. Ele estava encostado na porta, as mãos nos bolsos, um sorriso ladino nos lábios. Estava sem gravata, o colarinho da camisa aberto, como se quisesse parecer menos ameaçador. Mas com Carlos, essa era a maior das armadilhas.
— Achei que você tinha mais o que fazer do que me seguir, Carlos. — Minha voz saiu seca, mas ele apenas riu, entrando no bar.
— Não é todo dia que vejo Cristina Mendez bebendo sozinha. Pensei que talvez precisasse de companhia. — Ele serviu-se de um conhaque, sem pedir permissão, e levantou o copo em um brinde improvisado. — Às alianças e às verdades incômodas.
Suspirei, mas não recusei o brinde. Nossos copos se tocaram com um leve tinir, e eu tomei mais um gole, sentindo o calor se espalhar pelo corpo.
— O que você realmente quer, Carlos? — perguntei, mantendo meu olhar fixo no dele.
Ele se aproximou, parando ao meu lado no balcão. Era intimidador, mas também magnético. Carlos sempre soube como se posicionar, como fazer as pessoas se sentirem pequenas ou grandes dependendo do que queria delas.
— Quero o que você quer, Cristina: poder. Mas, diferentemente de outros, quero que você o mantenha. — Sua voz tinha uma seriedade que raramente eu via.
— Você acha que eu sou fraca? — desafiei, inclinando-me levemente em sua direção.
Carlos riu baixo, um som grave e provocador.
— Fraca? Não. Acho que você é forte demais, e isso assusta as pessoas. Especialmente homens como Heitor. Ele nunca vai entender o que é lidar com alguém como você.
As palavras dele me atingiram de forma estranha, como se estivesse arrancando uma camada que eu mantinha protegida. Fitei-o por alguns segundos, buscando alguma mentira nos olhos dele, mas tudo o que encontrei foi sinceridade. Ou algo que parecia sinceridade.
Peguei a garrafa de uísque e servi mais uma dose para mim e para ele. Carlos ergueu a sobrancelha, mas não recusou. Bebemos em silêncio por algum tempo, a tensão entre nós crescendo a cada gole.
— Por que você realmente veio aqui esta noite, Carlos? — Minha voz saiu mais baixa, quase como um sussurro.
Ele pousou o copo no balcão e se virou para mim, ficando tão perto que eu podia sentir o cheiro de conhaque em sua respiração.
— Porque você não devia estar sozinha. Não hoje. Não com tudo isso acontecendo.
Meu coração disparou, mas mantive a expressão controlada. Ele levantou a mão, tocando meu rosto com uma gentileza que eu não esperava dele. Por um momento, hesitei, mas não me afastei.
E então, sem aviso, ele me beijou. Não houve hesitação, nem permissão pedida. Seus lábios encontraram os meus com urgência, e eu cedi. Meu corpo reagiu antes que minha mente pudesse questionar. Uma de suas mãos foi para a minha cintura, puxando-me para mais perto, enquanto a outra se apoiava no balcão atrás de mim.
O beijo era uma batalha e uma rendição ao mesmo tempo. Meus dedos deslizaram pelo colarinho da camisa dele, puxando-o com força para eliminar qualquer espaço que ainda existisse entre nós. Sentia o sabor do conhaque em sua boca, misturado à intensidade que ele carregava em cada movimento.
Carlos me ergueu, sentando-me sobre o balcão de mármore do bar. As garrafas e copos ao redor foram esquecidos. Suas mãos deslizaram pelas minhas coxas, subindo pela renda fina do meu vestido enquanto o tecido se tornava uma barreira insignificante. O som dos suspiros e da respiração pesada preencheu o espaço, misturando-se ao pulsar acelerado dos nossos corações.— Você tem certeza? — Ele parou, seus olhos encontrando os meus. A preocupação inesperada nos olhos dele me surpreendeu.— Carlos, pare de falar — murmurei, puxando-o novamente para mim.E foi exatamente isso que ele fez. Não havia mais palavras, apenas toques e olhares que diziam tudo. Ele me carregou para longe do balcão, seus movimentos decididos enquanto me conduzia até o sofá luxuoso ao lado. Suas mãos eram firmes, mas cuidadosas, como se cada toque fosse um estudo da minha pele. E eu me entreguei, deixando de lado as responsabilidades, as alianças, as traições. Por uma noite, eu era apenas Cristina, sem os pesos do meu
— Vejo que o CEO ainda não desistiu. Admirável.Heitor avançou um passo, o olhar endurecido.— Talvez você devesse aprender a respeitar os momentos alheios, Albuquerque.Carlos riu novamente, cruzando os braços.— Respeito? Isso é engraçado, vindo de alguém que parece não conhecer limites.A tensão entre os dois era palpável, e eu sabia que, se não interferisse, aquilo poderia explodir em algo muito pior.— Já chega! — cortei, minha voz firme o suficiente para silenciá-los. — Vocês dois estão agindo como garotos mimados, e isso não vai me levar a lugar algum.Olhei para Heitor, depois para Carlos, meu coração dividido entre a raiva e o cansaço.— Vocês querem jogar um contra o outro? Que joguem, mas não usem meu nome como peça no tabuleiro.Carlos estreitou os olhos, mas o sorriso desapareceu de seus lábios. Heitor apenas assentiu, com o maxilar travado. Sem dizer mais nada, virei-me e saí, deixando-os no corredor.Enquanto me afastava, só uma coisa ecoava na minha mente: no meu mundo
O empurrei com força, sentindo o calor do contato se dissipar rápido demais, mas deixando algo mais profundo – algo que eu não queria admitir – fervendo dentro de mim. Ele passou as mãos pela nuca, claramente frustrado, e depois ajeitou o cabelo, como se tentasse recuperar a compostura.— Você me deixa louco, Cristina — disse Heitor, sua voz grave ainda reverberando em minha mente. Seus olhos encontraram os meus, intensos e desafiadores. — Pense com carinho e me liga. Prometo ser fiel à nossa aliança, como o bom cachorro do Carlos...Ele deu um último olhar carregado de arrogância antes de se virar e sair pelo corredor. Aquele tom, aquela insinuação... Minha raiva explodiu como uma chama que parecia não ter fim.Andei de um lado para o outro no escritório, meu coração martelando no peito. Não era só o beijo. Era a audácia, a certeza de que ele acreditava que me tinha em suas mãos. A ideia me enojava e me fascinava ao mesmo tempo, o que apenas me deixava ainda mais furiosa.Caminhei at
— Cristina, aconteceu algo?Engoli em seco antes de responder.— Alejandro... Papá... Ele não está mais conosco.Do outro lado, ouvi um silêncio pesado, seguido pelo som de uma respiração longa e controlada.— Como assim?— Ele teve morte cerebral, Alejandro. O médico confirmou hoje cedo. É o fim.Houve um longo silêncio antes de ele responder, sua voz carregada de pesar.— Sinto muito, Criss. Gostaria de estar aí com você agora.— E precisa estar — respondi com firmeza. — A família precisa de nós mais do que nunca.Ele suspirou, e eu soube que ele já estava calculando os próximos passos.— Vou encerrar tudo aqui o mais rápido possível e volto para a Itália. Precisamos estar unidos para proteger o nome dos Mendez.— Obrigada, Alejandro. — Minha voz tremeu levemente, mas o apoio dele trouxe um conforto inesperado.Assim que desliguei, um alívio momentâneo tomou conta de mim. Mas a sensação durou pouco. Batidas firmes na porta me tiraram do transe. Era Carlos.Ele entrou com sua postura
Enquanto ajustava os últimos detalhes, uma batida firme na porta me chamou a atenção.— Entre — disse, sem desviar o olhar do espelho.Carlos entrou, tão impecável quanto sempre, vestindo um terno que parecia feito sob medida. Seus olhos avaliavam o ambiente antes de pousarem em mim. Havia algo no jeito como ele me olhava que me deixava em alerta, como se ele soubesse algo que eu ainda não sabia.— O que você quer, Carlos? — perguntei, impaciente.Ele se aproximou devagar, a expressão séria.— Não tenho muito tempo para rodeios, Cristina. Precisamos conversar.Cruzei os braços, esperando que ele explicasse.— O conselho está inquieto — ele começou, sua voz calma, mas carregada de seriedade. — Eles querem Alejandro no comando. Acham que você não está pronta.O impacto daquelas palavras me atingiu como um soco no estômago, mas mantive minha expressão neutra.— Alejandro está no México e já deixou claro que me apoia. O que mais eles precisam?Carlos suspirou, passando a mão pelos cabelos
Desliguei o telefone e fiquei olhando para o aparelho por alguns segundos, como se esperasse que ele voltasse a tocar e me dissesse que tudo aquilo era só um sonho. Mas não era.Antes que eu pudesse sair do quarto, uma batida na porta me tirou dos pensamentos. Quando a abri, encontrei Carlos parado ali, com sua expressão séria e determinada.— Cristina— ele disse, entrando no quarto sem esperar convite. — Preciso falar com você.Fechei a porta e o encarei, esperando que continuasse. Ele deu um passo à frente, os olhos fixos nos meus.— Sei que o momento é difícil, mas minha proposta continua de pé. Acho que você já percebeu que, se aceitarmos isso, todos vão entender que estamos unidos. Que ninguém pode nos derrubar.Ele fez uma pausa, aproximando-se ainda mais.— Quero me casar com você, Cristina. Não apenas pelo poder, mas porque confio em você. Nós dois podemos fazer isso funcionar.Fiquei em silêncio, sentindo uma mistura de emoções. Não sabia se queria gritar ou rir, mas uma cois
Entrei no escritório, fechei a porta com cuidado e travei a chave. Queria estar sozinha, nem que fosse por um breve momento, para poder processar o que estava acontecendo. Sentei-me na poltrona perto da janela, onde costumava ficar em momentos de pressão. Agora, porém, tudo parecia sem sentido. Meus pensamentos estavam uma bagunça, e o que antes parecia um lugar de controle e reflexão, agora era apenas um cenário de solidão e dor. Eu só queria chorar, sem as máscaras que me forçavam a usar diante dos outros. As lágrimas começaram a escorrer silenciosamente, e cada soluço parecia carregar o peso de toda a perda que eu ainda não conseguia compreender. Meu pai não estava mais ali. E com isso, algo dentro de mim se despedaçava.Mas, antes que eu pudesse me perder completamente naqueles sentimentos, ouvi as batidas na porta, impacientes e desesperadas. Heitor. Sempre ele, com sua mania de querer ter a palavra final em tudo. Ele não sabia o que estava acontecendo, não entendia a dor que eu
Quando a porta se fechou atrás dele, um silêncio pesado se instalou. Eu estava exausta, emocionalmente drenada, mas, ao mesmo tempo, aliviada por ter evitado o pior. Olhei para Carlos, que ainda mantinha a arma nas mãos, e, embora ele estivesse alheio à tensão do momento, percebi um leve sorriso de aprovação em seu rosto. Ele sempre soubera como proteger, até quando isso significava agir de forma extrema. E, naquele momento, isso me assustava. Mas eu sabia que, ao menos por enquanto, eu estava segura.Carlos se aproximou lentamente, sua presença preenchendo o espaço como uma sombra constante. Eu estava parada na porta do escritório, tentando recuperar o controle da tempestade que rugia dentro de mim. Ele se posicionou a poucos passos de distância, a intensidade em seus olhos denunciando o que viria a seguir.– Eu te disse que nossa aliança é importante – começou ele, sua voz baixa, mas firme. – Quero você ao meu lado, Cristina, e espero que futuramente sejamos mais que aliados.Respir