ThierryMeu olhar ia repetidas vezes para o rosto do Carioca e para o resultado do teste de DNA, e vice-versa. Mesmo vendo o resultado, eu ainda estava sem acreditar.Levantei da cadeira e comecei a andar de um lado a outro na pequena sala. Eu estava parecendo aqueles malucos de clínicas psiquiátricas das novelas, que ficam inquietos e com o olhar perdido.Eu precisava de alguns minutos pra processar, e realmente meu olhar estava longe, assim como meu pensamento também.Minhas memórias viajaram para minha infância e a minha adolescência, onde cresci sem pai e sem mãe. Mas a memória mais triste que carrego é do dia em que mataram ela, a minha mãe.Dizem que não é possível guardar lembranças de quando somos muito pequenos. Em parte, isso pode ser verdade, pois não lembro de muita coisa, com exceção de uma forte lembrança que nunca saiu da minha memória: o triste acontecimento que eu gostaria de esquecer. O momento em que soubemos da morte da dela e também do marido dela, o pai da Thayla
ThierryQuando penso em sair da salinha, Carioca quer mais papo. O que mais ele quer conversar?— Senta aí! — Ele aponta autoritário para a cadeira em que eu estava antes e ele se dirige até a cadeira dele, atrás da mesa, enquanto mexe outra vez no celular.— O que faltou? — pergunto após me sentar, fazendo um sinal com a boca e posicionando uma mão entrelaçada à outra.— Calma, Thierry, não precisa ficar sempre na defensiva assim!Com as pernas esticadas, passo um pé por cima do outro, ficando tenso sem saber o que viria.O Carioca sempre consegue fazer isso, de uma forma ou outra, ele mexe com o emocional das pessoas.— Você não é meu filho, como o exame comprovou, mas eu prometi que mudaria a sua vida! — Ele digita algo no celular.Sigo calado, sem entender nada.— Não é porque você não é meu filho que eu não posso te proporcionar uma vida boa, Thierry. Minha mulher e eu, anos atrás, prometemos um ao outro que faríamos isso, e é o que vamos fazer.— Você não tem que me dar nada! —
📍VITÓRIA, CAPITAL DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTOThaylaVitória é uma cidade linda, e eu estou gostando daqui. Não é como o Rio de Janeiro, é claro, embora o calor seja bastante semelhante, mas eu sinto falta de muitas coisas de lá.Estou procurando emprego e, inclusive, já fiz uma entrevista para a vaga de atendente em uma lojinha e estou aguardando ansiosa a resposta.Teresa e Manoel, familiares de tia Célia, me acolheram muito bem. Os dois são muito queridos, tranquilos, e não tenho do que reclamar, pois me receberam de braços abertos. Porém, estar longe de tudo me faz ficar melancólica.Eu sinto falta da minha faculdade, que era meu sonho do qual tive que abrir mão. Sinto saudade da minha tia, da Milena, da Antonela. Do meu irmão, então, nem se fala. Eu morro de saudades dele e, embora nos falemos diariamente, não é a mesma coisa que estar perto.Também sinto saudade do Gabriel. Infelizmente, não posso negar o que sinto por ele, e a falta de vê-lo, mesmo que só às vezes, me machuca
ThaylaMeu coração chega errar as batidas, e sinto minhas pernas ficarem bambas. Parece que me falta o ar, e eu só queria sair correndo para longe ou agarrá-lo ali mesmo. Ter essa química insana com Gabriel faz ter pensamentos impuros até mesmo dentro de uma igreja, mas eu não poderia esquecer o motivo que me fez fugir dele.Como pode outra pessoa ter esse poder de domínio sobre mim sem sequer ter me tocado?Pois é exatamente isso que eu sinto. É como se eu pertencesse a ele de todas as formas e não pudesse sair disso, mesmo fugindo para qualquer lugar do mundo.Gabriel ali, quase me devorando com os olhos, e eu não sabia distinguir se ele sentia ódio ou desejo. Era um olhar indecifrável no momento.— Eu preciso falar com você, Thayla!— O que você está fazendo aqui? Vai embora, por favor! — respondi, olhando para os lados, verificando se alguém escutaria o que estávamos conversando.— Eu não vou embora até você falar comigo! — ele continuava falando enquanto segurava meu braço, sem s
G4 Encontrar a Thayla depois de todo esse tempo sem ver ela só mostrou o quanto eu amo essa mulher e o quanto ela mexe com as minhas estruturas, os meus pensamentos e meus instintos. Dentro da igreja mesmo, meu corpo já tava inquieto, com vontade de puxar Thayla pra perto, sentir a pele dela e fazer ela entender na prática o quanto me pertence. Mas aquele lugar exigia respeito, e eu também não tinha ido até ali só para isso. Eu precisava, antes de tudo, mostrar pra ela o quanto estava errada. Queria que ela soubesse, sem sombra de dúvida, que não aconteceu nada entre a Bruna e eu, que todos os meus pensamentos são dela, assim como o meu coração, e que nada tinha mudado em relação a isso. Mesmo assim, sei que ela pode não querer mais nada comigo, e esse pensamento me tortura. Se for o caso, vou ter que aceitar... mas vai me destruir por dentro. Entreguei o resultado dos meus exames, provando que a vagabundä da Bruna tinha colocado um "Boa noite, Cinderela" na minha bebida. Thayla p
Thayla Me senti tão burrä e, ao mesmo tempo, tão egoísta e injusta ao ver o exame que comprovava que ele tinha sido dopado pela nojenta da tal Bruna. Eu deixei o ciúme me cegar por conta da minha falta de confiança, permitindo que a raiva me dominasse e afastasse de mim o homem que mais me amou. Mas Gabriel não desistiu. Ele veio de helicóptero do Rio de Janeiro até o Espírito Santo para me mostrar a verdade. Não importaram os riscos, a distância, ou o medo de ser preso. Ele veio. Por mim. Por nós. Se isso não for amor, eu não sei mais o que é. Caso contrário, por que ele viria atrás de mim, correndo risco de ser preso ou coisa pior? Não posso mais tentar me enganar, não posso mais fugir do que sinto. A pousada onde ele se hospedou, certamente com um nome falso, era simples, discreta, perfeita para um homem como ele, que precisava manter-se fora da mira da justiça. Mas nada importava naquele momento, apenas a presença dele. Pelo corredor, Gabriel caminhava me abraçando por tr
MESES DEPOIS...ThierrySaindo do trabalho, meu telefone vibrou no bolso. Peguei o aparelho sem muita pressa, achando que era alguma ligação qualquer, dessas que as operadoras fazem, sempre perturbando, mas, ao ver o nome de Milena na tela, atendi na hora.— Oi, amor — falei, enquanto caminhava pela calçada movimentada. Mas, assim que ela respondeu, minha testa se franziu. Sua voz estava diferente, como se estivesse ofegante, talvez emocionada.— Aconteceu alguma coisa, linda? — perguntei, diminuindo o passo.— Eu ia te contar quando você chegasse aqui, mas… eu estou tão empolgada! — Ela riu nervosa. — Eu passei no teste, Thierry! Eu consegui uma vaga na Universidade da Califórnia! — Milena falava aceleradamente, demonstrando estar muito feliz.Parei, antes de atravessar a rua.— Universidade da Califórnia? — repeti, tentando processar. — Mas… e a faculdade daqui?Passei a mão pela testa, olhando ao redor sem realmente enxergar nada. Milena respirou fundo do outro lado da linha, e sua
Antonela Com meu barrigão enorme, sentada na poltrona do meu quarto, onde tudo está pronto para a chegada do meu filho, mais uma vez encaro o passaporte falso do Alexandre. Já fiz isso tantas vezes ao longo dos meses que já perdi as contas. Passo minha unha, feita no dia anterior, pela foto dele. Tão lindo ele era... Este passaporte é a prova de que foi recíproco. Ele me amava, e eu vou guardar para sempre comigo. — Seria tão incrível seu papai aqui conosco. — Minha mão passeia pela minha barriga, enquanto converso com meu filho, que já tem dado sinais de que quer nascer. Eu senti pequenas contrações há alguns dias, e minha cesariana está marcada para daqui a uma semana. O próprio médico recomendou o procedimento, pois as ecografias mostraram que o bebê é muito grande e eu sou muito pequena. Então, ele achou melhor assim, e eu não me opus. Olho no celular a foto que fiz do mapa no quarto do Alexandre. Essa imagem é outra coisa que guardarei para sempre. Levanto-me e vou até a cô