A menina chegou ao vilarejo uma semana depois do acordo entre o Lycan e os lobisomens ser firmado. Aram mandou seus betas que possuíam melhor treinamento em combate para ir buscá-la, ele ainda não estava certo que aquele acordo não se tratava de alguma armadilha.
Szafir era o beta de confiança de Aram, haviam lutado diversas batalhas e construíram juntos uma estabilidade para o clã. O amigo era um lobo de honra, em quem ele podia confiar. Se fosse realmente uma armadilha, ele era a pessoa certa para identificar e neutralizar o ataque. Porém, tudo ocorreu de forma tranquila. Quando o grupo de betas chegou no local indicado para pegar a garota, seu líder, Szafir, ficou muito impressionado com o aspecto da fêmea que seria a nova Luna da alcateia. Ela realmente parecia bastante jovem e assustada, era óbvio que não era uma convidada bem-vinda naquela matilha de lobisomens. Estava com as mãos e os pés amarrados e a boca amordaçada. Aquilo parecia um tanto exagerado, dado a constituição frágil da fêmea. Ela passou de um grupo ao outro sem contestar, apenas seguia de cabeça abaixada. O líder dos lobisomens os alertou ao entregá-la. — Boa sorte para vocês. Eu sugiro que não a desamarrem, ela vai tentar escapar na primeira oportunidade. Szafir achou melhor não responder, fazer negócios ou acordos com lobos de quatro patas nunca era nada benéfico, apenas assentiu para o outro grupo e iniciaram o caminho de volta a sua vila. Ela foi entregue-lhes na metade do caminho que ligava as aldeias, bem no meio da floresta. Eles haviam ido de carro até o ponto de entrada da floresta e depois seguiram a trilha a pé, porém na volta perceberam que a fêmea andava com dificuldade com as pernas amarradas. Szafir notou que ela já estava com feridas em seus tornozelos pois um pouco de sangue escorria deles. Sem aviso, ele se abaixou e cortou as amarras dos pés dela, que assustou-se com a brusquidão de seu movimento. — Iremos mais rápido se você não tiver isso, mas nem sonhe em tentar escapar. Eu não precisaria de dois passos para alcançá-la ou dois segundos para atirar em você. Em nenhum momento ela levantou a cabeça para encará-lo, apenas concordou silenciosamente e continuou seguindo o caminho que lhe era indicado. Aram aguardava um pouco impaciente o grupo chegar, aqueles seriam seus últimos momentos de paz. Na semana que se antecedeu ele pediu que fizessem os preparativos para a cerimônia de casamento, era doloroso fazer tudo aquilo outra vez após ter já ter se casado com a fêmea que desejava compartilhar a vida. Procurou se envolver o mínimo possível, deixou que a sacerdotisa e as mulheres fizessem o que bem entendessem e se entregou à bebida por mais alguns dias. Quando Szafir desceu a garota do carro, Aram julgou que sim, a situação sempre poderia piorar. Ela era muito diferente de tudo o que ele havia imaginado, parecia muito nova mas haviam lhe garantido que ela já completara dezoito anos. Possuía a pele pálida e uma constituição frágil, os cabelos eram impressionantes quando vistos pela primeira vez, de um tom acinzentado, como se refletissem a luz da lua. Seu nome era Lucine, seu tio havia mencionado. Depois do cabelo, a segunda coisa que Aram notou era que ela estava com as mãos amarradas, descalça e amordaçada. Parecia confusa e assustada, ela olhou rapidamente ao redor e abaixou a cabeça novamente enquanto era guiada para frente da casa dele. Estava muito suja e com as roupas em farrapos. Ele caminhou até o grupo que a trazia e se dirigiu diretamente a Szafir. — O que significa isso? Porque ela está amarrada e nessas condições? Ele disse indicando Lucine. — Eles nos entregaram ela assim, aconselharam a não desamarrar então acho melhor manter os olhos em cima dela. Bem, o pacote está entregue. — Ele deu um empurrão leve nela em direção ao seu Alfa e foi se afastando. — Nos vemos à noite no casamento, se precisar de algo me chama e boa sorte meu amigo. Szafir e os outros betas se retiraram e Aram se aproximou da fêmea a guiando para dentro da casa, para tirá-la dos olhares curiosos. A roupa que as mulheres prepararam para o casamento já estava pronta, ela precisaria de um longo banho para tirar todas aquelas camadas de sujeira. Quando entrou ele fechou a porta atrás de si, ela estava parada imóvel no meio da sala da pequena cabana. Ele precisou de um momento para controlar os nervos, toda aquela situação era sufocante. — Me disseram que seu nome é Lucine, você sabe quem eu sou? Lucine assentiu e continuou calada, com o olhar cravado ao chão. — Então sabe que seu clã tem uma dívida de sangue comigo. Fora o fato de eu ter feito um acordo para você ser entregue a mim, segundo as antigas leis eu tenho o direito de reivindicar uma fêmea da sua matilha, devido à ofensa que me foi feita. Como você foi a única que sobrou, as coisas acabaram tomando esse rumo. Eu quero que saiba que eu não quero essa união, eu a abomino inclusive. Mas sendo eu o Alfa da alcateia, eu mais do que ninguém, preciso seguir as antigas tradições, se me tiraram uma esposa eu devo reivindicar outra. Pelo jeito que você chegou aqui devo entender que veio contra sua vontade, mas preciso alertá-la, tentar fugir não adiantará. Eu tenho olhos e ouvidos por toda a parte, isso aqui é mais que uma aldeia, é uma fortaleza. Enquanto estiver sob minha proteção não precisa se preocupar em ser ferida ou maltratada, contanto que aja corretamente. Se esse casamento não acontecer, entre outras coisas, eu vou ter que matar você e eu não quero a morte de uma criança nas minhas costas. Ela ergueu os olhos, que era cor âmbar, pela primeira vez. Aram viu neles um misto de dor, medo e fúria. — E eu posso apostar que não vou querer saber o que aconteceria se eu não me comportar bem!— Ela disse em um tom fraco, mas desafiador. Ele andou até um dos sofás, se sentou e esfregou a cabeça com impaciência. — Olha garota, eu te asseguro que eu não quero essa situação tanto quanto você, mas aqui estamos, os dois sem saída. Se eu não me casar com você o meu clã estará ameaçado de diversas maneiras, e o seu futuro, bem, não acredito que dure mais que uma semana fora das nossas divisas. — Você poderia se surpreender. — ela disse enigmática. Ele ignorou o comentário dela e continuou falando. — O que eu sugiro é que nós apenas sigamos com esse circo todo e deixemos as coisas se acalmarem. Precisa cooperar e se manter o mais discreta possível pois o povo por aqui não é muito fã de lobos de quatro patas. Sinceramente, é melhor para você não criar problemas, aqui você terá um teto e comida, poderá se recuperar e criar um pouco de carne nos ossos. E fique tranquila, não tenho nenhuma intenção de que esse casamento seja de verdade, não a forçaria a fazer nada, pode dormir no sofá tranquilamente sem esperar que eu a ataque. Mas eu preciso de uma confirmação sua de que as coisas vão funcionar dessa forma, que você não vai criar problemas e transformar minha vida em um inferno ainda maior do que ela já é! A menina ponderou por um tempo sobre o que ele havia dito, como se pesasse os prós e os contras, o que era ridículo, visto as opções que ele havia lhe dado. Na realidade, no momento ela não tinha alternativa, era melhor se manter calma e focada. Mesmo que tivesse sucesso tentando uma fuga, aquele macho tinha razão quando dizia que ela não iria longe. Estava fraca, cansada e mal alimentada, precisava recuperar as forças e estudar o local para pensar em uma estratégia de fuga. Visto isso, não tinha outra opção a não ser concordar. — Eu não vou causar problemas, mas você precisa me desamarrar, afinal, eu tenho que me arrumar para um casamento. Ele a avaliou por um instante, como se decidisse se poderia ou não confiar nela, mas não tinha outra opção, afinal não poderia deixá-la amarrada para sempre. Ele a soltou e indicou o banheiro do quarto para que ela se lavasse e avisou que as roupas estavam em cima da cama.Aram levou Lucine até a frente da casa e ali já havia uma pequena multidão. Uma mulher entregou a xícara de café a ele e o sal a Lucine, que foi instruída a temperar a bebida. Ela já havia ouvido falar desse costume antigo mas nunca havia presenciado, ficou surpresa em como o noivo conseguiu beber o café tão rapidamente, visto a quantidade de sal que ela havia colocado.Depois, foi preparado um grande banquete, cada membro do clã doava o que tinha disponível para a festa, que era sempre grandiosa. A sacerdotisa reuniu os noivos bem no centro do círculo de mesas, em que estavam a comida e os convidados, os fez ficar bem na frente dela e deu início a cerimônia. Como de costume, ela os abençoou fazendo reverência e preces à Deusa Lua e outras deusas ancestrais, a Deusa do amor e a Deusa da fertilidade. Para Lucine, aquilo era um espetáculo muito exagerado, era estranho como os Lycans haviam parado no tempo, seguindo tradições e costumes que os Lobisomens haviam abandonado há muito. Tod
Aram acordou cedo como era seu costume quando estava sóbrio. Olhou no celular e eram apenas sete horas, não tinha nada programado para esta manhã assim como para nenhum horário do dia. Todos esperavam que ele quisesse ficar sozinho com a esposa e aproveitar o máximo possível a lua de mel, o que estava bem longe da sua realidade.Não podia ficar na cama o dia todo, mas também não podia sair e ficar dividindo a sala com aquela fêmea que o lembrava de tudo o que ele queria esquecer. Lenha, lembrou que precisava cortar lenha. O inverno estava próximo e ele precisava reabastecer seu estoque de lenha seca. Isso certamente o deixaria ocupado no pátio de trás da cabana por pelo menos a manhã toda.Quando ele se vestiu e saiu do quarto, a encontrou ainda profundamente adormecida no sofá. Se aproximou mais e a sacudiu de leve para despertar.— Acorde garota, eu disse que você precisava levantar cedo e guardar as cobertas.Ela acordou assustada olhando para os lados, pareceu por um momento, não
Aram se sentiu observado, ergueu os olhos e a loba estava parada na porta da cozinha encarando-o. Ele podia sentir o cheiro do seu medo, e não entendia, já que ele nem mesmo a havia percebido ali. Quando a olhou mais tempo viu que ela havia trocado de roupa, vestia um conjunto de moletom que parecia ser 5 vezes maior que o seu tamanho. Que belo trabalho Szafir havia feito.— O que foi? Tem algo a me dizer?— Eu, eu queria saber se você não tem nenhuma tarefa que eu possa realizar, não quero ficar sentada no sofá olhando para as paredes.Ele apoiou a lâmina do machado no chão antes de responder à ela.— Você pode, sei lá, assistir televisão. Aproveite para pôr em dia seu programa favorito.— Eu não tenho mais um programa favorito.Ela respondeu a ele em tom bastante sério. Aram deu um longo suspiro, sabendo que não seria tão fácil se livrar da companhia dela.— Então você pode ir pegando toda a lenha que eu rachar e levar para a pilha que tem no galpão.Ele disse, apontando a grande co
Eles comeram em silêncio e quando terminaram, Lucine foi recolher os pratos para limpá-los. Aram segurou seu pulso quando ela foi tirar o dele.— Depois de fazer isso, me espera no sofá da sala.Ela fez como ele pediu enquanto Aram se dirigia ao quarto. Ele voltou com uma caixa de suprimentos de primeiros socorros e se sentou no mesmo sofá que ela, porém mais afastado.— Agora tira o tênis e coloca a perna no sofá.Ela o obedeceu, colocou o pé já sem a meia para cima do sofá, próximo de onde ele estava. Ele pegou a perna dela, colocou em seu colo e começou a examinar atentamente os ferimentos. Deu-se conta que existiam diversas cicatrizes, umas por cima das outras, o que significava que ela passou bastante tempo amarrada com as cordas a ferindo. Os machucados se curavam e outros eram abertos. Naquele momento ele soube que aquela fêmea havia passado por algo verdadeiramente ruim. Achou melhor não fazer qualquer comentário, lavou a região com soro e aplicou uma pomada com antibiótico.—
— Comida de cachorro? Como eu iria imaginar? Você nem tem um cachorro!Lucine tentou se explicar, visivelmente confusa.— Você chegou aqui ontem, como pode saber se eu tenho ou não um cachorro?— Onde está esse cachorro então, e porque não estava escrito no pacote que era comida de cachorro?Aram secou a boca com um pano de prato que estava no fogão. Apesar de tudo, o cozido não havia ficado com gosto tão ruim, apenas a textura estava estranha. Quando Yasmina morreu, ele não conseguiu ficar com o cachorro deles, o Eros. Szafir então levou o animal para a sua casa, para que fosse cuidado decentemente. Nas raras vezes que ia fazer compras, ele comprava comida para o animal e entregava ao amigo. Com os últimos acontecimentos, havia esquecido de entregar a ração a Szafir.— O cachorro não mora mais aqui, mas eu ainda levo comida de vez em quando. Bem, mas não importa, não têm como comer isso, vou fazer uns sanduíches.Ela começou a esvaziar os pratos de volta na panela.— Eu sinto muito A
Quando todos já iam se dirigindo ao galpão de suprimentos, Lucine ainda esperava Aram, que conversava com alguns homens mais velhos. O fato daquele beta ter vindo falar com ela, diminuiu um pouco o desconforto de se sentir odiada por todos ali presentes. Não que ligasse para a opinião de quem quer que fosse, mas sentir olhares afiados em sua direção não era agradável.Szafir também havia dado um bom conselho, que ela precisava trazer sempre na mente. Ele disse que Aram era um bom Alfa, mas que sua paciência não era conhecida por ser infinita. Que ela teria mais a ganhar se não o ficasse testando em embates e, de preferência, não oferecesse mais comida de cachorro para ele. Ela sorriu ao lembrar de sua fala descontraída. Ele havia dado o conselho e se retirado, deixando-a pensativa, instantes depois ela percebeu que o Alfa estava vindo até onde ela o esperava. Tinha uma
O tempo passou de forma amena, com o Alfa reconquistando o respeito do povo. Trabalhava igual aos demais na indústria de madeira, e nos dias livres ajudava no reparo das casas que necessitavam algumas reformas. Lucine não desistiu de aprender a preparar uma refeição decente, e com comida de verdade, que não era para cachorros, não foi tão difícil. Nos dias em que não ia para a madeireira, Aram ajudava bastante, com a casa e com as refeições.Lucine começou a gravar o rosto das pessoas, pois os via quase diariamente quando ia levar o almoço para o marido na fábrica. Com o passar dos dias, começou a receber alguns acenos de cabeça e até um até logo ou outro. O fato de ela ir todos os dias, pelo visto, estava fazendo as pessoas acreditarem que ela cuidava bem do marido.O fato do Alfa sempre a receber com um modesto, mas sincero sorriso, e demonstrar b
Em uma tarde em que ele não estava trabalhando, eles foram até uma pequena cidade que ficava próxima à aldeia, para comprar mantimentos. O lugar ficava a apenas 20 minutos de carro da aldeia, e possuíam um armazém bem abastecido e algumas lojas pequenas de roupas.Os dois foram primeiro ao armazém, passaram por um corredor de doces e ele percebeu que ela ficou olhando para uns chocolates que estavam na prateleira, porém não disse coisa alguma. Ele então, pegou alguns e colocou no carrinho de compras.— Você não precisa de nenhum produto específico, sei lá shampoo, desodorante?Ele perguntou, quando percebeu que ela não escolheria nada para si.— Estou bem com o que você tem em casa!Aram parou de empurrar o carrinho e a encarou.— Lucine, o shampoo do meu banheiro deve estar vencido a alguns meses! E você realmente planej